Frei Carlos Mesters, O. Carm.

João Batista aponta Jesus como Messias: Humildade é saber situar-se no chão da sua própria realidade

Oração inicial

Senhor Jesus, envie seu Espírito, para que Ele nos ajude a ler as Escrituras com o mesmo olhar, com o qual você os lê para os discípulos na rua de Emaús. Com a luz da Palavra, escrita na Bíblia, você o ajudou a descobrir a presença de Deus nos acontecimentos perturbadores de sua condenação e morte. Assim, a cruz que parecia ser o fim de toda a esperança, apareceu como fonte de vida e ressurreição.

Crie em nós o silêncio para ouvir sua voz na Criação e na Escritura, nos eventos e nas pessoas, especialmente nos pobres e no sofrimento. Sua palavra nos falará sempre que nós, como os dois discípulos de Emaús, possamos experimentar a força de sua ressurreição e testemunhar aos outros que você está vivo entre nós como fonte de fraternidade, justiça e paz. Isto pedimos a você, Jesus, filho de Maria, que nos revelou o Pai e enviou seu Espírito. Amem.

Lendo João 1,6-8.19-28 (Uma chave de leitura)

A liturgia deste terceiro domingo do Advento coloca diante de nós a figura de João Batista e descreve o lugar que ele ocupa dentro do plano de Deus. Assim, ela nos ajuda a ocupar o nosso lugar e nos prepara para a festa de Natal.

João Batista foi grande, muito grande. Tinha sido um profeta com muitos discípulos e grande liderança popular. Jesus o definiu como o maior nascido de entre as mulheres. Mesmo assim, conforme Jesus, o menor no Reino é maior que João (Mt 11,11). João sabia disso. Exaltado pelos outros, ele não se exaltava a si mesmo. Depois que Jesus começou a anunciar o Reino de Deus, ele soube ceder o lugar. Os seus discípulos, porém, não tiveram a mesma grandeza de alma. Eles ficaram com inveja. João os ajudou a superar o problema. De fato, não é fácil ceder o lugar e a liderança aos outros e colaborar com eles para que possam realizar a sua missão.

Uma divisão do texto para ajudar na leitura:

JO 1,6-8: O lugar de João dentro do plano de Deus: dar testemunho da luz

JO 1,19-21: O testemunho negativo de João a respeito de si mesmo: ele não é o que os outros pensam dele.

JO 1,22-24: O testemunho positivo de João a respeito de si mesmo: ele prepara o caminho do Senhor.

JO 1,25-28: O significado do batismo de João: prepara a vinda de alguém maior que virá depois.

O texto

6 Havia um homem enviado de Deus; o nome dele era Giovanni. 7 Estes vieram como uma testemunha para testemunhar a luz, para que todos possam acreditar através dele. 8 Ele não era a luz, mas para testemunhar a luz. 19 Agora, este é o testemunho de João, quando os judeus enviaram sacerdotes e levitas de Jerusalém para pedir-lhe: "Quem é você?" 20 E ele professou, e ele não negou, e professou: "Eu não sou o Cristo". 21 Eles perguntaram-lhe: "Quem é você então? Você é Elias? " Ele diz: "Eu não sou". "Você é o profeta?" Ele respondeu: "Não!" 22 Eles lhe disseram: "Quem é você? O que podemos dar uma resposta para quem nos enviou! O que você diz sobre você? " 23 Ele afirmou: "Eu sou a voz de alguém que chora no deserto: endireite o caminho do Senhor,

como o profeta Isaías disse ". 24 Foram enviados pelos fariseus.

25 E eles perguntaram novamente: "Por que você batiza se você não é o Cristo, nem Elias, nem o profeta?" 26 Respondeu-lhes João: "batizarei com água; entre vós é aquele a quem não conheces, 27 o que vem atrás de mim, de quem não sou digno de desatar a perna da sandália ". 28 Estes fatos ocorreram em Betània além do Jordão, onde João estava batizando.

Momento de silêncio orante: Porque a Palavra de Deus pode entrar em nós e iluminar nossas vidas.

Algumas perguntas para nos ajudar na meditação e na oração:

1- Qual o ponto que mais chamou a minha atenção ou de que mais gostei na atitude de João Batista?

2- Por três vezes, João define-se a si mesmo por uma negativa: não sou o Messias, não sou Elias, não sou o Profeta. O que cada uma destas três negativas afirma sobre a pessoa de João?

3- Usando uma frase do Antigo Testamento para dizer quem ele é, João desvia a atenção de si mesmo para Jesus. O que isto nos informa sobre João e sobre Jesus?

4- O que João afirma sobre o batismo? Como o batismo de João se distingue do batismo de Jesus?

5- Por que será que Jesus falou: João é o maior, mas o menor no Reino é maior do que ele (Mt 11,11)?

6- Como tudo isto pode ajudar-nos na preparação para festa de Natal?

5- Uma chave de leitura: para os que quiserem aprofundar mais o assunto

O contexto em que João Batista aparece no Evangelho de João

            O evangelho de João foi escrito no fim do 1º século. Naquele tempo, tanto na Palestina como na Ásia Menor, onde quer que houvesse alguma comunidade de judeus, havia também pessoas que tinham estado em contato com João Batista ou que tinham sido batizadas por ele (At 19,3). Visto do lado de fora, o movimento de João Batista era muito semelhante ao de Jesus. Ambos anunciavam a chegada do Reino (Mt 3,1-2) e ambos exigiam a conversão (Mt 4,17). Deve ter havido uma certa competição entre os seguidores de João e os de Jesus. Por isso, a resposta de João a respeito de Jesus valia não só para os enviados dos sacerdotes e fariseus da época de João, mas também para as comunidades cristãs do fim do primeiro século. De fato, todos os quatro evangelhos se preocupam em relatar as palavras de João Batista afirmando ele não ser o messias (Mt 3,3.11; Mc 1,2.7; Lc 3,4.16; Jo 1,19-23.30; 3,28-30).

Comentário do testemunho de João Batista

João 1,6-8:  O lugar de João dentro do plano de Deus: dar testemunho da luz. 

            O Prólogo do quarto Evangelho afirma que a Palavra viva de Deus está presente em todas as coisas e brilha nas trevas como luz para todo ser humano. As trevas tentam apagá-la, mas não o conseguem (Jo 1,1-5). Ninguém consegue abafá-la, pois não conseguimos viver sem Deus por muito tempo. A busca de Deus, sempre de novo, renasce no coração humano. João Batista veio para ajudar o povo a descobrir esta presença luminosa da Palavra de Deus na vida. O testemunho dele foi tão importante, que muita gente chegou a pensar que ele fosse o Cristo (Messias)! (At 19,3; Jo 1,20) Por isso, o Prólogo esclarece dizendo: "João não era a luz! Veio apenas para dar testemunho da luz!"

  1. João 1,19-21: O testemunho negativo de João a respeito de si mesmo: ele não é o que os outros pensam dele.

            Os judeus enviaram sacerdotes e fariseus para saber quem era esse João que batizava o povo no deserto e que atraía tanta gente de todos os lados. Eles mandaram perguntar: “Quem é você?” A resposta de João é curiosa. Em vez de dizer quem é, ele responde dizendo quem não é: “Não sou o Messias!” Em seguida, vem mais duas negativas: ele não é Elias nem o profeta. Tratava-se de aspectos diferentes da mesma esperança messiânica. Nos tempos messiânicos, Elias  voltaria para reconduzir o coração dos pais para os filhos e dos filhos para os pais. Ou seja, voltaria para restaurar a convivência humana (Ml 3,23-24; Ecl 48,10). O profeta, anunciado para, no futuro, levar a bom termo a obra iniciada por Moisés, era visto pelo povo como o messias esperado (Dt 18,15). João recusou estes títulos messiânicos, porque ele não era o Messias.

            Mais tarde, porém, o próprio Jesus disse que João era Elias (Mt 17,12-13). Como entender esta afirmação? É que havia várias interpretações a respeito da missão de Elias. Alguns diziam que o Messias seria como um novo Elias. Neste sentido, João não era Elias. Outros ensinavam que a missão de Elias era apenas para preparar a vinda do Messias. Neste sentido, João era Elias.

            Neste diálogo entre João e os fariseus e sacerdotes transparece a catequese das comunidades do fim do primeiro século. As perguntas dos sacerdotes e dos fariseus a respeito do significado de João Batista dentro do plano de Deus eram também as perguntas das comunidades. Assim, as respostas de Jesus, recolhidas pelo evangelista, serviam também para as comunidades.

  1. João 1,22-24: O testemunho positivo de João: ele é apenas alguém que prepara o caminho

            “Então, quem é você e por que batiza, se não é o Messias, nem Elias, nem o Profeta?” Os enviados pelos sacerdotes e fariseus queriam uma resposta clara, pois deviam prestar conta aos que os tinham encarregado de interrogar João. Para eles não bastava saber o que João não é. Eles querem saber quem ele é e o que ele significa dentro do plano de Deus.

            A resposta de João é uma frase tirada do profeta Isaías, frase muito usada, que aparece nos quatro evangelhos: “Sou a voz que clama no deserto. Preparem os caminhos do Senhor!” (Mt 3,3; Mc 1,3; Lc 3,4; Jo 1,23). Neste uso do Antigo Testamento transparece a mística que animava a leitura que os primeiros cristãos faziam da Sagrada Escritura. Eles buscavam aí dentro as palavras, não tanto como argumentos para provar suas afirmações, mas muito mais para verbalizar e explicitar para si mesmos e para os outros a novidade da experiência que tinham de Deus em Jesus (cf 2 Tim 3,15-17). 

  1. João 1,25-28: O significado do batismo e da pessoa de João.

            Nas comunidades cristãs do fim do primeiro século havia pessoas que só conheciam o batismo de João (At 18,25; 19,3). Entrando em contato com outros cristãos que tinham sido batizados no batismo de Jesus, eles queriam saber qual o significa do batismo de João. Naquele tempo, havia muitos batismos. O batismo era uma forma de a pessoa se comprometer com uma determinada mensagem. Quem aceitava a mensagem era convidado a confirmar a sua decisão através de um batismo (ablução, purificação ou banho). Por exemplo, pelo batismo de João, a pessoa se comprometia com a mensagem anunciada por João. Pelo batismo de Jesus, a pessoa se comprometia com a mensagem de Jesus que lhe comunicava o dom do Espírito (At 10,44-48; 19,5-6).

            No meio de vocês está quem vocês não conhecem. Esta afirmação de João refere-se a Jesus, presente no meio da multidão. Na época em que João escrevia o seu evangelho, Jesus continuava presente nas comunidades e nas pessoas, sobretudo nos pobres com os quais ele se identificava. Hoje ele está no meio de nós de muitas maneiras e também hoje, muitas vezes, nós não o conhecemos, como diz o canto: Entre nós está e não o conhecemos!

Ampliando as informações do Evangelho de João sobre João Batista

João Batista no Evangelho de João

            João provocou um movimento popular muito grande. O próprio Jesus aderiu ao movimento do Batista e se fez batizar por ele no rio Jordão. Mesmo depois de morto, João continuava a exercer uma grande atração e liderança, tanto entre os judeus como entre os cristãos vindos do judaísmo (At 19,1-7). As informações sobre João Batista, conservadas no Quarto Evangelho (Jo 1,6-8.15.19-36; Jo 3,22-30), são as seguintes: 1) João veio para dar testemunho da luz, para que todos pudessem crer por meio dele. Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz (Jo 1,6-8).  2) Jesus veio depois de João e chegou a ser discípulo de João. Mesmo assim, ele é mais importante que João, porque já existia antes de João: "Aquele que vem depois de mim, passou na minha frente, porque existia antes de mim" (Jo 1,15.30). Jesus é a Palavra Criadora que estava junto do Pai desde antes da criação (Jo 1,1-3).  3) João confessou abertamente: "Não sou o Messias. Não sou Elias. Não sou o profeta que o povo espera. Sou apenas uma voz que clama no deserto: endireitai o caminho do Senhor!" (Jo 1,19-23).  4) Diante de Jesus, João se considera indigno de desatar a correia da sandália dele e diz: "É preciso que ele cresça e eu diminua" (Jo 1,27; 3,30).  5) A respeito de Jesus, ele declarou ao povo: "Vi o Espírito descer do céu e permanecer sobre ele. Ele vai batizar com o Espírito Santo!" (Jo 1,32-33). 6) João aponta Jesus como o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (Jo 1,29.36), o Eleito de Deus (Jo 1,34).

A Galeria dos Encontros no Evangelho de João

            No Evangelho de João, são narrados com muitos detalhes os vários encontros que Jesus teve com as pessoas ao longo da sua vida itinerante pela Palestina: com os primeiros discípulos (Jo 1,35-51), com Nicodemos (Jo 3,1-13; 4,14; 7,50-52; 19,39), com João Batista (Jo 3,22-36), com a Samaritana (Jo 4,1-42), com o paralítico (Jo 5,1-18), com a mulher que ia ser apedrejada (Jo 8,1-11), com o cego (Jo 9,1-41), com Marta e Maria (Jo 11,17-37). Estes e outros encontros são como quadros, colocados nas paredes de uma galeria de arte. Eles vão revelando aos olhos atentos de quem os aprecia algo que está por trás dos detalhes, a saber, a identidade de Jesus. Ao mesmo tempo, mostram as características das comunidades que acreditavam em Jesus e davam testemunho da sua presença. São também espelhos, que ajudam a descobrir o que se passa dentro de nós quando nos encontramos com Jesus. O espelho do encontro de Jesus com João Batista, que meditamos neste terceiro domingo do Advento, ajuda a preparar-nos para o nosso encontro com Jesus na próxima festa de Natal.

Oração final: Salmo 131: Abandono de filial:

Senhor, meu coração não é orgulhoso,

Meus olhos não são arrogantes,

Não me mudo entre coisas que são muito grandes,

superior à minha força.

Pelo contrário, mantenho minha alma calma e calma.

Como um bebê desmamado nos braços de sua mãe,

Como uma criança desmamada é minha alma.

Espere, Israel, o Senhor;

agora e sempre!

Oração final

Senhor Jesus, agradecemos a sua palavra que nos fez ver melhor a vontade do Pai. Deixe seu Espírito iluminar nossas ações e nos dizer a força para fazer isso, que Sua Palavra nos mostrou. Que nós, como Maria, sua Mãe, não possamos apenas escutar, mas também praticar a Palavra, você que vive e reina com o Pai na unidade do Espírito Santo para todo o sempre. Amém.