Frei Carlos Mesters, O. Carm.

As três estrelas no escudo do Carmo representam Elias, o profeta do zelo pela causa do Senhor; Eliseu, o herdeiro que irradia a experiência do Deus de Elias, e Maria, a mãe de Jesus, que ouve a Palavra e a coloca em prática. As três são o resumo da nossa identidade, do nosso carisma e da nossa missão. O escapulário é o manto de Elias. É o manto que Eliseu recebeu de Elias. É o manto da proteção que Maria, a Mãe de Jesus, nos oferece.

1-O manto de Elias

Deus mandou que Elias ungisse Eliseu como seu sucessor (1Rs 19,16). Elias foi e transmitiu a Eliseu o chamado de Deus. Ele o encontrou trabalhando com doze juntas de bois diante dele; ele próprio conduzia a décima segunda junta. Elias passou perto dele e lançou sobre ele seu manto (1Rs 19,19). Elias não disse nada, não explicou nada. Apenas colocou sobre ele o manto, o manto de Elias. A Bíblia de Jerusalém em nota ao pé da página diz: "O manto simboliza a personalidade e os direitos do seu dono".

Eliseu entendeu o gesto do manto, abandonou seus bois, correu atrás de Elias e disse: "Deixa-me abraçar meu pai e minha mãe, depois te seguirei". Elias respondeu: "Vai e volta logo" (1Rs 19,20).

Eliseu foi para a casa dos pais e fez uma festa de despedida: "Tomando a junta de bois, a imolou. Serviu-se da lenha do arado para cozinhar a carne e deu-a ao pessoal para comer. Depois levantou-se e seguiu Elias na qualidade de servo" (1Rs 19,21). Largou tudo que possuía e seguiu Elias como servo. De dono rico de muitos bens, ele se fez empregado pobre que abandonou tudo que tinha. O que chama a atenção é a coerência de Eliseu na resposta ao chamado.

2-O manto de Eliseu

Uma coisa que chama a atenção é a maneira intrigante como Eliseu acompanhou Elias na última caminhada antes de Elias ser arrebatado pelo carro de fogo. Por três vezes, Elias pede a Eliseu: "Fica aqui, pois Javé me enviou ir sozinho até Betel ... até Jericó ...até o Jordão"(2Rs 2,2.4.6). E por três vezes Eliseu responde: "Tão certo como Javé vive e tu vives, não te deixarei!" (2Rs 2,2,4,6). Por duas  vezes, os irmãos profetas disseram a Eliseu: "Sabes que hoje Javé vai levar teu mestre por sobre tua cabeça?" E por duas vezes, Eliseu responde: "Sei! Fiquem calados!" (2Rs 2,3.5).  Eliseu não abandonou Elias e, como diz a história, "os dois partiram juntos" (2Rs 2.1.2.6) Sempre juntos, desde Guilgal, passando por Betel e Jeric até o rio Jordão! Elias insiste, Eliseu não desiste, os irmãos profetas observam de longe e confirmam a caminhada dos dois. Qual o significado desta cena?  

Esta caminhada dos dois não era uma caminhada qualquer! Todos sabiam que em breve Elias seria levado embora (2Rs 2,3.5). Por isso, nada podia separar o discípulo do mestre. Eliseu, o discípulo; Elias, o mestre.

Chegando no rio Jordão, Elias pega o manto, bate nas águas, a água se divide e eles passam a pé enxuto (2Rs 2,8). Depois que passaram o rio, Elias diz a Eliseu: "Peça o que quiser antes que eu seja arrebatado da sua presença!" Eliseu pede: "Deixe-me como herança uma dupla porção do seu espírito" (2Rs 2,9). Naquele tempo, o filho mais velho recebia dos pais uma dupla porção da herança (cf. Dt 21,17). Era para não diminuir ou pulverizar a propriedade da família. A herança devia ser preservada integralmente para as gerações seguintes. Pelo pedido que fez a Elias, Eliseu mostrou ter plena consciência da sua missão como filho mais velho que deve preservar a herança do profeta Elias. Hoje, nós somos Eliseu, o filho mais velho. Nossa herança é o duplo espírito de Elias a ser preservada integralmente. Esta herança não pode ser diminuída nem pulverizada, mas deve continuar na íntegra e irradiar nos outros, através do nosso testemunho.

No momento de ser arrebatado, Elias deixou cair o manto. Eliseu pegou o manto de Elias, bateu com ele nas águas do rio Jordão e disse: "Onde está o Deus de Elias?" (2Rs 2,14). Na mesma hora, as águas se dividiram em duas partes, e Eliseu atravessou o rio a pé enxuto. Os irmãos profetas reconheceram o sinal de Deus e disseram: O espírito de Elias repousa sobre Eliseu (2Rs 2,15). Eliseu é o sucessor aceito e reconhecido por todos. O Espírito de Elias está simbolizado no manto (escapulário) que nós recebemos. Será que hoje o povo pode reconhecer que o espírito o profeta Elias repousa sobre nós!

3-O manto de Maria a mãe de Jesus

A Bíblia não fala do manto de Maria, mas nela aparecem sinais e símbolos que são usados na liturgia para explicar como o escapulário, o manto de Maria, é um sinal de proteção, de reconhecimento e de compromisso.

São três os principais símbolos que merecem sem lembrados aqui: (1) o manto da justiça, (2) a nuvenzinha que sobe do mar, (3) a figura da mulher em dores de parto que aparece no Apocalipse. Um símbolo não precisa de muita explicação. Ele fala por si e faz sentir a sua mensagem , quando contemplado em silêncio.

 4-O manto da justiça

Na Missa Votiva de Nossa Senhora do Carmo, a liturgia aplica este texto do profeta Isaías a Nossa Senhora, onde se diz que Deus a revestiu com o manto da justiça. O Escapulário, o manto de Nossa Senhora que nos cobre e defende, é o manto da justiça. Enquanto for ler o texto de Isaías, pense no Escapulário, o manto de Maria, e tente intuir o que este texto nos insinua a respeito do Escapulário que nós carregamos. Eis o texto:

"Transbordo de alegria em Javé, e me regozijo com meu Deus, porque ele me vestiu com a salvação, cobriu-me com o manto da justiça, como o noivo que se enfeita com turbante, e a noiva que se adorna com joias. Assim como a terra faz brotar uma nova planta, e o jardim faz germinar suas sementes, assim também o Senhor Javé faz brotar a justiça e o louvor na presença de todas as nações" (Isaías 61,10-11).

5-A nuvenzinha que sobe do mar

Elias mandou o rapaz subir o Monte Carmelo para ver se havia algum sinal de chuva: "Suba e olhe para o lado do mar". O rapaz foi e voltou dizendo: "Não há nada!" (1Rs 18,43). Elias disse: Volte, até sete vezes (1Rs 18,43). Isto é: sempre! Não desistir nunca. Enquanto isso, Elias reza. O que chama a atenção é a atitude durante a reza: "Elias subiu ao topo do monte Carmelo e se encurvou até o chão, colocando o rosto entre os joelhos" (1Rs 18,42). É a atitude de total dependência do feto dentro da barriga da mãe durante os nove meses da gestação. Na sétima vez, o rapaz voltou dizendo: "Uma nuvenzinha, do tamanho da mão de uma pessoa, vem subindo do mar" (1Rs 18,44). Era o sinal da chuva. Num instante o céu ficou escuro, com nuvens trazidas pelo vento, e caiu uma chuva pesada (1Rs 18,45).

Nós Carmelitas sempre interpretamos este fato como uma prefiguração de Nossa Senhora e da proteção que o escapulário oferece. Maria nos trouxe Jesus que irrigou e fecundou nossa vida com a certeza da presença do amor de Deus em nossas vidas. A nuvenzinha evoca a nuvem da presença de Deus que acompanhava o povo pelo deserto durante quarenta anos: "Javé ia adiante deles, de dia numa coluna de nuvem, para lhes mostrar o caminho, e de noite numa coluna de fogo, para os alumiar, a fim de que caminhassem de dia e de noite. Nunca se retirou de diante do povo a coluna de nuvem durante o dia, nem a coluna de fogo, durante a noite". (Ex 13,21-22)

6-A mulher revestida do sol

"Apareceu no céu um grande sinal: uma Mulher revestida com o sol, tendo a lua debaixo dos pés, e sobre a cabeça uma coroa de doze estrelas. Estava grávida e gritava, entre as dores do parto, atormentada para dar à luz. Apareceu, então, outro sinal no céu: um grande Dragão, cor de fogo. Tinha sete cabeças e dez chifres. Sobre as cabeças sete diademas.  Com a cauda ele varria a terça parte das estrelas do céu, jogando-as sobre a terra. O Dragão colocou-se diante da Mulher que estava para dar à luz, pronto para lhe devorar o Filho, logo que ele nascesse. Nasceu o Filho da Mulher. Era menino homem. Nasceu para governar todas as nações com cetro de ferro. Mas o Filho foi levado para junto de Deus e de seu trono. A Mulher fugiu para o deserto. Deus lhe tinha preparado aí um lugar onde fosse alimentada por mil, duzentos e sessenta dias" (Apocalipse 12,1-6).

A liturgia aplica este texto do Apocalipse a Nossa Senhora. A Mulher em dores de parto simboliza Maria, a mãe de Jesus, que faz nascer vida nova. Simboliza a humanidade, o povo de Deus e tudo aquilo que fazemos para melhorar a vida do povo.

O Dragão simboliza o poder do mal, a morte, os poderes que oprimem e sufocam a vida. Sua força é tão grande que com uma balançada do rabo derruba uma terça parte das estrelas. Ele está diante da Mulher para devorar o menino que vai nascer. Luta desigual! O que pode uma mulher em dores de parto, uma comunidade, um círculo bíblico, uma organização do bairro, contra o poder do dinheiro que hoje domina o mundo e ameaça desintegrar a vida no planeta?

Mas Deus tomou posição a favor da vida! Ele intervém defende a Mulher, defende o menino, defende a vida. Jesus nasce, vive, morre, ressuscita e sobe ao céu. A ressurreição de Jesus é o novo começo, a nova criação. Ela revela o poder com que Deus enfrenta e vence o Dragão e protege o seu povo. O Escapulário é sinal desta fé na vitória final e expressão do compromisso nosso em assumir a mesma luta em defesa da vida.