Frei Pedro Jansen, O. Carm. In Memoriam (*07/02/1938 + 22/06/2010)

O fato que vou narrar se deu há 30 anos. Data exata não sei mais. O lugar foi Governador Valadares, na estrada do seminário. A pancada jamais esqueci e a muita gente transmiti. Quer saber o que foi que aconteceu?

Na diocese as reuniões do bispo com os padres eram feitas no  seminário. Ficava na periferia da cidade a uns cinco quilômetros do centro. O encontro ocupou o dia todo e terminou no começo da noite. Para não enfrentar sozinho mais de 150 Km. em estrada de chão, para chegar em casa, resolvi dormir no seminário. No dia seguinte, bem cedo, entrei no carro e desci a rampa do seminário e entrei na estrada que vinha da roça para o centro. De imediato vi 3 figuras femininas: uma senhora com idade de vó, uma senhora de meia idade e uma jovem de uns 15 anos. Cada uma carregava uma cesta com produtos de horta, verduras e legumes. Hesitei, mas parei o carro e ofereci carona, caso fossem para o centro. Elas se entreolharam e olharam para mim e a vó decidiu: nós vamos aceitar.

A conversa mexeu nos assuntos corriqueiros de sol e chuva, das dificuldades da vida e das alegrias. Curioso, eu não pude deixar de perguntar de onde vinham e para onde iam. Outra vez a vó conduziu a conversa: tinha um sítio, traziam verduras para vender no mercado, porque com a filha viúva, a neta para criar, abandonada pelo marido, era isso o meio de sobreviver. Refleti sobre o que a vó tinha dito e arrisquei um palpite: “Vó, na falta de homem no sítio, porque a senhora não vende a terra, muda para a cidade. A filha poderá se empregar, a neta poderá estudar e a senhora cuida da casa.

Quando a vó ouviu a palavra vender ela se mexeu na poltrona, virou para mim e disse.

“Meu senhor, vosmecê não falou por mal, mas eu não posso vender a terra. A mulher que vive agora com meu marido, não ama “ele”. Quem amo meu marido sou eu. Ela aproveita dele, enquanto tiver algum recurso e saúde. No dia em que ele- meu marido- ficar doente, ela vai abandonar “ele”. E então, quando isto acontecer, sem a terra eu não vou poder cuidar dele. Porque, quem ama meu marido sou seu.”

É inútil dizer que eu esperava todas as respostas, menos a que eu acabava de ouvir. Foi como um pancada na cabeça.

Logo chegamos no ponto em que elas deviam descer do carro. Agradeceram a carona e me desejaram muita felicidade. Retribui os votos. Sozinho, tive que parar o carro para me recuperar da pancada que a vó me tinha dado. Eu, como padre e religioso, me senti pequeno, vencido. Agradeci a Deus aquele testemunho de fé e de amor.

Não sei se a vó precisou realizar o que o seu compromisso de fidelidade lhe inspirava. Sei que nunca ouvi história semelhante. pude conta-la apropriadamente muitas vezes, no decorrer da minha vida e nos diversos lugares em que cheguei a morar.

Para a Semana da Família seria uma bênção se tivesse uma centena de vós deste tipo, dando pancada por aí.