Frei Cláudio van Balen, O. Carm. Convento do Carmo, Belo Horizonte-MG.
Embora os estudos a deixassem com um certo vazio, ela continuou ampliando sua visão. Caiu em uma quase total indiferença diante de questionamentos religiosos, chegando a denominar-se ateísta. Mesmo assim, por sentimentos de compaixão, ela continuou a acompanhar sua mãe à sinagoga. Essa delicada sensibilidade e a abertura de espírito a acompanharam em toda a sua trajetória. Posteriormente, renasceu para a capacidade de admirar a realidade, que lhe foi revelando dimensões muito além dos horizontes de esquemas fixos e de ideologias de dominação. Agora a verdade passa a ser uma certeza que vem dar direcionamento à sua busca.
No estudo fenomenológico, Edith despertou para a percepção dos fenômenos e seu significado para a vida. No verão de 1912, ela entrou em contato com a riqueza do pensamento filosófico de Edmundo Husserl (1859-1938), o que a libertou da visão estreita que herdara da universidade de Breslau. Conheceu também o pensamento da filósofa Hedwig Martius e resolveu mudar para Göttingen, onde ambos residiam. Desencantada com o subjetivismo da psicologia, que ainda estava engatinhando, ela se entusiasmou pelo método objetivo da fenomenologia, em que a realidade fala de si. E seus professores, judeus que adotaram a fé cristã - Husserl, Adolf Reinach e Max Scheler - despertaram nela também a pesquisa religiosa, uma vez que a ciência não conseguiu saciá-la em sua busca da verdade.
Relações de amizade a ajudaram a descobrir o Cristianismo e o significado da cruz. De seu encontro com A. Reinach, assistente de Husserl, ela diz, a partir de sua posição inferior de mulher: “Nunca me tinha sentido acolhida por um ser humano, com tão grande bondade... Foi como se um mundo novo se abrisse para mim”. Ela também foi tocada, em admiração, pelo testemunho de vida de Max Scheler, Hedwig Martius e Anna Reinach que se fizeram janela aberta para o mundo da fé, cuja influência ela ia sofrendo quase imperceptivelmente. Na primeira Guerra Mundial, ela interrompeu seus estudos e passou a trabalhar como ajudante de enfermagem, no hospital austríaco de Maehren, tratando dos feridos.
Em agosto de 1916, ela defende a tese: “Zum Problem der Einfühlung” (“summa cum laude”). Ela se torna doutora em filosofia e aceita o convite de Husserl para ser seu assistente na universidade de Freiburg, em Breisgau. Após um ano e meio, reconhece que não consegue prosseguir com independência sua pesquisa, sem fazer sombra ao mestre. Resolve, então, renunciar à sua função de assistente, sem que rompa com a amizade. Quando Adolf Reinach, discípulo de Husserl e filósofo, falece na Bélgica, em 1917, sua esposa Anna convida Edite para ordenar os escritos do marido em vista de uma publicação póstuma. Ela aceita o convite de bom grado, mas teme o encontro com a viúva, pois não sabe como consolá-la, por não acreditar em uma vida eterna. (Reinach, judeu, tinha aderido à Igreja Evangélica.)
Para sua surpresa, encontrou essa amiga muito sofrida, mas não abatida e portadora de uma força interior que muito a impressionou. Batizada, havia poucos meses, ela encontra na fé uma grande força e paz. Mais tarde, Edith escreverá: “Esse foi meu primeiro encontro com a Cruz e a força divina que ela imprime nos que a carregam. Pela primeira vez, vi de modo palpável, diante de mim, a Igreja, nascida do amor libertador de Cristo, em sua vitória sobre o aguilhão da morte. Esse foi o momento em que minha descrença implodiu e Cristo passou a brilhar, Cristo em seu mistério da Cruz”. (PC, p.116) Aqui, ela aprendeu que não é o conhecimento racional que muda a pessoa, mas o ser tocado pela própria verdade. Porém, persistiu em seu esforço de resistir às consequências que emanam do encontro com Deus. Edith fala dessa “sombra da morte” que a perseguiu entre os anos 1917 a 1921.
Concluído o serviço, ela retornou para Freiburg, onde ficou até 1918, quando começou a procurar um emprego de professora de filosofia. A recomendação elogiosa de Husserl não bastou para que alguma universidade assumisse o risco de contratar uma mulher como docente. Em 1920, está de volta a Breslau onde, na casa paterna, passa a dar aulas particulares, mas nada feliz com essa exclusão da mulher. Ela escreve: “O chão me queima debaixo dos pés. Estou passando por uma profunda crise que, na casa paterna, não poderá chegar a uma solução”. Em sua busca religiosa, começou a ler o Novo Testamento, vacilando na decisão de aderir à religião católica ou evangélica. Até que foi confrontada com uma surpresa.