Frei Joseph Chalmers O.Carm. O. Carm. Ex- Prior Geral da Ordem do Carmo.
Ser um leigo carmelita não é apenas uma vocação acrescentada à vida. É uma vocação. Por isso, uma formação sólida é essencial assim como para os frades, as monjas e as irmãs. O desafio principal que os leigos carmelitas encaram é traduzir os elementos essenciais do carisma carmelita para a vida diária. Vamos tomar como exemplo a devoção à Nossa Senhora. Esta é uma parte profunda da tradição carmelita. O que esta devoção significa no início do século XXI? No ano de 2001, a Ordem celebrou o 750º aniversário do escapulário. O Papa lembrou, em sua carta pelo ano mariano carmelitano, que o escapulário era essencialmente o hábito da Ordem e, por isso, aquele que o usa deve ter alguma ligação com a Ordem e com sua espiritualidade. O escapulário é um símbolo poderoso da presença de Nossa Senhora não apenas nesta vida, mas também na passagem desta vida para a vida eterna com Deus. O escapulário também implica num duplo compromisso. Nossa Senhora é a Padroeira, a Irmã e a Mãe dos carmelitas e, como tal, cuida de nós. Por outro lado, devemos colocar em prática as virtudes de Maria em nossa vida diária. Portanto, uma devoção carmelitana à Nossa Senhora não é realizada simplesmente pela recitação de algumas orações, sejam elas poucas ou muitas.
Sendo uma Ordem, redescobrimos, nestes anos recentes, a Lectio Divina como um poderoso caminho de oração e de vida. A Lectio Divina é a escuta orante da Palavra de Deus que, como toda oração, busca abrir-nos à contemplação. Nossa Senhora é o modelo daquela que escutou a Palavra de Deus. É claro que não é suficiente apenas ouvir a Palavra. Maria a colocou em prática e nós também devemos fazer isso (cf. Lc 8,21). Na proposta tradicional da Lectio Divina, existe um tempo para a meditação sobre a Palavra que escutamos e esta ponderação deve levar-nos à oração que, por sua vez, leva ao silêncio, um silêncio profundo e aberto à contemplação. São João da Cruz escreveu, “Busque na leitura e você encontrará na meditação. Bata na oração e ela se abrirá para você na contemplação” (Máximas e Conselhos, 79).
Maria, a Mãe do Carmelo ouviu e viveu a Palavra. Ela acolheu a Palavra e a meditava da maneira como a Palavra chegava até ela, nos acontecimentos de sua vida. Na Anunciação, ela aceitou e cooperou com a vontade de Deus que lhe foi trazida pela mensagem do Anjo. Aos pés da cruz ela aceitou e cooperou com a vontade de Deus através de sua dor. Nas palavras do Magnificat encontramos Maria, a contemplativa, a olhar para o mundo através dos olhos da fé e glorificando a Deus pela realização do plano divino.
Todos os carmelitas têm um relacionamento pessoal com Maria. Os carmelitas leigos têm que viver este relacionamento, imitando suas virtudes, ouvindo a Palavra de Deus na vida diária. O mundo em que vivemos nos encara com muitos desafios. As estruturas sociais que amparam a fé desapareceram em muitas áreas e a opção de seguir a Cristo precisa de coragem. A vocação dos leigos cristãos, acima de tudo, é a de ser fermento no coração do mundo secular. Os leigos carmelitas vivem esta vocação, inspirados pela tradição carmelita. No Magnificat, Nossa Senhora dá glória a Deus porque ela é consciente que Deus está agindo na transformação da realidade mesmo que as aparências evidenciem o contrário. Os leigos carmelitas também permanecem com Maria aos pés da cruz, cooperando com a misteriosa vontade de Deus que deseja salvar todos os homens e todas as mulheres. Vivendo o Evangelho diariamente como Maria, nossa Padroeira, Irmã e Mãe, os leigos carmelitas exercem seu papel na transformação do mundo.
Conclusão
Nos últimos anos o conceito de “Família Carmelitana” tornou-se parte de nosso modo normal de pensar. Todos os carmelitas, religiosos e leigos, são membros da mesma família e vivem a mesma vocação de modos diferentes de acordo com os diferentes estados na vida. Somos herdeiros de uma grande tradição e temos o dever sagrado de passar esta tradição aos outros. Temos de fazê-lo de uma forma harmoniosa, através nossas vocações pessoais.
Como membros da mesma Família, estamos unidos uns aos outros através de nossa oração feita uns pelos outros, e também por nossa assistência mútua. Deste modo, seremos testemunhas poderosas, na Igreja e no mundo, de que o carisma carmelita está vivo e inspira continuamente as pessoas a viver a mensagem de Jesus Cristo. Através dos séculos da existência da Ordem, houve muitas formas pelas quais as pessoas encontraram inspiração no carisma carmelita. A Igreja aprovou oficialmente algumas destas formas enquanto outras pessoas preferem uma ligação mais livre com a Família. Algumas destas novas formas de ser carmelita, que estão emergindo nos dias de hoje em diversas partes do mundo, podem ser o começo de uma nova obra do Espírito. Permaneçamos abertos à inspiração do Espírito e, com discernimento, saibamos ler os sinais dos tempos. O carisma de nossa Ordem possui uma grande criatividade. Demos graças a Deus por sermos chamados ao Carmelo e agradeçamos a Deus por todos os nossos irmãos e irmãs.
Que Deus abençoe nossa Família e nos leve a todos e todas para nossa pátria celestial. Que Nossa Senhora do Monte Carmelo nos ensine a ouvir a Palavra de Deus e saibamos colocá-la em prática em nossa vida diária.