Frei Carlos Mesters, O. Carm

Olhando a nossa história toda, desde o início no Monte Carmelo, desde a vinda para Europa em 1238, desde a reforma de João Soreth no século XV, desde a vinda para o Brasil em 1580, desde a restauração no começo do século XX, aparecem umas constantes, uns pontos comuns nas várias épocas que merecem nossas atenção e que podem ajudar para descobrir os desafios para nós, pois neles se revela algo do rumo do Espírito de Deus para nós.

Assinalo aqui as seguintes dez constantes que aparecem ao longo da nossa história. Existe um certo desdobramento ou repetição entre eles, mas o enfoque de cada um é diferente:

  1. A vontade de estar em dia com a Igreja que se renova, atentos aos Sinais dos Tempos,
  2. A tensão entre contemplação e serviço ao povo, desde Simão Stock e Nicola o Francês
  3. Criatividade e entusiasmo que cativa a juventude
  4. Cultivar o que é próprio do Carmelo e não perder a identidade
  5. Acentuar a dimensão comunitária e a dimensão de Família Carmelitana
  6. Aprofundar e reler sempre de novo o ideal do Profeta Elias: Mística e Profecia
  7. Aprofundar e atualizar a devoção a Maria: ouvir, meditar e praticar a Palavra
  8. Ser fiel à origem Mendicante
  9. Não ter medo de reconhecer os erros e limitações, viver em conversão permanente.

O resumo de tudo: Viver em Obséquio de Jesus Cristo

Penso que cada um destes dez pontos deve merecer nossa atenção para descobrir os desafios de Deus no começo deste novo milênio, para a nossa presença e missão aqui no Brasil, onde chegamos faz apenas um pouco mais de 400 anos, e em Moça,bique, onde o ardor missionário nos levou a irradiar a presença do Carmelo. Em cada uma destas constantes podemos e devemos perguntar:

  1. Como foi que isto aconteceu no passado?
  2. Como podemos dar continuidade?

Segue uma primeira tentativa de recolher alguns sinais de como no passado procuramos responder aos desafios dentro destas dez constantes da nossa história:

A vontade de estar em dia com a Igreja que se renova: atentos aos Sinais dos Tempos.

Desde o seu mais remoto início, mesmo antes de receber a Regra, os Carmelitas procuravam sintonizar com a Igreja que se renovava, e buscavam estar dentro do rumo do Espírito de Deus. Buscavam farejar e seguir os “sinais dos tempos e lugares”. Não tiveram medo de tomar decisões ousadas para dar continuidade à sua missão:

  1. Abandonar Europa e ir para a Terra Santa
  2. Desejo de estar com a Igreja, pois queriam ter uma Regra aprovada por Alberto e pelo Papa.
  3. Assumir a forma mendicante de Vida Religiosa desde o início
  4. Abandonar o Monte Carmelo para vir à Europa para dar continuidade à Missão, mesmo sem saber bem como seria.
  5. As várias reformas que surgiram em praticamente todos os séculos até hoje
  6. Mesmo sendo eremitas assumem ser missionários a pedido da Igreja.
  7. Sair de Portugal para o Brasil: viagem ao desconhecido da Terra de Santa Cruz: viagem de três meses, sem celular nem rádio.

Tensão entre contemplação e serviço ao povo, desde os tempos de Simão Stock e Nicola o Francês

Os Carmelitas, mesmo sendo eremitas, não viviam separados nem alienados da realidade do mundo, mas procuravam servir ao povo. Nunca deixamos para trás nossa origem que é o Monte Carmelo: cada comunidade é desafiada a ser um “Pequeno Carmelo” que acolhe e faz a pessoa sentir e experimentas os mesmos valores que marcavam a vida dos primeiros frades no Monte Carmelo.

  1. O lugar geográfico deu origem ao nosso nome: “Carmelitas” e não “Albertinos”.
  2. Quando voltam para a Europa, eles entram nas cidades para poder servir ao povo e souberam encontrar e recriar nas cidades o deserto do Carmelo.
  3. O Monte Carmelo deixou de ser apenas um lugar geográfico para tornar-se um ideal de vida.
  4. A escolha dos lugares levava em conta o ideal de vida orante, conforme pede a própria Regra.
  5. A preocupação em seguir a Reforma de Touraine aqui no Brasil
  6. O surgimento hoje de dois eremitérios no Brasil
  7. Até hoje definimos nossa vida como “Fraternidade Orante no meio do Povo”.

Criatividade, coragem e entusiasmo que cativa a juventude

Aqui temos uma característica que chama atenção até hoje e nos desafia: é a criatividade na maneira de ser fiel às duas exigências do carisma: mística e Profecia, oração e missão, fraternidade contemplativa e serviço ao povo.

  1. O lugar onde os primeiros carmelitas construíram os conventos logo depois que vieram para a Europa.
  2. Depois de menos de 70 anos (de 1238 a 1300) criaram mais de 160 conventos em toda a Europa. Sinal de muito entusiasmo e criatividade.
  3. Tendo 200 frades em Portugal, eles têm a coragem de seguir o rumo da Igreja e aceitam o pedido de enviar quatro frades para uma terra totalmente desconhecida. De 1580 a 1635, em mais ou menos cinqüenta anos, os quatro frades souberam aumentar o número até 200 frades no Brasil. Sinal de que souberam apresentar o ideal carmelitano para a juventude destas épocas.
  4. As várias formas de presença aqui no Brasil, tão diferente de Portugal. Deixaram um rastro da sua presença na Amazônia, até hoje.
  5. No fim do século XIX, atendendo ao pedido do Papa e do Padre geral, vieram os frades da Espanha, da Alemanha, da Holanda e da América do Norte. A decisão na Holanda foi tomada em quatro dias e um grupo de seis frades veio para o totalmente desconhecido.
  6. A formação dada era totalmente deficiente (frei Timóteo) e mesmo assim de dentro dos frades renasce a criatividade que começa a reler o carisma e dá lição a quem já pensa saber tudo.
  7. Hoje se constata a mesma criatividade entre os formandos nossos na América Latina, África e Ásia (Timor Leste)

Cultivar o que é próprio do Carmelo e não perder a identidade

A história do Carmelo no Brasil é um testemunho desta fidelidade dos frades ao que temos de próprio. Olhando o gênero das atividades, eles se dedicam à pastoral comum, mas insistem no que nos é próprio:

  1. Devoção a Nossa Senhora, Escapulário, (Minas, Amazonas, Pará)
  2. Devoção ao Senhor dos Sete Passos,
  3. Práticas próprias para vários momentos do ano litúrgico: Statio,
  4. Novenas, uma iniciativa começada com os carmelitas.
  5. Acentuar a dimensão comunitária e a dimensão de Família Carmelitana

Nascemos como um grupo leigo

  1. A dimensão comunitária e muito forte na Regra
  2. Éramos eremitas que viviam em comunidade

3.As iniciativas são tomadas sempre em comunidade, em grupos. Havia o exercício participativo da autoridade, próprio dos Mendicantes e que se reflete na nossa Regra.

  1. Desde a reforma de João Soreth já se abre para leigos e leigas
  2. No Brasil temos a criação das Ordens Terceiras em vários lugares.
  3. Além disso, a partir dos frades e ligados a eles, surgiram Ordens Terceiras em toda parte.
  4. Surgem muitas congregações religiosas femininas, e a partir das Congregações há muita colaboração em nível de Família.
  5. É importante o esforço OC-OCD que nasceu aqui e que está sendo retomado para a toda a Ordem.
  6. A pintura em Recife une todas as ordens ao redor da fonte de Elias.

Aprofundar e reler sempre de novo o ideal do Profeta Elias: Mística e Profecia

  1. Renasce sempre em todas as épocas, mas sobretudo hoje a dupla dimensão Mística e Profecia que nos marca desde o começo.
  2. Neste ponto, no século XX, o Carmelo da América Latina deu uma grande contribuição para renovar a visão que tínhamos do profeta Elias como modelo de Vida Carmelitana. Veja a Ratio
  3. A ONG KARIT da Espanha, inspirada na figura do Profeta Elias.
  4. Na liturgia tínhamos orações diárias especiais ao Profeta Elias
  5. A iconografia do Carmelo no Brasil.

Aprofundar e atualizar a devoção a Maria: ouvir, meditar e praticar a Palavra

  1. Carmelo Bíblia o preferido das jovens e dos jovens
  2. Trabalho bíblico com as comunidades
  3. Devoção a Nossa Senhora, sobretudo por meio do Escapulário
  4. Festas e orações próprias
  5. As imagens e festas nas nossas igrejas

Ser fiel à origem Mendicante

Esta origem está dentro de nós e sempre levanta a cabeça. Surgimos numa época de mudança política e social na Idade Média. Surgimos para estar do lado dos Menores para fazer com que a riqueza da tradição orante da Igreja, através da nossa fidelidade, chegasse a ajudar o povo das cidades.

Os mendicantes se caracterizam por uma

*  Vivência fraterna muito forte que não tem abade, mas tem prior;

*  Itinerância e disponibilidade que gera mobilidade para o serviço aos pobres;

*  Espiritualidade muito forte que irradia;

*  Partilha que tem tudo em comum.

  1. Na América Latina, o que mais tem é pobre e empobrecimento. Já houve várias iniciativa da parte dos grupos Mendicantes (franciscanos, dominicanos, carmelitas, mercedários e outros) para ver como esta raiz comum nos pode ajudar a ser mais fiéis ao que Deus pede de nós hoje aqui nestas nossas terras.
  2. Em Roma, por iniciativa do nosso Padre Geral Joseph Chalmers, começou um movimento de encontros entre os Superiores Gerais das várias Ordens Mendicantes.
  3. No início, devido ao desejo de poder servir melhor ao povo, os mendicantes se clericalizaram. Hoje, penso que devemos pensar em desclericalizar para poder encontrar novos formas de serviço ao povo de acordo com o que a Realidade e a Igreja estão pedindo.

Não ter medo de reconhecer os erros e limitação e viver em conversão permanente.

Erramos muito ao longo dos séculos, em parte devido às limitações inerentes à visão da Igreja que funcionava como quadro de referências para todas as atividades:

  1. Conversão: expulsão da TFP
  2. Aceitação de negros
  3. Releitura dos Santos e das Santas
  4. Abandono da visão colonialista

Resumo de tudo: Viver em Obséquio de Jesus Cristo

No fim, o que renasce em todo carmelita é o desejo de, como Maria, meditar dia e noite na Lei do Senhor; como Elias, ser um testemunho ambulante do Deus vivo e, assim, viver sempre mais em obséquio de Jesus e deixar que o Reino de Deus tome conta de toda a nossa vida.