Frei Joseph Chalmers, O. Carm. Ex- Prior Geral (Ex-Frade Carmelita)

A Ordem sempre afirmou que a contemplação está no coração de nossa vocação. O Institutio Primorum Monachorum, que desde o século 14 foi o documento para a formação de todos os jovens carmelitas, diz: “O objetivo dessa vida tem duplo sentido: Uma parte alcançamos através de nosso próprio esforço e do exercício das virtudes, com a ajuda da graça divina. Isso significa oferecer a Deus um coração que é sagrado e puro da verdadeira mancha do pecado. Alcançamos este objetivo quando somos perfeitos e ‘in Carith’, isto é, escondido naquela caridade que o Homem Sábio diz: ‘O amor cobre todas as ofensas’ (Pr 10,12). ... O outro objetivo desta vida nos é concedido como um dom gratuito de Deus; ou seja, saborear algo no coração e experimentar na mente o poder da presença divina e da doçura da glória celestial não apenas após a morte mas também nesta vida mortal (Livro 1, cap. 2). Santa Teresa e São João da Cruz foram formados na tradição carmelitana e conduziram a Ordem de volta à sua inspiração inicial, assim como todas as outras reformas através da história da Ordem. Santa Teresa e São João da Cruz são modelos de gênios espirituais e, para aqueles que desejam compreender mais o desenvolvimento da contemplação dentro da pessoa, é essencial estudar estes santos.

Nesta apresentação do carisma carmelitano, a Ordem declara nas Constituições dos frades: “Os carmelitas buscam viver em fidelidade a Jesus Cristo através do compromisso de buscar a face do Deus vivo (a dimensão contemplativa da vida), através da fraternidade e do serviço no meio do povo” (Const. 14). Outro artigo nas Constituições diz: “A tradição da Ordem tem interpretado a Regra e o carisma inicial como expressões da dimensão contemplativa da vida e os grandes mestres espirituais da Família Carmelitana sempre se voltaram para esta vocação contemplativa” (Const. 17). De acordo com as Constituições, a contemplação “é uma experiência transformadora do amor esmagador de Deus. Esse amor nos esvazia de nossa maneira humana de pensar, amar e agir, limitada e imperfeita, divinizando-a” (Const. 17). Nas Constituições das Congregações afiliadas e na recentemente aprovada Regra da Ordem Terceira, aparece a mesma insistência na contemplação.

A Ratio Institutionis Vitae Carmelitana e (o documento da formação ao qual nos referiremos como Ratio) dos frades, esclarece o papel da contemplação no carisma da Ordem: “A dimensão contemplativa não é meramente um dos elementos de nosso carisma (oração, fraternidade e serviço): ela é o elemento dinâmico que os une.

Na oração nos abrimos para Deus que, por sua ação, nos transforma gradualmente através de todos os grandes e pequenos eventos de nossas vidas. Esse processo de transformação nos possibilita iniciar e manter relacionamentos fraternos autênticos. Ele nos faz desejosos de servir, capazes de compaixão e de solidariedade, e nos permite colocar diante do Pai as aspirações, angústias, esperanças e súplicas do povo.

A fraternidade é o teste básico da autenticidade da transformação que está acontecendo dentro de nós” (Ratio 23). A Ratio continua dizendo: “Através dessa transformação gradual e contínua em Cristo, que é realizada dentro de nós pelo Espírito, Deus nos chama em sua direção numa jornada interior que nos leva das margens dispersivas da vida ao âmago de nosso ser, onde Deus mora e nos une a ele.

O processo interior que leva ao desenvolvimento da dimensão contemplativa nos ajuda a adquirir uma atitude de abertura à presença de Deus em nossa vida, nos ensina a ver o mundo com os olhos de Deus e nos inspira a buscar, reconhecer, amar e servir a Deus naqueles que estão à nossa volta” (Ratio 24).

O objetivo da jornada contemplativa é nos tornarmos amigos amadurecidos de Jesus Cristo a tal ponto que seus valores se tornem nossos valores e comecemos a ver com os olhos de Deus e a amar com o coração de Deus. A contemplação autêntica deve encontrar expressão num compromisso de serviço, quer seja realizado através de um apostolado ativo, quer dentro de um mosteiro. Quando contempla o mundo, Deus vê para além do exterior. Deus vê a motivação do coração humano. A autêntica experiência de Deus de uma comunidade contemplativa nos leva a tornar nossa “a missão de Jesus, que foi enviado para proclamar a Boa Nova do Reino de Deus e a realizar a libertação total da humanidade de todo pecado e opressão” (Ratio, 38)