Junção entre a Oração Litúrgica e a Oração Contemplativa

               A característica principal do grande Profeta é a oração, de que a sua vida está impregnada. Por isso, São Tiago apresenta-o como modelo vivo de contínua oração. Descobrimos na oração de Elias uma união providencial da oração oral e da oração contemplativa, esta última entendida no duplo significado de ativa e passiva.

               Temos nele um exemplo de oração litúrgica, pois na escola dos Profetas dava-se muito realce ao canto dos louvores divinos. A significação da palavra "Profeta" era na Lei antiga muito mais ampla do que agora. Profeta era não só aquele a quem Deus havia dado o dom da profecia, de vaticinar, mas também o que cantava as glórias de Deus juntamente com os outras, geralmente sete vezes por dia. Lemos, por exemplo, na história de Israel, que Saul contava-se entre os profetas não por possuir o dom da profecia, mas por haver-se unido a estes grupos peculiares no canto das glórias divinas. Elias foi Profeta em todos os sentidos que a palavra tem. Tinha uma escola e vários discípulos espalhados por diversos lugares; provavelmente presidia-lhes na oração, feita a horas determinadas.

               Podemos, pois, dizer que a oração litúrgica tem uma antiquíssima tradição, não obstante a posição secundária que ocupa em confronto com a oração mais profunda da meditação e da contemplação.

               A nossa Ordem não é uma Ordem de oração litúrgica como o éa antiga Ordem oriental dos monges de S. Basílio ou a ocidental dos Beneditinos; porém, o rito próprio da Ordem não deixa de dar-lhe singular relevo. Ocupa posição muito importante na nossa vida com Deus. A Regra convoca-nos para a celebração litúrgica em Coro do Ofício divino.

               Santa Teresa, atraída pela estima da oração litúrgica, impregnou-a de tal maneira com santas considerações, que transformou, em certo sentido, em oração contemplativa, em oração de contemplação ativa. Foi sempre notável a influência e atração da singela e devota oração litúrgica na Ordem do Carmo. Mais de um Carmelo se fundou por este motivo na Europa.          

              

Crescimento da Vida Contemplativa no Deserto pelo Alimento da Eucaristia

                A espiritualidade Carmelitana concebe a vida espiritual como algo orgânico que cresce. Neste ponto a vida do profeta dá-nos outra lição notável. A vida espiritual, do mesmo modo que a vida natural, pede alimento. A Sagrada Escritura narra que Elias, robustecido pelo alimento que o Anjo lhe ministrou, andou quarenta dias e quarenta noites até ao monte Horeb, onde lhe foi dado contemplar a Deus. A vida espiritual e a vida mística anseiam pelo santo Alimento que Deus nos dá no Santíssimo Sacramento da Eucaristia.

               Na escola do Carmelo a vida contemplativa e mística é fruto da vida eucarística. A vida de Elias apresenta um dos mais típicos símbolos, prefigurativos do Santíssimo Sacramento do altar, fonte da nossa vida de oração. O pão milagroso que o Anjo lhe deu é uma imagem perfeita do alimento eucarístico por cuja força percorremos a jornada da vida terrena.

               O culto especial da Eucaristia não é exclusivo da Ordem do Carmo. Contudo, é lícito afirmar que tem sido sempre uma parte importante da tradição carmelita. Os nossos conventos foram em muitas ocasiões verdadeiros centros de culto eucarístico. Santa Maria Madalena de Pazzi sentiu-se atraída para o Carmelo de Florença porque as religiosas deste mosteiro recebiam diariamente a Sagrada Comunhão, costume pouco comum naquele tempo. Para Santa Teresa não havia maior alegria do que a abertura de uma nova igreja ou capela, novas moradas para o Senhor. A Regra prescreve que todos os membros da Comunidade Carmelita assistiam diariamente a Santa Missa e que a capela esteja no centro do claustro, facilmente acessível a qualquer hora do dia, e que as Horas Canônicas sejam rezadas na presença do Santíssimo Sacramento.       

               Por ser uma Ordem mendicante, a arquitetura das igrejas e conventos costuma ser simples, mas a pobreza não se estende a ornamentação das igrejas e dos altares. Nisto nota-se uma divergência acentuada dos costumes de outras Ordens mendicantes por exemplo, a dos Capuchinhos, em que a pobreza atinge o próprio santuário.            

               Eis em breves traços a tradição eucarística do Carmelo. Com Elias caminhamos pela força do pão divino. Já que na oração nos achegamos a vida divina, lembremos continuamente o mandamento do Salvador: "Se não comerdes a Carne do Filho do Homem e não beberdes o Seu Sangue, não tereis a vida em vós". Da mesma maneira que a comunhão de Elias no pão milagroso do deserto o conduziu na sua caminhada até a contemplação de Deus no Horeb, assim também a Eucaristia deve conduzir-nos a contemplação da Sua Santa Face. Nas cavernas de Horeb Deus falou ao Profeta no murmúrio da brisa ligeira. O Senhor não estava na tempestade nem no terremoto, mas na leve aragem. É desta maneira que na Comunhão havemos de contemplá-lo sob as espécies eucarísticas e nas profundezas do nosso espírito, pois Deus passa aí.