Frei  Egídio Palumbo O.Carm

            Uma das imagens simbólicas fortemente evocativas do Carmelo das origens é a "centralidade" da igrejinha dedicada a Santa Maria: ela demonstra a centralidade da Eucaristia como força plasmadora da "koinonia" fraterna na linha existencial da condivisão, da caridade, do serviço. Não por acaso, de fato, a Regra coloca esta "centralidade" num contexto mais amplo - bem no meio dos capítulos VII-XIII -  onde  emerge  com  evidência  a ligação por "entrelaçamento" entre oração e vida: a escuta pessoal da Palavra (VII), que se faz louvor comunitário (VIII), exige dos irmãos a vivência da comunhão de bens (IX), que na Eucaristia encontra a sua profecia e o seu fundamento (é o Capítulo X), enquanto a Eucaristia assume forma existencial no diálogo e na reconciliação mediante a caridade (XI) e num estilo de vida simples e sóbrio, atento às verdadeiras necessidades do outro e capaz de adaptar-se às situações (XII e XIII).

            Outra imagem, complementar da primeira, vem expressa por uma indicação "ritual" da Institutio Primorum Monachorum (Livro II, cap. 3º), onde se afirma que os carmelitas eram chamados profetas, porque salmodiavam ou então porque entoavam em louvor de Deus salmos, hinos e cânticos, acompanhados por instrumentos musicais, "na casa de oração", que Elias havia edificado para eles sobre o Monte Carmelo, e ali se reuniam três vezes ao dia para orarem. Com a vinda de Jesus Cristo - contam-nos ainda naquela mesma obra (Livro IV, cap.5º) - este rito de louvor a Deus ao som de instrumentos musicais foi interiorizado conforme as palavras do Apóstolo: "Sede cheios do Espírito, entretendo-vos mutuamente por meio de salmos e cânticos espirituais, entoando hinos ao Senhor com todo o vosso coração, por todas as coisas dando graças a Deus Pai continuamente, no nome do Senhor Nosso, Jesus Cristo" (Ef 5,18-20). Aqui também, segundo penso, revela-se o peso da intenção do autor de, numa linguagem e figuras diversas, reafirmar aquele "entrelaçamento": oração/vida já observado na Regra, e que significa fazer da nossa vida uma doxologia perene, um autêntico "Louvor de Glória" - para usar o modo de falar de Isabel da Trindade - onde esteja espelhada a presença do Deus Vivo.

            Enfim não se deve esquecer que o tema "oração e vida" é um dos mais fecundos na tradição espiritual do Carmelo, a tal ponto que tem uma ressonância eclesial a nível universal, educando e inspirando gerações inteiras.

            Cabe a nós hoje revitalizar a herança desta "indiscutível" Diaconia e antes de tudo dar à nossa oração pessoal e comunitária e à nossa Liturgia não somente dignidade e beleza, mas também uma "respiração" contemplativa que possa nutri-la com a Palavra de Deus e encarná-la na vida. Só daqui surgirá depois o empenho pastoral de criar Escolas de iniciação à oração, de promover momentos de formação litúrgica, de cuidar de um culto mariano autêntico em memória da "centralidade" da primeira igrejinha dedicada a Santa Maria.