Frei Joseph Chalmers O. Carm. Ex- Superior Geral da Ordem do Carmo.
Elias estava totalmente disponível para Deus. Ele permaneceu diante de Deus como um servo que espera instruções (1Rs 17,1; 18,15.36). Como todos os profetas, ele foi plenamente envolvido pela Palavra de Deus. Poderíamos afirmar que o sujeito de todo ciclo das histórias sobre Elias não é ele mesmo, mas Deus. Sua Palavra não foi apenas o motivo para a reflexão no silêncio e na solidão, mas também um fogo para extinguir o mal do coração humano. A total abertura de Elias à Palavra de Deus fez com que ele tivesse um estilo de vida especial. Elias quis ser um sinal visível em Israel, um sinal que desafiou as atitudes complacentes do povo. O profeta não concordou com as opiniões de seu tempo, mas estava preparado a não ceder para que toda sua vida pudesse ser uma crítica aberta aos valores do povo. Antes de mais nada, um profeta só pode ser sinal para os outros se ele mesmo se deixar envolver por Deus. Elias era um homem misterioso, conhecido por aparecer e desaparecer de repente (1Rs 18,12). Seu desaparecimento no carro de fogo causou um impacto profundo em Israel (2Rs 2,11).
As duas características principais de Elias são sua fidelidade e sua criatividade. Ele foi totalmente fiel às suas tradições religiosas e foi o campeão de fidelidade à aliança que Deus fez com o povo, num tempo em que a aliança estava quase desaparecendo. Elias rejeitou qualquer “diluição” de sua religião. Só Iahweh era Senhor em Israel e Elias não podia permitir a interferência de qualquer ídolo no território de Iahweh. Na disputa no Monte Carmelo, o profeta não teve medo de desafiar a todos: “Até quando claudicareis das duas pernas? Se Iahweh é Deus, segui-o; se é Baal segui-o” (1Rs 18,21). Não era possível servir aos dois: no sacrifício no Monte Carmelo, Elias relembra seu povo da fé de seus ancestrais.
Ao mesmo tempo, o profeta Elias não teve medo de ser criativo nas questões religiosas. Quando o povo se estabeleceu em Israel, começaram a esquecer Deus. Iahweh foi muito importante para os israelitas quando estes vagavam pelo deserto, mas parece que tinha pouco a dizer no novo estilo de vida na Terra Prometida. Os israelitas preferiam adorar Baal. Ele era mais útil aos fazendeiros, pois de acordo com seus seguidores, era o senhor da chuva, do sol e da fertilidade em geral. Era preciso modernizar a imagem de Iahweh. Se Iahweh era realmente o verdadeiro Deus de Israel, ele precisava estar presente em todas as situações em que Israel se encontrava. Elias conseguiu transformar a imagem de Iahweh, mostrando que foi Iahweh e não Baal quem mandou a chuva e o fogo do céu. Iahweh era o Senhor de Israel, e não Baal. Elias sabia como fazer a Palavra de Deus falar de acordo com a realidade de sua época.
Para os judeus, Elias ainda é uma figura viva. Para os cristãos, ele representa um desafio para que façamos hoje o que ele fez. Apesar dos elementos que nos distraem em nosso mundo moderno, devemos permanecer fortes na verdade que recebemos. Ao mesmo tempo, devemos ser capazes de traduzir essa verdade eterna para os tempos que estão continuamente em transformação. Fidelidade sem criatividade dá a fé um anacronismo; criatividade sem fidelidade abandona a fé a toda fantasia momentânea.
A função de Elias na fé judaica pós-bíblica não era ser o precursor do Messias. Essa crença, comum no tempo de Jesus, demonstra que para os judeus Elias não foi – e ainda não é hoje – meramente uma figura histórica, mas uma pessoa viva. Depois de Moisés, Abraão e Davi, Elias é a figura do Antigo Testamento mais mencionada no Novo Testamento.
A escolha dos textos que se seguem do ciclo da saga de Elias foi motivada por sua utilidade para a oração. Trata-se de uma escolha pessoal. Este livro pode ser usado individualmente ou em grupos e não é necessário seguir a ordem dos capítulos. Antes de começar com os textos individuais, gostaria de falar sobre um método antigo de oração chamado Lectio Divina. Esse método nos ajuda a ler as histórias do profeta Elias.
*Do Livro- O SOM DO SILÊNCIO