Ao menos 56 processos pedem remoção de links publicados na rede; entre os presidenciáveis, Ciro Gomes (PDT) é o que mais usa o recurso

Em ano eleitoral marcado pela polarização nas redes sociais, candidatos recorrem à Justiça para tentar remover conteúdos da internet que consideram falsos ou enganosos. Tramitam, atualmente, ao menos 56 processos que pedem a retirada de conteúdos envolvendo políticos no País. Os alvos são páginas anônimas de Facebook, youtubers e imprensa.

O maior número de pedidos foi apresentado pelo ex-prefeito e candidato ao governo de São Paulo, João Doria (PSDB), e pela ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney(MDB), que vai tentar a reeleição, com oito ações cada. Entre os presidenciáveis, Ciro Gomes (PDT), por meio de seu partido, foi o que mais usou deste recurso. Ele é parte em seis ações que pediram remoção de vídeos e links - todas indeferidas até agora.

Ao todo, há ao menos dez ações ligadas aos presidenciáveis neste ano. Além de Ciro, outros três presidenciáveis recorreram à Justiça: Marina Silva, com dois pedidos - um deles indeferido; Geraldo Alckmin (PSDB), com uma ação indeferida; e Jair Bolsonaro (PSL), com duas ações, uma delas deferida. Procurados, os candidatos à Presidência não se manifestaram sobre as ações, assim como João Doria. Em nota, a defesa de Roseana disse que as representações miram “exclusivamente” páginas anônimas. “Não há que se falar em ataque à liberdade de manifestação, expressão ou imprensa.”

Os dados foram compilados pelo Estadão Dados no site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e pela plataforma Ctrl-X, criada pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que reúne dados sobre políticos que acionam a Justiça para combater informações falsas. A plataforma também inclui informações de tribunais nos Estados. Foram considerados somente casos de 2018 que não têm sigilo.

O Ctrl-X foi criado para medir um problema que a entidade já identifica há mais tempo: as ações judiciais contra jornalistas feitas por políticos. O criador da ferramenta, Tiago Mali, aponta que a plataforma ajudar a mapear quais e políticos e partidos tentam adotar esse tipo de ação. 

"É um indicativo do quanto especialmente alguns políticos estão tentando esconder algumas publicações, críticas, postagens da internet, para que não tenham a sua imagem atingida. É possível descobrir quem está por trás desses processos, quais são os partidos cujos candidatos mais processam para tentar retirar alguma coisa do ar e tentar fazer com que eles sejam confrontados com essas ações. Há candidatos que têm discursos pró-liberdade de expressão, mas, nos bastidores, contratam escritório de advocacia para retirar tudo de negativo do nome deles na internet".

Ciro pediu a remoção de diversos vídeos e postagens nas quais é chamado de “coronel”, “autoritário”, “socialista”, entre outros termos. Na mais recente, de 6 de julho, sua defesa pede a remoção do vídeo “Ciro Gomes confessa a Caetano: vou implantar o socialismo”. A publicação é um pequeno trecho recortado de entrevista do político feita pelo músico Caetano Veloso e publicada originalmente em 24 de junho no canal do YouTube da Mídia Ninja.

Caetano questiona o político sobre como ele pesa o fato de experiências socialistas terem fracassado pelo mundo, ao que ele responde: “eu quero correr esse risco”. A frase como foi colocada, no entanto, é ambígua, pois, antes da pergunta, Ciro falava sobre o que significava ser de esquerda no País. O vídeo é acompanhado da legenda “Ciro Gomes confessa que pretende insistir em mais uma experiência socialista”. A publicação teve 28,4 mil visualizações e foi replicada por outros canais do site.

Para a defesa do político, “a notícia desborda dos limites da mera crítica e macula a imagem do pré-candidato.” A ministra Rosa Weber, presidente do TSE, no entanto, indeferiu o pedido. “É natural que pessoas públicas estejam sujeitas a maior escrutínio por parte da opinião pública, o que não revela, por si só, violação dos direitos de personalidade”, votou.

‘Nenhum’

 Em ação, Bolsonaro acusou Alckmin de difundir o link para o site “motivosparavotarembolsonaro.org”, que tem como conteúdo uma tela preta e a frase “não existe nenhum”. Segundo a ação, o link era enviado automaticamente, por meio de mensagem privada da página de Alckmin, a todos que fizessem comentários com menções a Bolsonaro. Mesmo com liminar proferida em 27 de junho, determinando a remoção do conteúdo, o site continua no ar.

“Sabemos que fake news é um fenômeno bastante complexo, porque não tratamos somente de informações falsas, mas também descontextualizadas. Mas a Justiça Eleitoral decidiu que só vai intervir em casos de fatos sabidamente inverídicos”, disse o professor Alexandre Pacheco, da Escola de Direito da FGV-SP. Fonte: https://politica.estadao.com.br