Ao propor 13.º para o Auxílio Brasil, Bolsonaro expõe convicção de que o voto das mulheres vulneráveis está à venda
Notas & Informações, O Estado de S.Paulo
O presidente Jair Bolsonaro decidiu aumentar o lance no leilão pelo voto dos mais pobres. Passado o primeiro turno, o governo não esperou um dia sequer para anunciar a antecipação do calendário de pagamentos do Auxílio Brasil. Até então, as transferências estavam programadas para serem encerradas no dia 31 de outubro, depois, portanto, da segunda etapa da disputa eleitoral. Não foi – nem será – a única investida. O governo prometeu um 13.º benefício para os 16,7 milhões de famílias chefiadas por mulheres. Antes, havia regulamentado uma modalidade criminosa de crédito consignado que tem tudo para expor os vulneráveis ao superendividamento.
É um feito impressionante. O arremedo de programa social que o governo inventou para substituir o bem-sucedido Bolsa Família paga mais, alcança um número maior de pessoas e não cobra qualquer contrapartida dos beneficiários, como o cumprimento do calendário vacinal ou a presença escolar obrigatória de seus filhos. E, a despeito do escancarado uso da máquina pública, cujo peso é muito maior que o Fundo Eleitoral, o presidente/candidato permanece na segunda posição com possibilidades reais de derrota. Para enquadrar o Auxílio Brasil ao Orçamento-Geral da União, o governo violou o teto de gastos, mas fez um esforço para criar um discurso social minimamente crível a justificar essa opção. Se nunca houve preocupação genuína com o bem-estar dos mais pobres, antes havia um mínimo de pudor, agora completamente abandonado.
Como nada disso gerou o efeito esperado, o governo se converteu em um puxadinho da campanha bolsonarista e compactua com seus devaneios sem qualquer empenho para manter a credibilidade. A proposta formal para o Orçamento de 2023 desmente a si própria e promete manter o piso em R$ 600 sem reservar os R$ 52,5 bilhões extras para custeá-la. A ela se junta o 13.º benefício às mulheres, cujo custo é estimado em R$ 10 bilhões. Não houve – nem haverá – qualquer explicação sobre a fonte de recursos para bancar a medida, tampouco sobre sua necessidade. Afinal, há algumas semanas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse ser impossível que milhões de pessoas estivessem passando fome no País, dando a entender que o piso era suficiente para garantir todas as necessidades e despesas fixas de uma família. O que mudou para justificar a criação do 13.º benefício?
Há algo em comum a tudo que envolve o Auxílio Brasil desde sua concepção. Todas as discussões sobre o programa sempre foram superficiais e centradas unicamente no valor final a ser pago aos beneficiários, expondo a profunda convicção do presidente e de sua equipe de ministros de que o voto dos mais vulneráveis, de forma geral, e das mulheres mais pobres, em particular, está à venda. Quando era deputado federal, Bolsonaro chamou o Bolsa Família de bolsa farelo e chegou a compará-lo à prática do voto de cabresto. Sua opinião, evidentemente, não se alterou. A diferença é que agora ele espera colher frutos adotando uma estratégia que sempre condenou. Fonte: https://opiniao.estadao.com.br