Derrota de Bolsonaro pode levar alguns de seus adeptos a novos esforços de fé

 

VOLTAIRE DE SOUZA

Crônicas da vida louca

 

 

Fé. Tristeza. Exaltação.

Muita gente ainda não se conforma com a derrota de Bolsonaro.

Alguns pedem intervenção militar.

O pastor Avarildo tinha outra opinião.

—A Deus tudo é possível.

Na Igreja Jesus do Último Dia, a orientação era uma só.

—Orar.

Mas havia um adendo.

—Contribua com os Batalhões de Cristo.

Avarildo aceitava todos os cartões de crédito.

--Vamos fazer romaria até Brasília.

Bandeira, camisa da seleção, Bíblia e botas resistentes.

—Modelo igualzinho ao da Infantaria.

A irmã Rodésia ficou em dúvida.

—Mas a gente vai até Brasília a pé?

—Caminhando e cantando, irmã.

—O senhor também, pastor Avarildo?

—Eu vou acompanhando... no meu jatinho.

—Louvado seja.

—Aleluia.

Um expressivo grupo evangélico pôs os pés na estrada.

—Se tiver bloqueio de caminhão...

—Não tem problema. A gente continua caminhando.

Irmã Rodésia ia no pelotão da frente.

—Aleluia, aleluia. Bolsonaro voltará.

—E Jesus também.

Ela fechou os olhos.

Veio a tremedeira. O transe. O êxtase místico.

—Meu Senhoooor Jesúúúis...

—Calma, irmã.

Ela ficou de joelhos.

—É ele. É ele ali. Não estão vendo?

—Quem? O Bolsonaro?

—Não. Jesus. Está chegando ali na estrada.

—Onde? Onde?

Antes do desmaio, os dedos trêmulos de Rodésia apontaram para a faixa contrária da rodovia.

—Mas será que é Jesus mesmo?

Era o Patriota do Caminhão.

Braços em cruz. Grudado na vidraça de um impaciente veículo de carga.

—É Jesus. Com certeza.

—Chegou a salvação do Brasil.

Muitos religiosos se lembram das palavras de Cristo.

—Eu sou o caminho, a verdade e a vida.

Mas é bom não ter ninguém atrapalhando a visão no para-brisa.

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br