*Por Emir Sader

"A burguesia não tem heróis" Bertold Brecht

Pobre Brecht! Não sobreviveu para conhecer os super-heróis da burguesia brasileira. A quem a Associação Comercial de São Paulo convida para falar aos grandes empresários do comércio? A um economista, para falar dos saldos da balança comercial, que mal escondem nossa reconversão para uma economia primária exportadora? Ou sobre a estreiteza do mercado interno de consumo? Ou então sobre a taxa de juros, que inibe o consumo e o investimento?

Foram convidados Luis Gonzaga Belluzzo ou João Sayad? Ou Maria da Conceição Tavares? Nada disso. Roberto Jefferson. Exatamente. O escroque Roberto Jefferson, com quem essa burguesia se havia relacionado tão estreitamente no governo Collor, que eles haviam eleito e promovido a seu mais novo super-herói - junto com a quase totalidade da mídia.

Falando muito à vontade, sentindo-se em casa. Com razão! Afinal ele estava na avenida Paulista, notabilizada por abrigar as 101 agências bancárias! Por ser o coração do Estado governado pelo novo candidatinho da burguesia neoliberal – o picolé de chuchu, como o chama muito propriamente o Zé Simão, pela consistência e o saber forte que o caracterizam, um nada de nada, mas com privatizações daquele tamanho.

Este é o novo herói na galeria dos super-heróis da burguesia brasileira, que vem se somar a Severino Cavalcanti e ao candidato dos ilustrados jardins paulistanos, o weberiano FHC. E a Fernando Collor, aposta de toda a burguesia brasileira, incluídos os tucanos, de Tasso Jereissati a FHC, da Rede Globo aos dos "liberais" brasileiros.

E aos ditadores militares, todos eles consagrados nas ruas das nossas cidades e nas linhas da imprensa "liberal" brasileira como "presidentes" - de Castelo Branco a João Figueiredo, de Costa e Silva a Garrastazu Médici, passando por Ernesto Geisel - e não "ditadores" - epíteto reservado para Fidel - e nunca para Musharaf ou para os xeiques árabes - como diria Foster Dulles, "ditadores, mas os nossos ditadores e, portanto, presidentes".

Bela burguesia liberal, que conviveu alegremente com a escravidão, a monarquia, a primeira "república", a ditadura militar, o governo Collor, as mamatas da privatização do governo FHC, e agora goza e se representa em Roberto Jefferson.

Das suas mãos poderemos esperar o melhor para o Brasil, com ministros de relações exteriores que tiram subservientemente os sapatos nos aeroportos dos EUA, com presidentes que conchavam contra a América Latina em Washington, com ex-ministros da Educação que vivem de assessorias a entidades privadas de educação que sua gestão promoveu. E sempre escribas na imprensa, dispostos à bajulação dos poderosos de plantão.

Aleluia! A burguesia tem super-heróis! Pobre país que precisa de uma burguesia assim!

*Emir Sader, professor da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), é coordenador do Laboratório de Políticas Públicas da Uerj e autor, entre outros, de "A vingança da História".

 

(Em artigo publicado na Agência Carta Maior, o sociólogo Emir Sader analisa a recepção festiva que a Associação Comercial de São Paulo deu ao deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), aclamado como super-herói em meio à burguesia paulistana).