Frei Carlos Mesters, O. Carm.

“Desejei muito comer esta Páscoa com vocês!”: Uma ajuda para o grupo: 

Situando

            No 6º Bloco, Lucas descreve a paixão, morte e ressurreição de Jesus. Inicia-se a etapa final do “êxodo” de Jesus, anunciado por Moisés e Elias no Monte da Transfiguração (Lc 9,31). A maneira de Lucas descrever os acontecimentos é semelhante àqueles filmes que, primeiro, mostram a cena de longe. Em seguida, pouco a pouco, eles ajustam a câmara e a cena vai chegando mais perto, até que se possa ver todos os detalhes. Assim faz Lucas. Desde o capítulo 9, ele vem dizendo que Jesus está indo para Jerusalém. E agora, uma vez em Jerusalém, ele vai ajustando a câmara no ponto, em que os leitores e as leitoras devem prestar mais atenção. Primeiro, ele diz: "Aproxima-se a festa dos ázimos, chamada Páscoa" (Lc 22,1). Em seguida, informa: "Chegou o dia dos Ázimos" (Lc 22,7). E finalmente, constata: "Quando chegou a hora, ele sentou à mesa!" (Lc 22,14). Este é o ponto onde Lucas quer que a gente preste toda a atenção, pois é o momento em que começa a Páscoa, o “êxodo” de Jesus.

Comentando

Lucas 22,7-13: Preparativos para a Ceia Pascal

            “Veio o dia dos Ázimos, quando devia ser imolada a páscoa”. Esta frase lembra a carta de Paulo que diz: “Nossa páscoa, Cristo, foi imolada” (1 Cor 5,7). No primeiro êxodo, aquele do Egito, o sangue do cordeiro pascal, passado nas portas das casas, libertou o povo da opressão do faraó (Ex 12,13). Agora, neste novo êxodo, Jesus, o novo Cordeiro pascal, vai libertar o povo da opressão da lei. Vai revelar a bondade e a ternura de Deus Pai que acolhe a todos. Jesus pensou em tudo para preparar bem a celebração desta última páscoa com seus amigos. Combinou as coisas com pessoas conhecidas da cidade. Ele mantém até um certo segredo, pois o momento era perigoso. Jesus estava sendo procurado para ser preso e morto.

Lucas 22,14-18: Início da Ceia Pascal

            “Desejei ardentemente comer esta páscoa com vocês”. É como se dissesse: “Até que enfim! Chegou o momento que tanto desejei!” Jesus tem o desejo ardente de levar a bom termo o projeto do Pai. É a última vez que ele está reunido com seus amigos. É a páscoa definitiva, em que ele celebra a Nova Aliança e realiza a passagem da opressão da antiga lei para a revelação da lei do amor. Jesus enche um cálice com vinho e o distribui aos amigos. Beber o cálice significa cumprir a missão recebida do Pai (Mc 10,38-39; Jo 18,11). Jesus bebe o cálice que o Pai lhe deu e pede que seus amigos participem.

Lucas 22,19-20: A instituição da eucaristia

            O último encontro de Jesus com os discípulos realiza-se no ambiente solene da celebração tradicional da Páscoa. Eles estão reunidos para comer o cordeiro pascal e, assim, lembrar a libertação da opressão do Egito. O contraste é muito grande. De um lado, os discípulos: eles estão inseguros, sem enten­derem o alcance dos acontecimentos. De outro lado, Jesus que faz um gesto de partilha, convidando seus amigos a tomar o seu corpo e o seu sangue. Ele distribui o pão e o vinho como expressão do que ele mesmo estava vivendo naquele momento: doar sua vida, distribuir-se aos outros para que eles pudessem viver e, assim, revelar o amor do Pai. Este é o sentido da eucaristia: aprender de Jesus a distribuir-se, doar-se, entregar-se, servir, sem medo dos poderes que ameaçam a vida. E Jesus acrescenta uma frase que só Lucas conservou: “Fazei isto em memória de mim!” (Lc 19,22).

 Lucas 22,21-23: Anúncio da traição de Judas

            Estando reunido com os discípulos pela última vez, Jesus anuncia: “A mão daquele que me trai está comigo sobre a mesa”. Este jeito de falar acentua o contraste. Para os judeus a comunhão de mesa era a expressão máxima da amizade, da intimidade e da confiança. Com outras palavras, Jesus vai ser traído por alguém muito amigo! E Jesus acrescenta: “Sim, o Filho do Homem vai morrer, segundo o que foi determinado!” Aqui não se trata de predestinação nem de fatalismo. Trata-se da certeza que a experiência humana de séculos nos comunica: num mundo organizado a partir do egoismo, quem decide viver o amor, vai morrer crucificado. E Jesus termina: “Ai daquele homem por quem o Filho do Homem foi entregue!”  Será para sempre conhecido e lembrado como o traidor de Jesus!

Alargando

  1. A grande luta. De um lado, Jesus. Animado pelo Espírito de Deus, ele procura realizar o projeto do Pai. Do outro lado, os inimigos de Jesus. Animados pelo espírito oposto, procuram realizar o projeto de satanás. "Satanás entrou em Judas” e o levou a conferenciar com os sacerdotes, que estavam procurando um meio para eliminar Jesus, mas temiam o povo (Lc 22,2-3). Combinaram o preço e Judas começou a procurar um jeito de como entregá-lo (Lc 22,5). É na Última Ceia que as duas forças se encontram e se enfrentam! Jesus diz: "A mão que me trai está comigo sobre a mesa" (Lc 22,21). Por de trás da luta entre os homens, está a luta entre os poderes. O vencedor será Jesus!
  2. Lucas acentua a semelhança entre o Êxodo e a paixão, morte e ressurreição de Jesus. No êxo­do antigo, conduzido por Moisés, Deus libertou o povo da lei do Faraó que oprimia e escravi­za­va o povo. No novo êxodo, conduzido por Jesus, Deus liberta o povo da escravidão da lei, que o impedia de perceber e de experimentar o amor acolhedor de Deus como Pai. No antigo êxodo, nasceu o povo, feito de muitas raças e tribos diferentes. O que os unia e deles fazia um só povo era a fé comum em Javé, o Deus libertador. No novo êxodo, nasce um povo novo, feito de mui­tas raças, culturas e etnias. O que os une não é o sangue nem a raça, mas sim a fé comum em Jesus. Ele nos revelou a misericórdia e a ternura do Deus libertador que não exclui a ninguém.