Os meios de comunicação de massa e as redes sociais podem ser usados também pelas religiosas de clausura, mas com “sobriedade e discrição”. A recomendação consta da Instrução da Congregação para a Vida Consagrada Cor Orans, dedicada aos mosteiros de vida contemplativa, “coração orante” da Igreja que, apesar da emergência devido à redução das vocações, conta atualmente com 37.970 religiosas de clausura espalhadas por todo o mundo. A reportagem é de Iacopo Scaramuzzi e Salvatore Cernuzio, publicada por Vatican Insider, 15-05-2018. A tradução é de André Langer.
Com o documento publicado hoje, que aplica concretamente a Constituição Apostólica Vultum Dei Quaerere do Papa Francisco (julho de 2016), o dicastério da Santa Sérevoga alguns cânones do Código de Direito Canônico, para estabelecer, entre outras medidas, que quando um mosteiro tem menos de cinco religiosas, perde sua autonomia jurídica em vista da filiação ou de sua supressão, e de modo a não encorajar “o recrutamento de candidatos de outros países com o único objetivo de salvaguardar a sobrevivência do mosteiro”. O documento equilibra a relação entre cada uma das casas religiosas e as federações de mosteiros, reforçando, no respeito da autonomia dos mosteiros, estas “estruturas de comunhão” também em relação às visitas canônicas e à revisão das contas de cada mosteiro.
Em quatro capítulos (dedicados aos temas do mosteiro autônomo, da federação dos mosteiros, da clausura, da formação inicial e permanente), o documento oferece indicações práticas para as contemplativas, começando por duas pequenas ações cotidianas, como o uso dos meios de comunicação e das redes sociais. Todas as religiosas de clausura podem acessá-los, mas somente “com sobriedade e discrição”, explica a Instrução, porque existe o perigo de “esvaziar o silêncio contemplativo quando a clausura se enche de barulhos, de notícias e de palavras”.
A “sobriedade e a discrição” exigidas não têm a ver apenas com os “conteúdos”, mas também com a “quantidade de informações” e com o “tipo de comunicação”, para que “estejam a serviço da formação para a vida contemplativa e das comunicações necessárias”, e não sejam “uma ocasião de dissipação ou de evasão da vida fraterna”. Portanto, “o uso dos meios de comunicação, por razões de informação, de formação ou de trabalho, pode ser consentido no mosteiro, com prudente discernimento, para utilidade comum”, enfatiza a Congregação. A “separação do mundo”, em geral, “deve ser material e efetiva, não apenas simbólica ou espiritual”.
Uma “novidade absoluta” da Instrução, destacou, durante a coletiva de imprensa para a apresentação do documento, o secretário da Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, Mons. José Rodríguez Carballo, é o artigo 45: “Quando em um mosteiro autônomo, as professas de votos solenes chegam ao número de cinco, a comunidade do dito mosteiro perde o direito à eleição da própria superiora. Neste caso, a presidente federal deve informar a Santa Sé em vista da nomeação da Comissão ‘ad hoc’”. Esta é, continuou o franciscano, uma disposição “que seguramente diz respeito a um grande número de mosteiros, aos quais, pois, se pedirá que se cobre consciência da própria realidade, em um diálogo com a Santa Sé e com as figuras de referência previstas pela comissão”.
A Instrução afirma que a autonomia legal de um mosteiro deve “pressupor uma real autonomia de vida, isto é, a capacidade de cuidar da vida do mosteiro em todas as suas dimensões (vocacional, formativa, de governo, relacional, litúrgica, econômica...)”. De fato, esclareceu Carballo, “o dicastério teve que observar em várias oportunidades, com tristeza, a existência de mosteiros que não eram mais capazes de levar adiante uma vida digna, sem que tivessem uma legislação que indicasse quando e como intervir a respeito: ter preenchido esta lacuna legislativa é, certamente, um dos pontos mais importantes e mais aguardados da Instrução”.
O que a Congregação vaticana quer é que “os mosteiros sejam realidades vivas e significativas, evitando prolongar experiências que não têm, razoavelmente, possibilidade de futuro”. A autonomia, portanto, permanece, mas “sob certas condições, seguindo o princípio geral de que à autonomia ‘sui iuris’ corresponda a autonomia real de um mosteiro: se não existir essa autonomia, não pode existir a autonomia jurídica, e então procederá à filiação ou, em alguns casos, infelizmente, inclusive à supressão”.
O documento do Vaticano também especifica particularmente as regras de filiação, “verdadeira novidade do ponto de vista legislativo”, explicou o religioso espanhol: “Preciosa novidade, porque permitirá que muitos mosteiros em dificuldades sejam apoiados e sustentados por outras comunidades mais florescentes, se se abrem em espírito de fé e de comunhão a esta possibilidade de ajuda fraterna, que poderá, por um lado, abrir processos de revitalização e, por outro, preparar um terreno adequado para a transferência e a acolhida das religiosas em caso de fechamento, para que possam continuar a viver sua consagração com dignidade”.
Somente quando se verificar a “ineficácia da filiação”, a Santa Sé dará o “passo, provavelmente grave”, da supressão. Posto que o documento revoga alguns cânones, necessitava-se que o Pontífice, na qualidade de legislador, aprovasse as modificações, o que ele fez em 25 de março passado. As novidades introduzidas pela Cor Orans, disse mons. Carballo, “respondem em grande parte ao que as próprias religiosas pediram”.
A Instrução revoga, além disso, o direito canônico também em relação às Federações de mosteiros, figura introduzida por Pio XII. A intenção do Papa Pacelli com a Constituição Apostólica Sponsa Christi Ecclesia, de 1950, explicou o padre Sebastiano Paciolla, subsecretário da Congregação vaticana, “era manter os mosteiros como realidades autônomas, mas havia o perigo do isolamento entre os diferentes mosteiros, às vezes, inclusive entre os que se encontravam geograficamente próximos. As Federações nasceram para superar esse isolamento. Sendo uma estrutura de comunhão, devia respeitar a autonomia dos mosteiros e toda a normativa em questão era tão forte no respeito da autonomia dos mosteiros que a estrutura de comunhão tinha um reduzidíssimo alcance para ser aplicada e no final cada mosteiro continuava a ser um mundo em si mesmo”.
A Vultum Dei Quaerere do Papa Francisco “não modificou o status dos mosteiros, nem a realidade da Federação, mas equilibrou melhor as relações dentro dessas duas realidades, respeitando” a autonomia jurídica, “mas especificando os critérios de uma autonomia que deve ser real, e não um rótulo”. O texto vaticano de hoje reforça, em particular, a figura da presidente federal (sem dar-lhe ‘superpoderes’, disse Paciolla) e encomenda-lhe o papel de “co-visitadora” por ocasião de visitas canônicas regulares, reforça o papel do Conselho federal e também o da ecônoma federal, que “tem a responsabilidade de implementar o que o Conselho Federal estabelece e colabora com a presidente da Federação, no contexto da visita regular”, para verificar as contas “de cada um dos mosteiros”, identificando os pontos positivos e os pontos críticos, “dados que devem aparecer na relação final da visita”.
Entre as normas gerais, também são esclarecidos os termos da relação entre o mosteiro e o bispo diocesano, que, entre outras coisas, pode tomar decisões “oportunas quando constatar que existem abusos e depois que os chamados feitos à Superiora Maior não surtirem nenhum efeito”. O bispo também intervém “na construção do mosteiro, dando o seu consentimento por escrito antes que se peça a aprovação da Sé Apostólica”, bem como no caso da sua “supressão”. Também tem a “faculdade por justa causa de entrar no claustro e permitir, com o consenso da Superiora Maior, a entrada de outras pessoas”.
O último capítulo do documento do Vaticano trata da formação. Uma das questões que aborda é a constituição de “comunidades monásticas internacionais e multiculturais”, que “manifesta a universalidade de um carisma”: acolher as vocações de outros países, assinala a Congregação vaticana, “deve ser objeto de adequado discernimento”. Um dos critérios da acolhida é a “perspectiva de difundir futuramente a vida monástica em Igrejas particulares nas quais esta forma de seguimento de Cristo não esteja presente”. No entanto, precisa o texto, deve-se “evitar completamente o recrutamento de candidatos de outros países com a única finalidade de salvaguardar a sobrevivência do mosteiro”. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br