Frei Carlos Mesters, O. Carm.
Dois assuntos ligados entre si: a Transfiguração de Jesus e a questão da volta do profeta Elias. Hoje, muita gente vive esperando pela volta de Jesus e escreve nos muros da cidade: Jesus voltará! Eles não se dão conta de que Jesus já está presente dentro da nossa vida. De vez em quando, como um relâmpago repentino, esta presença se ilumina e transfigura nossa vida.
A fé que você tem em Jesus já lhe proporcionou algum momento de transfiguração e de alegria intensa? Estes momentos de alegria dão força na hora das dificuldades.
Vamos olhar de perto nos seus mínimos detalhes o texto que nos descreve a transfiguração de Jesus (Lucas 9,28-36). Durante a leitura, vamos prestar atenção no seguinte: “Como acontece a transfiguração e qual a reação dos discípulos diante desta experiência?”
LEITURA DO TEXTO LUCAS 9, 28-36
Como acontece a transfiguração e qual a reação dos discípulos diante desta experiência?
Por que o texto apresenta Jesus com vestes resplandecentes conversando com Moisés e Elias? O que Moisés e Elias significam para Jesus? E o que significam para os discípulos?
Qual a mensagem da Voz do Pai para Jesus? E qual para os discípulos?
Como transfigurar, hoje, tanto a vida pessoal e familiar, como a vida comunitária aqui no bairro?
Vamos rezar o salmo que fala da luz de Deus: Salmo 27(26)
A Transfiguração acontece depois do primeiro anúncio da Morte de Jesus (Lc 9,21-22). Este anúncio tinha transtornado a cabeça dos discípulos, sobretudo de Pedro (Mc 8,31-33). (Lucas omite esta passagem sobre Pedro.) Eles tinham os pés no meio dos pobres, mas a cabeça perdida na propaganda do governo e da religião da época (Mc 8,15). Pois, conforme o Antigo Testamento, um condenado à morte na cruz devia ser considerado como um “maldito de Deus” (Dt 21,22-23) e jamais poderia ser o messias! Por isso Pedro reagiu com tanta força contra a cruz (Mc 8,32). A cruz era um impedimento para crer em Jesus. “A cruz é um escândalo!”, assim diziam (1Cor 1,23). A Transfiguração de Jesus ajuda os discípulos a superar o trauma da Cruz. No Evangelho de Lucas, Jesus conversa sobre a sua Paixão e Morte com Moisés e Elias (Lc 9,31).
Nos anos 80, quando Lucas escreve, a Cruz continuava sendo um grande impedimento para os judeus aceitarem Jesus como Messias. Como é que um crucificado, morto como marginal, podia ser o grande messias que o povo esperava há séculos? As comunidades não sabiam como responder às perguntas críticas dos judeus. Um dos maiores esforços dos primeiros cristãos consistia em ajudar as pessoas a perceber que a cruz não era escândalo nem loucura, mas sim expressão do poder e da sabedoria de Deus (1Cor 1,22-31). Lucas dá a sua contribuição neste esforço. Ele usa textos e figuras do Antigo Testamento para descrever a cena da Transfiguração. Assim ele ilumina os fatos da vida de Jesus e mostra que Jesus veio realizar as profecias e que a Cruz era o caminho para a Glória. Assim ajudava as comunidades para entender melhor quem era Jesus e qual a mensagem dele.
Jesus muda de aspecto.
Jesus sobe a uma montanha alta. Lucas acrescenta que ele subiu para rezar (Lc 9,28). Lá em cima, Jesus aparece na glória diante de Pedro, Tiago e João. Junto com ele aparecem Moisés e Elias. A Montanha alta evoca o Monte Sinai, onde Deus tinha manifestado sua vontade ao povo entregando a lei. As vestes brancas lembram Moisés que ficava fulgurante quando conversava com Deus na Montanha e dele recebia a lei (cf. Ex 34,29-35). Elias e Moisés, as duas maiores autoridades do Antigo Testamento, conversam com Jesus e aprovam o que ele diz e faz. Lucas informa que a conversa de Moisés e Elias é sobre a Morte de Jesus em Jerusalém (Lc 9,31).
Pedro gostou mas não entendeu.
Pedro gostou e quer segurar o momento agradável na Montanha. Ele se oferece para construir três tendas. Lucas diz que Pedro não sabia o que estava dizendo. Falou por falar. E Lucas acrescenta que os discípulos estavam com sono (Lc 9,32). Os discípulos são como nós: têm dificuldade para entender a Cruz!
A voz do céu esclarece os fatos.
A voz do Pai diz: “Este é o meu Filho amado! Ouvi-o!”. A expressão “Filho amado” lembra a figura do Messias Servidor, anunciado pelo profeta Isaías (cf. Is 42,1). A expressão “Ouvi-o!” lembra a profecia que prometia a chegada de um novo Moisés (cf. Dt 18,15). Com outras palavras, em Jesus, as profecias do Antigo Testamento estão se realizando. Os discípulos já não podem duvidar. Devem entender que Jesus é realmente o Messias glorioso e que o caminho da glória passa pela cruz. Pois tudo isto já tinha sido anunciado na profecia do Servo sofredor (Is 53,3-9). Moisés e Elias o confirmam. A glória da Transfiguração o comprova. O Pai o garante. Jesus o aceita.
No fim, Lucas diz que, depois da visão, os discípulos vêem só Jesus e ninguém mais. Daqui para frente, Jesus é a única revelação de Deus para nós! Só ele! Jesus é a chave para a gente entender o Antigo Testamento.
Saber guardar o silêncio.
Jesus pedia para não dizerem nada a ninguém até que tivesse ressuscitado dos mortos, mas os discípulos não entenderam. De fato, não entende o significado da Cruz quem não liga o sofrimento com a ressurreição. A Cruz de Jesus é a prova de que a vida é mais forte que a morte.
A volta do profeta Elias.
No Evangelho de Marcos os discípulos querem saber sobre a volta do profeta Elias (Mc 9,11-13). O profeta Malaquias tinha anunciado que Elias devia voltar para preparar o caminho do Messias (Ml 3,23-24). O mesmo anúncio está no livro do Eclesiástico (Eclo 48,10). Então, como Jesus podia ser o Messias, se Elias ainda não tinha voltado? Por isso, os discípulos perguntam: “Por que motivo os escribas dizem que Elias deve vir primeiro?” (Mc 9,11). A resposta de Jesus é clara: “Elias já veio e fizeram com ele tudo o que quiseram, conforme dele está escrito” (Mc 9, 13). Escrito aonde e o que? Jesus alude à morte violenta de João Batista (cf Mc 6,16.27-28). Nela se realizou a ameaça de morte que Jezabel fez contra Elias, conforme está escrito no livro dos Reis (1 Rs 19,2.10). Com outras palavras, as profecias de Isaías que falam da morte violenta do Messias Servo também se cumprirão.
Instrução sobre a necessidade da fé (Mc 9,14-29).
Ao descer do Monte, Jesus encontra os discípulos tentando inutilmente expulsar o demônio impuro de um menino doente. Anteriormente, eles tinham sido capazes de expulsar demônios (Mc 6,13). Mas, ao que parece, o desencontro crescente entre eles e Jesus tinha enfraquecido sua fé. Jesus teve um desabafo: “Ó geração sem fé! Até quando vou estar com vocês! Até quando vou suportá-los?” (Mc 9,19) De volta em casa, os discípulos perguntaram: “Por que não pudemos expulsá-lo?” Jesus responde: “Essa espécie não pode sair a não ser com oração” (Mc 9,28-29). Só mesmo a oração fortalece a fé do discípulo a ponto de ela ser capaz de expulsar o demônio e de corrigir as idéias erradas sobre Jesus, o Messias. Pois “tudo é possível àquele que crê!” (Mc 9,24)