Dom Rodolfo Weber

Arcebispo de Passo Fundo (RS)

 

Celebradas as festividades do Natal, a liturgia inicia o Tempo Comum com o início da vida pública e as pregações de Jesus Cristo. Quando João Batista viu Jesus aproximar-se (João 1,29-34), dá testemunho do Messias apresentando de imediato as suas credenciais: Jesus é o “Cordeiro de Deus que tira o pecado o mundo”. “Eu vi o Espírito descer, como uma pomba do céu, e permanecer sobre ele”. Ele “é quem batiza com o Espírito Santo”. “Este é o Filho de Deus”. Sem rodeios, João Batista realiza sua missão de testemunhar que o Salvador estava entre eles e era hora de ouvir e acolher os seus ensinamentos, reconhecer os sinais e crer nele. 

Em todas as celebrações eucarísticas proclamamos Jesus o “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”. A expressão no contexto cultural e religioso judaico e para os primeiros cristãos de origem judaica era muito conhecida e muito bem compreendida. Era um dos títulos messiânicos aplicados a Jesus conforme o profeta Isaías 53,7. “Como cordeiro que é levado ao matadouro ou como ovelha, que emudece diante do tosquiador, ele não abriu a boca”. 

Para nós hoje e na nossa cultura temos algumas dificuldades em compreender a profundidade da afirmação de João Batista. A expressão faz parte da liturgia e é muito rica em ressonâncias bíblicas. Ela refere-se ao cordeiro pascal da libertação do Egito (Êxodo 12). A noite da libertação foi marcada pelo sacrifício do cordeiro para servir de ceia e o sangue aspergido na porta era sinal de identificação e proteção. A partir daquela data, todos os anos a Páscoa judaica, isto é a Passagem, será realizada desta forma. Tradição se mantém viva na Páscoa Judaica. A segunda referência está nos sacrifícios habituais de cordeiros realizados no templo para a expiação dos pecados do povo, conforme Êxodo 29,38 e Levítico 16,21. Estes sacrifícios de cordeiros aconteciam regularmente no Templo de Jerusalém realizados pelos sacerdotes do Antigo Testamento. 

Jesus é o novo Cordeiro pascal imolado no dia da Páscoa e na hora em que eram sacrificados os cordeiros pascais no templo. Ele é o sacrifício da Nova Aliança que supera e anula o sangue dos sacrifícios animais (Hebreus 10,1-18). Ele é a nova Vítima e o Sacerdote, simultaneamente (Hb 7,27). “Nele, e por seu sangue, obtemos a redenção e recebemos o perdão de nossas faltas” (Efésios 1,7). “Tende consciência que fostes resgatados da vida fútil, transmitida pelos antepassados, não ao preço de coisas perecíveis, como a prata ou o ouro, mas pelo precioso sangue de Cristo, cordeiro sem defeito e sem mancha. (1Pedro 1,18-19). 

João Batista apresenta Jesus como o libertador do homem. O grande mal e a fonte de todos os males é o pecado. A afirmação é feita no singular “o pecado”, pois engloba todos os pecados numericamente, mas principalmente acentua do pecado do mundo que escraviza o homem. 

A realidade do pecado se faz presente entre nós e dentro de cada um nós, hoje como ontem e como sempre. É verdade que fomos redimidos e vocacionados para a santidade como nos ensina São Paulo na segunda leitura da liturgia dominical. “Aos que foram santificados em Cristo Jesus, chamados a ser santos junto com todos os que, em qualquer invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso” (1 Coríntios 1,1-3). O sangue de Cristo não nos torna impecáveis. O pecado está no meio de nós, embora a palavra “pecado” pareça defasada. Basta lançar um olhar ao redor para percebermos que o pecado abunda na sociedade, no ambiente de trabalho, na família e no plano pessoal. Convivemos com estruturas que induzem as pessoas ao mal, basta acompanhar os fatos anunciados e as conversas. O caminho da libertação passa por Jesus Cristo, o “Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo”.  Fonte: https://www.cnbb.org.br