Com a catedral mais antiga das Américas e uma longa história de base para a evangelização do continente, Santo Domingo, capital da República Dominicana no Caribe, é conhecida como a “Primaz das Américas”. O Papa Francisconovamente causou surpresa ao nomear um bispo pouco conhecido como o seu novo arcebispo. A reportagem é de Austen Ivereigh, publicada por Crux, 04-07-2016. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Se em algum momento foram necessários exemplos de que o Papa Francisco realmente pretende mudar o rosto do episcopado latino-americano, a nomeação de um pastor com pouco destaque, vindo de uma pequena diocese da República Dominicana para ser o próximo primaz das Américas, deve servir como um exemplo perfeito para dissipar qualquer dúvida.
Nesta segunda-feira, o Vaticano anunciou que Dom Francisco Ozoria Acosta, de San Pedro de Macorís (com 500 mil habitantes) será o novo arcebispo de Santo Domingo (arquidiocese com 5 milhões de habitantes), substituindo o Cardeal Nicolás de Jesús López Rodríguez.
Depois de sua instalação em 4 de setembro, o arcebispo-eleito Francisco Ozoria Acosta – praticamente desconhecido da imprensa – irá liderar a diocese-mãe da República Dominicana, local a partir de onde se iniciou a evangelização das Américas.
A catedral do novo arcebispo, que abriga os restos mortais dos membros da família de Cristóvão Colombo, foi erguida pelo Papa Paulo III para ser a “primeira catedral das Américas” em 1546 a pedido de Carlos V, da Espanha. “Tenho certeza de que essa escolha foi uma surpresa para todos vocês”, disse o arcebispo-eleito aos jornalistas em coletiva de imprensa no início do dia em Santo Domingo. “Posso assegurar-lhes de que o mais surpreso de todos sou eu!”, disse.
A substituição há muito aguardada de Dom López Rodríguez, de 80 anos, põe fim a um interregno aparentemente interminável, em que o cardeal praticamente não mais se fazia ver em público. Uma figura imponente não só na Igreja latino-americana como também na vida pública da República Dominicana, o cardeal de repente retirou-se do espaço coletivo antes do Natal do ano passado, e desde então quase não foi visto, inclusive no Natal e nas celebrações litúrgicas de Páscoa.
Especulações sobre o seu estado de saúde – uma mistura de doenças e depressão, segundo alguns – têm sido uma constante na imprensa local, cujas histórias sobre a Igreja costumam incluir uma referência ao “longo silêncio do cardeal”. A escolha de Dom Francisco Ozoria Acosta para ser o arcebispo representa dois importantes desafios: estar na pele de uma figura importante e altamente capaz como a do Cardeal Rodríguez, e sair de uma diocese de meio milhão de pessoas para assumir uma com 5 milhões de habitantes.
Esta nomeação surpreendeu inúmeros analistas que esperavam que a nomeação fosse para Freddy Bretón, arcebispo da segunda maior cidade do país, Santiago, ou para Victor Masalles, talentoso porém ainda jovem bispo auxiliar de Santo Domingo. O número de candidatos era relativamente pequeno – a maioria dos bispos dominicanos estão na cada dos 70 anos – e o bispo de San Pedro de Macorís, com 65 anos, não estava entre os mencionados quando estive na ilha há algumas semanas. No entanto, o currículo de Ozoria Ocosta, em que a palavra “pastoral” aparece constantemente, dá uma pista para os motivos que levaram Francisco escolhê-lo.
Assim como o papa, ele estudou Teologia Pastoral (no caso do dominicano, na Pontifícia Universidade Lateranense, em Roma) e lecionou a disciplina no seminário de Santo Domingo, onde também era o responsável pela formação. Ele foi igualmente o pároco em sua cidade natal de Nagua antes de ser nomeado bispo da recém-criada diocese de San Pedro de Macorís, no sul da ilha, em 1997.
Aí, sem chamar muita atenção em nível nacional, conquistou vocações e teve uma forte presença pastoral. Atualmente,Ozoria Ocosta coordena as comissões episcopais para a formação, os leigos e jovens. Leslie Torres, diretora do canal dominicano católico Televida, conhece o novo arcebispo desde a sua diocese anterior.
“Ele é um pastor que se mostra acessível, é humilde e simples, com uma grande capacidade de escuta e diálogo”, disse, acrescentando que o prelado é “capaz de olhar para o seu povo com um grande coração”. Um contraste maior com o espirituoso, mordaz, sofisticado, porém clerical Nicolás de Jesús López Rodríguez seria difícil de encontrar, inclusive no tocante à aparência.
Enquanto o cardeal tem as características classicamente europeias das classes superiores, o novo arcebispo se parece – e soa – como a maioria dos dominicanos de raça mista. Num país onde o tema da imigração por parte do vizinho Haiti nunca está fora de pauta, isso em si representa uma mudança.
Na manhã desta segunda-feira, Ozoria Ocosta disse aos jornalistas ser um “seguidor apaixonado do Concílio Vaticano II, sobretudo da eclesiologia de comunhão que sustenta o nosso programa pastoral nacional”. Ele prometeu juntar-se a todos os agentes pastorais, leigos e religiosos, em uma missão compartilhada de evangelização.
Segundo ele, o seu objetivo como arcebispo será “dar continuidade à missão da Igreja”, conhecer a arquidiocese e desempenhar as três tarefas de um bispo: ser pastor, educar e santificar. “Mas não podemos esquecer”, acrescentou, “que todos os batizados participam destas tarefas”.
O Vaticano também anunciou esta manhã que aceitou a renúncia do cardeal com base na idade de um dos bispos auxiliares do cardeal, o carmelita nascido na Espanha Amancio Escapa Aparicio. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br