Frei Alexander Vella, O.Carm.
(A Imagem Peregrina de Santo Elias se encontra na cidade de Santos/SP. De 17-21. PRÓXIMA CIDADE: São Paulo- Sapopemba- De 22-27)
Hoje ninguém coloca em dúvida a existência de Elias, visto antes por alguns apenas como personificacão da luta do javismo contra o baalismo. O tempo em que foram escritas, não muito distante da passagem do profeta, constitui um argumento a favor de tal historicidade, ao menos em relação ao núcleo do que se afirma sobre ele. Conhece-se realmente bastante bem a sua época de forma a poder enquadra-lo facilmente em seu ambiente, um ambiente que é apresentado com clareza nestas histórias.
É necessário ter presente que as histórias nos dizem muito pouco dele. Se referem a ele como pessoa bem conhecida de todos e que dispensa apresentações. De suas origens não se sabe nada, a não ser que era proveniente da região de Galaad. Sua vida pessoal, o seu ambiente religioso e social são desconhecidos. Também, como escreve o notável biblista G. von Rad, Elias não é nem mesmo apresentado como uma "figura" no sentido literário moderno, o que torna difícil descobrir a sua personalidade uma vez que tal cogitacão não fazia parte das histórias narradas (ver G. von Rad, Theology of the Old Testament, II, London, 1975 pp. 15 e 24).
O personagem principal dos contos não é Elias mas o Senhor que escolhe Elias como instrumento em um momento muito crítico da história religiosa de Israel para fazer triunfar o javismo puro e íntegro contra o sincretismo religioso, que o ameacava de substituir pelo baalismo. Pode-se afirmar que nestas histórias, apesar de toda a sua grandeza, Elias continuamente desaparece da cena para deixar a Deus só o lugar principal.
Sem dúvida, pode-se dizer da figura de Elias, que o profeta era guiado exclusivamente pela Palavra de Deus. Isto é repetido muitas vezes no texto. Podemos verificar, por exemplo no caso dos deslocamentos de Elias. Os dois deslocamentos do cap. 17 são claramente guiados por Deus e por Ele orientados (vv. 3-5,9-10). Da mesma forma o narrado no cap. 18 (vv.1 e 2). Elias aparece como um homem todo plasmado pela palavra de Deus. Por isto não é de admirar que nossos padres o tenham escolhido como seu modelo inspirativo, uma vez que a escuta-obediência à Palavra de Deus é elemento constitutivo do carisma carmelitano. A Regra, realmente, o indica como nossa ocupacão principal (n. 10) e nos recomenda a tudo fazer conforme a Palavra do Senhor (n. 19).
Entretanto, sobre este aspecto, Elias parece resvalar por um momento, pois, ele que sempre agia movido pela Palavra de Deus, no cap. 19, empreende a viagem pelo deserto, não sob o comando de Deus, mas pela própria iniciativa, tanto que Deus o interpela por duas vezes "que fazes aqui Elias?" (vv.9-13). É a hora difìcil na vida do Profeta, a sua "noite escura", apresentada com a imagem bíblica do deserto que aliás é muito cara a nossa tradição carmelitana.
Elias é o homem do coração indiviso, o homem que vive inteiramente diante de Deus, todo a serviço de Deus, pronto a seguir as suas ordens (17,1; 18,15). Não tem outro interesse senão Deus e sua causa. É um profeta de fogo que arde de paixão por Deus e por sua aliança que vê completamente ameaçada. Toda a sua existência teve como sentido a luta contra as falsas imagens de Deus que os homens iam criando para satisfazer as próprias necessidades. É nisto que consiste a idolatria. Mas, o Deus de Israel, o Deus de Elias é um Deus infinitamente maior que o nosso coração, que nossos conceitos, que nossas espectativas e nossas necessidades. É um Deus com o qual também Elias, o seu grande herói, perde, porque não havia compreendido como Deus age na história e em seus desvios. Precisa passar ainda pelo deserto para ser transformado.
Imerso em seu contexto histórico, Elias transcende o seu ambiente e a sua epoca e torna-se um homem de todos os tempos, pois a humanidade em cada homem é sempre a mesma seja pagão, israelita e também cristão. Sua maior tentação será sempre a de fazer um Deus a sua medida. Elias e depois dele os grandes mestres do Carmelo, nos ensinam que, ao contrario, devemos permitir a Deus de ser Deus em nossa vida, acolhendo-o tal como Ele é. Isto não ocorre naturalmente mas resulta de um longo e árduo caminho que nos leva ao deserto, onde encontrando a Deus e sendo por Ele transformados, começamos a deixar todas as nossas falsas imagens dele e ao contrario de reduzi-lo a nossas dimensões, começamos a acolhê-lo em nós, tal como Ele é.