As leituras deste domingo põem em relevo a dificuldade em viver como discípulo, dando testemunho do projeto de Deus no mundo. Sugerem que a perseguição está sempre no horizonte do discípulo… Mas garantem também que a solicitude e o amor de Deus não abandonam o discípulo que dá testemunho da salvação.
No Evangelho, é o próprio Jesus que, ao enviar os discípulos, os avisa para a inevitabilidade das perseguições e das incompreensões; mas acrescenta: “não temais”. Jesus garante aos seus a presença contínua, a solicitude e o amor de Deus, ao longo de toda a sua caminhada pelo mundo.
Um olhar para o Evangelho- Atualização: (Mt 10, 26-33)
O projeto de Jesus, vivido com radicalidade e coerência, não é um projeto “simpático”, aclamado e aplaudido por aqueles que mandam no mundo ou que “fazem” a opinião pública; mas é um projeto radical, questionante, provocante, que exige a vitória sobre o egoísmo, o comodismo, a instalação, a opressão, a injustiça… É um projeto capaz de abalar os fundamentos dessa ordem injusta e alienante sobre a qual o mundo se constrói. Há um certo “mundo” que se sente ameaçado nos seus fundamentos e que procura, todos os dias, encontrar formas para subverter e domesticar o projeto de Jesus.
Quem quer seguir um Jesus oba oba e light, descomprometido com a realidade, é melhor ficar em casa e esquecer a verdadeira mensagem cristológica que exige tomada de posição. Ou seja, impossível falar de Jesus de Nazaré e ficarmos em cima do muro ou de braços cruzados diante de um mundo consumista, desumano, violento e injusto.
A nossa época inventou formas (menos sangrentas, mas certamente mais refinadas do que as de Domiciano) de reduzir ao silêncio os discípulos: ridiculariza-os, desautoriza-os, calunia-os, corrompe-os, massacra-os com publicidade enganosa de valores efêmeros… Como a comunidade de Mateus, também nós andamos assustados, confusos, desorientados, interrogando-nos se vale a pena continuar a remar contra a maré… A todos nós, Jesus diz: “não temais”.
O medo - de parecer antiquado, de ficar desenquadrado em relação aos outros, de ser ridicularizado, de ser morto – não pode impedir-nos de dar testemunho. A Palavra libertadora de Jesus não pode ser calada, escondida, escamoteada; mas tem de ser vivamente afirmada com palavras, com gestos, com atitudes provocatórias e questionantes. Em outras palavras, ser cristão não é um passaporte para o ibope ou o aumento da conta bancária, mas sujarmos as mãos na mudança que “AINDA” é possível, mesmo que para tal tenhamos que passar pelas noites escuras da vida.
Viver uma fé “morninha” (instalada, cômoda, que não faz ondas, que não muda nada, que aceita passivamente valores, esquemas, dinâmicas e estruturas desumanizantes), não chega para nos integrar plenamente na comunidade de Jesus. A Boa Nova de Jesus Cristo não é doce de coco ou suco de maracujá. Às vezes é amarga como jiló.
De resto, o valor supremo da nossa vida não está no reconhecimento público, mas está nessa vida definitiva que nos espera no final de um caminho gasto na entrega ao Pai e no serviço aos homens; e Jesus demonstrou-nos que só esse caminho produz essa vida de felicidade sem fim que os donos do mundo não conseguem roubar.
A Palavra de Deus que nos foi hoje proposta convida-nos também a fazer a descoberta desse Deus que tem um coração cheio de ternura, de bondade, de solicitude. Se nos entregarmos confiadamente nas mãos desse Deus, que é um pai que nos dá confiança e proteção e é uma mãe que nos dá amor e que nos pega ao colo quando temos dificuldade em caminhar, não teremos qualquer receio de enfrentar os homens.
Enfim, temos que ter a mesma convicção do apóstolo Paulo (Romanos 8, 35-39 e dizer: “Quem vai nos separar do amor de Cristo? O desemprego? Os corruptos do Brasil? As balas perdidas do Rio de Janeiro, os assaltos e a violência em nossas cidades? A depressão? A infidelidade matrimonial? As incompreensões no trabalho, na família e na Igreja?... Não, não. Nada, eu disse NADA! poderá nos separar do amor de Cristo.