*Por Pe. Luciano Guedes

No texto sagrado do Novo Testamento, Maria é narrada como a serva, a eleita do Senhor, obediente, ouvinte e fiel. Quando de sua descida a Jerusalém para a festa da Páscoa junto com José e o Menino ou na sua pressa de subir às montanhas da Judeia para socorrer sua prima Isabel grávida, contemplamos a Virgem inteiramente relacionada ao espaço da família. Nas bodas de Caná, ela surge como figura representante das angústias e necessidades humanas, no contexto de um casamento que era, naturalmente, no mundo judaico, expressão dos profundos vínculos tecidos entre os convidados para aquela celebração, festa da família.

Em Maria, a família está sempre aberta para Deus, na recepção e escuta amorosa de sua Palavra, no serviço livre e imediato oferecido aos irmãos. Nela, a família é o lugar no qual Deus é o centro e por causa desta convicção não se evidencia simplesmente o ego das pessoas, mas cada indivíduo abre-se ao mistério de Deus que se esconde no rosto do semelhante, na alegria ou na aflição do outro, pedindo para ser reverenciado.

A família atual tem imensas possibilidades. Estamos na era da comunicação e assim podemos estar mais próximos se soubermos colocar tantas tecnologias as quais dispomos a serviço do fortalecimento de nossos vínculos. Por outro lado, o forte narcisismo, sintoma de nossos tempos, desponta como risco que adoece os relacionamentos. Ouvi certo dia que a redescoberta da oração do Terço em família, uma vez por semana – com dia e hora marcada -, foi capaz de fazer milagre, reunir pessoas de um mesmo núcleo que em razão de seus tantos deveres e tarefas, quase não se encontravam mais para conversar e partilhar a vida. Ali, naquele espaço, sagrado por desejo de Deus, mas negligenciado pelas preocupações humanas, pais, filhos, netos, sobrinhos, cunhados, avós e amigos encontraram sentido para condividir as suas vidas e superarem juntos o isolamento da vida urbana e do estresse do trabalho.

Na sua Encíclica Amoris Laetitia, o Papa Francisco nos ensina que na família não pode existir o desejo da vanglória nem a vontade de se mostrar superior para impressionar os outros com atitude pedante e agressiva. O Santo Padre nos exorta: “Quem ama não só evita falar muito de si mesmo, mas, porque está centrado nos outros, sabe manter-se no seu lugar sem pretender estar no centro. A atitude de humildade aparece aqui como algo que faz parte do amor, porque, para poder compreender, desculpar ou servir os outros de coração, é indispensável curar o orgulho”. (Papa Francisco, Amoris Laetitia, 2016, p.65-66)

Quem sabe neste santo tempo do Advento, olhando para a Imaculada – a toda bela, sem a mancha do pecado – que nos ensina a preservar a sacralidade da família, seja tempo oportuno para interrogarmos o próprio coração: Estou permitindo que Deus seja o Senhor da minha casa, da minha família?  Ou será que estou no centro, exigindo e cobrando dos outros mais que oferecendo o meu amor e generosidade?

O cultivo da espiritualidade mariana pode auxiliar-nos neste caminho, na saída de nós mesmos em direção a Deus e aos outros. Quando rezamos a Ave-Maria, repetindo as palavras do anjo do Senhor, pedimos que a Virgem rogue por nós, os pecadores, até a hora de nossa morte. Estamos assim a dizer que sem Deus, ficamos mais pobres, encerrados no nosso vazio, fechados na soberba que mata e destrói. A Imaculada de Deus, a Virgem bela que nos conduz ao Céu, seja nossa inspiração e guia neste itinerário de prepararmos a “manjedoura” de nossas famílias, onde o Cristo Deus virá nascer!

(*) Pároco da Catedral Diocesana de Campina Grande-PB.

Fonte: https://paraibaonline.com.br