Por Carolina Delboni

Tem assunto que parece missão impossível, que você não tem ideia por onde começar. Tem assunto que dá pesadelo e outros que você quer passar longe, certo? Pois é, mas quando a gente não fala, a internet fala. Já pensou sobre isso?

Sabe aquela música da Pitty que diz: "Pane no sistema, alguém me desconfigurou"? É exatamente assim que muitos pais se sentem, quando precisam ter conversas difíceis com seus filhos. Assuntos como puberdade, sexo, gravidez na adolescência, pornografia e identidade de gênero são tópicos frequentemente evitados porque geram desconforto tanto para os pais quanto para os filhos.

Mas com tanta informação disponível nas redes sociais e nas conversas entre amigos, os adolescentes rapidamente encontram tudo e mais um pouco numa simples busca. Acabam se deparando não só com os temas que pesquisavam, como com muito - muito - conteúdo que não deveriam ter acesso.

Pensa que a internet é uma grande casa, cheia de quartos e cômodos todos sem portas. Entra quem quer, a hora que quer e vê o que os olhos são capazes de ver. Basicamente isso. E quando pais e responsáveis legais optam por não conversarem sobre os assuntos mais cabeludos, é lá que os adolescentes vão buscar informação - quer você queira ou não.

E a adolescência é um período cheio de curiosidades e descobertas, portanto, eles vão buscar informação - em algum lugar. Ficar sem resposta ou no vácuo, como dizem, não é uma alternativa. Claro que as conversas entre os colegas são super bem-vindas, mas muitas vezes os amigos têm o mesmo aprofundamento de informação do que seu filho e/ ou filha.

As fontes de pesquisa também costumam ser as mesmas: redes sociais e influenciadores. E veja, como o próprio nome diz são pessoas que falam e fazem coisas para influenciar outras, mesmo que não seja intencional. Estamos falando de uma geração que usa as redes para buscar informação. Eles não acessam jornais ou canais de mídias confiáveis. Eles buscam semelhantes.

Segundo estudo da TIC Kids Online, divulgado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil em 2022, 71% dos jovens entrevistados buscam as redes para fazer pesquisa, inclusive para a escola. Outros 32% buscaram a internet para saber ou conversar sobre vivências ruins que passaram, pode ser um sentimento ou alguma situação mais traumática. Mas e aí, o que fazer ou como fazer? Competir com as redes sociais não é um caminho, mas andar ao lado dela sim. O que eu estou querendo dizer?

Converse com seu adolescente. "Ah, mas é impossível, ele nunca quer falar". Pode ser que ele não queira sentar e bater um papo cabeça com você, algo mais formal, mas procure trazer os temas de maneira mais solta, descontraída. Não, você não vai fazer piada sobre coisas sérias, mas vai puxar o assunto de forma mais suave, contando um caso, algo que você leu, viu nas redes sociais, enfim, usando mais a linguagem do adolescente do que a sua, que é adulta.

Conversar de maneira aberta e informativa pode fortalecer os laços familiares e preparar o terreno para mais diálogos difíceis no futuro. Mesmo que discutir sobre sexo possa ser desconfortável, é importante vencer os obstáculos culturais, religiosos e pessoais para começar essa conversa. Comece aos poucos. Por onde você dá conta.

 

1 e 2. Sexo e Gravidez na adolescência

Ensinar sobre sexualidade é fundamental para proteger nossos jovens. Isso inclui dar informações corretas e criar um ambiente onde eles possam falar sobre assuntos sensíveis sem medo e/ ou vergonha. A gravidez na adolescência, por exemplo, é outro assunto sério que continua sendo uma pauta urgente.

Dados da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) do IBGE, mostram que quase um terço dos jovens de 13 a 15 anos já iniciaram sua vida sexual e menos estão usando preservativos. Segundo a OMS, 30% das meninas adolescentes que engravidam dizem não ter tido informação alguma. Isso destaca a necessidade inadiável de conversar sobre sexo e como se prevenir de riscos, como as doenças sexualmente transmitidas.

Conforme pesquisa da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), o Brasil tem uma das maiores taxas de gravidez em adolescentes entre 14 a 19 anos. Isso mostra o quanto é importante ensinar sobre prevenção e incentivar visitas regulares ao médico para orientação especializada. E isso vale para os meninos também.

Meninos precisam entender sobre o próprio corpo e o corpo do outro. Precisam aprender sobre a camisinha antes de terem que usá-la, precisam fazer visitas regulares a um médico. Precisam saber sobre menstruação. Sobre coisas que acontecem no corpo das meninas para respeitá-las.

 

3. Pornografia na adolescência

Outro assunto espinhoso, mas que precisa ser abordado porque tem inúmeros riscos. Estudos mostram que os jovens têm contato cada vez mais cedo com a pornografia. Um levantamento com 9.250 pré-adolescentes, com idades entre 10 e 14 anos, revelou que 14,5% dos jovens entrevistados no Equador (a menor taxa) e 33% na Bélgica (a maior) já tiveram contato com pornografia nessa faixa etária.

O estudo, publicado no jornal científico Journal of Adolescent Health, em julho de 2021, concentrou-se especialmente em moradores de áreas mais pobres desses países. Uma das razões apontadas é a popularização dos celulares, que alavancou a quantidade e a variedade desse tipo de conteúdo - além de ter facilitado o acesso, não apenas por adolescentes, mas para crianças também. Preocupante? Muito. O que fazer?

A melhor maneira de lidar ainda é a conversa, mas aqui elas devem ser educativas e positivas, onde se explique a diferença entre a pornografia e a realidade, se fale sobre sexualidade, toque e afeto de maneira respeitosa e verdadeira como partes importantes da experiência sexual humana.

 

4. Identidade de gênero

Abordar temas como sexualidade e identidade de gênero com os filhos pode ser desafiador, mas também é uma oportunidade para refletir sobre as transformações sociais e culturais atuais. Conforme o artigo "Gênero vs Sexualidade", publicado pela Unicef Brasil, a identidade de gênero relaciona-se ao modo como o indivíduo se reconhece em relação ao seu corpo, não se limitando necessariamente ao sexo biológico.

Há pessoas que, embora nascidas biologicamente em um gênero específico, identificam-se com outro desde a infância. Por outro lado, a sexualidade diz respeito às atrações afetivas e sexuais, podendo ser direcionada as pessoas do mesmo sexo, do sexo oposto, ou de ambos, caracterizando, respectivamente, as orientações homossexual, heterossexual e bissexual.

A nova geração está à frente de um movimento pela aceitação da diversidade de gênero e expressões sexuais de forma inclusiva, desprovida de julgamentos e respeitosa. Os jovens estão redefinindo padrões sociais, valorizando a liberdade de ser e amar. Para os pais, este processo envolve aprender e dialogar de maneira aberta, buscando fortalecer a relação com os filhos e promover um ambiente de apoio, onde eles possam explorar sua identidade e sexualidade de maneira segura. Nesse contexto, profissionais da psicologia podem oferecer suporte essencial, auxiliando na criação de espaços seguros para essas conversas.

 

5. Cigarro eletrônico na adolescência

A questão do consumo de cigarros eletrônicos, ou vapes, também requer atenção. Apesar da proibição de venda no Brasil, a aquisição ilegal desses dispositivos persiste. Dados da pesquisa PeNSE de 2019 indicam que aproximadamente 16,8% dos adolescentes entre 13 e 17 anos já experimentaram cigarro eletrônico.

Os pais devem buscar informações sobre os riscos associados ao uso desses dispositivos, incluindo o potencial para dependência pela presença de nicotina, que pode prejudicar o desenvolvimento cerebral dos jovens. Recentemente, a Anvisa reforçou a proibição dos cigarros eletrônicos, incluindo restrições à publicidade e divulgação. Uma compreensão aprofundada sobre a popularidade dos vapes pode capacitar os pais a orientar seus filhos para tomadas de decisão mais seguras, incentivando alternativas saudáveis.

 

6.Bebidas alcoólicas na adolescência

O aumento no consumo de álcool entre adolescentes é outro tema. A pesquisa PeNSE mostrou um crescimento na taxa de consumo de 61,4% para 63,3% desde 2015, com quase um terço dos jovens iniciando o consumo antes dos 14 anos. A fiscalização da venda de bebidas alcoólicas para menores ainda enfrenta desafios, especialmente nas plataformas digitais pelos aplicativos de entrega que vendem bebida alcóolica para essa faixa etária sem nenhum recurso de segurança extra.

Na adolescência, a bebida alcóolica não só representa a transgressão como é um código da vida adulta e "crescer" é outro desejo desta faixa etária. Portanto, aqui os pais têm apenas uma alternativa: falar abertamente sobre o tema. A bebida é proibida para menores de 18 anos, isso é Lei e eles precisam saber. Mas e se beberem escondido, o que também precisam saber? É importante orientar sobre consequências do consumo excessivo, a vulnerabilidade que a pessoa se encontra neste estado físico, o que fazer, a quem pedir ajuda, enfim, aqui vale a transparência no assunto e não o moralismo.

 

7.Uso excessivo das telas

Quando a pandemia nos forçou a adaptar nossas rotinas, incluindo a escola em casa, as crianças e adolescentes acabaram passando mais tempo do que nunca em frente às telas. Pesquisas, incluindo uma da UFMG, apontaram que até mesmo as crianças chegaram a ficar até quatro horas diárias conectadas, enquanto muitos adolescentes excederam a orientação de duas horas de tela por dia.

impacto potencial desse aumento no uso de telas vai desde o risco de dependência até questões de autoimagem, exacerbadas pelos filtros e padrões irreais propagados nas redes sociais. Uma pesquisa da Dove sobre Autoestima em 2021, revelou que 84% das meninas de 13 anos já tinham usado algum filtro nas fotos, antes de publicá-las. A pesquisa também informou que 78% delas já tinham tentado mudar ou esconder alguma parte indesejada do corpo antes de postar uma foto nas redes.

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Os pais podem promover em casa, uma "cidadania digital", incentivando um equilíbrio entre o mundo online e as experiências fora da tela, e discutindo de maneira educativa os impactos das redes sociais na autoestima.

 

8. Efeitos das redes sociais

Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Internet de Oxford, apresentou o impacto do uso excessivo das redes sociais na satisfação de vida dos adolescentes. Com uma amostra de cerca de 84 mil pessoas, constatou-se uma redução no contentamento entre os jovens, evidenciando o desafio de navegar nesse mar de aprovações virtuais durante um período importante de autoconhecimento. Além disso, uma pesquisa estadunidense sobre comportamento nas redes sociais, indica que o engajamento intenso em algumas plataformas digitais pode provocar tiques nervosos em crianças.

Diante dessas descobertas, é fundamental que os pais monitorem e incentivem um equilíbrio entre a vida online e as experiências fora da tela, mas destacando a importância de interações pessoais.

Atividades que dispensam a conexão à internet, como passeios ao ar livre, práticas esportivas ou o simples ato de assistir a um programa de TV em família, podem enriquecer a realidade dos jovens, mostrando que ela pode ser tão ou mais legal do que o universo digital.

 

9.Os transtornos mentais na adolescência

A última década registrou um aumento nos casos de ansiedade, depressão, automutilação e tentativas de suicídio entre os jovens, ressaltando a importância da atenção à saúde mental nesta faixa etária. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o Brasil tem uma das maiores prevalências de depressão entre adolescentes na América Latina. Tanto que iniciativas como a campanha Setembro Amarelo reforçam a necessidade de cuidado com o bem-estar emocional, em um período já marcado por intensas transformações hormonais e sociais.

Um estudo feito pelo Unicef em 2022 apontou que metade dos adolescentes já sentiu necessidade de buscar ajuda para questões de saúde mental, evidenciando uma lacuna no acesso a recursos de apoio. Paralelamente, o Brasil também ocupa a segunda posição mundial em casos de burnout entre adultos, o que pode comprometer a capacidade desses de oferecer o suporte necessário aos jovens em casa.

Esta crescente prevalência de transtornos mentais tanto em adultos quanto em jovens e crianças chama atenção para a importância de promover hábitos saudáveis e um espaço emocional equilibrado. Não é uma tarefa fácil. É uma prática diária. Até porque a presença de uma rede de apoio familiar, que propicie diálogo aberto e acolhimento, se faz cada vez mais necessária para que se enfrente estes desafios.

Encorajar conversas sobre saúde mental, estimular a resiliência e apoiar a busca por recursos internos são passos importantes para superar adversidades com mais leveza e bem-estar.

 

10. Saúde Mental

Promover a saúde mental dos filhos adolescentes envolve também compreender os desafios únicos enfrentados por esta geração imersa em um mundo onde bullying, cyberbullying, depressão, ansiedade, esgotamento e crises existenciais são prevalentes.

A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), conduzida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019, revelou que um terço dos estudantes de 13 a 17 anos frequentemente se sentem tristes, e mais de 20% questionam o valor da vida.

A importância de escutar ativamente e validar as emoções dos jovens não pode ser subestimada. E mais uma vez, batendo na tecla, é preciso que os pais cultivem a resiliência e o bem-estar emocional dentro de casa, para prevenir o agravamento de questões de saúde mental porque lá fora eles vão ter de enfrentar problemas, cedo ou mais tarde.

Incentive seus filhos a falarem sobre o que estão sentindo, mas garanta que eles terão o seu suporte. Vale lembrar que não precisamos ter todas as respostas. Mas abrir espaços para um diálogo possível é um jeito sábio de guiar e manter uma relação de confiança. A postura encoraja os filhos a compartilharem suas dúvidas e experiências, sabendo que serão recebidos com carinho e sem julgamentos. Fonte: https://www.estadao.com.br