Os brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza devem passar de 2,5 milhões a 3,6 milhões entre 2016 e o final deste ano, segundo o Banco Mundial.
A tendência à redução da pobreza vivida entre 2004 e 2014 se reverteu nos últimos dois anos devido à recessão econômica, a mais profunda na história do Brasil. Os cortes nos programas sociais alargaram a brecha e alimentaram as amplas desigualdades que se remontam à época colonial.
Embora o desemprego causado pela crise econômica tenha feito com que mais brasileiros sejam elegíveis para receber o subsídio, há menos pessoas cobertas pelo programa. "Muitas pessoas que saíram da pobreza, e inclusive aquelas que haviam se convertido em classe média, retrocederam", afirma Monica de Bolle, pesquisadora principal do Instituto Peterson de Economia Internacional, com sede em Washington.
O Banco Mundial estima que cerca de 28,6 milhões de brasileiros saíram da pobreza entre 2004 e 2014. Mas a instituição também estima que desde o início de 2016 até o final deste ano, os brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza (com 140 reais por mês) passarão de 2,5 milhões de pessoas a 3,6 milhões. Quando Leticia Miranda tinha um trabalho vendendo jornais nas ruas ganhava cerca de 600 reais ao mês, o suficiente para pagar um pequeno imóvel que compartilhava com seu filho de oito anos em um bairro pobre do Rio de Janeiro. Quando perdeu seu emprego, há seis meses, no meio da pior crise econômica do Brasil em décadas, Miranda precisou mudar para um edifício abandonado onde já viviam centenas de pessoas.
De Bolle comenta que as cifras do Banco Mundial provavelmente estão subestimadas e não refletem o fato de que muitos brasileiros de classe média baixa que haviam melhorado de vida durante os anos do boom econômico voltaram a se aproximar da pobreza. As filas de solicitantes de emprego que se prolongam por várias quadras se converteram em algo comum cada vez que uma empresa anuncia novas vagas. No incício deste mês, quando uma universidade do Rio ofereceu empregos de baixa qualificação por um salário de 1.200 reais, centenas de pessoas se apresentaram. Muitos passaram a noite debaixo de chuva para garantir os primeiros lugares da fila.
Os rendimentos não trabalhistas, incluindo os programas sociais como Bolsa Família, contribuíram com cerca de 60% na redução do número de pessoas que viviam na extrema pobreza durante a década do boom econômico do Brasil, segundo Emmanuel Skoufias, economista do Banco Mundial e um dos autores do relatório sobre os "novos pobres" do Brasil. Os economistas sustentam que uma taxa de desemprego elevada e os cortes em programas sociais importantes poderiam exacerbar os problemas.
Os altos preços das commodities e os recursos petroleiros durante a época de bonança ajudaram a financiar os programas sociais dirigidos aos mais pobres.
Um ano após ser anfitriã dos Jogos Olímpicos de 2016, a cidade do Rio vive uma situação tão precária que milhares de trabalhadores públicos não recebem o salário ou o recebem em parcelas.
Maria de Pena Souza, de 59 anos, vive com seu filho de 24 anos em uma pequena casa com teto de zinco na favela do Lins, oeste do Rio. Queriam ter se mudado porque a casa se encontra em um morro propenso a deslizamentos de terra que podem ser mortais. Mas seu filho não conseguiu encontrar trabalho desde que terminou o serviço militar há alguns anos. A subsistência de muitas famílias que vivem em centenas de favelas ou cortiços do Rio é cada vez mais dura e precária.
O desemprego hoje chega a 12,6%, nove pontos percentuais a mais que 2013. A crise econômica está alimentando o regresso político do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Após deixar o cargo, em 2010, com um índice de aprovação de mais de 80%, a popularidade de Lula despencou quando ele e seu partido começaram a ser investigados por corrupção. Condenado a nove anos de prisão por corrução e lavagem de dinheiro, o ex-presidente segue liderando as pesquisas para as eleições presidenciais do próximo ano.
Luciana Bastos vê televisão com suas filhas em um quarto do edifício desativado do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, ocupado por centenas de pessoas que não podem pagar um aluguel. Fonte: https://brasil.elpais.com