A Igreja latino-americana denuncia o ataque “vergonhoso” contra Francisco
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“O pontificado de Francisco “está carregado de espinhos e sacrifícios fortalecido com o bálsamo da graça”. Por isso, “oferecemos-lhe nossa homenagem de fidelidade, de proximidade e colaboração para que a verdade brilhe acima de todo pecado”, destacou o cardeal Rubén Salazar, presidente do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), no encerramento, neste domingo, dia 26 de agosto, do congresso eclesial Medellín 50 anos. A reportagem é publicada por Religión Digital, 28-08-2018. A tradução é do Cepat.
O comunicado, subscrito pelos representantes do CELAM, CLAR, Cáritas Latino-Americana e a Arquidiocese de Medellín, expressa gratidão ao Santo Padre “por seu serviço abnegado à Igreja e por seu testemunho”.
“Se fomos duros, indiferentes, se nos faltou prontidão ou zelo pastoral, imploro-lhes que aceitem nosso perdão, perdoemo-nos”, disse o cardeal Salazar e aproveitou a oportunidade para que, à luz do vivido, “comecemos uma nova etapa, uma nova relação, alguns novos vínculos que nos permitam construir uma Igreja mais fraterna, maisigualitária, mais pobre, mais missionária”.
Em clara referência a Medellín, o também arcebispo de Bogotá recordou que “se naquele momento atacavam a instituição, hoje atacam a pessoa” e precisamente mencionou que o Papa foi atacado não somente no exercício de seu ministério, mas já começa a ser atacado como pessoa, “quase poderíamos dizer de uma maneira vergonhosa”, razão pela qual pediu para o apoiar e, como o próprio Francisco solicita permanentemente, que “rezemos por ele”.
O cardeal primaz da Colômbia, durante a leitura da mensagem, comentou que “seguimos com atenção a visita pastoral que fez à Irlanda em razão do encontro internacional das famílias”.
O purpurado afirmou que a maior parte das viagens do Papa é um testemunho interpelante dirigido especialmente “às periferias existenciais e geográficas, marcadas por dolorosos abusos, a marginalização de minorias cristãs e a defesa de refugiados e excluídos”.
O presidente do CELAM destacou que Francisco em sua passagem por Dublincontinua “propondo o Evangelho da família, Igreja doméstica e o reflexo do amor de Deus”. O purpurado acrescentou, na sequência: “Obrigado por seu serviço abnegado à Igreja e por seu testemunho” e “queremos reforçar, nestes momentos, a comunhão com a pessoa e seu magistério e testemunhar a adesão da gente simples do povo de Deus que peregrina em nosso continente”.
Finalmente, o cardeal Salazar encomendou a Igreja e o sucessor de Pedro à proteção da Virgem Maria, em suas invocações de Guadalupe e Aparecida, ao mesmo tempo em que pediu sua bênção “àqueles que sempre oramos por você, com devoção e carinho”. Fonte: http://www.ihu.unisinos.br
O Papa, as fake news e o ato de confiança nos jornalistas
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Nesta quarta-feira na Praça São Pedro, um coro de fiéis para o seu bispo foi transformado em um ato de protesto contra o Papa Francisco. Uma fake news que girou o mundo.
Alessandro Gisotti - Cidade do Vaticano
A cena é a habitual da quarta-feira na Praça São Pedro. O Papa conclui a sua catequese, concede a sua bênção e cumprimenta algumas pessoas que foram admitidas no chamado "beija mão". Da praça ergue-se um coro, são fiéis que festejam alguém querido a eles, que pessoalmente está saudando o Santo Padre. Na manhã desta quarta-feira, ocorreu que os crismandos da diocese de Lucca entoaram um coro cantando o nome "Italo", nome de seu bispo, Dom Italo Castellano, que estava cumprimentando o Papa Francisco.
Tudo normal se não fosse que alguém se disse convicto de ter ouvido um coro que exaltava Viganò, o ex-núncio nos EUA, autor do conhecido documento de acusação contra o Papa. A notícia é daquelas que fazem clamor, de primeira página. Pena que seja falsa. Para notar isso seria basicamente suficiente ouvir atentamente o vídeo do Vatican News no Youtube, portanto acessível a todos, para perceber que, apesar de não saber que era para "Italo", certamente aquele coro não era para "Viganò". O fato é que em poucos minutos a "notícia" se tornou viral nas mídias sociais e a partir daí – como cada vez mais acontece - passa à informação main stream. Aparentemente sem filtros.
Em alguns sites de jornais, portanto, lemos que o Papa foi contestado pelos fiéis na Praça São Pedro, que exaltavam o "grande acusador" Carlo Maria Viganò. A verdadeira notícia surge em breve, graças ao profissionalismo daqueles que se dão ao trabalho de ouvir novamente o áudio e "descobrir" a presença na Praça São Pedro do grupo de fiéis da cidade de Lucca que, durante algumas horas, graças a esta fake news se tornaram "famosas" mesmo sem querer. A história, que tem alguns aspectos surrealistas e para alguns aspectos até mesmo cômicos, é na verdade o sintoma perturbador de um sistema midiático que, na busca exasperada do scoop da notícia, não analisa os fatos, mas os dobra para o que parece ser a expectativa do seu público.
Precisamente o Papa Francisco, na sua última Mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais, explicou eloquentemente quais são as dinâmicas que levam à propagação de falsas notícias como esta. A eficácia das fake news, observa o Papa, "é devido principalmente à sua natureza mimética, isto é, à capacidade de parecer plausível. Em segundo lugar, essas notícias falsas, falsas mas prováveis, são cativantes, no sentido de que são capazes de capturar a atenção dos destinatários ". O Papa observa em seguida um "uso manipulador das redes sociais," as notícias falsas "ganham uma tal visibilidade que até mesmo as desmentidas das com autoridade dificilmente conseguem conter os danos." O que está em jogo? O que preocupa o Papa? Para Francisco, as "razões econômicas e oportunistas da desinformação estão enraizadas na sede de poder” que "nos faz vítimas de um imbróglio muito mais trágico de cada singular manifestação: o do mal, que se move de falsidade em falsidade para nos roubar a liberdade do coração ".
Desde o início de seu Pontificado, Francisco manifestou uma grande confiança nos operadores da informação. Uma confiança reafirmada ano após ano, concedendo numerosas entrevistas também a meios de comunicação que não têm nenhum poder - como a revisita dos sem-casa de Milão ou à rádio de uma favela argentina - e nunca evitando as perguntas dos jornalistas, mesmo as mais desconfortáveis. Um ato de confiança (e de responsabilidade) que renovou aos jornalistas precisamente no documento de Viganò. "Vocês têm a capacidade jornalística suficiente para tirar as conclusões", disse o Papa no voo de volta da Irlanda, "é um ato de confiança". Uma confiança que recorda a essência da profissão jornalística que busca a verdade e não a fabrica. Fonte: https://www.vaticannews.va
Mãe e filho
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Dom Genival Saraiva.
Bispo-emérito católico brasileiro, da Diocese de Palmares.
Desde o momento da concepção, há uma relação profunda entre mãe e filho, sob os aspectos físico, psicológico e espiritual. A relação física, via cordão umbilical, estabelece uma efetiva interdependência, sob pena de não chegar ao fim a gestação, conforme as leis da natureza. A ciência demonstra que, na fase da gestação, a relação afetiva da mãe com o embrião/feto é sumamente importante, em vista de um harmonioso desenvolvimento de sua personalidade.
A dimensão espiritual da relação entre mãe e filho revela-se sempre consistente, qualquer que seja a linguagem do sentimento que expressa alegria, tristeza, confiança, apreensão. A relação entre mãe e filho é de caráter existencial. A mãe percebe isso, racional e afetivamente. Assim, as mães sabem, por experiência, que esse “denominador comum”, a maternidade, as torna mais próximas e mais solidárias, nas alegrias e adversidades do dia a dia. De seu lado, o coração do filho é o melhor termômetro de identificação do amor materno, sempre solidário.
Em razão de sua natureza e missão, a vocação à maternidade é um “chamado à santidade”. O Papa Francisco, em sua Exortação apostólica Gaudete et Exsultate, “sobre o chamado à santidade no mundo atual”, escreve: “Todos somos chamados a ser santos, vivendo com amor e oferecendo o próprio testemunho nas ocupações de cada dia, onde cada um se encontra. És uma consagrada ou um consagrado? Sê santo, vivendo com alegria a tua doação. Estás casado? Sê santo, amando e cuidando do teu marido ou da tua esposa, como Cristo fez com a Igreja. És um trabalhador? Sê santo, cumprindo com honestidade e competência o teu trabalho ao serviço dos irmãos. És progenitor, avó ou avô? Sê santo, ensinando com paciência as crianças a seguirem Jesus. Estás investido em autoridade? Sê santo, lutando pelo bem comum e renunciando aos teus interesses pessoais.” (GE, n. 14)
Na Sagrada Escritura e na história da Igreja, há mulheres que são autênticas referências de maternidade e de santidade. Nesse sentido, a Igreja Católica ensina que Maria é o protótipo de mulher, filha, esposa e mãe. Sua maternidade, que é de natureza divina, ao gerar Jesus, “concebido pelo poder do espírito Santo”, estende-se, espiritualmente, a quem faz a vontade de Deus: “Muita gente estava sentada em volta de Jesus, e lhe disseram: ‘Olha, tua mãe, teus irmãos e tuas irmãs te procuram lá fora.’ Ele lhes respondeu: ‘Quem é minha mãe e meus irmãos?’ E olhando em volta para os que estavam sentados ao seu redor, Jesus disse; ‘Eis minha mãe e meus irmãos. Pois que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe’.” (Mc 3, 32-35)
No seu calendário santoral, a Igreja propõe aos fiéis a imitação de homens, de mulheres, de casais, de filhos e filhas que, no seu tempo e lugar, cultivaram a santidade, inerente à sua vocação, como ideal de vida. Como exemplo, a Igreja celebra a memória de uma mãe e de um filho – Santa Mônica e Santo Agostinho –, respectivamente, nos dias 27 e 28 de agosto. Antes de morrer, tendo Agostinho ao seu lado, ela disse: “Filho, quanto a mim, nada mais me agrada nesta vida. Que faço ainda e por que ainda aqui estou, não sei. Toda a esperança terrena já desapareceu. Uma só coisa fazia-me desejar permanecer por algum tempo nesta vida: ver-te cristão católico, antes de morrer. Deus me atendeu com a maior generosidade, porque te vejo até como seu servo, desprezando a felicidade terrena. Que faço aqui?”
De sua parte, Santo Agostinho, sempre assistido e acompanhado por Santa Mônica, após “uma juventude perturbada, quer intelectualmente, quer moralmente, converteu-se e foi batizado”. Ele testemunha em suas Confissões: “Tarde te amei, ó beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei! Eis que estavas dentro e eu, fora. E aí te procurava e lançava-me nada belo ante a beleza que tu criaste. Estavas comigo e eu não contigo. Seguravam-me longe de ti as coisas que não existiriam, se não existissem em ti. Chamaste, clamaste e rompeste minha surdez, brilhaste, resplandeceste e afugentaste minha cegueira. Exalaste perfume e respirei. Agora anelo por ti. Provei-te, e tenho fome e sede. Tocaste-me e ardi por tua paz.”
Nesses tempos de agressão à vida intrauterina, mediante a prática do aborto, e a mobilização pela sua descriminalização, a defesa da vida, que é um dom de Deus, sempre deve ser feita por quem tem coração e fé. A relação entre mãe e filho, com seus traços físicos, psicológicos e espirituais, se fortalece com a voz da ternura e a força do amor. Fonte: https://paraibaonline.com.br
Após se negar a dar dinheiro, padre é esfaqueado em igreja em Campos
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Homem foi preso em flagrante após o crime
RIO — Um padre foi esfaqueado em Campos, no Norte Fluminense, na manhã desta terça-feira. O crime aconteceu na paróquia do Perpétuo Socorro, localizada na Rua Visconde de Itaboraí, no bairro Parque Rosário. Identificado como Élio S. Ataíde, de 82 anos, ele foi golpeado na altura das costas por Bruno Pereira dos Santos. Ele, de acordo com a polícia, utilizou uma faca de serrilhada para atacar o padre.
Testemunhas contaram aos policiais que, antes da agressão, Bruno teria pedido dinheiro ao padre. Diante da negativa, ele o atacou pelas costas. E teria fugido em seguida. Segundo a PM, o suspeito trabalharia como guardador de carros, próximo à igreja onde o crime ocorreu.
Após o padre ser ferido, policiais militares do batalhão de Campos, o 8º BPM, foram acionados por moradores da região. Eles conseguiram capturar homem momentos depois.
O padre foi socorrido pelo Corpo de Bombeiros e levado para o Hospital municipal Ferreira Machado, naquele mesmo município. De acordo com a assessoria de imprensa da unidade, o padre teve um dos pulmões perfurado e passou por procedimento de drenagem torácica. Ele, então, transferido para o hospital particular do município (Unimed) "lúcido e com quadro estável".
Diocese de Campos fez coro. A entidade informou que o padre está em observação e não tem previsão de alta; mas que seu quadro é estável. A diocese acrescentou que o Bispo de Campos, Dom Roberto Francisco, se solidarizou com a "família do Santuário Nossa Senhora Perpétuo Socorro" e informou que as missas continuam sendo realizadas normalmente.
O caso foi registrado na 134ª DP (Campos dos Goytacazes). De acordo com a Polícia Civil, Bruno foi preso em flagrante e autuado por homicídio tentado triplamente qualificado.
Fonte: https://oglobo.globo.com
Arquidiocese do Rio e Parque Nacional da Tijuca brigam por acesso ao Cristo Redentor
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Igreja reclama que vem sofrendo restrições para chegar ao santuário
RIO — O clima não tem sido dos mais amenos no Cristo Redentor, o cartão-postal mais famoso da cidade do Rio. No Corcovado, tem se desenrolado uma disputa entre a Arquidiocese do Rio — responsável pelo platô onde fica o monumento — e a direção do Parque Nacional da Tijuca, que pertence ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e administra toda a área que dá acesso à estátua. A Igreja reclama que vem sofrendo restrições para chegar ao santuário — padres teriam sido impedidos de subir à capela —, e ameaça entrar na Justiça se as proibições não forem resolvidas em breve. A confusão foi parar em Brasília, onde a questão está sendo tratada com todo o cuidado no gabinete do Ministério do Meio Ambiente.
Um dos primeiros sinais do mal-estar entre “os vizinhos" aconteceu em maio, quando o Copacabana Palace, autorizado pela Arquidiocese, levou hóspedes para tomar café da manhã ao nascer do sol, aos pés do Cristo Redentor. O evento, realizado fora do horário normal de visitação, não tinha o aval do ICMBio. Resultado: o hotel foi multado em R$ 60 mil por crime ambiental. Este mês, um outro imbróglio azedou ainda mais a relação, como informou Ancelmo Gois, na terça-feira, em sua coluna no GLOBO. O arcebispo do Rio, cardeal dom Orani Tempesta, foi impedido pelo diretor do parque, Ernesto Viveiros de Castro, de fazer um evento no cartão-postal. O evento acabou acontecendo, sem a autorização da direção do parque, aos pés do Cristo, como dom Orani havia planejado. Fonte: https://oglobo.globo.com
VOCAÇÃO E DÚVIDAS: Frei Petrônio
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Ex-núncio nos EUA, Viganò: ''O papa deve renunciar''
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O diplomata vaticano publicou um documento sobre o caso do cardeal homossexual McCarrick com acusações contra a cúpula vaticana dos últimos 20 anos. A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada em Vatican Insider, 26-08-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
As autoridades da Santa Sé tinham conhecimento, desde o ano 2000, da existência de acusações contra o arcebispo Theodore McCarrik, promovido no fim daquele ano a arcebispo de Washington e criado cardeal por João Paulo II no ano seguinte: era sabido que o prelado convidava seus seminaristas para dormir com ele na casa de praia. É o que afirma um documento de 11 páginas assinado por Carlo Maria Viganò, ex-secretário do Governatorato e ex-núncio apostólico nos Estados Unidos, que foi afastado do Vaticano e enviado para a sede diplomática de Washington em 2011.
O texto do Viganò está repleto de datas e de circunstâncias, e é claramente dirigido contra o Papa Francisco, do qual o ex-núncio pede a renúncia, porque, na sua opinião, teria removido as sanções existentes contra McCarrick após o conclave de 2013.
O documento repropõe, detalhando-os, boatos e informações que já circularam pelo menos nos últimos dois meses na galáxia midiática antipapal e tradicionalista norte-americana e europeia, tentando descarregar toda a responsabilidade sobre os ombros do atual pontífice.
Viganò afirma que as denúncias do ano 2000, com testemunhos escritos contra McCarrick – acusado de molestar seminaristas e jovens padres adultos – foram regularmente transmitidas pelos núncios apostólicos que se sucederam na sede de Washington, Dom Gabriel Montalvo, antes, e Dom Pietro Sambi, depois. No entanto, esses relatórios ficaram sem resposta.
Viganò culpa por tudo isso o então secretário de Estado, Angelo Sodano – mas também o substituto, Leonardo Sandri, hoje cardeal prefeito para as Igrejas Orientais – que, na sua opinião, teriam acobertado McCarrick. E João Paulo II, que, no ano 2000, aprovou a nomeação para Washington e, no ano seguinte, a inclusão do discutido arcebispo no Colégio Cardinalício.
Viganò escreve: “A nomeação a Washington e a cardeal de McCarrick foi obra de Sodano, quando João Paulo II já estava muito doente? Não nos é dado saber disso. Porém, é lícito pensar isso, mas não acho que ele tenha sido o único responsável. McCarrick ia com muita frequência a Roma e havia feito amigos por toda a parte, em todos os níveis da Cúria.”
Uma segunda rodada de acusações contra McCarrick é datada de 2006. O próprio Viganò escreveu que tinha preparado duas notas detalhadas contra o cardeal, encaminhando-as aos seus superiores – naquele momento, o cardeal secretário de Estado, Tarcisio Bertone (acusado de ter promovido muitos homossexuais para postos de responsabilidade na Cúria e na Igreja). O resultado dessas notas também tardou a chegar, embora Viganò afirme que, em 2009 ou 2010, Bento XVI decidiu impor sanções ao já renunciante McCarrick, impondo-lhe que não vivesse no seminário, não aparecesse ou celebrasse mais em público, não viajasse. McCarrick, no entanto, não levou a sério essas sanções que permaneceram secretas. Basta navegar na web por alguns minutos para perceber que, mesmo após as supostas sanções do Papa Ratzinger, o cardeal estadunidense continuou celebrando em público e proferindo conferências.
Por fim, o último capítulo: em junho de 2013, durante uma audiência privada, a uma pergunta de Francisco sobre McCarrick, Viganò teria respondido ao papa que, contra o cardeal, havia um dossiê cheio de acusações depositado na Congregação para os Bispos. Viganò não afirma ter transmitido naquele dia ou posteriormente documentos ou denúncias contra McCarrick ao novo papa. Mas aquelas poucas palavras trocadas foram suficientes para que ele afirmasse que Francisco não teria se comportado corretamente, mas, de algum modo, teria ajudado o cardeal idoso, que também teria se tornado – afirma ainda o ex-núncio, neste caso sem detalhar nada, nem relatar qualquer fato específico – um conselheiro muito ouvido pelo novo papa para as nomeações episcopais estadunidenses. Não se deve esquecer que, desde 2006, McCarrick não estava mais no cargo, mas era um cardeal arcebispo emérito, sem atribuições.
Para além dos detalhes de um texto que evidentemente se insere nas batalhas pessoais eclesiais de um prelado que nunca digeriu o fato de ter sido afastado do Vaticano por decisão de Bento XVI, e do uso instrumental que foi feito disso na batalha travada pela ala anti-Francisco e dos seus laços na Igreja, na política internacional e na mídia, alguns fatos ainda precisam ser esclarecidos.
O primeiro diz respeito à nomeação de McCarrick a Washington e, principalmente, à sua posterior inclusão no Colégio Cardinalício. No ano 2000, o Papa João Paulo II certamente não estava no fim dos seus dias (ele morreria cinco anos depois), e retratá-lo como cansado, doente e incapaz de tomar decisões parece bastante inapropriado. Deve-se supor que o cardeal Sodano escondia informações decisivas do pontífice. Notícias que chegavam do núncio apostólico em Washington, que, aliás, também podia ter acesso direto ao papa. O cardeal Giovanni Battista Re – que segundo Viganò, como neoprefeito da Congregação para os Bispos, se opôs por escrito à nomeação de McCarrick – era uma pessoa próxima do papa e próxima do poderoso secretário do Papa Wojtyla, Dom Stanislaw Dziwisz. Por que ninguém disse ao pontífice sobre as acusações contra o candidato ao arcebispado de Washington e por que ninguém impediu a sua posterior nomeação cardinalícia?
O segundo fato está relacionado ao período de 2006 a 2013. Viganò assegura que existem sanções secretas contra McCarrick por parte do Papa Bento XVI e ataca o sucessor de McCarrick em Washington, Donald Wuerl, por ter fingido não saber. Essas sanções obrigavam o cardeal molestador de seminaristas adultos e de jovens padres a viver retirado em oração e penitência, sem aparecer ou celebrar em público. Por que McCarrick não obedeceu a essas sanções e continuou fazendo o que fazia antes como cardeal aposentado, celebrando missas e proferindo conferências? Por que ninguém pediu respeito pelas ordens papais e por que ninguém avisou o pontífice sobre essa grave desobediência? E, ainda, por que o Papa Ratzinger optou por manter em segredo essas sanções – obviamente admitindo-se que cada afirmação de Viganò corresponda à verdade – sem nunca torná-las públicas?
Um terceiro fato: neste ano, quando se teve a notícia de uma denúncia concreta de abuso contra um menor por parte de McCarrick – episódio que remonta a quando ele era padre em Nova York – o Papa Francisco obrigou-o a viver retirado e removeu a sua púrpura cardinalícia: a primeira, verdadeira e radical sanção contra o ex-arcebispo, que não tem precedentes na história mais recente da Igreja. Até 2018, ou seja, até a abertura formal da investigação canônica contra McCarrick, as acusações diziam respeito a relações homossexuais com pessoas adultas. Depois, resta saber por que Dom Viganò não divulgou essas informações até hoje, se estava tão convencido de que se tratava de algo da maior importância para a Igreja. E por que, como núncio apostólico nos Estados Unidos, não as colocou por escrito, convidando o novo papa a tomar medidas contra McCarrick, para fazer com que as sanções secretas de Bento fossem finalmente aplicadas, o que, evidentemente, não tinha ocorrido antes.
Nota de IHU On-Line: Na viagem de retorno de Dublin, o Papa Francisco se referiu ao testemunho de Viganò, afirmando:
"Li na manhã de hoje esse comunicado de Viganò. Digo sinceramente isto: leiam-no atentamente e tirem suas conclusões pessoais. Não direi nenhuma palavra sobre isto. Creio que o documento fala por si mesmo. Vocês têm a capacidade jornalística suficiente, com sua maturidade profissional, para tirar suas conclusões". Fonte: http://www.ihu.unisinos.br
SANTO AGOSTINHO: “Tarde Te amei!” De Santo Agostinho, uma das mais arrebatadoras orações de todos os tempos
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"Et ecce intus eras et ego foris et ibi te quaerebam, et in ista formosa quae fecisti deformis irruebam..."
1- Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova… Tarde Te amei! Trinta anos estive longe de Deus. Mas, durante esse tempo, algo se movia dentro do meu coração… Eu era inquieto, alguém que buscava a felicidade, buscava algo que não achava… Mas Tu Te compadeceste de mim e tudo mudou, porque Tu me deixaste conhecer-Te. Entrei no meu íntimo sob a Tua Guia e consegui, porque Tu Te fizeste meu auxílio.
2- Tu estavas dentro de mim e eu fora… “Os homens saem para fazer passeios, a fim de admirar o alto dos montes, o ruído incessante dos mares, o belo e ininterrupto curso dos rios, os majestosos movimentos dos astros. E, no entanto, passam ao largo de si mesmos. Não se arriscam na aventura de um passeio interior”. Durante os anos de minha juventude, pus meu coração em coisas exteriores que só faziam me afastar cada vez mais d’Aquele a Quem meu coração, sem saber, desejava… Eis que estavas dentro e eu fora! Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Estavas comigo e não eu Contigo…
3- Mas Tu me chamaste, clamaste por mim e Teu grito rompeu a minha surdez… “Fizeste-me entrar em mim mesmo… Para não olhar para dentro de mim, eu tinha me escondido. Mas Tu me arrancaste do meu esconderijo e me puseste diante de mim mesmo, a fim de que eu enxergasse o indigno que era, o quão deformado, manchado e sujo eu estava”. Em meio à luta, recorri a meu grande amigo Alípio e lhe disse: “Os ignorantes nos arrebatam o céu e nós, com toda a nossa ciência, nos debatemos em nossa carne”. Assim me encontrava, chorando desconsolado, enquanto perguntava a mim mesmo quando deixaria de dizer “Amanhã, amanhã”… Foi então que escutei uma voz que vinha da casa vizinha… Uma voz que dizia: “Pega e lê. Pega e lê!”.
4- Brilhaste, resplandeceste sobre mim e afugentaste a minha cegueira. Então corri à Bíblia, abri-a e li o primeiro capítulo sobre o qual caiu o meu olhar. Pertencia à carta de São Paulo aos Romanos e dizia assim: “Não em orgias e bebedeiras, nem na devassidão e libertinagem, nem nas rixas e ciúmes. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo” (Rm 13,13s). Aquelas Palavras ressoaram dentro de mim. Pareciam escritas por uma pessoa que me conhecia, que sabia da minha vida.
5- Exalaste Teu Perfume e respirei. Agora suspiro por Ti, anseio por Ti! Deus… de Quem separar-se é morrer, de Quem aproximar-se é ressuscitar, com Quem habitar é viver. Deus… de Quem fugir é cair, a Quem voltar é levantar-se, em Quem apoiar-se é estar seguro. Deus… a Quem esquecer é perecer, a Quem buscar é renascer, a Quem conhecer é possuir. Foi assim que descobri a Deus e me dei conta de que, no fundo, era a Ele, mesmo sem saber, a Quem buscava ardentemente o meu coração.
6- Provei-Te, e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me, e agora ardo por Tua Paz. “Deus começa a habitar em ti quando tu começas a amá-Lo”. Vi dentro de mim a Luz Imutável, Forte e Brilhante! Quem conhece a Verdade conhece esta Luz. Ó Eterna Verdade! Verdadeira Caridade! Tu és o meu Deus! Por Ti suspiro dia e noite desde que Te conheci. E mostraste-me então Quem eras. E irradiaste sobre mim a Tua Força dando-me o Teu Amor!
7- E agora, Senhor, só amo a Ti! Só sigo a Ti! Só busco a Ti! Só ardo por Ti!…
8- Tarde te amei! Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova! Tarde demais eu Te amei! Eis que estavas dentro, e eu, fora – e fora Te buscava, e me lançava, disforme e nada belo, perante a beleza de tudo e de todos que criaste. Estavas comigo, e eu não estava Contigo… Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Chamaste, clamaste por mim e rompeste a minha surdez. Brilhaste, resplandeceste, e a Tua Luz afugentou minha cegueira. Exalaste o Teu Perfume e, respirando-o, suspirei por Ti, Te desejei. Eu Te provei, Te saboreei e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me e agora ardo em desejos por Tua Paz!
*Santo Agostinho, Confissões 10, 27-29. Fonte: https://pt.aleteia.org
VOCAÇÃO E ALEGRIA: Frei Petrônio
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VOCAÇÃO E LIBERDADE: Frei Petrônio
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"Medellín 50 anos": migração, refugiados e tráfico de pessoas
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O presidente dos bispos peruanos, Dom Cabrejos Vidarte, abordou o tema da migração, a situação dos refugiados e o tráfico de pessoas, referindo-se concretamente ao êxodo de venezuelanos que chegam ao Peru com a esperança de encontrar melhores condições de vida para si e suas famílias.
Cidade do Vaticano
Devemos por em prática a dinâmica da cultura do encontro, que o Papa Francisco propõe em relação aos migrantes, e que considera quatro ações precisas: “Acolher, proteger, promover e integrar os migrantes e refugiados”.
Esperança de encontrar melhores condições de vida
Foi o que disse o arcebispo de Trujillo e presidente da Conferência Episcopal Peruana, Dom Héctor Miguel Cabrejos Vidarte, OFM, no Congresso eclesial “Medellín 50 anos”, realizado na cidade colombiana de 23 a 26 de agosto para celebrar o 50º aniversário da segunda Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano (1968).
Migração, situação dos refugiados e tráfico de pessoas
No contexto das dificuldades vividas atualmente por alguns povos da América Latina, como é o caso da Venezuela e Nicarágua, o presidente dos bispos peruanos participou do Congresso abordando o tema da migração, a situação dos refugiados e o tráfico de pessoas, referindo-se concretamente ao êxodo de venezuelanos que chegam ao Peru com a esperança de encontrar melhores condições de vida para si e suas famílias.
Ação solidária da Igreja peruana aos irmãos venezuelanos
Em seu pronunciamento, Dom Cabrejos Vidarte precisou as ações solidárias que a Igreja peruana vem realizando para apoiar os irmãos venezuelanos, mediante várias congregações e paróquias. Entre estas, mencionou:
A coleta em prol dos venezuelanos de 3 de junho passado; a criação no mês de julho, na sede da Conferência Episcopal Peruana, do Centro de Informação e Orientação ao Migrante Venezuelano; a realização da Campanha Partilhar 2018 (dias 24 a 26 de agosto); e a abertura da Casa do Migrante, na capital Lima, em coordenação com a Congregação Scalabriniana.
Mais de 400 mil venezuelanos imigrados no Peru
Conhecendo os problemas enfrentados pelos venezuelanos no Peru, os quais, de acordo com cifras da Superintendência Nacional de Migrações, passam de 400 mil pessoas, a Igreja peruana vem trabalhando como uma Igreja universal que acolhe todas as pessoas, oferecendo-lhes um acompanhamento pastoral que é fundamental nestes momentos de dificuldades.
Mulheres e meninas “traficadas” dentro e fora do país
O presidente do episcopado peruano afirmou que o tráfico de pessoas e o tráfico de migrantes vem crescendo no país, de norte a sul, leste a oeste, por rotas específicas. Disse ainda que esta problemática afeta milhares de vidas, especialmente mulheres e meninas, que são “traficadas” dentro e fora do Peru.
Reforçar laços entre Igrejas de origem, trânsito e destino
Nesse sentido, Dom Cabrejos Vidarte instou a reforçar os laços entre as Igrejas de origem, trânsito e destino, e a denunciar os entraves que as pessoas sofrem para que a sociedade civil e os governo alcancem uma política migratória que priorize sobretudo os direitos humanos das pessoas em mobilidade.
Também participaram do Congresso concluído este domingo (26/08) em Medellín, na Colômbia, o arcebispo de Huancayo, no Peru, cardeal Pedro Ricardo Barreto Jimeno, e o bispo de Chuquibamba e presidente da Comissão Episcopal de Ação Social peruana, Dom Jorge Enrique Izaguirre Rafael. Fonte: https://www.vaticannews.va
VOCAÇÃO E CAMINHO: Frei Petrônio
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TRECHO DO DOCUMENTO DE APARECIDA: Vocação Leiga
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Os fiéis leigos são “os cristãos que estão incorporados a Cristo pelo batismo, que formam o povo de Deus e participam das funções de Cristo: sacerdote, profeta e rei. Realizam, segundo sua condição, a missão de todo o povo cristão na Igreja e no mundo”. São “homens da Igreja no coração do mundo, e homens do mundo no coração da Igreja”. Sua missão própria e específica se realiza de tal modo que, com seu testemunho e sua atividade, contribuam para a transformação das realidades e para a criação de estruturas justas segundo os critérios do Evangelho.
Os leigos também são chamados a participar na ação pastoral da Igreja, primeiro com o testemunho de vida e, em segundo lugar, com ações no campo da evangelização, da vida litúrgica e outras formas de apostolado, segundo as necessidades locais sob a guia de seus pastores. Para cumprir sua missão com responsabilidade pessoal, os leigos necessitam de sólida formação doutrinal, pastoral, espiritual e adequado acompanhamento para darem testemunho de Cristo e dos valores do Reino no âmbito da vida social, econômica, política e cultural.
21º Domingo do Tempo Comum. ''Vocês também querem ir embora?'' (Domingo, 26 de agosto-2018)
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Publicamos aqui o comentário do monge italiano Enzo Bianchi, fundador da Comunidade de Bose, sobre o Evangelho deste 21º Domingo do Tempo Comum, 26 de agosto (Jo 6, 60-69). A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Chegamos ao final do sexto capítulo do Evangelho segundo João, e, nestes últimos versículos, é posto diante de nós todo o choque, o escândalo que as palavras de Jesus causaram não só nas multidões dos judeus, mas também entre os seus discípulos.
Essa crise nas relações entre Jesus e a sua comunidade é testemunhada por todos os quatro Evangelhos no momento de uma palavra decisiva de Pedro que confessava a identidade de Jesus como Messias (cf. Mc 8, 29 e par.) e como enviado do Pai como Filho.
Por que essa crise? Porque as palavras de Jesus, às vezes, eram duras e chocavam também os ouvidos de discípulos que o seguiam com afeto e atenção, mas não conseguiam aceitar, considerando-a como uma pretensão, que Jesus tinha “descido do céu” e que na carne (basar/sárx) de um corpo humano frágil e mortal ele narrava o Deus vivo e verdadeiro.
No seu discurso, Jesus tinha dito muitas vezes: “Eu sou o pão vivo descido do céu” (Jo 6, 51; cf. 6, 33.38.41-42.58), mas justamente aqueles que o tinham aclamado como “o grande profeta que devia vir ao mundo” (Jo 6, 14) e que até tinham querido proclamá-lo rei (cf. Jo 6, 15), diante dessas palavras, sentem-se escandalizados na sua fé.
Profeta, sim; Messias, sim; Enviado de Deus sim, mas descido do céu e feito carne, corpo entregado (verbo paradídomi) e doado até a morte violenta, carne para comer e sangue para beber (cf. Jo 6, 51-56), isso realmente não: são palavras que soam como uma pretensão insuportável, impossível de escutar!
Jesus, que conhece essas murmurações dos discípulos, neste ponto, não tem medo de dizer toda a verdade, às custos de causar uma divisão entre os seus e um abandono do seu discipulado. Poderíamos dizer que ele “ataca” os murmuradores: “Isto vos escandaliza? E quando virdes o Filho do Homem subindo para onde estava antes?”. Isto é, “quando vocês estiverem diante da realidade do Filho do homem que, através da elevação na cruz, da morte ignominiosa, subirá a Deus, de quem veio (cf. Jo 3, 14; 8, 28; 12, 32)? Quando se manifestar a plena identidade daquele que desceu de Deus e que a Deus subiu novamente na sua humanidade assumida como condição carnal, mortal, ‘semelhante à carne do pecado’ (Rm 8, 3), então o escândalo será maior”!
Jesus faz esse ataque sofrendo todo o peso da incredulidade, da incompreensão por parte daqueles que, durante anos, estavam envolvidos com ele e eram assíduos à sua palavra. Como esse comportamento deles é possível?
É por isso que ele não pode deixar de constatar que, na realidade, ninguém pode vir até ele se o Pai não o atrair, se não o conceder. É preciso esse dom que não é dado arbitrariamente por Deus, mas deve ser buscado, deve ser acolhido como dom que não requer nenhum mérito por parte de quem o recebe. Mas isso também escandaliza as pessoas religiosas, que sempre pretendem que Deus dê dons não só de acordo com os seus desejos, mas também de acordo com aquilo que mereceram e alcançaram.
O que é escandaloso em relação a Jesus é a sua condição humaníssima, o fato de se entregar em uma carne frágil e em um corpo mortal a carnes frágeis e corpos mortais, isto é, as pessoas. Como é possível que Deus se entregue em um homem, “o filho de José” (Jo 6, 42), uma criatura humana que pode ser entregue, traída, dada nas mãos dos pecadores, como acontecerá justamente por causa de um dos Doze, Judas, um servo do diabo (cf. Jo 6, 70)?
Aqui, a fé tropeça no fato de ter que acolher a imagem de um “Deus ao contrário”, de um “enviado divino, um Messias ao contrário”, que é frágil, pobre, fraco e do qual os homens podem fazer o que quiserem... É o escândalo da encarnação de Deus, sofrido ao longo dos séculos por muitos cristãos, por muitas Igrejas, pelo próprio Islã e ainda hoje pelos homens religiosos que acusam de não crerem em Deus aqueles que acolhem do Evangelho a mensagem escandalosa de um Deus que realmente, verdadeiramente se fez homem, carne mortal, em Jesus de Nazaré.
A fé cristã torna-se facilmente docetismo, porque prefere, como todas as religiões, um Deus sempre e somente onipotente, um Deus que não pode se tornar humano, como nós, em tudo, exceto no pecado.
Por isso, Jesus insiste: “Vós também vos quereis ir embora?”, dirigindo-se àqueles que permaneceram, na realidade, poucos. Jesus não teme, embora sofra, permanecer sozinho, porque tem fé na palavra que o Pai lhe dirigiu, na promessa de Deus que não falhará. Os outros podem ir embora, mas Deus permanece fiel! E, assim, o evangelho registra que alguns discípulos, escandalizados pelas palavras e pelos gestos de Jesus, vão embora: por medo? Por convicções religiosas? Em todo o caso, por falta de fé. Eles havia acolhido a vocação, haviam seguido Jesus talvez com entusiasmo, mas depois, não crescendo na sua adesão a ele, tropeçaram na incompreensão das suas palavras.
Consequentemente, tomaram um caminho de de-vocação, desmentindo a estrada feita, até darem meia-volta e irem embora. Entre eles, está também Judas, um dos Doze, escolhido pessoalmente como discípulo por Jesus. Como isso é possível? Sim, é possível que, na comunidade de Jesus e assim na comunidade cristã, haja aqueles que se tornem um ministro do diabo, um discípulo do diabo, que, portanto, não pode deixar de trair. E, quando a relação de amor conhece a traição, para aqueles que traem, torna-se imperativo apagar o amado, até entregá-lo para que seja tirado do meio do caminho. Aquilo que os outros evangelhos colocam na última ceia, João significativamente põe aqui, no anúncio da eucaristia, dom da vida de Jesus para todos.
Às vezes, eu me pergunto por que, na Igreja, não se tem a coragem de fazer ressoar ainda hoje essa pergunta de Jesus: “Vocês também querem ir embora?”; por que sempre se ensina o sucesso, sempre se olha para o número dos fiéis, sempre se fazem esforços visando à grandeza da comunidade cristã e não à qualidade da fé. Somos verdadeiramente gente de pouca fé!
A crise, por sua vez, que sempre é fracasso, nós a afastamos o máximo possível, dissimulamo-la, calamo-la, para que não pareça que às vezes perdemos, caímos, fracassamos até mesmo nas nossas obras eclesiais e comunitárias, embora em conformidade com a vontade do Senhor.
Por outro lado, Jesus usará a imagem da poda da vinha para dizer que há ramos que devem ser podados (cf. Jo 15, 2): mas é determinante que a poda seja feita pelo Pai, e não por nós, nem mesmo por aqueles que, na comunidade cristã, presidem ou trabalham nela como operários. Por si só, o Evangelho tem a força de atrair e de deixar cair: basta que ele seja anunciado na sua verdade e com franqueza, sem ser adocicado.
Sim, o Evangelho é a Palavra de vida eterna, como Pedro responde a Jesus, confessando que a fé da Igreja é fé no “Santo de Deus”, isto é, fé que, em Jesus, está a Shekinah, a presença de Deus. Onde Deus está agora neste mundo? Não no Santo do templo de Jerusalém, mas sim na humanidade feita carne e sangue de Jesus, o Filho de Deus.
Ao perguntar a Jesus: “A quem iremos, Senhor?”, Pedro expressa toda a fé dos discípulos em relação a ele, toda a sua unicidade de Rabi, Profeta e Messias; ao mesmo tempo, chega ao verdadeiro vértice da sua profissão de fé: “Nós cremos firmemente e reconhecemos que tu és o Santo de Deus”.
Pedro manifesta uma experiência, um conhecimento devido ao fato de estar com Jesus durante anos: ele é o Santo, como o anjo o tinha definido a Maria no anúncio (“O Santo que vai nascer de você será chamado Filho de Deus”, Lc 1,35); Jesus é partícipe da santidade do próprio Deus, portanto, é o Senhor (JHWH), que, nas Sagradas Escrituras, é chamado e invocado como Santo. Na tradição joanina, que confluiu no Apocalipse, Santo também é o título de Jesus ressuscitado (cf. Ap 3, 7).
Assim termina o longo e nada fácil discurso de Jesus sobre o pão da vida. No fim, provavelmente, há mais coisas que não conseguimos entender, realidades que não podemos sustentar, em relação àquilo que compreendemos e acolhemos. Nós também ficamos chocados com essas palavras, talvez não intelectualmente, mas ao acolhê-las para vive-las existencial, concreta e cotidianamente. Mas se, como os Doze, não vamos embora, mas permanecemos junto de Jesus com as nossas fraquezas, que também dizem respeito à fé, e se tentamos perseverar no seu seguimento, isso é suficiente para acolher o dom gratuito e não rejeitá-lo ou não percebê-lo: Jesus, homem como nós, no qual “habita corporalmente toda a plenitude da vida de Deus” (Col 2, 9), Deus mesmo, é a palavra que nos alimenta, é o pão de vida que recebemos na eucaristia, no nosso caminho rumo ao Reino.
Fonte: http://www.ihu.unisinos.br
Medellín 50 anos: liberdade para ousar
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Medellín 50 anos: liberdade para ousar
*Por Agenor Brighenti
Há exatamente 50 anos, de 24 de agosto a 06 de setembro de 1968, realizava-se em Medellín a Segunda Conferência Geral do Episcopado Latino-americano, no contexto do Concílio Vaticano II. Medellín, mais que um Documento, é um espírito, um ponto de partida, uma perspectiva, o desencadeamento de uma tradição autóctone. Ele continua fazendo caminho, sobretudo, através de uma rede capilar de comunidades eclesiais inseridas nos meios populares, sem alarde, em grande medida brasas sob cinzas nestes tempos de inverno eclesial, mas na fidelidade ao evangelho da justiça, do amor e da paz.
Uma recepção criativa do Vaticano II
A força e a atualidade de Medellín estão em sua ousadia de fazer uma “recepção criativa” do Concílio Vaticano II, no contexto particular da Igreja na América Latina. Seu episcopado, é verdade, até então acostumado a uma postura mimética de decisões de além-mar, pouco havia contribuído com o evento. Entretanto, a participação ativa no mesmo, além de possibilitar uma maior integração entre seus membros, propiciou-lhe voltar para casa, imbuído de seu espírito. Tanto que os Bispos da América Latina foram os primeiros no mundo, a dar um rosto próprio a suas Igrejas Locais. Para eles, terminado o evento, não se tratava de simplesmente implementar o Concílio, mas de recebê-lo de forma contextualizada, buscando situar “A Igreja na atual transformação da América Latina à luz do Concílio”, conforme atesta o título do Documento de Medellín.
O início de uma tradição latino-americana
O tempo se encarregaria de mostrar de que se tratava de uma aventura permeada de riscos e conflitos, mas, sobretudo de resultados alvissareiros, tanto que suas intuições fundamentais foram resgatadas e re-impulsionadas por Aparecida. Em outras palavras, na fidelidade aos eixos fundamentais do Concílio, com Medellín houve “encarnação” e “desdobramentos”, diríamos hoje “inculturação”, fazendo do Vaticano II não só um ponto de chegada, mas especialmente um ponto de partida para uma evangelização contextualizada, na perspectiva dos pobres. Com Medellín, a Igreja na América Latina deixa de ser uma “Igreja reflexo”, para desencadear um processo de tecitura de um rosto e de uma palavra própria, que redundou na “tradição latino-americana”.
Liberdade para ousar
Diferente destes tempos de involução eclesial e de entrincheiramento identitário, o Papa João XXIII, desde o início de seu pontificado, insistia na necessidade de uma ação eclesial de conjunto na América Latina, que desembocasse num plano de ação. Entretanto, as disparidades entre os Bispos impediam sua concretização. Seria preciso esperar a maior integração do episcopado propiciada pela participação nos trabalhos do Concílio e, sobretudo, a sintonia com seu espírito, para que, ao final do mesmo, se expressasse ao Papa o desejo de convocação de uma Conferência para pôr em prática o
Vaticano II no Subcontinente.
Medellín, diferente das demais Conferências, teve um excelente processo de preparação, na perspectiva do Concílio, com diversos encontros promovidos pelos Departamentos do Celam: em 1966, em Baños (Equador), se refletiu sobre a pastoral de conjunto, educação, ação social e leigos; no mesmo ano, em Mar del Plata (Argentina), se estudou a aplicação da Populorum Progressio na América Latina e, em Lima, o importante tema da educação; em 1967, em Buga (Colombia) se abordou a questão da universidade católica e a pastoral universitária; em 1968, em Melgar (Colômbia), estudou-se os novos desafios em torno à missão ad gentes, concretamente em relação aos povos indígenas e afro-americanos.
Para a realização da Assembléia, como metodologia de trabalho, adotou-se o método ver-julgar-agir da Ação Católica, recentemente assumido pelo Concílio, mais concretamente na Gaudium et Spes. Como ótica de fundo, adota-se também a perspectiva libertadora, que rompe com a postura desenvolvimentista reinante, colocando-se as bases da futura teologia da libertação. Participaram da Assembléia de Medellín 249 pessoas: 145 bispos, 70 presbíteros, 10 religiosos, 19 leigos e 9 observadores. Diferente da Conferência do Rio de Janeiro (1955), houve participação de não-bispos e o Documento foi publicado imediatamente à Assembléia, sem passar por Roma. Eram outros tempos.
Desafios e respostas pastorais
Em Medellín, ecoou o grito do sofrimento dos pobres, que delatava o cinismo dos satisfeitos. Sob a ótica dos pobres, em Medellín, os Bispos se propõem a ajudar a responder a quatro desafios principais do Subcontinente: primeiro, a fé cristã confrontada com o grave fenômeno da pobreza, que ameaça a vida de grande parte da população; segundo, desenvolver uma ação evangelizadora que chegue aos setores populares e também às estruturas de poder; terceiro, promover uma libertação integral, que conjugue simultaneamente mudança pessoal e mudança das estruturas; e, quarto, promover um novo modelo de Igreja – autenticamente pobre, missionária e pascal, desligada de todo poder temporal.
Como respostas pastorais concretas a estes desafios, apoiado no Vaticano II, o Documento de Medellín, propõe, entre outros: a opção pelos pobres, contra a pobreza, como forma de testemunho do Evangelho de Jesus Cristo; a vivência da fé cristã em comunidades eclesiais de base, alicerçadas na leitura popular da Bíblia e inseridas no lugar social dos pobres; uma evangelização que promova a vida em todas as dimensões da pessoa; uma reflexão teológico-pastoral, ancorada nas práticas libertadoras; a presença profética no seio da sociedade, sem medo de ir até o fim, na defesa dos excluídos, etc.
Os pilares de uma tradição alicerçada no Vaticano II
Igreja Comunhão e CEBs. Superando o binômio clero-leigos, o Vaticano II concebeu a Igreja como a comunidade dos batizados, na comunhão da radical igualdade em dignidade de todos os ministérios. Tirando conseqüências desta nova postura, para Medellín, a comunhão eclesial, real e palpável, acontece nas comunidades eclesiais de base (Med 7,4) célula inicial da estruturação eclesial, foco de evangelização (Med 15,10).
Pastoral de conservação e evangelização. Para Medellín, com o Vaticano II, se a comunidade dos batizados, em todos os seus membros, é o sujeito eclesial, então, é também a comunidade, como um todo, o sujeito da ação evangelizadora (Med 6,13; 9,6). Por isso, é preciso passar de uma pastoral de conservação, alicerçada na sacramentalização, para uma ação com ênfase na evangelização (Med 6,1; 6,8). Passar da paróquia tradicional, uma estrutura centralizadora e clerical, a comunidades de serviço, no seio da sociedade, de forma propositiva e transformadora (Med 7,13).
Igreja dos pobres e Igreja pobre. O Vaticano II conclama sermos “uma Igreja dos pobres para ser a Igreja de todos”. Para Medellín, não basta uma Igreja dos pobres. A ação evangelizadora, enquanto testemunho de Jesus, “que sendo rico se fez pobre para nos enriquecer com sua pobreza”, passa pela visibilidade de uma Igreja pobre (Med 14,7).
Do pobre, objeto de caridade, a sujeito de sua libertação. O Vaticano II fala de Deus a partir do ser humano e busca servir a Deus, servindo o ser humano. Na ação evangelizadora, opta pelo ser humano. Para Medellín, dada nossa situação de exclusão tão escandalosa aos olhos da fé e a predileção de Deus pelos excluídos, é preciso optar pelos pobres (Med 14,9). Não fazendo deles um objeto de caridade, mas sujeito de sua própria libertação, ensinando-lhe a ajudar-se a si mesmo (Med 14,10).
Opção pelo sujeito social – o pobre – e pelo seu lugar social. O Vaticano II conclamou a Igreja inserir-se no mundo, dado que, embora não seja deste mundo, ela está no mundo e existe para o mundo. Medellín se perguntará: inserir-se dentro de que mundo? Do mundo da minoria dos incluídos ou da maioria dos excluídos? Em conseqüência, a opção pelo sujeito social – o pobre – implica igualmente a opção pelo seu lugar social. A evangelização, enquanto anúncio encarnado, precisa do suporte de uma Igreja sinal, compartilhando a vida dos pobres (Med 14,15) e sendo uma presença profética e transformadora (Med 7,13).
Evangelização, promoção humana e conversão das estruturas. O Vaticano II superou todo dualismo entre matéria-espírito, corpo-alma, sagrado-profano, história e meta-história. Em conseqüência, para Medellín, como não há duas histórias, mas uma única história de salvação que se dá na história profana, a obra da salvação é uma ação de libertação integral e de promoção humana (Med 2,14,a; 7,9; 7,13; 8,4; 8,6; 11,5). Toda libertação é já uma antecipação da plena redenção em Cristo (Med 4,9). A missão evangelizadora abarca também as estruturas: “não teremos Continente novo, sem novas e renovadas estruturas” (Med 1,3; 1,5).
Diakonía histórica, profetismo e martírio. Para o Vaticano II, a Igreja precisa exercer uma diakoníahistórica, ou seja, um serviço no mundo, que contribua com o progresso e o desenvolvimento humano e social. Medellín, em sua opção pelos pobres e seu lugar social, faz da diakonía um serviço profético. A missão evangelizadora se concretizará na denúncia da injustiça e da opressão, constituindo num sinal de contradição para os opressores. O serviço profético pode levar ao martírio, expressão da fidelidade à opção pelos pobres. (Med 14,10).
*Agenor Brighenti. Doutor em Ciências Teológicas e Religiosas pela Universidade de Louvain/Bélgica, professor de teologia na Pontifícia Universidade Católica de Curitiba, membro da Equipe de Reflexão Teológica do Conselho Episcopal Latino-americano (CELAM). Foi perito do CELAM na Conferência de Santo Domingo e, da Conferência dos Bispos do Brasil, em Aparecida.
Presidente da CNBB participa de celebração pelos 50 anos de Medellín
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O arcebispo de Brasília (DF) e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), cardeal Sergio da Rocha, está em Medellín (Colômbia), para participar da celebração do 50º aniversário da II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, celebrado neste 24 agosto. O cinquentenário será celebrado até domingo (26).
“É muito importante valorizar a Conferência de Medellín. Como evangelizar acolhendo o Vaticano II? Isso trouxe muitos frutos para a Igreja. Medellín, naquele momento e ao longo dos anos, trouxe uma grande contribuição para evangelização na América Latina”, afirma o presidente da CNBB.
A Conferência Medellín colocou o tema da pobreza na teologia e na pastoral. “Chamou a atenção sobre a pobreza fruto da injustiça evidenciando-a como uma das situações mais explícitas da realidade latino-americana”, afirmou o arcebispo de Medellín, na Colômbia, dom Tobón Restrepo, em entrevista à agência italiana SIR.
A Conferência do Episcopado havia sido convocada pelo papa Paulo VI para aplicar os ensinamentos do Concílio Vaticano II às necessidades da Igreja presente na América Latina. Com o tema “A Igreja na presente transformação da América Latina à luz do Concílio Vaticano II”, o encontro foi realizado em Medellín de 26 de agosto a 6 de setembro de 1968.
Dom Restrepo ainda ressalta que Medellín é muito representativa no pontificado de Francisco, “principalmente, quando coloca os pobres no centro da Igreja, valoriza os movimentos sociais e pensa numa reforma da Igreja baseada na sinodalidade”.
O cardeal Sergio da Rocha ressalta que há vários métodos de Medellín que o papa Francisco testemunha de maneira exemplar em seu papado como a simplicidade da vida da Igreja.
“Há um dos documentos de Medellín que tem o tema da pobreza da Igreja. Este aspecto da simplicidade a ser cultivada por todos na Igreja, mas especificamente, pelo episcopado, pelo clero é algo que o próprio papa Francisco tem ressaltado frequentemente. De alguma maneira, aquilo que o papa propõe hoje já está presente lá em Medellin”.
Participaram da Conferência de Medellín 86 bispos, 45 arcebispos, 6 cardeais, 70 sacerdotes e religiosos, 6 religiosas, 19 leigos e 9 observadores não católicos, presididos por Antônio Cardeal Samoré, presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina, e por dom Avelar Brandão Vilela, arcebispo de Teresina (PI) e presidente do Celam, naquela ocasião. No total, participaram 137 bispos com direito a voto e 112 delegados e observadores.
De acordo com o Celam, a Conferência ofereceu como fruto às Igrejas Particulares da América Latina 16 documentos, agrupados nos núcleos de promoção humana, evangelização e crescimento na fé e a Igreja visível e suas estruturas.
– Promoção Humana: a pessoa humana como centro, com abordagem de temas fundamentais para seu desenvolvimento como a Justiça, a Paz, a Família, a Educação e a Juventude.
– Evangelização e crescimento na fé: núcleo de natureza eclesiológica, destacou a imagem de uma Igreja evangelizadora que busca o amadurecimento na fé dos povos, sem descuidar de suas elites, através da catequese e da liturgia.
– A Igreja visível e suas estruturas: abordagem dos problemas relativos aos membros da Igreja, que exigem intensificar sua unidade e ação pastoral através de estruturas visíveis, também adaptadas às novas condições do continente. Em Medellín foram tratados os âmbitos: Movimentos de leigos, Sacerdotes, Religiosos, Formação do clero, Pobreza da Igreja, Pastoral de conjunto y Meios de comunicação social. Fonte: http://www.cnbb.org.br
SÃO BARTOLOMEU-O Santo do dia.
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Clericalismo: a cultura que permite o abuso e insiste em escondê-lo
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O Papa Francisco culpou o "clericalismo" da Igreja Católica por criar uma cultura em que o abuso criminoso foi difundido e foram feitos extraordinários esforços para ocular os crimes. A reportagem é de Cindy Wooden, publicada por America, 22-08-2018. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Ao longo do pontificado, o Papa Francisco tem considerado o clericalismo uma doença na Igreja, que finge que "Igreja" significa "padres e bispos", ignora ou minimiza a graça divina e os talentos dos leigos e enfatiza a autoridade dos clérigos sobre sua obrigação de servir.
O clericalismo, disse, envolve a tentativa de "substituir, silenciar, ignorar ou reduzir o povo de Deus às pequenas elites", geralmente aos clérigos.
Kathleen Sprows Cummings, professora de história da Universidade de Notre Damee autora de um artigo de opinião sobre o escândalo de abusos publicado no dia 17 de agosto no New York Times, disse ao Catholic News Service que ficou "encantada" com o foco do Papa a respeito do fato de o clericalismo ser o problema, "porque é o que eu senti".
O que foi diferente com o relatório da Suprema Corte da Pensilvânia, ela disse, não foi apenas a dimensão esmagadora e a magnitude dos casos de abuso, "mas o fato de realmente ter acusado a cultura - do clericalismo - de ter permitido que este abuso continuasse e permitido que fosse encoberto".
"Dizer não ao abuso, é dizer um vigoroso não a qualquer forma de clericalismo”, declarou o Papa em uma carta a todos os católicos, divulgada no dia 20 de agosto. "Não são apenas 'algumas laranjas podres', como se diz, mas toda a cultura que possibilita isso", disse Cummings.
Natalia Imperatori-Lee, professora de teologia do Manhattan College, disse ao CNS: "Não há dúvidas de que o clericalismo está na raiz da crise de abuso. O clericalismo é isolacionista e insular - corta o 'ar' da solidariedade genuína e compartilhamento da vida com os leigos, criando uma classe separada, uma casta, dentro da Igreja".
Quando as pessoas criam "pequenas elites", como os chama o Papa Francisco, observou ela, "a tentação é de preservar 'a nós mesmos' e 'nossa visão/vida/privilégio' em detrimento da 'deles' - os leigos, 'os que não entendem', 'os que não estão sobrecarregados como nós'."
Por mais de duas décadas, o autor e escritor Russell Shaw tem alertado sobre o desastre que o clericalismo coloca para a Igreja. Seu livro, "To Hunt, To Shoot, To Entertain: Clericalism and the Catholic Laity", foi publicado em 1993.
"O clericalismo está ligado a um sentido de direito, superioridade, exclusão e abuso de poder" Tweet
Num artigo publicado no dia 6 de agosto no Angelus News, o sítio de notícias da arquidiocese de Los Angeles, Shaw analisou particularmente as acusações de abuso sexual e má conduta levantadas contra o atual arcebispo Theodore E. McCarrick.
"O clericalismo não é totalmente culpado pelo que aconteceu", escreveu. "Mas é parte importante da explicação. É essencial que nós entendamos como isso aconteceu", particularmente ao explicar como o arcebispo foi capaz de subir tanto na hierarquia da Igreja.
Conceder qualquer tipo de integridade a investigações do escândalo por parte da Igreja vai exigir a participação dos leigos, observou Shaw, porque "seria um erro grave investigar os danos causados pelo clericalismo usando o clericalismo".
A Comissão Real para Respostas Institucionais ao Abuso Sexual Infantilemitiu um relatório em dezembro do ano passado, após cinco anos de investigações e audiências, e concluiu que o "clericalismo está no núcleo de um conjunto interconectado de fatores que contribuem" para o abuso dentro da Igreja Católica. "O clericalismo está ligado a um sentido de direito, superioridade, exclusão e abuso de poder", afirmou o relatório.
Além disso, "fez com que alguns bispos e superiores religiosos se identificassem com pessoas que cometeram abuso sexual, e não com vítimas e suas famílias".
Os bispos da Austrália planejam divulgar uma resposta formal ao relatório no final de agosto. Mas enquanto isso o arcebispo de Brisbane Mark Coleridge, que é presidente da conferência, disse ao CNS que, embora o relatório seja "essencialmente um olhar secular sobre a Igreja, (...) parece correto afirmar que 'o clericalismo está no núcleo de um conjunto interconectado de fatores que contribuem [para casos de abuso]'”.
"Para tentar combater o clericalismo", mencionou, "é preciso ter cuidado para não perder tudo porque uma coisa não serve. Claramente, é necessária uma revisão radical de como recrutar e preparar os candidatos à ordenação. Muita coisa mudou nos seminários, mas é preciso refletir se são o melhor lugar ou a melhor forma de treinar homens para o sacerdócio atualmente”.
"Também deve haver uma mudança na cultura associada com o sacerdócio católico, o que, é claro, é mais fácil falar do que fazer", acrescentou, respondendo a perguntas por e-mail. "Parte dessa mudança envolve supervisão profissional adequada em prol de uma maior responsabilidade, mas também uma maior partilha de responsabilidades com os leigos - o que, por sua vez, requer uma reconsideração das nossas estruturas de decisão."
"Isso também envolve uma reflexão séria e prática do diagnóstico de clericalismo dado pelo Papa Francisco durante seus anos de pontificado - um diagnóstico que é ao mesmo tempo perturbador e consolador, assim como o Espírito Santo", escreveu o arcebispo Coleridge. "Aceitar e agir de acordo com esse diagnóstico não vai diminuir o sacerdócio de forma alguma - como temem alguns -, mas vai mostrar que o sacerdócio pode estar em circunstâncias muito diferentes das que enfrentamos agora".
O relatório da Comissão Real também tentou abordar um pouco de teologia católica, alegando que, "a noção teológica de que o padre passa por uma 'mudança ontológica' na ordenação, para que seja diferente dos seres humanos comuns e seja padre de forma permanente, é um perigoso componente da cultura do clericalismo. A noção de que o padre é uma pessoa sagrada contribuiu aos níveis exagerados de confiança e poder não regulamentado que os que cometeram abuso sexual foram capazes de explorar".
O arcebispo de Coleridge disse que sua aceitação da ideia do clericalismo como um fator que contribui para a crise de abuso obviamente não significa que ele aceita o entendimento da Comissão Real sobre a teologia das ordens sagradas.
A expressão "mudança ontológica" é o que a Igreja usa para descrever o que acontece na ordenação, relatou, afirmando que "Deus faz alguma coisa na ordenação, algo que atinge as profundezas do ser" e que "depois de ordenado, as relações do homem com as outras pessoas e com Deus são radicalmente e permanentemente alteradas".
Portanto, ainda que o ensinamento de que a ordenação traz uma mudança permanente possa contribuir para o clericalismo, não tem necessariamente de contribuir, disse o arcebispo.
"Há certos modos em que o clericalismo machuca a todos. Os leigos são vitimados e infantilizados; o clero é isolado e deve ser sobre-humano" Tweet
"Imperatori-Lee também mencionou isso ao comentar com o CNS como clericalismo pode infectar os leigos, bem como sacerdotes e os bispos".
"Os leigos, que ouvem reiteradamente que o sacerdote é especial e exclusivamente santo - 'mudança ontológica', 'marca indelével' - não é levado a acreditar que o clero pode pecar", afirmou, "e depois quando surgem essas alegações e elas são corroboradas, a quebra de confiança é irreparável".
"Há certos modos em que o clericalismo machuca a todos”, disse. “Os leigos são vitimados e infantilizados; o clero é isolado e deve ser sobre-humano."
Marie Collins, vítima de abuso e ex-membro da Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores, também parabenizou o Papa por abordar o clericalismo.
No dia 20 de agosto, no Twitter, ela disse: "é bom ver a condenação ao clericalismo na carta, pois tem um papel importante ao ignorar as vítimas, os leigos e os especialistas. Dá origem à facilidade com que os líderes da Igreja ficam confortáveis ao proteger outros clérigos apesar dos crimes cometidos contra crianças." Fonte: http://www.ihu.unisinos.br
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