Líderes evangélicos no Brasil celebram Trump e falam em repetir feito em 2026
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Nomes influentes nas igrejas, como Michelle Bolsonaro e Silas Malafaia, exaltaram vitória
São Paulo
Donald Trump de olhos fechados e cabeça baixa, com várias mãos espalmadas sobre ele. A imagem foi compartilhada nesta quarta (6) pela ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro com um agradecimento especial a Deus, a quem ela credita a vitória do republicano na eleição presidencial dos Estados Unidos.
"Um homem temente a Deus. Um homem que ama o Estado de Israel. Obrigada, Senhor! Que Deus o livre de todo o mal. Que Deus abençoe a sua vida com sabedoria e discernimento para governar a sua nação", diz Michelle. "Viva a América!"
Seu enteado Eduardo Bolsonaro, deputado federal pelo PL-SP, acompanhou a apuração dos votos na casa do presidente eleito.
Michelle engrossou o coro de evangélicos influentes no Brasil que celebraram o triunfo de Trump. Uma das bases preferenciais do republicano é o chamado evangélico branco americano.
O pastor André Valadão, que comanda em Orlando um galho da mineira Igreja Batista da Lagoinha, também foi à rede social destacar o desfecho eleitoral.
Ele pede que seus seguidores reajam à conquista republicana. A maioria é simpática a ela. "Que alívio!! Deus fazendo a obra!! A próxima lavada de direita será o Brasil em 2026!!" é o comentário mais curtido.
O pastor Silas Malafaia foi outro a exaltar o resultado sobre a democrata Kamala Harris. "Ele fez barba, cabelo e bigode", diz. "Cadê os institutos de pesquisa? Cadê a imprensa esquerdopata? Eu não aguento essa imprensa tendenciosa, o tempo todo, falando ‘blá-blá-blá, a mulher tá na frente’. Pelo amor de Deus, o cara deitou e rolou."
Os levantamentos vinham apontando empate técnico entre os dois candidatos, sem cravar qual deles tinha mais força para vencer o pleito.
"Quem vota em direita sabe que a bandeira é a família tradicional, é contra aborto", diz Malafaia. "E é o que vai acontecer na América. Só que, desta vez, com Trump ganhando nas duas Casas [Senado e Câmara], vai mudar."
Ao emplacar um presidente e a maioria do Congresso, o conservadorismo ganha musculatura, segundo o pastor. Ficará mais fácil passar leis com apelo conservador, por exemplo. "Com as duas Casas na mão dele, a história vai ser diferente."
O bispo Alessandro Paschoall, da Igreja Universal do Reino de Deus, tratou o saldo das urnas como uma bola dentro do cristianismo. Postou no Instagram uma montagem em que Kamala aparece primeiro repreendendo pessoas que gritavam contra ela num ato de campanha. "Vocês estão no comício errado", ela disse na ocasião.
As redes conservadoras sugeriram que a democrata respondia a um homem que bradou "Jesus Cristo é o Senhor", pintando-a como inimiga dos valores cristãos. Mas não ficou claro se ela, que falava sobre aborto, reagiu a outros comentários críticos dessa turma. É possível ouvir alguém na audiência dizendo que ela estava mentindo, por exemplo.
O bispo intercala essa cena com outra de Trump recebendo uma oração de duas jovens loiras, olhos fechados e Bíblia na mão. Corta para outro momento do empresário dançando em um comício, uma trilha sonora que indica lacração sobre a adversária.
Paschoall comanda o Arimateia, grupo de conscientização política que empresta o nome de José de Arimateia, personagem contemporâneo a Jesus Cristo, descrito na Bíblia como senador e membro do que hoje equivaleria ao Supremo Tribunal Federal.
O pastor Cláudio Duarte, bastante influente nas redes sociais evangélicas, integra a turma entusiasmada com o retorno de Trump à Casa Branca. "Meus parabéns aos americanos que votaram com responsabilidade", escreveu num perfil virtual. E arrematou: "Uma boa mensagem para nós".
A senadora Damares Alves (Republicanos-DF), ex-ministra do governo Jair Bolsonaro (PL), viu em 2024 um trailer para o pleito presidencial que o Brasil enfrentará daqui a dois anos. Ela publicou uma foto de Trump vitorioso e outra de Bolsonaro, inelegível —sua militância nutre esperanças de ver esse status ser revertido até lá. "Simbora, capitão, 2026 é logo ali!", bradou Damares. "Estamos endireitando o mundo!" Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
Sai o crime organizado, entra o legalizado
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Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.
Quantos vereadores ligados às facções criminosas não têm sido eleitos no país?
Cidades brasileiras com até 15 mil habitantes elegem nove vereadores. As que têm cerca de um milhão elegem 33. São Paulo, com seus mais de 11 milhões, elege 55. Tire a média e multiplique pelos, segundo o IBGE, 5.570 municípios do Brasil. A pergunta é: quantos dos quase 200 mil vereadores em exercício no país não fazem parte de alguma forma do crime organizado ou foram cooptados por ele?
A pergunta é irrespondível, porque nenhum deles se elege pelo PCC ou por seus satélites, mas por um dos 33 partidos legalmente constituídos, reconhecidos pela Justiça Eleitoral e com direito ao fundo partidário provido pela União para financiar suas campanhas. Os próprios cartolas dos partidos talvez nem desconfiem da ligação deste ou daquele de seus filiados com uma organização criminosa nem ele sobe ao palanque com o button da sua facção. Mas, assim que é eleito, já começa a trabalhar para os interesses do crime, propondo ou revogando leis, nomeando aliados ou facilitando o controle da polícia.
Para que serve um vereador infiltrado? Para o mesmo que um deputado estadual, federal ou senador, ou, se chegarmos a isso, um juiz, desembargador ou ministro —para a lenta costura interna do tecido jurídico, de modo a pôr o Estado a serviço do crime. Essa trama já começou há muito, com a diplomação anual de advogados saídos das facções e sua escalada a promotores ou defensores públicos.
Muitos candidatos a vereador a serviço delas terão sido eleitos há duas semanas, e talvez até alguns prefeitos. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral), presidido pela ministra Cármen Lúcia, formou um núcleo de especialistas do Ministério Público e da Polícia Federal para cruzar os pedidos de registro de candidaturas com um possível envolvimento com o crime. É uma nova e poderosa prática de varredura, mas ainda embrionária. Não impede que as facções apontem como candidatos seus membros recém-admitidos, ainda sem nódoa na ficha.
O submundo descobriu que é melhor trabalhar sem balbúrdia, execuções, tiros, balas perdidas e arranca-rabos entre eles. Sai o crime organizado, entra o crime legalizado. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
A hora da política e do diálogo
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Só as ditaduras podem prescindir do debate livre e civilizado. O Brasil está cansado do radicalismo que mata a política e abre as portas para os aventureiros
Escrevo este artigo antes do resultado do primeiro turno das eleições municipais. Mas a temperatura política, marcada por preocupante radicalização, ausência de propostas e demonização do adversário, transmite a urgente necessidade de repensar muitas coisas.
O adversário não é um inimigo a ser extirpado. Todos, à esquerda ou à direita, deveriam saber que é típico do pensamento totalitário reivindicar o monopólio da verdade. Não há democracia sem diálogo. Só as ditaduras podem prescindir do debate livre e civilizado. O Brasil está cansado do radicalismo que mata a política e abre as portas para os aventureiros.
A maioria dos brasileiros, mesmo os que foram seduzidos pelas lantejoulas do marketing político, não está disposta a renunciar aos valores que compõem a essência da nossa tradição: a paixão pela liberdade e a prática da tolerância. É preciso investir na convivência pacífica e plural.
A radicalização ideológica, de direita ou de esquerda, não tem a cara do Brasil. Tenta-se dividir o País ao meio. Jogar pobres contra ricos, negros contra brancos, homossexuais contra héteros. Querem substituir o Brasil da alegria pelo país do ódio e da divisão. Tentam arrancar com o fórceps da intolerância o espírito aberto dos brasileiros. Procuram extirpar o DNA, a alma de um povo bom, aberto e multicolorido. Não querem o Brasil café com leite. A miscigenação, riqueza maior da nossa cultura, evapora nos rarefeitos laboratórios do fanatismo ideológico.
Está surgindo, de forma acelerada, uma nova “democracia” totalitária e ditatorial, que pretende espoliar milhões de cidadãos do direito fundamental de opinar, elemento essencial da democracia. Se a ditadura politicamente correta constrange a cidadania, não pode, por óbvio, acuar jornalistas e formadores de opinião.
O primeiro mandamento do jornalismo de qualidade é a independência. Não podemos sucumbir às pressões dos lobbies direitistas, esquerdistas, de orientação sexual ou raciais. O Brasil sempre lutou contra a censura. E só há um desvio pior que o controle governamental da informação: a autocensura. Para o jornalismo não há vetos, tabus e proibições. Informar é um dever ético. E ninguém, ninguém mesmo, impedirá o cumprimento do primeiro mandamento da nossa profissão: transmitir a verdade dos fatos.
A preservação da democracia, sempre acossada por projetos autoritários, depende, e muito, da qualidade técnica e ética da informação. Um exercício de autocrítica do nosso trabalho é necessário e conveniente.
As virtudes e as fraquezas dos jornais não são recatadas. Registram-nas fielmente os radares dos consumidores de informação. Precisamos, por isso, derrubar inúmeros desvios que conspiram contra a credibilidade do noticiário.
Um deles, talvez o mais resistente, é o dogma da objetividade absoluta. Transmite, num pomposo tom de verdade, a falsa certeza da neutralidade jornalística. Só que essa separação radical entre fatos e interpretações simplesmente não existe. É uma bobagem.
Jornalismo não é ciência exata e jornalistas não são autômatos. Além disso, não se faz bom jornalismo sem emoção. A frieza é anti-humana e, portanto, antijornalística. A neutralidade é uma mentira, mas a isenção é uma meta a ser perseguida. Todos os dias. A imprensa honesta e desengajada tem um compromisso com a verdade. E é isso que conta.
Mas a busca da isenção enfrenta a sabotagem da manipulação deliberada, da falta de rigor e do excesso de declarações entre aspas. O jornalista engajado é sempre um mau repórter. Militância e jornalismo não combinam. Trata-se de uma mescla que traz a marca do atraso e o vestígio do sectarismo. O militante não sabe que o importante é saber escutar. Esquece, ofuscado pela arrogância ideológica ou pela névoa do partidarismo, que as respostas são sempre mais importantes do que as perguntas.
A grande surpresa no jornalismo é descobrir que quase nunca uma história corresponde àquilo que imaginávamos. O bom repórter é um curioso essencial, um profissional que é pago para se surpreender. Pode haver algo mais fascinante?
O jornalista ético esquadrinha a realidade, o profissional preconceituoso constrói a história. É necessário cobrir os fatos com uma perspectiva mais profunda. Convém fugir das armadilhas do politicamente correto e do contrabando opinativo semeado pelos profetas das ideologias.
Veículos de comunicação tradicional e produtos digitais de credibilidade oxigenam a democracia. As tentativas de controle da mídia tradicional e também do mundo digital, abertas ou disfarçadas, são sempre uma tentativa de asfixiar a liberdade. Num momento de crise no modelo de negócio, evidente e desafiante, o que não podemos é perder o norte. E o foco é claro: produzir conteúdo de alta qualidade técnica e ética. Somente isso atrairá consumidores em qualquer plataforma. E só isso garantirá a permanência da democracia.
Vivemos tempos de forte polarização, de afirmações superficiais, carentes de profundidade e de saudável visão crítica. Tempos de cancelamentos, uma atmosfera viciada que pode desembocar em rupturas e fraturas sociais.
Chegou a hora da política e do diálogo. Fonte: https://www.estadao.com.br
*JORNALISTA. E-MAIL: Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.
Ex-catador de lixo, novo prefeito define saúde e gestão de recursos como prioridades
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Guilherme Gonçalves (Podemos) recebeu 49,83% dos votos válidos em Ourinhos, no interior de SP
Guilherme Gonçalves (Podemos), ex-coletor de lixo, foi eleito prefeito de Ourinhos (SP) - Arquivo Pessoal
Brasília
A Prefeitura de Ourinhos (SP) será ocupada a partir de 1º de janeiro por Guilherme Gonçalves (Podemos), 33, um ex-trabalhador rural e ex-catador de lixo que pretende priorizar saúde e gestão de recursos públicos em seu primeiro cargo no Executivo.
Gonçalves começou como trabalhador rural registrado em carteira. Aos 18 anos, passou em um concurso público para a Prefeitura de Ourinhos. O município de 106 mil habitantes fica a 364 km da capital, no oeste do estado.
Na administração municipal, esteve em diversos setores, o último deles a coleta de lixo, de 2019 a 2020. "Essa história de passar pelas vilas com o caminhão me fez ver os problemas da cidade. Aí eu decidi sair candidato a vereador."
Ele se elegeu com 1.151 votos, o oitavo mais votado na cidade em 2020. Agora, para prefeito, recebeu 27.721 votos, derrotando Caio Lima (PSD), que obteve 23.355 votos (41,98%).
Eleito, Gonçalves definiu algumas prioridades em sua gestão, como uma atenção maior às partes mais distantes do centro.
"A gente nota que o cuidado não é igual ao da parte central. A gente vai também ter zelo com dinheiro público. O pessoal reclamou que não tem mais concurso público. Tem a parte de saúde também, que os moradores reclamavam bastante que não tem especialistas, como em neuropediatria", afirma.
Segundo ele, a composição da Câmara dos Vereadores não é majoritariamente de aliados. Mas Gonçalves se diz disposto a procurar e conversar com todos os vereadores eleitos. "A eleição acabou, todo mundo tem que pensar no bem da cidade. Entendemos que a democracia foi feita e todos eles foram eleitos. Agora, é esquecer a eleição."
"Eu queria que as pessoas não desistissem dos sonhos. De onde saiu, do bairro que saiu, do local que saiu, das possibilidades que teve na vida, todo mundo é capaz de chegar onde quiser", diz.
Presidente do Podemos, a deputada federal Renata Abreu diz que a história de vida e caminhada política do prefeito eleito é exemplo de superação e determinação. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
Marçal é filho de uma revolução cultural e social que vai longe
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Candidato surfa mudança profunda e que deve contaminar ainda mais a política
Pablo Marçal dá entrevista após debate no SBT - Rubens Cavallari- 20.set.2024/Folhapress
Pablo Marçal (PRTB) teve até aqui considerável, mas relativo, sucesso de público. Tem 24% dos votos, até 38% em um segundo turno e é rejeitado por 53%. Se não vier a ser inelegível por causa de crimes, apenas começou a carreira política? De onde veio, chegarão outros?
Talvez o tipo puro de marçalismo não prevaleça, mas a mentalidade que representa pode ter um terço do eleitorado, o que tende a orientar os novos investimentos do negócio político-partidário estabelecido.
Há grande revolução social e cultural, acelerada em torno de 2010, em parte por mídias sociais, renda maior e alterações no mundo do trabalho. A mudança agora é conhecida, mas pouco compreendida a fundo. Vamos sabendo dela em episódios traumáticos ou caricatos. Marçal é a mais recente cristalização política ou social desse mundo novo.
Houve Junho de 2013, contra o sistema político, o Estado e elites tradicionais. Houve Jair Bolsonaro, insider da escória política bizarra que passou por harmonização digital em um projeto de direita nova gestado desde o imediato pós-2013.
Houve a ascensão dos influencers. Há o mundo de Deolane Bezerra, presa por ser suspeita de ligação com esquema de lavagem de dinheiro de "bets". A influencer tinha 20,7 milhões de seguidores no Instagram ao ser detida; solta, foi a 22,2 milhões. Há a epidemia de jogo online.
Estudos indicam a disseminação do messianismo individualista e niilista quanto a política e movimentos sociais. Mídias sociais diminuíram custos de difundir informação e barreiras à entrada em mercados, entre eles o de mídia e de acumulação de status monetizável. É o futuro em que todos teriam 15 minutos de fama.
Marçal não é Bolsonaro, vai mais fundo: não foi adotado pelo mundo político, nem pelo centrão mais podre; espezinha políticos. É um garoto-propaganda das mentalidades da teologia da prosperidade ou da prosperidade teológica, temperado pelo que se chama dos valores da direita, que ele dissemina por meio de doutrinação, choque midiático e células familiares militantes.
A precarização do trabalho e a descrença na capacidade do Estado de melhorar vidas (quando não atrapalha) aumentam o apelo desse messianismo individualista, se diz. Pode ser, mas sabemos pouco de detalhes do mundo do trabalho.
Pelos grandes números, a formalização do trabalho está pouco abaixo do recorde do começo da década de 2010, assim como a parcela ocupada da população em idade de trabalhar; o salário médio passou do pico de 2013. A vida melhora um tico. Não parece social ou politicamente relevante.
Há precarização no trabalho, mas não sabemos de seu tamanho e o que é apenas nova forma de precarização. Certo é que o emprego desta economia meio pobre não dará vida satisfatória à massa ou acesso à vida instagramável. A grande mudança seria o vislumbre dessa existência fotogênica conspícua e exemplos raríssimos, mas inspiradores, de que há atalhos para se chegar lá, driblando desigualdades, emprego ruim e escola inútil.
A mudança religiosa tem peso, mas menos de um quarto dos eleitores paulistanos é evangélico e só um terço deles vota em Marçal (aliás, 15% não têm religião). Ideias de certos evangélicos é que parecem fazer parte de mudança cultural maior, revolução ainda pouco compreendida e que estoura outra vez na nossa fuça, na forma sórdida de um Marçal. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
Da cadeirada de agora ao Cacareco de ontem
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Seguimos negando as evidências, como se a defesa do meio ambiente nada tivesse que ver com a área municipal
Por Flávio Tavares
No próximo domingo, celebram-se eleições para prefeitos em 5.570 municípios, além de 58 mil vereadores ao longo do País. Na cidade de São Paulo, a expectativa pelo resultado é redobrada e ecoa Brasil afora, mas não só porque se trata da maior cidade do País e da América Latina.
O motivo principal foi a campanha eleitoral ou, mais exatamente, a “cadeirada” que dominou um dos debates entre os candidatos a prefeito. Mais do que nunca, aplica-se naquele episódio o velho refrão “vivendo e aprendendo”. No entanto, os políticos parecem não ter entendido o significado de uma eleição, vendo toda a campanha eleitoral como se fosse apenas uma contagem para arrebanhar votos. Ou uma simples aposta na Mega-Sena acumulada…
A “cadeirada” mostrou a pobreza da campanha eleitoral e, mais do que tudo, revelou que os insultos verbais geram reações impensadas. Não ouso defender o autor da “cadeirada”. No entanto, prefiro vê-la como uma reação à mediocridade da campanha eleitoral (revelada naquele debate) e da qual ele próprio foi um dos protagonistas.
Lembro-me agora do “resultado” da eleição à Câmara de Vereadores em 1959 na cidade de São Paulo. Naquela época não havia urna eletrônica como agora (quando usamos apenas números) e se votava escrevendo o nome do candidato preferido numa cédula de papel.
Pois, naquele ano de 1959, o rinoceronte Cacareco, do zoológico paulistano, obteve mais de 100 mil votos, transformando-se no vereador mais votado, suplantando mais de 450 candidatos à Câmara Municipal. A iniciativa e propaganda do rinoceronte-candidato foram inventadas pelo jornalista deste jornal Itaboraí Martins, e o Estadão encampou e divulgou.
Ali estava a crítica mais aguda à medíocre campanha eleitoral daquele 1959. Surgiu até uma canção para festejar o “candidato” que muitos entoavam pelas ruas. “Cansados de tanto sofrer / E de levar peteleco / Vamos agora responder / Votando no Cacareco”.
Os meios de comunicação do mundo inteiro contaram do “êxito” de Cacareco, que mesmo sendo o candidato mais votado, com mais de 100 mil sufrágios para ocupar uma das 45 cadeiras de vereadores, obviamente não foi reconhecido pela Justiça Eleitoral. Os sufrágios a ele destinados foram anulados.
Agora não existem rinocerontes que tomem o lugar de Cacareco, que morreu anos atrás, mas cujo esqueleto se encontra à mostra no Museu de Anatomia da Universidade de São Paulo.
No País inteiro, os partidos políticos e os candidatos a prefeito, vice e vereadores receberam agora R$ 4,9 bilhões (repito, bilhões), nada menos do que 150% superior à verba das eleições municipais de 2020.
Mundo afora, todos reconhecem que os municípios são a “célula mater” da administração pública. Lá, os problemas estão à mostra, ainda no nascedouro, antes de expandir-se pelo Estado e o País. Assim, é mais fácil resolvê-los. Entretanto, na maior cidade da América Latina a defesa do meio ambiente não apareceu na propaganda eleitoral ou foi apenas mencionada nos debates dos candidatos.
Assim, pergunto: será mesmo que estamos aprendendo com o desastre, ou continuamos na inércia, sem reagir à hecatombe da crise climática, que nós mesmos engendramos e fizemos nascer?
Nos anos 1970, em Belém do Pará, marcavam-se encontros para “antes” ou “depois” da chuva que despencava diariamente.
Tudo isso está desaparecendo por uma devastação progressiva e predatória em que a mata nativa está sendo avassalada pela especulação imobiliária. Nas áreas de Cerrado estão a maioria de nossas vertentes hidrográficas, mas nem isso tratamos de preservar.
Ou o mais sensato ou verdadeiro será recorrer àquele antigo versinho que virou refrão popular?
“Por falta de prego perdeu-se a ferradura / Por falta da ferradura perdeu-se o cavalo / Por falta do cavalo perdeu-se o cavaleiro / Por falta do cavaleiro perdeu-se a batalha / E assim perdeu-se o reino inteiro.”
Tudo está à mostra, mas parece não existir. O Cerrado sofre mais, atualmente, do que a Floresta Amazônica. As queimadas dos campos, em boa parte criminosas, aí estão espalhando minipartículas nas grandes e pequenas cidades. O Pantanal irá desaparecer até 2070, segundo cálculos da ciência climatológica. Quando conheci Belém do Pará nos anos 1970, lá chovia todos os dias. Atualmente, boa parte dos grandes rios estão secos ou assoreados. Já não há navegação nem pesca, coisas essenciais naquela região.
Em São Paulo, o Sistema Cantareira, que abastece grande parte da área metropolitana, está muito abaixo dos níveis normais. No entanto, continuamos a lavar calçadas com água tratada e potável ou seguimos lavando automóveis com a mesma água.
Seguimos, porém, negando as evidências, como se o assunto nada tivesse que ver com a área municipal. Poderemos negar as evidências, tal qual no passado não vimos que Cacareco era uma advertência?
*JORNALISTA E ESCRITOR, PRÊMIO JABUTI DE LITERATURA 2000 e 2005, PRÊMIO APCA 2004, É PROFESSOR APOSENTADO DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
O preocupante aumento da violência política
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A sociedade e seus representantes precisarão encontrar meios de desarmar os ânimos, desconstruir a polarização e obliterar a infiltração do crime organizado no poder público
Um levantamento do Observatório da Violência Política e Eleitoral (OVPE), da Universidade Federal do Rio de Janeiro, identificou 455 casos de violência contra lideranças políticas do Brasil de janeiro a 16 de setembro deste ano. À medida que o pleito se aproxima, os incidentes aumentam. Entre julho e 16 de setembro, foram 15 homicídios. No período eleitoral crítico, daqui até o segundo turno, a tendência é de aumento.
A violência política tem se intensificado nos últimos ciclos eleitorais. Segundo levantamento do Estadão, a média de mortes por motivações políticas nos primeiros dez ciclos da redemocratização foi de 52. Em 2020, ao menos 72 brasileiros foram assassinados por motivações políticas. Só as agressões contra lideranças computadas pelo OVPE já são maiores que em 2020 e 2022.
Duas causas parecem alavancar essa escalada. Uma é da ordem da cultura política: a intensificação da polarização e da intolerância e a naturalização da truculência como meio de ação política. A outra é um problema sistêmico de segurança pública: a expansão e complexificação do crime organizado e sua infiltração no Estado.
Divergências são naturais e desejáveis em uma democracia. Mesmo certos graus de polarização são normais. Processos deliberativos e ciclos eleitorais culminam inevitavelmente em momentos em que é preciso decidir “sim” ou “não”, “contra” ou “a favor”. O problema é quando essas polarizações – necessárias, circunstanciais e localizadas – se degeneram em polarizações estruturais, generalizadas e perniciosas, e a pluralidade de esferas sociais passa a ser determinada pela clivagem político-ideológica.
Nas democracias esse processo de radicalização ocorre de cima para baixo. Políticos de ofício têm incentivos para promover atitudes polarizadas, forjando “batalhões” leais e permanentemente mobilizados. Em contrapartida, esses batalhões exigem de seus representantes um alinhamento cada vez mais estrito às linhas partidárias e desmoralizam os moderados. Cria-se um círculo vicioso entre elites políticas radicais e massas militantes radicalizadas, que esvazia o centro, amplia a distância entre os polos e intensifica a hostilidade entre eles.
Essa clivagem única degrada o processo democrático, impossibilitando interações, consensos e compromissos; disseminando desconfiança nas instituições e no jogo democrático; e incentivando o sensacionalismo e o tribalismo. Adversários políticos se tornam inimigos existenciais. A desumanização do “outro” propicia as condições para violências de todo tipo, desde a segregação até a eliminação.
Mas possivelmente a principal causa do aumento da violência é a infiltração do crime organizado na máquina pública. A atuação das facções e milícias passa pelo financiamento de campanhas de aliados, intimidação e extorsão de eleitores, ameaças a políticos, corrupção de agentes de Estado e captura de contratos públicos.
As forças de segurança precisam organizar núcleos específicos que investiguem permanentemente as relações promíscuas entre a política e o crime. Os partidos precisam aprimorar mecanismos de controle para identificar e afastar criminosos ou agregados do crime organizado.
Quanto à violência política “passional”, por assim dizer, a Justiça Eleitoral pode aprimorar as condições de segurança nos ciclos eleitorais, especialmente nos dias das eleições. Mas desarmar os ânimos não é tarefa de um dia, e a responsabilidade é de todos: de cada cidadão, das organizações civis, mídia, instituições públicas e, especialmente, elites políticas. Um desenho institucional de prevenção e mitigação deve considerar melhorias no sistema da Justiça Eleitoral e uma infraestrutura para a paz, incluindo pactos e códigos de conduta, comitês suprapartidários e campanhas e sistemas de alerta.
A responsabilidade final é do eleitor. A menos que puna hoje, nas urnas, os autoritários que instrumentalizam a retórica da demonização, do “vale-tudo” no “nós contra eles” e, sobretudo, os que apelam às vias de fato, amanhã não só seu voto pode ser tolhido, como a sua própria vida. Fonte: https://www.estadao.com.br
PT terá série com evangélicos que conecta ensinamentos bíblicos a bandeiras do partido.
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Ideia é que o material sirva de apoio para candidaturas petistas nestas eleições municipais
O PT preparou uma série de vídeos em que integrantes da comunidade evangélica relatam como o exercício de sua fé se relaciona com as bandeiras sociais e políticas do partido. A ideia é que o material sirva de apoio para as 32 mil candidaturas petistas que disputam as eleições municipais deste ano.
O advogado-geral da União, Jorge Messias, a deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) e o pastor Oliver Goiano, da Igreja Batista da Lagoa, estão entre os entrevistados.
Intitulado "Testemunhos de Fé e Luta", o projeto é encabeçado pela Fundação Perseu Abramo, braço do PT que se dedica à pesquisa e à educação política do partido e que foi responsável pelo desenvolvimento da "Cartilha Evangélica – Diálogo nas Eleições", antecipada pela coluna.
Uma leva de oito vídeos com cerca de cinco minutos de duração foi preparada para divulgação. Ao gravar seu depoimento, o ministro Jorge Messias, que frequenta a Igreja Batista Cristã e diz professar sua fé há 40 anos, dedicou parte de sua exposição a desmentir o boato de que Lula (PT) pretende fechar igrejas.
"Tentaram usar isso na campanha de 1989, tentaram usar isso na campanha de 2002, 2006 e por aí vai. Fizeram isso também contra a presidenta Dilma. E a verdade é que desde que o presidente Lula foi eleito, no primeiro mandato em 2002, nunca houve na história desse país um aumento tão significativo de igrejas como nós temos presenciado nos últimos 20 anos", diz o chefe da AGU (Advocacia-Geral da União).
Messias ainda afirma que, graças à Lei de Liberdade Religiosa sancionada por Lula, igrejas protestantes criadas nos últimos anos tiveram mais facilidade para regularizar sua situação jurídica e financeira.
"Eu, como caminho com Deus há 40 anos, posso ver e pude testemunhar o avanço de novas denominações. Isso é resultado de uma lei aprovada pelo presidente Lula", diz o ministro, que também atribui a governos petistas a expansão internacional de igrejas evangélicas brasileiras.
O chefe da AGU também compara a existência de fake news à passagem bíblica que versa sobre a presença da serpente no Jardim do Éden.
"Muitas mentiras são produzidas para serem penetradas nos meios evangélicos como o único propósito de causar temor e intranquilidade nos nossos irmãos. E isso tem, infelizmente, fins eleitorais", diz.
A deputada Benedita da Silva, por sua vez, brinca que é chamada de "PTcostal". Adepta da Igreja Presbiteriana Betânia de Niterói, a parlamentar diz não ser verdade a afirmação de que evangélicos não votam PT e compara pautas defendidas pelo partido a ensinamento cristãos.
"Meus irmãos e minhas irmãs, o PT cuida das pessoas, e elas podem estar em qualquer condição. Ela pode ser, no sentido bíblico, a prostituta que está conversando com Jesus, ela pode ser aquele que está na cadeia, ela pode ser aquele que está sem casa, no meio da rua. Podem ser aquelas criancinhas abandonadas, pode ser o trabalhador desemprego", afirma Bené, como é conhecida.
"Nós [evangélicos] temos muito mais em comum com o PT do que nós possamos imaginar", segue a deputada, que em determinado momento da gravação se dirige especificamente às mulheres evangélicas.
"Queria chamar a atenção dessas mulheres [para falar] que esse governo tem muito a ver com a nossa prática cotidiana. A gente que limpa igreja, a gente que faz quentinha para doar. O governo tem cozinha solidária", afirma Benedita.
Também foram entrevistados para a série o secretário de Educação Superior do Ministério da Educação, Alexandre Brasil, o sociólogo e ex-prefeito de Carapicuíba (SP) Sergio Ribeiro, a jornalista Nilza Valeria, a assessora parlamentar Bernadete Adriana Alves de Lima e o pastor batista Sergio Dusilek. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH
O fenômeno Marçal
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Com ele, mais do que com Bolsonaro, o uso das redes tornou-se um instrumento imprescindível de qualquer campanha, presentes e futuras
Menos fígado, mais inteligência. Menos julgamentos apressados, mais análise. O surgimento e a força da candidatura de Pablo Marçal a prefeito de São Paulo exigem a compreensão desse fenômeno, o que pressupõe abandonar juízos açodados, se não preconceituosos, como se fosse ele uma espécie de perversão da boa política, quando essa se tornou no Brasil, nos últimos anos, ela mesma pervertida.
Partidos políticos afastaram-se cada vez mais de sua função de representação dos interesses da sociedade em sua diversidade, tornando-se máquinas de atendimento dos seus próprios interesses, paroquiais e corporativos, quando não instrumentos de corrupção. O espetáculo escabroso das emendas parlamentares, seu montante assustador e sua falta de transparência apenas distancia ainda mais os cidadãos dos seus representantes. Um pilar da democracia mostra-se, assim, periclitante. Os candidatos a prefeito, via de regra, são incapazes, inclusive, de apresentar programas e ideias viáveis para suas respectivas cidades. Agora, dizer que Marçal vai contra a boa política, seja lá o que isso signifique, apenas reforça a ausência de compreensão do que essa mesma política se tornou.
Um candidato foi fisicamente agredido em uma cena propriamente ridícula. O agressor, aliás, é candidato do PSDB, partido que até poucos anos atrás foi o mais importante, com um histórico impressionante de realizações. Seus políticos, especialmente em São Paulo, eram um exemplo para todo o País. Ora, é esse mesmo partido, em processo de franca decadência, que escolheu um personagem para prefeito buscado às pressas no mundo televisivo, como se fosse uma nova promessa de soerguimento partidário. Aliás, os outros candidatos não apresentaram nenhuma solidariedade com o agredido, tendo suas falas, hipocritamente, condenado a agressão para logo aduzirem o uso do “mas”, em argumentos que apenas justificavam o ataque.
Marçal rompe com a política tradicional tal como vinha sendo feita nas últimas décadas. Baseia-se essa em um tripé: coligações partidárias, financiamento eleitoral e partidário e tempo de rádio e televisão. Ora, o candidato contestador ameaça chegar ao segundo turno e, mesmo, ser prefeito de São Paulo, sem preencher nenhuma dessas condições. É candidato de um partido que nem representação parlamentar tem, não tendo se aliado a nenhum outro partido. Não usufrui tampouco de financiamento público, tendo de se virar com doações privadas ou uso de recursos próprios. O seu tempo de rádio e televisão é nulo, sendo ele o expoente de um novo meio de comunicação, as redes sociais, as quais sabe usar admiravelmente. Causa espanto que os outros candidatos não tenham se apercebido a tempo da importância desse novo meio de comunicação, contentando-se com os meios tradicionais.
O grande ativo de Pablo Marçal consiste no uso das mídias sociais. Excelente comunicador, exímio nos cortes das gravações, volta-se exclusivamente para isso, talvez em excesso, o que não deixa de produzir efeitos deletérios, como quando, um pouco apressadamente, colocou-se como vítima. É como se tivesse sofrido uma grande fratura. Não colou! A sua imagem de homem forte perdeu aderência. Entretanto, o que deve ser ressaltado é que, com ele, mais do que com Jair Bolsonaro, o uso das redes sociais tornou-se um instrumento imprescindível de qualquer campanha eleitoral, presentes e futuras. Os políticos que não compreenderem isso estarão fadados ao fracasso.
Há outro aspecto essencial que deve ser ressaltado em sua candidatura: a sua mensagem. Analistas têm frisado primordialmente seu perfil negativo, baseado na lacração, no ataque e em inúmeras agressões verbais. Em segundo plano tem ficado a enorme adesão que suas falas, melhor dito, ensinamentos têm produzido em seus seguidores e eleitores. Ele representa, melhor do que ninguém, um Brasil que quer crescer, onde as pessoas melhorarão seu nível de vida, preocupando-se principalmente com seu bem-estar social. As pessoas almejam melhores condições de vida, livres das amarras do Estado, podendo progredir por si mesmas. Não necessitam da bengala do Estado, não querem bolsas-esmola, mas espaço para sua livre iniciativa. São pessoas empreendedoras, que desejam melhores condições econômicas e sociais.
Não mais se contentam com políticas de esquerda, de assistencialismo à pobreza, que só tornam os cidadãos uma massa de manobra para esses partidos políticos. Entendeu esse novo público que o discurso para os pobres é miserável por si mesmo, tendo como objetivo meramente criar uma clientela partidária fiel, mesmo que revistam a sua narrativa de uma aparência humanitária. Almeja ele crescer por suas próprias mãos, sendo livre e independente para empreender. Essas pessoas não visam a pertencerem a um sindicato, atrelando-se a seus dirigentes, que, por sua vez, só perseguem seus próprios privilégios. Estão imbuídas do espírito capitalista da prosperidade. E elas se reconhecem em Marçal. Fonte: www.estadao.com.br
*É PROFESSOR DE FILOSOFIA NA UFRGS. E-MAIL: Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.
Trump se torna o centro da eleição
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Trump se torna o centro da eleição
Em debate, Kamala Harris consegue transformar a disputa num referendo sobre o ex-presidente, e não sobre o atual, e ainda se livrou de ter de explicar seus planos, de resto desconhecidos
Na acirrada disputa pela presidência dos Estados Unidos, o contraste entre o primeiro e o segundo debates entre os candidatos não poderia ser maior. Há 50 dias, o presidente Joe Biden, postulante à reeleição pelo Partido Democrata, teve um desempenho tão desastroso que se viu obrigado a desistir da disputa. A nova candidata democrata, a vice-presidente Kamala Harris, já havia recolhido com sucesso, na convenção do partido, todos os votos democratas deixados pelo caminho. Foi em meio a uma disputa cabeça a cabeça que ela entrou no debate com Donald Trump – e venceu. Não por nocaute, mas com uma margem confortável de pontos.
O debate expôs as estratégias das campanhas. A dos republicanos é implicar Harris com o governo impopular de Biden e assustar os moderados com seu histórico de apoio a políticas radicais das elites esquerdistas, ou forçá-la a negá-las, e então denunciar sua inconsistência. Sobretudo, o maior temor dos estrategistas era que Trump não perdesse a calma. O principal desafio de Harris era mostrar aos eleitores um caráter sólido, apto a governar o país, depois, evitar comprometer-se com políticas que pudessem soar radicais e, por fim, expor a personalidade volátil e temerária de Trump.
Essa personalidade já foi naturalizada na opinião pública. Como candidato bem conhecido, Trump era o que tinha menos a perder, mas, o pouco que tinha, perdeu. Como candidata menos conhecida, Harris era quem tinha mais a ganhar, e ganhou. Considerando as duas estratégias, Harris conseguiu expor a vaidade de Trump. Trump fracassou em expor a vacuidade de Harris. Ele não conseguiu forçá-la a defender suas políticas. Ela o induziu a cair na provocação.
Como notaram os analistas do New York Times L. Lerer e R.J. Epstein: “Harris explorou habilmente a maior das fraquezas de seu oponente. Não o seu histórico. Não suas políticas divisivas. Não sua história de declarações inflamatórias. Ao invés disso, alvejou uma parte muito mais primitiva dele: seu ego”. Seja declarando que líderes mundiais dizem que ele é uma “vergonha”, seja sugerindo que sua fortuna não era a de um “self-made man”, mas de um herdeiro mimado, ela conseguiu a um tempo se esquivar de questões temerárias e forçar o adversário a submergir seus questionamentos mais pertinentes em surtos de fúria, hipérboles e digressões.
O maior exemplo foi num tema que deveria ser um prato cheio para Trump, quando os mediadores questionaram Harris por que só agora a gestão de Biden decidiu agir contra a imigração ilegal. Harris disse algo sobre seu histórico como promotora, e rapidamente virou o holofote para Trump, acusando-o de sabotar um projeto de lei anti-imigração. Mas o golpe de mestre foi questionar o tamanho de seus comícios “entediantes”. Trump queimou sua réplica fulminando sobre como seus comícios eram os mais “incríveis na história da política”.
A fala mais efetiva de Trump – “se você tem todas essas grandes ideias, por que não as pôs em prática nos três anos e meio de governo?” – deveria ter sido dita no começo, corroborada com dados, e repetida insistentemente ao longo do debate. Mas foi dita só no fim, sem contundência. Na defensiva, era como se ele fosse o incumbente e ela, a desafiante. Repetidas vezes Harris falou em “virar a página”: ela tem “planos” (embora nunca bem esclarecidos), ela é a “novidade”, o “futuro” – ele é só um velho rancoroso.
Esse foi não só o primeiro debate entre ambos, mas o primeiro encontro – e possivelmente será o último. Os candidatos voltaram aos seus casulos, e as estratégias estão traçadas. Trump manterá sua militância inflamada. Harris se esquivará de confrontos em entrevistas e se oferecerá como uma candidata normal contra um candidato caótico, transformando a eleição num referendo sobre Trump.
Fazendo as contas do debate, Trump certamente não ganhou eleitores. Provavelmente também não perdeu. A questão é se Harris ganhou ou não o favor dos indecisos. Eis outro grande contraste com o debate anterior: aquele mudou tudo, este possivelmente mudará pouca coisa. Mas, numa eleição tão apertada, esse pouco pode ser o que Harris precisa para levar o grande prêmio. Fonte: https://www.estadao.com.br
A Independência deve iluminar o futuro
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O 7 de Setembro será uma data como outra qualquer se não servir para profunda reflexão sobre o bom uso da liberdade da Nação como única via para um país mais auspicioso para todos
O Brasil celebra hoje 202 anos como país soberano. A Independência do então Reino de Portugal marcou a ruptura com o passado colonial e a afirmação de um povo que almejava traçar o próprio destino. É de um anseio por liberdade e progresso que se trata. O 7 de Setembro, portanto, será apenas uma data qualquer no calendário se não servir para que os cidadãos reflitam sobre as experiências coletivas acumuladas nestes mais de dois séculos e, principalmente, decidam que passos hão de ser dados pela Nação brasileira em direção a um futuro mais auspicioso para todos.
Esse salto verdadeiramente libertador jamais poderá ser dado em sua plenitude enquanto os cidadãos não enxergarem uns nos outros os traços de união que os fazem brasileiros acima de tudo. Nos últimos anos, como tristemente se constata, os atributos que os separam têm sido os mais realçados. O estímulo à cizânia foi covardemente instrumentalizado como um ativo político-eleitoral. Soluções de consenso para problemas graves que ainda mantêm o País aferrado ao atraso não raro sofrem sérias interdições em decorrência de animosidades fabricadas por quem, ao contrário, deveria pregar a união nacional em prol do bem comum.
Todo dia é dia de pensar no significado de ser independente, mas hoje particularmente. Ser independente não se restringe a uma mera declaração de autonomia, como aquela de 1822. É um exercício contínuo, diário, muitas vezes árduo e frustrante. Escolhas coletivas exigem da sociedade – de qualquer sociedade, não só a brasileira – maturidade política, social e econômica. A Independência que hoje se celebra significa, antes de tudo, a capacidade do povo de se autodeterminar com responsabilidade, vale dizer, com respeito às leis e à Constituição pactuadas em conjunto e, sobretudo, com respeito aos seus concidadãos.
Não se constrói um país genuinamente livre sem respeito às liberdades individuais e aos direitos e garantias fundamentais assegurados a todos pela Lei Maior. Isso se materializa em instituições sólidas e confiáveis, comprometidas com o Estado Democrático de Direito, e numa sociedade civil engajada na defesa dos valores republicanos. Contudo, o que se vê com frequência maior do que seria suportável são autoridades que se julgam acima das instituições que representam e uma sociedade cindida, incapaz de concertar consensos mínimos para o desenvolvimento do Brasil por nem sequer compreender que a miséria de uns é a falência de todos como nação.
É inescapável constatar que esse estado de coisas está instalado no País por força dos estímulos que as desavenças entre os cidadãos, inclusive entre familiares, têm recebido para que projetos políticos individuais – mesquinhos, portanto – se sobreponham aos grandes projetos nacionais. O nome de cada um desses patriotas de fancaria é sobejamente conhecido, de modo que para este jornal, nesta data nacional, interessa mais apelar à consciência cívica dos cidadãos para que examinem como suas ações públicas se coadunam com as necessidades de uma sociedade que precisa urgentemente se reconciliar – o que não significa, em absoluto, calar as eventuais dissonâncias que caracterizam qualquer sociedade democrática e vibrante.
A união nacional não se confunde com homogeneidade de pensamento. Ao contrário. Foi na construção de acordos em torno da pluralidade de ideias e da diversidade de pensamentos e visões que o Brasil encontrou forças para realizar conquistas coletivas inimagináveis. Aí estão a redemocratização do País, a volta das eleições diretas, o Plano Real, a criação do Sistema Único de Saúde, entre tantas outras. A sociedade já foi capaz de mostrar que suas divisões não são insuperáveis, ao contrário do que pregam e estimulam os arautos do caos.
Tendo a Constituição como norte incontornável, cabe a todos os cidadãos, hoje e sempre, desarmar os espíritos e reconhecer que adversários políticos não são inimigos a serem eliminados. O Brasil são muitos. Só a partir dessa compreensão que há de triunfar o verdadeiro espírito da Independência. Fonte: https://www.estadao.com.br
Eleições
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Dom Leomar Brustolin
Arcebispo de Santa Maria (RS)
Uma forma de celebrarmos o dia da Pátria, que se aproxima, é nos comprometermos cada vez mais com uma sociedade justa e fraterna para que o nosso Brasil se torne uma nação mais humana e solidária. Para garantir esses ideais, a atenção ao processo eletivo de nossos governantes é um imperativo para um povo que visa a ética na sociedade.
Nesse contexto, o Regional Sul 3 da CNBB, por meio do Conselho Regional de Pastoral que reúne os Bispos, Coordenadores de Pastoral e Coordenadores das Comissões de Pastoral das 18 dioceses do Rio Grande do Sul, orienta os fiéis católicos e demais homens e mulheres de boa vontade para participar de forma ativa e consciente do pleito municipal de 2024. Com o Papa Francisco compreendemos que é “necessária a política melhor, a política colocada ao serviço do verdadeiro bem comum” (Fratelli Tutti, n. 154).
A Igreja Católica é apartidária, ou seja, não tem partido. Empenhada com a missão de anunciar o Evangelho, ela não renuncia ao seu compromisso político, que é o caminho concreto para a construção de uma sociedade mais justa e fraterna, na qual todos possam viver com dignidade.
A gravidade dos desafios surgidos no Estado do Rio Grande do Sul com as enchentes e inundações exige um intenso trabalho para reunir forças, superar divisões e fortalecer a esperança. É tempo de cuidar e recuperar o sentido de pertencimento a esse pampa querido. É tempo de investir em projetos comuns e oferecer respostas que vão ao encontro da nova realidade que se nos impõe.
Diante disso, elencamos alguns critérios indispensáveis que iluminam a escolha de prefeitos e vereadores, para um voto participativo e consciente:
1-Compromisso com a promoção, a defesa e a proteção da vida de todas as pessoas, desde a concepção até a morte natural;
2-Promoção da família, com posicionamentos que priorizem e defendam os seus valores;
valorização do Diálogo e da Paz, com discurso conciliador, capaz de escutar e defender as propostas, sem ofender os outros;
3-Empenho pelo bem comum, propondo projetos e ações que visem, particularmente, os mais necessitados, sem excluir ninguém;
4-Postura ética, correta e justa, sem histórico de envolvimento em casos de corrupção;
preocupação e cuidado com Ecologia Integral, colocando a emergência climática como prioridade.
Ao eleitor exortamos não “vender” seu voto. O voto direto, secreto, livre, consciente e soberano é um direito de todo cidadão (Constituição, artigo 14, caput).
Pedimos às comunidades cristãs que acolham a todos, sem promover um ou outro candidato. A propaganda eleitoral, em templos de qualquer culto, é proibida. Além disso, é vedado qualquer pedido de votos, implícito ou explícito, no ambiente das igrejas, capelas, instituições religiosas e similares.
A nossa participação na política ultrapassa o voto, pois é preciso também acompanhar e cobrar daqueles que forem eleitos.
Urge criar um clima coletivo de liberdade para construirmos a paz entre nós. Em toda a sociedade dinâmica e criativa, as tensões são normais, mas não podem se converter em pressões e ameaças que afetem desastrosamente o processo democrático e a amizade social.
Que a Virgem Maria, profetisa da Esperança, renove nosso empenho por uma sociedade onde “justiça e paz se abraçarão” (Sl 85,11).
Conforme decidimos em Assembleia do Clero de Santa Maria, neste segundo final de semana de setembro, esta carta será lida ao final de todas as celebrações eucarísticas. Fonte: https://www.cnbb.org.br
Nossa independência no abismo?
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Dos desvios idiomáticos aos problemas enfrentados nas contas públicas, o Brasil corre o risco de perder sua independência
Por Flávio Tavares
O mês de agosto terminou há pouco, mas dele fica aquela rima que virou repetido refrão: “Agosto, mês do desgosto”. E há pretextos (ou até motivos) para isso: agosto foi o mês da bomba atômica sobre Hiroshima e Nagasaki, em 1945. Nove anos depois, aqui, no Brasil, o assassinato do major Rubens Vaz desencadeou uma crise política profunda que culminou, em 24 de agosto de 1954, com o suicídio do presidente Getúlio Vargas. Em 22 de agosto de 1976, vivíamos ainda sob ditadura quando o ex-presidente Juscelino Kubitschek morreu num acidente automobilístico na Via Dutra, nunca esclarecido e que, por isso, até hoje levanta suspeitas.
Mas agosto já passou, agora estamos em setembro e, amanhã, dia 7, festejamos 202 anos da proclamação da Independência do Brasil. É o “Dia da Pátria”, rememorando o histórico “grito do Ipiranga”, atualmente comemorado com desfiles militares e outras demonstrações de que somos independentes.
Vivemos hoje, no entanto, uma invasão estrangeira que pode transformar o estilo de vida e, especialmente, o idioma e as diferentes formas de comunicação. Se isso se consumar, perderemos nossa “independência”.
O poeta Fernando Pessoa já escrevia que “minha pátria é a Língua Portuguesa”, atualmente invadida pelo idioma inglês, tal qual no século 19 fora, em parte, invadida pelo francês. Camões, poeta maior de nossa língua, tem um soneto sobre o idioma português que vai às origens da língua derivada do latim vulgar: “Última flor do Lácio, inculta e bela / és a um tempo esplendor e sepultura / ouro nativo que na ganga impura / a bruta mina entre os cascalhos vela”.
Corremos o risco de que a raiz e o cerne de nosso idioma sejam suprimidos ou desapareçam nas formas essenciais (como desapareceu o latim) numa avalanche que cresce quase diariamente.
A mais recente expressão inglesa incorporada ao nosso idioma é fake news, repetida pelos meios de comunicação e adotada até nas escolas, como se em nosso idioma não houvesse o termo “falsa notícia”.
Porém a verdadeira aberração entre nós no Brasil é “mídia” (escrito assim, com “i” acentuado), que, de fato, é o termo latino media. Como em inglês escrevem media, mas pronunciam “mídia”, aqui passamos a escrever e dizer também assim, para significar “meios de comunicação”.
A internet despejou no idioma português uma série de expressões inglesas, desde streaming até outras mais, como on line ou Wi Fi. Não pretendo fazer, aqui, uma espécie de minidicionário de vocábulos ingleses hoje incorporados ao nosso idioma ou de uso corrente no dia a dia. Ou já praticamente intraduzíveis, como spray. Ou simplesmente adotados e de uso corrente, como shopping center e show, que substituíram aquilo que deveríamos chamar de “centro comercial” e “espetáculo”, em castiço português.
Há outros vocábulos ingleses que, pelo uso constante, foram já aportuguesados, tal qual stress (que escrevemos “estresse”) ou team, que escrevemos “time”, antes restrito ao futebol e, agora, generalizado. Na área desportiva os vocábulos ingleses se aportuguesaram quase totalmente, e talvez nos sobre apenas “natação”. Seria ridículo dizer ludopédio em vez de futebol, como sugeria meu professor de Português no ensino fundamental. Entretanto, no México (onde morei por cinco anos) dizem balonpié, traduzindo literalmente o termo inglês football. Aqui, joga-se vôlei e basquete, que antes chamávamos bola ao cesto.
O uso do idioma inglês penetrou até no Poder Judiciário, onde antes usava-se um latinório quase incompreensível. Há poucos dias o culto ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso escreveu fishing expedition, expressão comum nas cortes dos EUA, para aqui significar a “busca de ilícito sem causa provável”.
Não é por isso, entretanto, que somos um país subdesenvolvido, mesmo com dimensões continentais. Tantos são os motivos que é difícil de enumerá-los. Seria infantil e absurdo culpar os desvios idiomáticos pelos problemas atuais ou, até mesmo, pelos vividos ao longo dos anos. Aí está a crise climática indicando que o problema é secular e abrange o planeta inteiro.
Fiquemos, porém, com os problemas e desacertos recentes. Não me refiro aos crimes comuns, como o feminicídio, o roubo ou os incêndios florestais criminosos, cuja fumaça chega até a cidades como São Paulo. Saliento, porém, as responsabilidades dos governantes. Passamos da desastrosa gestão de Jair Bolsonaro ao esperançoso governo de Lula da Silva, mas a máquina governamental continua lenta, parecendo até que nada mudou.
Nessa lentidão, em que a ociosa burocracia se sobrepõe à realidade, em 2023 a área governamental gastou mais de 45% do Produto Interno Bruto (PIB) – em 2022 foram 43,4% do PIB. A dívida líquida da União (externa mais interna) em julho deste ano chegou a R$ 6,962 trilhões, mesmo que tenha caído a 61,9% do PIB.
Também em julho de 2024, o Banco Central acumulava uma dívida de US$ 378,7 bilhões (para evitar dúvidas, repito, dólares). Só isso já basta para indagar se nossa independência não estará à beira do abismo. Fonte: https://www.estadao.com.br
*JORNALISTA E ESCRITOR, PRÊMIO JABUTI DE LITERATURA 2000 E 2005, PRÊMIO APCA 2004, É PROFESSOR APOSENTADO DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
A covardia do Brasil na Venezuela
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A covardia do Brasil na Venezuela
Mesmo ante ordem de prisão do líder da oposição venezuelana, Lula segue incapaz de condenar a ditadura do companheiro Maduro, ofendendo os que bravamente lutam pela democracia
A repressão na Venezuela recrudesce a níveis pavorosos mesmo para os padrões de truculência do chavismo. O regime está em vias de aprovar uma “Lei contra o Fascismo” que na prática lhe dará carta branca para prender quem bem entender. Desde as eleições presidenciais, cujos resultados foram escandalosamente fraudados para dar a vitória ao ditador Nicolás Maduro, quase 30 manifestantes foram mortos e cerca de 2 mil foram detidos, entre eles dezenas de menores de idade. As milícias informais conhecidas como “Coletivos”, a Gestapo chavista, intimidam famílias em suas casas e jornalistas nas redações. O advogado da oposição foi sequestrado.
Agora, o regime ordenou a prisão do candidato da oposição, Edmundo González. Como se sabe, o único “crime” da oposição foi divulgar, graças à insubordinação cívica de funcionários dos colégios eleitorais, fotogramas das atas eleitorais que confirmam, segundo a apuração de vários observadores independentes, sua vitória nas urnas com dois terços dos votos.
Chancelarias de diversos países latino-americanos emitiram notas veementes de repúdio. Já o governo brasileiro continua a fazer cara de paisagem. Em tom prazenteiro, o chanceler paralelo do presidente Lula da Silva, Celso Amorim, disse que “eu sou do tempo da bossa nova – a gente nunca sobe o tom”. Nunca, desde que se trate de tiranos companheiros.
Se o governo, sob a retórica malandra do “pragmatismo”, se desfaz de suas obrigações de denunciar a fraude contra a vontade do povo venezuelano e as violações de seus direitos fundamentais, não é por falta de saliva. Mesmo em questões em que tem pouca influência, como a guerra na Ucrânia ou em Gaza, Lula fala e fala muito, com frequência superlativamente, como quando equiparou as operações militares de Israel ao Holocausto. O Brasil, por sinal, segue sem um embaixador em Israel.
Em 2012, quando o Parlamento do Paraguai destituiu o presidente esquerdista Fernando Lugo, a então presidente Dilma Rousseff vociferou contra uma suposta “ruptura da ordem democrática”, engendrando com os governos esquerdistas da Argentina e do Uruguai o afastamento do Paraguai do Mercosul. Pouco importa que missões internacionais tenham constatado a higidez constitucional do impeachment de Lugo: como se tratava de um companheiro progressista, Dilma deixou de lado a diplomacia “bossa-nova” de Amorim. Para confirmar que a manobra era puramente ideológica, o consórcio esquerdista do Mercosul, sem o inconveniente voto contrário do Paraguai, aprovou a entrada no bloco da – ora vejam – Venezuela chavista.
Em outras palavras, em nome da “defesa da democracia”, o lulopetismo e seus sócios sul-americanos patrocinaram um atentado às instituições do Mercosul, alijando um país em condições de normalidade democrática para favorecer um regime cujo autoritarismo é a principal marca.
A oposição venezuelana tem dado ao mundo um exemplo de heroísmo. Em outras ocasiões ela se fracionou e oscilou entre modos diversos de resistência, de boicote às eleições a tentativas de rebelião armada. Agora, mesmo diante de uma ditadura militar que mantém na coleira o Legislativo, o Judiciário e a mídia, optou pelo enfrentamento nas urnas – e venceu. Mas o governo brasileiro continua a promover a farsa da “neutralidade”, cobrando as atas eleitorais que o chavismo trancou a sete chaves e a oposição mostrou ao mundo.
Já ficou claro que o Brasil tem pouca capacidade de influência num regime manietado por China, Rússia e Cuba. Mas longe de isentá-lo, essa seria mais uma razão para que o seu chefe de Estado denunciasse com todas as letras o atentado contra a democracia e os direitos humanos em curso. Não é só um dever moral, mas constitucional. A Carta Magna brasileira preconiza que as relações exteriores do Brasil se regem, entre outros princípios, pela prevalência dos direitos humanos e o repúdio ao terrorismo.
Ditaduras dependem de duas coisas para subsistir: o apoio das Forças Armadas e da população. Maduro, aparentemente, mantém o primeiro, mas o rechaço do povo venezuelano é inequívoco. Democracias genuínas deveriam celebrar e apoiar a resistência desse povo. O Brasil, em nome das amizades de seu presidente, prefere ofendê-lo. Fonte: https://www.estadao.com.br
Começa campanha eleitoral: veja o que pode e o que não pode
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Candidatos podem pedir votos, mas devem ficar atentos para não cometerem crimes eleitorais; veja quais regras os eleitores devem seguir
Período de campanha eleitoral começou nesta sexta-feira, 16 Foto: L. R. Moreira/TSE
Por Gabriel de Sousa
BRASÍLIA - O período oficial da campanha das eleições municipais de 2024 começou nesta sexta-feira, 15. A partir de agora, os candidatos aos cargos de prefeito e vereador nos 5.569 municípios do País podem pedir votos e organizar atos eleitorais.
O primeiro turno das eleições está marcado para o dia 6 de outubro. Em 103 cidades que possuem mais de 200 mil eleitores, há a possibilidade de haver segundo turno no dia 27 de outubro.
Os candidatos e os eleitores devem ficar atentos ao que é permitido fazer no período até o dia do pleito e o que pode ser configurado como crime eleitoral. Os delitos podem ocasionar multas até a cassação do registro de candidatura.
O que pode fazer?
A Justiça Eleitoral permite que os candidatos realizem comícios e carreatas. Os candidatos, porém, não podem utilizar aparelhos de som que ultrapassem 80 decibéis e deverão realizar os atos entre as 8 da manhã e às 22 horas. Também deverá ser respeitada uma distância de 200 metros de hospitais, escolas e sedes de Poderes.
Além de participar do horário eleitoral gratuito na rádio e na televisão, os candidatos podem pagar por anúncios de jornais até a antevéspera do dia do pleito. As propagandas em cadeia nacional vão começar a ser transmitidas no dia 30 de agosto e vão até 3 de outubro.
Nos jornais, os candidatos terão que respeitar o limite de até dez anúncios de propaganda eleitoral por veículo. A Justiça Eleitoral define também que o espaço máximo que os anúncios devem ocupar é de um oitavo de página de jornal padrão e de um quarto de página de revista ou tabloide.
O jornal impresso com o anúncio pode ser reproduzido na internet apenas pelo próprio veículo. É necessário que o valor pago pela campanha esteja visível nas páginas.
É permitido a propaganda em bens particulares desde que não haja algum tipo de pagamento, respeitando a vontade espontânea do dono do patrimônio.
As fachadas de comitês políticos podem ser utilizadas para a propaganda eleitoral. As faixas e cartazes não podem ultrapassar um limite de dois metros quadrados. Os candidatos também podem pedir votos em calçadas, desde que o trânsito de pedestres não seja prejudicado.
De acordo com uma nova resolução do TSE feita para as eleições deste ano, os candidatos podem utilizar a inteligência artificial (IA) para a produção das propagandas. É necessário que as campanhas divulguem de forma “explícita e destacada” o uso da IA para a fabricação do anúncio.
Os eleitores podem fixar nos carros adesivos micro-perfurados. As peças podem ocupar o para-brisa traseiro e outras partes do veículo, mas devem ter a dimensão de até 50x40 centímetros.
No dia das eleições, os eleitores poderão se manifestar, desde que de forma individual e silenciosa, a sua preferência por determinado candidato e partido. Segundo a Justiça Eleitoral, isso pode ser feito a partir de bandeiras, broches, dísticos, adesivos e camisetas.
O que não pode?
As campanhas não podem fixar propaganda eleitoral em muros, árvores e jardins, além de outdoors e fachadas de prédios públicos.
Uma resolução do TSE utilizada durante as eleições de 2022 que proibiu a divulgação de fake news em meios de comunicação, inclusive redes sociais, também será adotada nas eleições deste ano.
As campanhas não podem gastar mais do que o teto de gastos estabelecido pelo TSE para cada município. A lista com os valores foi divulgado no dia 18 de julho. Em São Paulo, que possui o maior eleitorado do País, os partidos poderão gastar até R$ 67.276.114,60 na campanha de prefeito em primeiro turno. Em eventual segundo turno, a quantia permitida é de R$ 26.910.445,80. A candidatura de vereador, por sua vez, tem um limite de R$ 4.773.280,39.
Os candidatos também estão proibidos de aparecer em inaugurações de obras públicas e não poderão distribuir camisas e demais brindes para eleitores.
Segundo nova resolução do TSE, é vedada o uso de “deepfake” em propagandas políticas. O termo denomina uma técnica que consiste na criação de conteúdos produzidos com auxílio de IA. O mecanismo funde, combina, substitui ou sobrepõe áudios e imagens para criar arquivos falsos em que pessoas podem ser colocadas em qualquer situação, dizendo frases nunca ditas ou assumindo atitudes jamais tomadas.
No dia das eleições, os eleitores não vão poder fazer manifestações sonoras e portar qualquer objeto que tenha propaganda de candidato, partido, coligação ou federação. O uso de armas no perímetro de 100 metros dos locais de votação também é proibido.
Por parte dos candidatos, é proibido transportar eleitores e pedir votos em zonas de votação. Também é vedado o uso de alto-falantes e amplificadores de som ou a realização de comícios e carreatas. A distribuição dos “santinhos” também configura crime eleitoral. Fonte: https://www.estadao.com.br
Aprendiz de Fidel
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Como franquia da ditadura cubana, chavismo aprendeu a sufocar os que ousam se lhe opor. Com apoio chinês e russo, Maduro parece querer transformar a Venezuela de vez numa nova Cuba
O ditador Nicolás Maduro decidiu dar uma banana para a comunidade internacional e fechar ainda mais seu regime de opressão, que há 11 anos subjuga os venezuelanos de todas as formas pelas quais um povo pode ser subjugado por seu próprio governante. Suas ações nesse sentido são inequívocas desde aquele farsesco ato de “diplomação” encenado no Conselho Nacional Eleitoral (CNE), um quintal do Palácio de Miraflores, horas após o pleito. Ali se ouviu a coda da ópera-bufa que apresentou Maduro como um legítimo candidato que teria triunfado sobre os adversários dentro das regras do jogo democrático, e não como o tirano sanguinário que ele é.
Maduro parece determinado a transformar a Venezuela em um Estado pária perante a comunidade das nações democráticas, entre as quais o Brasil. E ele só se movimenta com tamanho desassombro, malgrado todas as consequências políticas e econômicas que podem advir de seu novo golpe contra a soberania popular, porque conta com o imprescindível apoio da China e, a reboque, da Rússia, dois países que, como é notório, tratam as liberdades individuais e os direitos fundamentais dos cidadãos como excentricidades ocidentais.
Enquanto Estados Unidos e União Europeia se uniram para manifestar desconfiança em relação às condições da “vitória” de Maduro, China e Rússia foram rápidas na direção diametralmente oposta. Vieram de Pequim e de Moscou as mais importantes entre as escassas manifestações de apoio ao ditador venezuelano nas horas que se seguiram à proclamação do resultado pelo CNE no domingo passado.
A China de Xi Jinping, que conta com o petróleo da Venezuela para sustentar seu crescimento econômico, saudou Maduro e disse estar “disposta a enriquecer a associação estratégica com o país”. Ato seguinte, a Rússia do delinquente Vladimir Putin, outro capacho de Pequim, felicitou o ditador sul-americano e afirmou acreditar que “a associação estratégica” entre Moscou e Caracas se desenvolverá “em todas as áreas” a partir de agora. Engana-se quem pensa que essa coincidência de expressões empregadas foi mera obra do acaso.
Hoje, a Venezuela está para a China e Rússia como Cuba já esteve para a então União Soviética na década de 1960 – um posto avançado a serviço dos interesses chineses e russos contra os interesses americanos na América Latina. Não é força de expressão: é sabido que o regime chavista há tempos é uma franquia da ditadura cubana, que forneceu a Hugo Chávez e a Nicolás Maduro sua eficientíssima tecnologia de repressão a dissidentes, tanto políticos quanto militares. Maduro, devotado aprendiz de Fidel Castro, pretende se aferrar ao poder assim como o longevo ditador cubano.
Eis o teatro geopolítico que tem autorizado Maduro a não só desafiar, como a humilhar os países da América Latina e do Caribe que ousaram desconfiar de sua fajuta vitória ou guardar, no mínimo, um providencial silêncio nesse momento de crise, como fizeram Brasil e Colômbia, em que pese a hora grave impor uma condenação inequívoca da violência em curso no país vizinho.
No caso do Brasil, em particular, Maduro tem sido especialmente agressivo, tanto do ponto de vista retórico como militar. Recorde-se que, há poucos dias, o ditador recomendou que o presidente Lula da Silva tomasse um “chá de camomila” após o brasileiro se dizer “assustado” diante da ameaça feita pelo ditador companheiro de que haveria um “banho de sangue” na Venezuela caso ele não fosse reeleito. Ademais, Maduro segue inabalável em suas agressões contra a soberania da Guiana, mantendo tropas na região de fronteira com o Brasil.
A bem da verdade, Maduro sabe muito bem com quem está lidando ao se portar com esse misto de petulância e desdém pelo governo brasileiro. Fiel à tradição petista de condescendência com o chavismo, Lula afirmou ontem à noite que “nada tem de grave ou de anormal” na suspeitíssima eleição na Venezuela. De fato, sob a sanha persecutória e a sede de poder de Maduro, normal é ver os cadáveres de quem se opõe ao regime estendidos nas ruas, como já se vê. E isso é apenas o começo. Fonte: https://www.estadao.com.br
É assim que funciona uma ditadura
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Oposição jamais teve a chance de derrotar Nicolás Maduro no voto. Do início ao fim, o ditador fraudou o processo eleitoral e intimidou os venezuelanos para se aferrar ainda mais ao poder
Para surpresa de ninguém, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), um simulacro de Justiça Eleitoral na Venezuela que há anos se submete às ordens do Palácio de Miraflores, declarou a vitória de Nicolás Maduro na eleição presidencial de domingo passado. Segundo o órgão chavista, o ditador teria recebido 51,2% dos votos válidos, ante 44,2% dados ao oposicionista Edmundo González Urrutia. Qualquer número poderia ter sido chutado, pois a eleição, evidentemente, foi uma fraude.
Maduro não sobreviveria politicamente se fosse exposto ao ar das liberdades individuais e da soberania da vontade popular. Ciente disso, mais uma vez, o caudilho exerceu seu controle total sobre o Estado e suas instituições na Venezuela. Do início ao fim, o processo eleitoral foi conspurcado. Nesse sentido, a oposição jamais teve a chance real, por mínima que fosse, de derrotar Maduro nas urnas. É assim, afinal, que funciona uma ditadura.
O grande mérito de Urrutia e María Corina Machado – hoje a principal líder da oposição ao chavismo, a mulher que teria enfrentado Maduro caso não tivesse sido cassada pelo regime sob a falsa alegação de corrupção – foi ter reafirmado para o povo venezuelano e para o mundo, tal como uma anticandidatura, que a assim chamada “democracia” na Venezuela é uma farsa. “Todas as regras foram violadas”, afirmou Urrutia ainda na noite de domingo. Maduro não demorou para se autoproclamar oficialmente o vencedor, em clara demonstração de desdém com as preocupações da comunidade internacional.
A fim de não correr o menor risco de ser defenestrado do poder pela força das urnas, o que teria acontecido não fosse o recurso à fraude, Maduro cometeu uma pletora de arbitrariedades ao longo dos últimos meses, a começar pela cassação sumária de todas as candidaturas que, em dado momento da campanha eleitoral, cresceram como uma ameaça real a seus interesses.
Diversos oposicionistas foram presos – e os que não foram sofreram a brutal intimidação do regime antes, durante e depois do pleito. No dia da eleição, as temidas Milícias Bolivarianas, conhecidas como “Coletivos”, circularam em suas motos pelas seções eleitorais de Caracas armadas até os dentes, mostrando aos eleitores até onde ia, de fato, sua liberdade de escolha. Cerca de 4,5 milhões de venezuelanos exilados e aptos a votar no exterior foram impedidos por Maduro de exercer seus direitos políticos.
Jamais se tratou de uma eleição justa na Venezuela, em que pese a demonstração de união das forças de oposição ao regime ter representado a melhor chance de derrotar o chavismo nos últimos 25 anos. A rigor, Maduro se proclamou vitorioso em uma eleição na qual foi derrotado.
Não surpreende que o CNE tenha resistido a fornecer as atas de votação das seções eleitorais à oposição e aos escassos observadores internacionais presentes na Venezuela. Esses documentos, que poderiam atestar que Urrutia foi o grande vencedor das urnas, talvez jamais vejam a luz do dia.
Por meio de nota, o governo brasileiro saudou o “caráter pacífico da jornada eleitoral” na Venezuela, de resto um teatro para iludir incautos de que a reeleição de Maduro teria transcorrido dentro da mais absoluta normalidade democrática. Mas ao menos cobrou a publicação das atas de votação, gesto classificado pelo Itamaraty como “um passo indispensável para a transparência, credibilidade e legitimidade do resultado do pleito”. Já é alguma coisa, sobretudo em se tratando do governo de Lula da Silva, aquele para quem há “excesso de democracia” na Venezuela chavista. Fonte: https://www.estadao.com.br
Venezuela expulsa diplomatas de sete países latino-americanos após eleição
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Decisão afeta representantes de governos que questionaram resultado oficial do pleito, vencido por Nicolás Maduro
O chanceler da Venezuela, Yvan Gil. - Marcos Salgado - 29.jun.24/Xinhua
Brasília
O chanceler da Venezuela, Yván Gil, publicou um comunicado nesta segunda-feira (29) no qual determina que os governos de Argentina, Chile, Costa Rica, Peru, Panamá, República Dominicana e Uruguai devem retirar seus representantes diplomáticos do território de seu país.
No texto, Gil afirma que esses governos estão subordinados aos Estados Unidos e realizaram ações e declarações de ingerência em assuntos internos de Caracas.
Na mesma nota, a chancelaria venezuelana afirma que o regime do ditador Nicolás Maduro vai retirar todos os seus diplomatas das respectivas missões em que atuam nesses países.
"A República Bolivariana da Venezuela expressa seu mais firme repúdio diante das ações de ingerência e declarações de um grupo de governos de direita, subordinados a Washington e comprometidos abertamente com os mais sórdidos postulados ideológicos do fascismo internacional, tratando de reeditar o fracassado e derrotado Grupo de Lima, que pretendem desconhecer os resultados eleitorais", lê-se no comunicado. O Grupo de Lima foi formado por países que se uniram para pressionar o regime de Nicolás Maduro.
"O governo bolivariano enfrentará todas as ações que atentem contra o clima de paz e a convivência que exigiram tantos esforços do povo venezuelano, razão pela qual somos contrários a todos os pronunciamentos de ingerência e de assédio com os quais, de forma reiterada, tentam desconhecer a vontade do povo venezuelano."
Os países citados por Gil são críticos a Maduro e questionaram os resultados oficiais divulgados pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral). Javier Milei, presidente da Argentina, chamou Maduro de ditador e afirmou que a oposição teve uma vitória acachapante. Já Luis Lacalle Pou, líder do Uruguai, afirmou que o processo eleitoral venezuelano é alvo de manipulação.
Parte desses governos articulou ainda uma reunião na OEA (Organização dos Estados Americanos), convocada para esta quarta-feira (31), para discutir o pleito na Venezuela, que eles descrevem como um motivo de profunda preocupação.
A articulação na OEA, liderada pelo Equador, visa a uma declaração conjunta dos governos de Paraguai, Argentina, Costa Rica, Guatemala, Panamá, Peru, República Dominicana e Uruguai. Numa mensagem publicada nas redes sociais, esses governos afirmaram estar profundamente preocupados e exigiram a revisão completa dos resultados na Venezuela com a presença de observadores eleitorais independentes.
Na madrugada desta segunda, o CNE —controlado pelo chavismo— anunciou que o ditador Nicolás Maduro havia vencido as eleições de domingo. A divulgação foi rapidamente contestada pela oposição e por um grupo de líderes regionais.
Horas depois, Maduro foi proclamado presidente eleito para um terceiro mandato pelo CNE. "É irreversível", disse o líder do regime em Caracas.
O governo Lula (PT), que tem laços históricos com o chavismo, defendeu que o CNE divulgue as informações das mesas de votação. Em uma nota, o Itamaraty não parabenizou Maduro e pediu a publicação de "dados desagregados por mesa de votação".
Ainda de acordo com o Itamaraty, tal medida representaria um "passo indispensável para a transparência, credibilidade e legitimidade do resultado do pleito". No mesmo comunicado, a pasta saudou o "caráter pacífico da jornada eleitoral" e disse acompanhar com atenção o processo de apuração.
"[O governo] reafirma ainda o princípio fundamental da soberania popular, a ser observado por meio da verificação imparcial dos resultados", diz.
Enviado do Planalto para acompanhar a votação, o assessor para assuntos internacionais de Lula, Celso Amorim, esteve nesta manhã em reunião com os observadores eleitorais do Carter Center.
Depois, tinha reunião marcada com o painel de especialistas ligados à ONU (Organização das Nações Unidas). Os especialistas da ONU não têm mandato para manifestar juízo público sobre a condução das eleições. Eles devem produzir um relatório confidencial sobre aspectos gerais do processo eleitoral.
Amorim disse nesta segunda que nem o regime nem a oposição comprovaram suas afirmações de vitória. "A gente tem que ter uma verdade verificada. É uma norma de desarmamento básica: confie e verifique", disse à Folha. "O resultado só pode ser verificado quando o resultado das várias mesas [de votação] for divulgado. Não basta dar um número geral." Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
#tamojunto Biden
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Quantas vezes a gente insistiu em algo que era uma roubada? Todo mundo avisando e a gente ali, teimando. Desistir teria sido muito melhor
Por Leo Aversa
Domingo de tarde, Biden deitadão naquele sofá bege do Salão Oval. O jornal na barriga, a TV ligada, o telefone — vermelho — tocando sem parar. Do outro lado, assessores querendo discutir a guerra da Ucrânia, a questão dos imigrantes, o apagão cibernético na semana passada. Só treta, confusão e briga de cachorro grande. Ele ali, de saco cheio, olhar no teto, lembrando da torta de maçã que a avó fazia, sonhando com as férias na Disney na companhia dos netos. Enquanto espera a música do Fantástico para ir dormir, se pergunta: por que não consigo ficar aqui tranquilo, de boas? De supetão — não tão supetão assim, que a lombar não aguenta mais —, ele levanta e solta o grito primal do homem contemporâneo: “Que se foda, tô fora!”
Não quero tirar o emprego de escritores de autoajuda, nem desapontar admiradores de influencers existenciais e seguidores de coachs metafísicos, mas a persistência é uma qualidade sobrevalorizada. A toda hora, em todo lugar, tem um profeta do óbvio mandando a gente persistir, insistir, seguir em frente a qualquer preço. É bom, até faz bem, mas não vamos exagerar: desistir — na hora certa — é a grande arte.
Um monte de gente persiste, persiste, persiste e mesmo assim não chega onde queria. Pelo contrário, acaba pior que começou. Por teimosia, não percebe que até estava avançando, mas na direção contrária. Tipo ter que ir para Niterói, pegar a Brasil para o outro lado e acabar em Bangu. Acontece muito.
São pessoas a quem sobra vontade e determinação, mas falta GPS. Também existem os que insistem no que nunca vai dar certo e os que persistem em algo que, sim, funciona, mas não para eles.
Não quero fazer uma ode ao pessimismo, mas uma dose de régua e compasso e uma pitada de “melhor não” podem nos poupar de grandes decepções.
Dizem que o sucesso é 99% de suor e 1% de talento. Mais certo, impossível. Mas vamos ser sinceros, leitor: existem pessoas — maravilhosas — que nem esse 1% têm. Aí, complica. O sonho de uma jornada heroica rumo ao topo da montanha vira um patético tombo na escada na direção do porão. Não era melhor ter largado o osso lá no começo?
Nem deveria falar sobre a importância da desistência na vida afetiva. É até covardia. Construir uma relação, ir colocando tijolinho em cima de tijolinho, é algo lindo, deve ser um objetivo tão desejado como celebrado. Mas... Vamos ser sinceros: é uma em cem, né? Sobre as outras 99, meu caro leitor, descobrimos depois — estropiados — que era melhor ter pulado fora antes. Quantas vezes a gente insistiu em algo que era obviamente uma roubada? Todo mundo avisando e a gente ali, teimando. Desistir teria sido muito melhor do que descer a ladeira sem freio e bater de frente com um caminhão.
Nem acho que Biden estava tão mal assim, entrar num debate com um lunático mitômano é uma luta inglória para qualquer um, você tem que contestar um sujeito que acredita mesmo nas mentiras que diz. Igual a jogar xadrez com pombo. Vale a pena? Para quem tem tempo, disposição e um futuro pela frente, sim.
Só que tem uma hora na vida em que você percebe que o tempo é curto e que o que você quer mesmo é ler o jornal de domingo tranquilo, de boas, deitado no sofá.
Eles que lutem. Fonte: https://oglobo.globo.com
Cacá Diegues: e Deus com isso?
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Donald Trump — Foto: SCOTT OLSON / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP
Trump atribuiu ao todo-poderoso o milagre de ter sido salvo do atentado. Mas deus deve ter outras coisas para fazer
Por Cacá Diegues
Desde sábado da semana passada só se fala no atentado sofrido por Donald Trump. Nada pode justificar tamanha violência contra uma pessoa. Não se trata disso. Mas nós, por aqui, vimos algo parecido nas eleições de 2018. Com uma grande diferença. Quando Jair levou uma facada na campanha ainda tínhamos uma total indefinição do resultado das nossas eleições. A vítima, então, pode contar com um fato que justificaria sua ausência em todo e qualquer debate em que poderiam ser discutidos os planos de cada um para o nosso país: poderia ficar em casa, como ficou utilizando-se unicamente das mídias sociais, onde falava sozinho.
Foi justamente em um debate que a fragilidade da saúde de Joe Biden ficou escancarada “via satélite” para o mundo todo. Trump já aparecia com vantagem sobre Biden e depois disso disparou na preferência dos eleitores americanos, enquanto o presidente dividiu até mesmo seus companheiros do Partido Democrata. Quer dizer, Trump sofreu um atentado a sua vida mesmo já estando à frente da corrida presidencial, diferentemente do que ocorreu por aqui.
Mas um, como o outro, atribuíram a Deus o milagre de terem saído salvos dos respectivos atentados. Quando pessoas que almejam o poder atribuem a Ele uma intervenção por estarem vivos, temos que ficar atentos. Se o Todo-Poderoso os unge com tamanho privilégio, quem somos nós para discutir com Ele? E como Deus pode estar tão atento com homens tão poderosos e, ao mesmo tempo, estar tão distraído com as vítimas de balas perdidas diárias que testemunhamos em nossas favelas, ou com os absurdos que vemos acontecer seja na Ucrânia, seja em Gaza, ou em quaisquer outras barbaridades que os homens cometem contra outros homens? Deus não tem a nada a ver com isso. Se Ele existe mesmo deve ter outras coisas para fazer.
Espero que os Estados Unidos, pelo seu inegável protagonismo, achem um caminho para evitar que o nosso planeta se afunde ainda mais nessa rota suicida que alguns tentam nos impor. O mundo precisa mesmo de mais fraternidade, mais cordialidade, mais solidariedade. Menos muros, menos preconceitos, menos ódio com o diferente de nós. O entendimento de que ou daremos certo juntos ou não teremos saída. E aí, Deus, pode sim resolver mandar um meteoro para acabar com tudo mesmo para começar de novo porque não demos certo. Melhor resolver aqui mesmo, entre nós, humanos. Fonte: https://oglobo.globo.com
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