Quem foi Tiradentes? Dentista, comerciante, minerador, alferes e traído
- Detalhes
Joaquim José da Silva Xavier, símbolo da Inconfidência Mineira, morreu no dia 21 de abril.
Por Thaís Leocádio, TV Globo — Belo Horizonte
O feriado desta sexta-feira (21) marca a morte de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, símbolo da Inconfidência Mineira. Para além do mártir, ele era um homem comum: trabalhava muito, gostava de ler, falava demais e dizem até que foi traído pela mulher.
O movimento do qual fez parte era anticolonialista e queria a instalação da República. Os "conspiradores" mineiros planejavam o fim da dominação portuguesa sobre o Brasil. Por "traição à coroa", Tiradentes foi enforcado em 1792 e, depois, esquartejado.
Ele foi um homem tagarela, namorador, teimoso, corajoso, apaixonado por livros e defensor do conhecimento. Joaquim teve várias profissões, como dentista (“tira dentes”), minerador, comerciante e alferes.
“Um bom militar, diga-se de passagem”, afirma Luiz Villalta, professor do departamento de história da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A República só foi proclamada no Brasil em 1889.
Na vida afetiva, Tiradentes teve um relacionamento com Antônia do Espírito Santo, 25 anos mais nova do que ele. Os dois moraram juntos, mas não chegaram a se casar.
“Há registros de que, com ela, teve uma filha. Mas não é improvável que tenha deixado outros descendentes. Ele viajava demais. Era obcecado pela conspiração. Ao que tudo indica, a amante se cansou dele e o traiu”, relata Luiz Villalta.
Por que é feriado?
Tiradentes morreu como traidor do Brasil, mas, anos depois, foi considerado herói. O dia da morte, 21 de abril, é feriado em todo o país desde 1890. O Decreto nº 155-B foi publicado em janeiro daquele ano.
Ele foi declarado patrono cívico da nação brasileira no dia 9 de dezembro de 1965, com a Lei de nº 4.897, no governo de Castello Branco.
O texto diz que a homenagem a ele pretende destacar que a condenação de Joaquim José da Silva Xavier não deve manchar a memória dele, que é "reconhecida e proclamada oficialmente pelos seus concidadãos, como o mais alto título de glorificação do nosso maior compatriota de todos os tempos".
Quem foi Tiradentes?
Após ficar três anos preso no Rio de Janeiro, Tiradentes foi enforcado em 1792. Esquartejado, ele teve as partes do corpo expostas em diferentes locais públicos de Vila Rica, atual Ouro Preto, para "servir de exemplo".
Em um destes pontos, há hoje uma estátua e uma placa onde se lê “aqui em poste de ignominia esteve exposta sua cabeça”. A rota do inconfidente pela cidade foi relembrada pelo g1 em 2018, quando o jornalista Lucas Figueiredo publicou a biografia moderna “O Tiradentes”.
“No começo, Tiradentes se envolveu na trama pelo mesmo motivo da maioria de seus companheiros: insatisfação pessoal com a Coroa. Com o passar do tempo, já dentro do movimento, Joaquim adquiriu consciência política e compreendeu que a luta em que estava envolvia causas nobres, como a instalação da República e o fim da cruel dominação portuguesa”, conta o biógrafo Figueiredo.
O apreço pela leitura e pelo conhecimento técnico também tem destaque na personalidade de Tiradentes. Lendo obras estrangeiras e nacionais, montava suas próprias estratégias de intervenção. Ele circulava bem por diferentes grupos sociais e tinha uma alma inquieta.
Segundo Villalta, entre os legados deixados pela Inconfidência Mineira estão “as falhas permanentes de nosso poder judiciário, desde aquela época notabilizado por produzir injustiças”. Apesar de ter sido um movimento que pregava a liberdade, o professor destaca que os inconfidentes não tocaram na questão da escravidão: “Não tinham a menor sensibilidade social”.
“Ele era alguém que queria muito vencer na vida, que acreditava que o esforço seria recompensado. Mas, ao mesmo tempo, uma pessoa muito teimosa e inocente. Às vezes, confuso; sempre generoso e com uma coragem infinita”, descreve Figueiredo.
“Tem gente que quer que Tiradentes seja um ‘santo’, mas ele foi um homem, com paixões, defeitos e qualidades. Era fanfarrão? Falava demais? Sim! Mas sua participação como tal era essencial para o sucesso do movimento. Ele era o agente que poderia incendiar o povo”, completa Villalta. Fonte: https://g1.globo.com
Programa Minha Rua, Minha Vida
- Detalhes
O inverno está chegando, mas o STF silencia sobre população em situação de rua
Professor de direito constitucional da USP, é doutor em direito e ciência política e membro do Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade - SBPC
Banalizamos a urgência da promoção de direitos existenciais dos grupos mais vulneráveis da sociedade brasileira. Somos tão vocacionados para a violação de direitos que também banalizamos a própria noção de banalização. Nesse circuito de indiferença, inação e cumplicidade, o PIBB (Produto Interno da Brutalidade Brasileira) segue como nosso principal selo de inumanidade.
Entre esses grupos, a população em situação de rua é o mais sub-representado politicamente e desprovido de canais para influenciar decisões ou reivindicar qualquer coisa. Indivíduos isolados, em geral com vínculos sociais, familiares e afetivos rompidos, sem laços comunitários, com baixa capacidade de organização e mobilização, nem mesmo um "grupo", a rigor, conseguem formar.
Cidadãos de direito, subcidadãos de fato, ocupam o degrau mais baixo da subcidadania. E nem precisamos lembrar como as dimensões de gênero, raça, orientação sexual e capacidade física ou intelectual cavam ainda mais fundo esse poço. Quando jovens atearam fogo e mataram o líder indígena Galdino Pataxó, há 25 anos, alegaram confundi-lo com "morador de rua".
A política de zeladoria urbana da Prefeitura de São Paulo tem radicalizado a arbitrariedade contra essa população. "Política de porradaria" seria a versão não eufemística. Casos de violência física, verbal, patrimonial e institucional se intensificam sem controle e responsabilização.
Violam legislação municipal que exige comunicação com antecedência de ações de limpeza urbana; entrega de contralacre dos bens apreendidos; vedação de subtração de objetos como medicamentos, cobertores e travesseiros (Decreto 59.246/2020 e Portaria 4/2020).
Violam Resolução 40/2020 do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, que determina a autoridades "coibir atos ilegais de retirada de documentos e pertences" e respeitar a inviolabilidade e privacidade "do domicílio improvisado da pessoa em situação de rua".
A Defensoria Pública e a Clínica de Direitos Humanos Luiz Gama descrevem ações que se multiplicaram nos últimos anos: remoções de barracas e pertences (roupas, absorventes, cobertas, fraldas geriátricas), sem aviso prévio e contralacre, com agressão física e verbal; uso eventual de bala de borracha e spray de pimenta por guarda municipal.
Num caso da Vila Matilde, agentes municipais chegaram com tratores para, depois de remoção dos bens, cavar buracos e dificultar a presença de barracas. Reproduziram as imagens mais sombrias e traumáticas de covas coletivas da pandemia.
O prefeito silencia sobre violações. Na tentativa de deixar sua marca, gestores medíocres ou mal-intencionados viram reféns da ciclotimia eleitoral. Precisam mostrar algum serviço para as próximas eleições e tentam resolver a jato um problema estrutural e histórico. O país já ensinou que as operações de lavagem a jato acabam mal.
Políticas públicas para a população em situação de rua têm tradição repressora e higienista. Têm também tradição de errar consistentemente e agravar o problema. Costumam ser feitas no escuro empírico, sem evidências qualitativas e quantitativas.
A ideia de que se pode propor soluções para o mundo sem investigá-lo é um sintoma sério de ignorância e estupidez. De arrogância e autoritarismo também. Isso quando não se atribui responsabilidade à falta de caráter, de vontade, de esforço e competência. A desgraça e infortuna de indivíduos são reduzidas a uma falha moral.
Entre as poucas evidências que temos, sabe-se que nenhuma política para essa população obtém resultado se não acompanhada de programas de moradia e trabalho, respeitadas a autonomia de cada um. Mas essa rara evidência se tem preferido ignorar.
Na cidade de São Paulo, esses indivíduos não estão destituídos apenas do direito de propriedade ou moradia. Na rua, buscam ter, quando muito, a liberdade de não sentir fome, de dormir sem frio e acordar sem medo. Mas a autoridade municipal lhes subtrai, ilegalmente, a propriedade de pertences de sobrevivência, higiene e mínimo bem-estar.
Como pedir urgência para algo sempre urgente, sempre ignorado? O STF, sob relatoria de Alexandre de Moraes, tem a oportunidade de reconhecer essa séria violação de direitos fundamentais e exigir de autoridades urbanas o respeito a regras básicas de não arbitrariedade e não violência.
Que o município de São Paulo cumpra seu próprio decreto. E que parâmetros normativos de proteção aos cidadãos mais vulneráveis entre os vulneráveis sejam respeitados nas cidades do país. Pede-se pouco, apenas um grão de decência constitucional, não o fim da limpeza urbana. Com direitos, sem medo, sem violência.
O inverno está chegando e o frio, na rua, mata. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
Jornalismo – a hora de recuperar o encanto
- Detalhes
Sou otimista quanto ao futuro das empresas de comunicação, mas não deixo de considerar que o renascer do nosso setor será resultado de um doloroso processo
O jornalista Carlos Alberto Di Franco escreve quinzenalmente na seção Espaço Aberto
Estou em Roma. Aqui, como aí, no Brasil, há gente desencantada com o jornalismo e fascinada com as redes sociais. Acreditam, talvez ingenuamente, que a agitação do mundo digital vai resgatar a verdade conspurcada. Como se as redes fossem um espaço plural que se contrapõe a uma suposta hegemonia da mídia tradicional. Não percebem que os algoritmos tendem a criar redutos fechados, bolhas impermeáveis ao contraditório.
Sou apaixonado pelo jornalismo. Escrevo na imprensa tradicional e participo intensamente das novas mídias. Ambas são importantes. Não são excludentes. É preciso navegar com profissionalismo e seriedade.
O combate às fake news, uma demanda importante e necessária, não deve justificar censura, limitações à liberdade de expressão e prisões arbitrárias e ilegais. Quem vai dizer o que podemos ou não consumir? Quem vai definir o que é ou não fake news? O Estado? O Executivo? Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF)? Transferir para o Estado a tutela da liberdade é muito perigoso. Fake news se combatem não com menos informação, mas com mais informação, e informação mais qualificada.
A reinvenção do jornalismo, a recuperação do encanto, passa necessariamente pelo retorno aos sólidos pilares da ética e da qualidade informativa.
A crise do jornalismo está ligada à falência da objetividade e ao avanço do subjetivismo engajado e das narrativas divorciadas dos fatos. Quase sem perceber, alguns jornais sucumbem à síndrome da opinião invasiva. Ganham traços de redes sociais. Falam para si mesmos, e não para sua audiência.
É preciso apostar na informação. Sentir o cheiro da notícia. Persegui-la. Buscar novas fontes e encaixar as peças de um enorme quebra-cabeças para apresentá-lo o mais completo possível. Entre as competências necessárias para exercer um bom jornalismo, algumas parecem ser inatas, e, por mais que se tente aprender, inútil será o esforço. É assim o tal “faro jornalístico”. Uma capacidade quase inexplicável que alguns profissionais têm de descobrir histórias inéditas, de furar a concorrência e manter pulsando a certeza de que é possível produzir conteúdo de qualidade que sirva ao interesse público.
Nunca se pôs em xeque o papel essencial do instinto jornalístico. Nem eu pretendo fazê-lo agora. Como já venho reiterando há tempos neste espaço, apenas essa vibração será capaz de devolver a alma que, por vezes, percebo faltar ao trabalho das redações. O que quero é acrescentar um aspecto que julgo importante nesta discussão: na era digital, a intuição pode e deve ser apoiada pelos números. A informação precisa ser bem fundamentada.
Realidades que pareciam alheias aos negócios da mídia estão cada vez mais próximas dos veículos. É o caso do Big Data. A cada dia os acessos digitais aos portais de notícias geram quantidades incríveis de dados sobre o comportamento de nossas audiências, mas ainda não fomos capazes de enxergar o potencial que há por trás dessa montanha de informação desestruturada. Nas redações brasileiras, multiplicam-se as telas coloridas que trazem, minuto a minuto, indicadores e gráficos mirabolantes. Ao final de um dia de trabalho, qualquer editor está habilitado a responder quais foram as reportagens mais lidas. Mas e depois disso? Já não basta que definamos nós o que precisam os consumidores de informação. É preciso ouvir o que eles têm a dizer. O ambiente digital rompeu a comunicação unidirecional que, por muitas décadas, imperou nas redações. O fenômeno das redes sociais estourou a bolha em que se confinavam alguns jornalistas que produziam notícias para muitos, menos para o seu leitor real. Além disso, perdemos o domínio da narrativa. Chegou a hora das pautas com pegada.
Ao longo deste ano, alguns jornalistas da grande mídia, sobretudo na cobertura de política, em nome de suposta independência, têm enveredado excessivamente pelo que eu chamaria de jornalismo de militância. E isso não é legal. Não fortalece a credibilidade e incomoda seus próprios leitores.
Na verdade, há um crescente distanciamento entre o que veem e reportam e o que se consolida paulatinamente como fatos ou percepções de suas próprias audiências, posto que a estas foi dado o poder de fazer suas reflexões e até mesmo apurações, facilitadas e potencializadas pela internet.
É necessário perceber, para o bem e para o mal, que perdemos a hegemonia da informação. Impõe-se um jornalismo menos anti e mais propositivo. Precisamos olhar para nossas coberturas e nos questionarmos se há valor diferencial naquilo que estamos entregando aos nossos consumidores. Sabendo que, se a resposta for negativa, poucas serão as possibilidades de monetizar nosso conteúdo. Afinal, ninguém pagará pelo que pode encontrar de forma similar e gratuita na rede.
Sou otimista em relação ao futuro das empresas de comunicação, mas não deixo de considerar que o renascer do nosso setor será resultado de um doloroso processo. Exigirá uma boa dose de audácia para dinamitar antigos processos e modelos mentais que, até este momento, vêm freando as tentativas de reinvenção. Chegou a hora do encantamento. Fonte: https://www.estadao.com.br
Deputada do Rio se abriga de tiroteio e interrompe evento no Complexo da Maré
- Detalhes
A parlamentar Renata Souza (Psol) participava de um encontro em uma instituição; segundo a Polícia Civil, uma operação ocorreu no local nesta sexta-feira
Por O Globo — Rio de Janeiro
Um evento realizado na Casa de Mulheres da Maré, na Zona Norte do Rio, precisou ser interrompido devido a um tiroteio na região, na tarde desta sexta-feira. A deputada estadual Renata Souza (Psol) era uma das convidadas e precisou se abrigar, junto a 70 mulheres que participavam do encontro, por conta dos disparos, que, segundo elas, partiu de um helicóptero da Polícia Civil. De acordo com a corporação, uma operação da Delegacia de Roubos e Furtos de Cargas foi realizada no Complexo da Maré nesta sexta-feira.
Renata Souza, que é presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Mulheres da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), esteve presente no lançamento da pesquisa "Os impactos da violência armada na vida das mulheres da Maré: gênero, território e prática artística”, realizada pela ONG Redes da Maré.
Com o tiroteio, o encontro precisou ser interrompido e as participantes, incluindo a parlamentar, se abrigaram dentro da sede da ONG. Renata afirma que não foi a primeira vez que viveu essa situação, que definiu como "aterrorizante", mas, como deputada, foi a primeira experiência do tipo.
— Como parlamentar, representante do povo, sim, é a primeira situação de perigo real que enfrento junto dos moradores da favela — afirma Renata Souza, que pede um "cessar fogo". — Precisamos de segurança, com inteligência, investigação e prevenção de tiroteios. Não se combate a violência com mais violência. A política de confronto nunca garantiu segurança e paz na favela.
A parlamentar, enquanto estava sentada no chão da ONG, gravou um vídeo em que cobra o governador Cláudio Castro (PL):
— O que a gente está vendo aqui hoje é, de fato, a situação limite. Vivi muito isso aqui no cotidiano e, hoje, viver isso aqui, é a demonstração que o governador Cláudio Castro não garante segurança para quem vive na favela, na periferia.
Segundo a deputada estadual, ela também entrou em contato com Castro por telefone e relatou a situação. O GLOBO procurou o Palácio Guanabara e aguarda um posicionamento.
Em vídeos compartilhados nas redes sociais, circulam imagens de um helicóptero sobrevoando a comunidade, junto ao som de tiros. De acordo com a Polícia Civil, a comunidade recebeu uma operação da Delegacia de Roubos e Furtos de Cargas nesta sexta-feira.
Em nota, o Governo do Estado informou que "policiais civis da Delegacia de Roubos e Furtos de Cargas (DRFC), que fazem ações diárias no entorno do Complexo da Maré para evitar que cargas roubadas entrem na comunidade, foram atacados a tiros por criminosos da localidade, na Avenida Brasil, em um dos acessos à Nova Holanda. Uma viatura foi alvejada com 4 tiros de fuzil".
A nota informa ainda que "os policiais perseguiram os criminosos, que escoltavam uma carga roubada de polietileno, no valor de R$ 2 milhões, e foi recuperada no interior da antiga garagem de uma empresa de ônibus desativada, na entrada da comunidade. Durante o confronto, os policiais tomaram conhecimento de um atendimento com defensores públicos na comunidade ao lado, no Parque União, e se ofereceram para retirar a defensora do local, mas ela se recusou a entrar na viatura policial. Não há informações sobre feridos." Fonte: https://oglobo.globo.com
Crença na imortalidade transforma bilionários em profetas apocalípticos sem Deus
- Detalhes
O bilionário Elon Musk - Jim Watson - 10.fev.22/AFP
Ou seja, os sujeitos não apenas querem confiar à IA a tarefa de criar Deus —ou alguma coisa muito superior a um ser humano, pelo menos— como também acham que ela vai abrir as portas da imortalidade.
Não resisto à tentação de começar esta coluna repetindo uma piada clássica sobre os primórdios da computação. Dizem que, nos anos 1950, quando os EUA puseram seu primeiro supercomputador em funcionamento —um monstro valvulado, maior do que a maioria dos apartamentos paulistanos de hoje—, o presidente Dwight Eisenhower (1890-1969) teria perguntado à máquina se Deus existia. A resposta: "Agora existe".
Pois bem: anda difícil escapar à sensação de que, quando o assunto é inteligência artificial, tem muita gente poderosa por aí concordando com o interlocutor de Eisenhower. Os investimentos bilionários na área, com toda aquela aversão clássica a críticas ou regulação externa tão cara ao Vale do Silício, frequentemente se fazem acompanhar da crença de que seria desejável e/ou inevitável desenvolver inteligências artificiais similares ou superiores à humana em breve. Pra ontem, se for possível.
E a coisa não para por aí, é claro. Circulou nesta semana, pelas redes sociais, o apelo de um desses futurólogos para que obtenhamos o máximo de gravações de áudio e vídeo dos nossos entes queridos já idosos. O motivo: com os avanços da IA (vou ter de abreviar esse negócio, não vai ter jeito), em breve poderemos usar esses dados para criar simulações computacionais extremamente realistas de quem nos deixar. Quer falar com o finado vovô? É só baixar este aplicativo aqui, ó.
Depois de respirar fundo, rezar um pai-nosso e uma ave-maria e assim domar meu instinto de cobrir de cadeiradas quem defende esse tipo de coisa, dei-me conta de algo curioso. A nova heresia dos devotos da IA não passa, no fundo, no fundo, de uma versão secularizada —portanto, (superficialmente) não religiosa— de uma das vertentes mais antigas da teologia cristã: o milenarismo.
Simplificando brutalmente uma discussão teológica que poderia ser um livro, podemos dizer que uma das grandes inspirações do milenarismo é a narrativa em ritmo de videogame do livro do Apocalipse, o último da Bíblia. Também é comum, hoje em dia, que essa corrente de pensamento se manifeste por meio da crença no arrebatamento, suposto momento dramático em que os verdadeiros cristãos seriam arrebatados ao céu de corpo e alma. (Não é por acaso, aliás, que a ideia de fazer o "upload" da consciência humana para um computador tenha sido apelidada de "arrebatamento geek".)
Em comum com o milenarismo cristão, as crenças dos devotos da IA (e também a dos que acham que a biotecnologia será capaz de produzir alguma forma de imortalidade biológica) têm como corolário a possibilidade de um reino dos céus a ser vivenciado em breve, aqui mesmo na Terra.
Há outra semelhança ainda mais perturbadora: o sectarismo. Enquanto os milenaristas cristãos acreditavam (e alguns ainda acreditam) que só um punhado de eleitos de Deus terá acesso às chaves do reino, o paraíso dos devotos da IA e da biotecnologia é de quem puder pagar por ele.
Não estou convencido de que seja possível criar uma IA com inteligência similar ou superior à humana, e me parece praticamente certo que a busca pela imortalidade biológica ignora aspectos básicos do funcionamento dos seres vivos. Mas, mesmo que tais ideias fossem exequíveis, o essencial é perceber que elas brotam do que há de mais escroto na natureza humana. Além disso, vale ressaltar que todas as tentativas de milenaristas para exercer poder no mundo real terminaram em desgraça para todos os envolvidos. Quem tiver ouvidos para ouvir, que ouça. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
8 de janeiro à luz do dia
- Detalhes
Supremo jamais poderia julgar caso de extrema gravidade no espaço virtual
O ministro Alexandre de Moraes durante visita ao complexo da Papuda, quando chegou a inspecionar a comida de presos suspeitos de envolvimento nos ataques golpistas de 8 de janeiro - Divulgação - 10.abr.2023/STF - Divulgação
Advogado criminalista e doutor em direito penal (USP), é professor de processo penal (Faap), conselheiro federal da OAB e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim)
Com elogiável rapidez, o Supremo Tribunal Federal anunciou o julgamento dos primeiros cem acusados de participar dos deploráveis atos de vandalismo ocorridos em Brasília —verdadeira ação golpista que alguns até qualificam como intentona.
Mas, segundo esta Folha ("STF julgará se 100 acusados viram réus 100 dias após ataques golpistas de 8 de janeiro", 12/4), o julgamento se fará de forma virtual e os advogados "poderão apresentar sustentações orais até 23h59 do dia 17 de abril".
Malgrado a previsão regimental para a realização de julgamentos dessa forma, um caso dessa importância jamais poderia ser julgado no espaço virtual. A nação —e não apenas as partes— tem o direito de acompanhar os debates entre a acusação e as diferentes defesas, além do voto de cada ministro e a discussão entre eles. Não podemos ficar privados de conhecer os argumentos lançados no debate, sem falar no fundamento dos votos dos ministros. Tudo, até para se afastar especulações indevidas, deveria ser público e transparente como a luz do dia!
Ainda que se possa dizer que as partes consigam acompanhar em tempo real o lançamento dos votos e conhecer os argumentos e os fundamentos dos mesmos, isso para o grande público é imperceptível.
No plenário virtual parece haver apenas uma superposição de votos, sem debate efetivo. É certo que um ministro pode ver o voto do colega e voltar atrás, mas isso não é debate.
É um verdadeiro acinte à causa da democracia e do processo civilizatório que um caso da dimensão e do significado do "8 de janeiro" não seja julgado publicamente pelo STF, como foi o do mensalão (AP-470).
Sabemos que a ferramenta do plenário virtual veio para viabilizar o julgamento em tempo razoável da enorme quantidade de casos em trâmite na corte. Todavia, ao menos o julgamento de ações penais deve ser público no sentido pleno da palavra.
Outro lado da questão é o verdadeiro cerceamento ao direito de defesa no poder de convencimento dos ministros. A sustentação oral se faz olhando nos olhos dos juízes, não sozinho entre quatro paredes.
Como apropriadamente alertaram os advogados Mário Luiz Oliveira da Costa, presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp), e Renato Silveira, professor da USP e presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), a sustentação oral "é uma das etapas mais bonitas e valiosas do processo, em que advogados e julgadores podem interagir e contribuir para uma melhor prestação jurisdicional, que efetivamente examine os principais fundamentos jurídicos (e, quando o caso, fáticos) envolvidos, colocando-se o patrono da causa —que tem obrigação de dominar todos os aspectos em debate— à disposição dos julgadores para prestar quaisquer esclarecimentos que possam auxiliar a uma melhor compreensão da lide posta a exame" ("Sustentações orais e sessões virtuais de julgamento – um convite ao diálogo"). Não por acaso, o ex-ministro Celso de Mello afirmava que ela "traduz prerrogativa jurídica de essencial importância", compondo o "estatuto constitucional do direito de defesa" (HC nº 86.551)
Esse momento privilegiado na interlocução deixa de existir quando o advogado "manda" sua sustentação oral, ou, na linguagem da internet, faz um "upload" dela.
E fica a pergunta: se o juiz não quer ouvir o advogado em tempo real na sessão presencial, ou mesmo na telepresencial, que funciona muito bem, por que haveria de querê-lo em casa? Quem garante que os argumentos orais da defesa serão ouvidos? Quiçá por um assessor? É uma ilusão.
A Justiça, numa democracia, não pode funcionar assim, como uma espécie de fordismo na linha de produção de julgamentos. Perdemos todos com essa maneira menos transparente de julgar e se compromete gravemente o direito de defesa. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
WhatsApp passa a pedir autorização para acessar conta em outro celular; veja novas medidas de segurança
- Detalhes
Aplicativo anunciou novidades para evitar clonagem, prevenir programas maliciosos e fortalecer criptografia
Nova verificação de registro pedirá autorização em aparelho antigo conectado à conta. O aviso informa horário da tentativa de acesso e o dispositivo usado. O usuário ainda terá que confirmar a operação em uma segunda tela. - Divulgação/WhatsApp
SÃO PAULO
Para acessar a conta de WhatsApp em um novo aparelho, usuários precisarão aprovar o procedimento no celular antigo. A novidade visa alertar sobre tentativas não autorizadas de transferência do perfil a outro dispositivo, e foi anunciada pela Meta nesta quinta-feira (13).
A transferência costuma ser a primeira etapa do golpe do WhatsApp clonado, em que terceiros conseguem entrar na conta da pessoa.
Atualmente, é preciso inserir um código de verificação enviado por SMS na hora de um efetuar um novo login. No entanto, golpistas conseguem burlar o reconhecimento, entrando em contato com o alvo e simulando precisar dos caracteres informados pelo WhatsApp para prestar algum serviço.
A necessidade de autorização no celular anterior serve como mais uma etapa de proteção, de acordo com comunicado divulgado pelo aplicativo de mensagens.
O WhatsApp também diz ter reforçado a segurança contra programas maliciosos, que podem explorar o telefone sem autorização do dono. O aplicativo adicionou etapas de verificação automática para evitar acesso de desconhecidos além do dono do celular.
A empresa também vai passar a informar se uma conversa é protegida por criptografia. Basta selecionar o contato desejado e clicar no botão "Criptografia". Já era possível confirmar essa medida de segurança, mas o aplicativo requeria a leitura de um QR Code.
As três medidas pretendem reforçar a proteção de contas no WhatsApp, segundo a Meta.
A empresa recomenda ainda que os usuários habilitem as opções de verificação em duas etapas e de backups protegidos com criptografia de ponta a ponta. A primeira se refere à habilitação de uma senha de seis caracteres para se conectar ao WhatsApp; a segunda, à proteção das conversas armazenadas na nuvem.
Nesta semana, o WhatsApp ainda anunciou outras novidades, como a liberação de um novo sistema de pagamento pelo aplicativo e a versão beta um novo modo que permite conectar até quatro celulares a uma única conta. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
Barbárie nas redes sociais
- Detalhes
Ataques a escolas evidenciam que plataformas digitais precisam agir para conter violência
A covardia e a barbárie dos recentes ataques a escolas no País jogaram luz sobre a violência que se propaga na internet e sobre o papel das redes sociais na incitação a esse tipo de crime. Uma amostra do tamanho do problema acaba de ser divulgada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública: em poucos dias, a recém-lançada Operação Escola Segura solicitou a exclusão de 431 contas do Twitter que continham palavras-chave − as chamadas hashtags − relacionadas a ataques contra escolas em diferentes localidades do Brasil. Foram feitos pedidos também à plataforma TikTok para que retirasse do ar três perfis cujo conteúdo relacionado ao tema buscava espalhar medo na população.
Infelizmente, tais contas são apenas a ponta do iceberg − e que as redes sociais abrigam um volume infinitamente maior de grupos que se valem do mundo virtual para estimular a prática de atentados em estabelecimentos de ensino. Não surpreende, portanto, que as atenções se voltem para as plataformas digitais e para a sua responsabilidade no sentido de impedir a propagação de crimes. Sem dúvida, essas empresas têm muito a fazer, e se engana quem pensa que a internet é terra sem lei.
No Brasil, o Marco Civil da Internet define direitos e obrigações para usuários e provedores. Eis uma realidade que não pode passar despercebida: por mais que aperfeiçoamentos legislativos sejam sempre bem-vindos, o País dispõe de um marco legal sobre o tema − e é a partir dele que as redes sociais devem pautar sua atuação.
As plataformas digitais podem e devem agir para evitar a disseminação de conteúdos flagrantemente ilegais. Mais ainda quando esses conteúdos buscam incentivar a prática de crimes bárbaros. Condições técnicas, por óbvio, elas têm de sobra. Prova disso é que são ágeis na hora de impor seus termos de uso, impedindo que usuários infrinjam as regras de compartilhamento de informações. Algo que fica evidente, por exemplo, no bloqueio de conteúdos pornográficos em redes sociais que proíbem esse tipo de postagem.
Sob o Marco Civil da Internet, as plataformas têm obrigações a cumprir − e não podem ficar indiferentes ou deixar de agir quando cientes e notificadas de crimes. O esforço para conter a atuação de quem incita ataques a escolas é um desafio gigantesco, e todos devem fazer a sua parte. No caso dos meios de comunicação, cabe destacar a responsabilidade de veículos como o Estadão, que decidiu não publicar nome e foto dos agressores nem vídeos dos recentes atentados, a fim de evitar o chamado “efeito contágio”, considerando que esse tipo de criminoso, não raro, busca também visibilidade.
O uso da internet e de redes sociais em ataques a escolas, assim como em outros crimes bárbaros, é fenômeno global − um triste sinal dos tempos que precisa ser combatido com rigor e redobrado empenho também no mundo virtual. Eis uma tarefa para múltiplos atores, desafio que requer a ação do governo e da sociedade. Evidentemente, parte importante dessa responsabilidade cabe às plataformas, que podem e devem agir mais. Fonte: https://www.estadao.com.br
"A morte é distanciamento físico, o que a gente deixa é eterno"
- Detalhes
Ator Leo Bahia e médico Gerson Salvador falam sobre o filme Depois do Universo
Cynthia Araújo
CADA PESSOA VÊ UM SIGNIFICADO DIFERENTE, MAS, PARA MIM, MOSTRA COMO A MORTE É UM DISTANCIAMENTO FÍSICO: AS IDEIAS, OS MOMENTOS QUE A GENTE COMPARTILHA, OS ENSINAMENTOS QUE PODE DEIXAR PARA ALGUÉM, ISSO É IMORTAL, ETERNO. EU SINTO QUE O FILME MOSTRA COMO PODEMOS DIALOGAR COM A VIDA E O MUNDO, TÃO COMPLEXOS, DE DIFERENTES ÂNGULOS
LEO BAHIA
No final do ano passado, vi no catálogo da Netflix que um filme brasileiro estava entre os mais vistos da plataforma no mundo.
Depois do Universo estreou no dia 27 de outubro de 2022. Logo me chamou a atenção, porque reúne duas coisas que me interessam muito: histórias sobre pessoas com doenças graves e enredos em que pianos têm um papel importante. O filme conta a história de Nina (Giulia Be), uma pianista que tem lúpus e precisa de um transplante de rim.
Eu fiquei ainda mais interessada pelo filme ao saber que o querido amigo Gerson Salvador foi consultor técnico do filme. Gerson era nosso colega aqui na Folha de São Paulo e escrevia o Blog "Linha de Frente". Antes mesmo de assistir, pedi a ele uma entrevista para o Morte sem Tabu, porque acho fantástico quando as obras no audiovisual se preocupam com a qualidade das informações que passam, especialmente quando envolvem questões de saúde.
Logo nos primeiros minutos do filme, outra feliz surpresa. Leo Bahia, que eu havia conhecido alguns meses antes no teatro, como Marilton Borges do musical "Os sonhos não envelhecem", interpreta Yuri, um dos personagens mais carismáticos e sensíveis de Depois do Universo.
Abaixo você confere as entrevistas que realizei com o médico infectologista e escritor Gerson Salvador e com o ator, cantor e compositor Leo Bahia.
MORTE SEM TABU: Como é o trabalho de um médico consultor técnico no audiovisual?
GERSON SALVADOR: Na minha experiência, a consultoria técnica pode acontecer desde o roteiro até a produção, inclusive no set de filmagem.
A primeira consultoria técnica que eu fiz para audiovisual foi na série documental da Netflix Mundo Mistério, em que o apresentador Felipe Castanhari explora mistérios da ciência e da história. Eu fiz uma pesquisa para o episódio sobre a Grande Peste para dar suporte técnico para o roteiro. Então eu respondia perguntas e também revisava o texto final.
No filme Depois do Universo, com apoio de uma equipe de especialistas, eu trabalhei desde o roteiro até a produção, em diferentes etapas. Colaboramos com o laboratório do protagonista Gabriel (Henrique Zaga), que interpreta um médico que atua no SUS. Depois trabalhamos junto com o pessoal da direção de arte, cenografia e figurino. Na maquiagem, participamos especialmente da caracterização da Nina (Giulia Be), que é a outra protagonista, porque são apresentadas alterações no corpo em razão da doença que ela tem, lúpus. Também orientamos atores em cena, quando as gravações eram relacionadas a questões médicas.
O último trabalho de consultoria técnica que fiz foi para a 3ª temporada da série da Universal TV "Unidade Básica".
MORTE SEM TABU: Em qual momento você foi convidado para participar do filme?
GERSON SALVADOR: Um dos produtores do filme, Luciano Reck, fez o convite para o projeto ainda na fase de roteiro. Nessa fase da consultoria para o roteiro, eu trabalhei diretamente com o diretor e roteirista Diego Freitas, que tinha uma grande preocupação tanto de fazer um filme verossímil, representando as coisas como são e acontecem, quanto de ser respeitoso com as pessoas que tem lúpus, que fazem hemodiálise, aguardam transplante.
MORTE SEM TABU: Que tipo de informações são importantes no roteiro e na produção de filmes que contam a história de pessoas com doenças graves?
GERSON SALVADOR: O filme Depois do Universo conta a história da Nina, uma jovem que tem uma doença crônica, e quer passar a mensagem de que a doença não define um indivíduo. Apesar de ter lúpus com manifestações graves, como uma doença renal crônica, que exige a hemodiálise, ela mantém o sonho de ser pianista na Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo. Muitas pessoas em situações semelhantes podem se identificar com a história e se sentir representados nessa ideia de que nossa vida vai muito além da doença, que podemos fazer muitas coisas com e apesar dela.
Em relação à produção, foi desafiador encontrar locação em hospital, então o pessoal da arte construiu um hospital cenográfico. Foi muito importante trabalhar com a equipe de cenografia desde as primeiras plantas e ver o hospital construído. Também trabalhamos com a equipe de figurino discutindo os trajes dos profissionais de saúde; com a equipe de maquiagem, especialmente para a caracterização da Nina, em que incluímos marcas no rosto características do lúpus, que a gente chama de "rash malar"; e fístula em seu braço que foi feita pela maquiadora com o suporte de um cirurgião vascular de nossa equipe.
Foi uma experiência muito especial para mim, tanto pelo que aprendi, quanto pelos excelentes profissionais que conheci.
MORTE SEM TABU: No filme, Nina tem lúpus e precisa fazer sessões de hemodiálise, mas, em dado momento, sua situação de saúde se agrava e ela precisa encontrar logo um doador ou uma doadora de rim. Pode falar um pouco sobre a relação entre o lúpus e o comprometimento dos rins?
GERSON SALVADOR: O lúpus eritematoso sistêmico é uma doença que afeta o corpo em diversos aparelhos. Pode dar lesões de pele, alterações nas articulações, no sangue, no sistema nervoso central, pode inflamar a membrana que envolve o coração (pericárdio), e pleura que envolve o pulmão, o peritônio, que fica no abdômen. E pode também causar doença renal crônica, que acontece em 10 a 30% dos casos. É uma doença que acomete mais frequentemente mulheres jovens, como a protagonista Nina.
MORTE SEM TABU: Na sua experiência, é comum a doação de órgãos entre vivos? Em quais casos costuma acontecer?
GERSON SALVADOR: Eu nunca trabalhei diretamente com transplante, mas, sobre a doação de órgãos entre pessoas vivas, acho importante dizer que o doador ou a doadora precisa ter boas condições de saúde, ser capaz juridicamente, estar de acordo com a doação, tem que ter no mínimo 21 anos. Essa pessoa passará por uma avaliação geral de saúde, não pode ter insuficiência renal, precisa avaliar o risco cirúrgico e, claro, precisa fazer testes de compatibilidade, para evitar a rejeição do órgão, que poderia causar até mesmo a morte do receptor.
Diferente do que acontece na doação de órgãos de pessoas falecidas, em que existe uma lista única por ordem de entrada, requisitos de urgência e compatibilidade e condição clínica, pessoas vivas podem doar órgãos para familiares ou, mediante autorização judicial, para terceiros.
É importante destacar que o Brasil tem o maior programa público de transplantes do mundo, garantido a toda a população por meio do SUS, que é responsável pelo financiamento de cerca de 88% dos transplantes no país.
MORTE SEM TABU: Por que as pessoas leitoras do Morte sem Tabu devem assistir a Depois do Universo?
GERSON SALVADOR: O Morte sem Tabu é um espaço de reflexão ética sobre finitude. Depois do Universo, além de ser uma história muito bonita, por falar sobre sonhar e amar apesar da doença e das limitações que ela traz, tem muitas reflexões éticas sobre adoecer e morrer, além de ser um linda história de amor e arte. Então acredito que os leitores do blog irão gostar muito.
MORTE SEM TABU: Eu sei que você já fez trabalhos na televisão, mas fiquei apaixonada pela sua atuação no musical "Os sonhos não envelhecem". Conta para as pessoas que conheceram você em Depois do Universo sobre a sua trajetória?
LEO BAHIA: Quando era mais novo, eu queria fazer vestibular para Medicina, mas, enquanto tentava ser aprovado, comecei a me interessar por música e fazer aula de canto. Eu tinha alguns amigos que estavam fazendo a versão de 2008 da peça "O Despertar da Primavera" e eles sugeriram que eu fizesse um teste. E aí eu percebi que conseguia passar muito mais horas envolvido nesse universo, estudando texto e me preparando para esse teste, do que para qualquer outra coisa que eu já tivesse tentado fazer antes. Foi a primeira vez que eu me vi verdadeiramente focado, com a atenção totalmente voltada para algo que eu estava amando fazer.
Eu não consegui o papel, mas, quando voltei para o cursinho pré- vestibular, em uma aula de física, percebi que Medicina não fazia mais sentido para mim.
Então eu resolvi fazer vestibular de Música na Unirio, com habilitação em canto lírico, que depois também vi que não era bem a minha praia. Mas eu já estava muito inserido no mundo da Música e do Teatro, fiz parte do programa de teatro musical da universidade e fiquei um tempo envolvido com musicais. Em 2016, comecei a migrar para o audiovisual, onde me encontrei como ator. E hoje eu também trabalho em composições musicais, algo que eu quero explorar cada vez mais. Eu vejo a Música como um meio muito potente de compartilhar processos e ideias.
MORTE SEM TABU: Como surgiu o Yuri?
LEO BAHIA: Foi paixão à primeira vista. A produtora de elenco Vanessa Veiga me convidou para fazer esse teste e eu me identifiquei muito com o Yuri. O roteiro do Diego Freitas e da Ana Reber é muito rico, muito complexo e dá muitas camadas a todos os personagens. É um humor muito bem escrito e todas as facetas do Yuri estavam ali, era ler e entender de que forma eu iria entrar naquele personagem que já estava pronto, descobrir as minhas partes em comum com ele. Foi realmente um casamento, um processo de preparação muito gostoso.
MORTE SEM TABU: Você se inspirou em alguém para compor o Yuri?
LEO BAHIA: Eu me inspirei muito naquele Leo que queria estudar Medicina, mas ao mesmo tempo não compartilhava muitos interesses com o universo que envolve a Medicina. O Yuri é um médico meio perdido, talvez meio fora de lugar, quem sabe por não ter tanto empenho por aquele trabalho específico, como tem o protagonista Gabriel. Eu sinto que o personagem tem muito daquele Leo que não conseguia focar no estudo para o vestibular de Medicina, porque era atravessado por outros sentimentos, outros interesses. No caso do Yuri, ao menos naquele momento do filme, ele está muito mais voltado para suas questões amorosas.
MORTE SEM TABU: Quais as dificuldades de interpretar um personagem com veia cômica em uma obra dramática?
LEO BAHIA: Eu acho uma delícia encontrar esses pontos de soltura nas obras dramáticas, encontrar o contraponto. O Yuri, embora traga essa leveza para o filme, dialoga com todas as suas complexidades. Acho que é um pouco a forma como eu encaro a vida, com leveza diante das dificuldades e problemas, mas também mergulhando em suas águas profundas. Ele é aquela pessoa que alivia as dores, que traz um pouco de humor, com quem você pode contar, apesar de também ter os seus próprios problemas. Eu gosto de rir dos problemas, até me divertir com eles, acho que faz os monstros ficarem um pouco menores. É claro que nem sempre a gente consegue, mas, para mim, buscar essa leveza se tornou uma condição de sobrevivência, porque as situações difíceis sempre vão existir. Se eu puder rir um pouco delas, isso me ajuda até mesmo a encontrar caminhos diferentes para resolver e organizar a vida.
MORTE SEM TABU: Como você recebeu o final do filme?
LEO BAHIA: Eu acho o final de Depois do Universo muito bonito, muito sensível. Cada pessoa vê um significado diferente, mas, para mim, mostra como a morte é um distanciamento físico: as ideias, os momentos que a gente compartilha, os ensinamentos que pode deixar para alguém, isso é imortal, eterno. Eu sinto que o filme mostra como podemos dialogar com a vida e o mundo, tão complexos, de diferentes ângulos. E, embora seja surpreendente de certa forma, eu acho que o final sintetiza bem a mensagem que ele quer passar.
MORTE SEM TABU: Quais são os seus próximos projetos?
LEO BAHIA: Eu estou na nova série dramática da Globoplay, "O Jogo que mudou a História", com um personagem apaixonado por futebol que é viúvo, tem um filho e é muito diferente do Yuri. A série conta a história da guerra do tráfico entre os bairros cariocas Parada de Lucas e Vigário Geral, que começou com um jogo de futebol. Eu também estou gravando uma música para um projeto chamado "Vale a pena gravar de novo", sobre o lado B da Música Popular Brasileira, que é um projeto incrível. Será meu primeiro single e estou muito animado, doido para lançar. Assim que sair, mando para vocês incluírem na playlist do blog. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
'A vida não vale a pena ser vivida', dizem adolescentes
- Detalhes
Por Carolina Delboni
A saúde mental dos adolescentes está em crise e ela só vai sair deste buraco se afeto, gentileza e escuta forem as principais vias na construção da relação entre eles e os adultos
Corre ao cinema ou às plataformas de streaming para assistir ao filme O Filho. Uma história inspirada em muitas histórias reais e que termina com uma dedicatória: "a Gabriel". Gabriel era um menino com depressão crônica, filho de pais separados, que abandonou a convivência em sociedade porque era dolorido demais viver.
Isso: dor da vida. Para alguns, viver é mais dolorido que morrer. Num determinado ponto do filme, Nicholas, como é chamado o personagem que vive o adolescente, é internado no hospital e os médicos psiquiatras insistem aos pais para mantê-lo ali, pois ele precisa de tratamento psiquiátrico e químico.
Eu não vou contar como o filme se desenrola, obviamente, mas sugiro que assistam e prestem atenção aos inúmeros diálogos que o pai tem com o filho. À escuta, à disposição em estar presente, o carinho, o afeto, a segurança do abraço.
Independente do desenrolar da história, se faz presente uma relação respeitosa e amorosa entre pai e filho num momento em que este menino adolescente deprime de tanta dor em viver. Mas onde eu quero chegar? Continua comigo.
Ir mal em uma prova, não ser aceito num grupo de colegas, se achar feio em uma determinada roupa ou achar que não passará em uma boa faculdade são situações que, em um primeiro momento, parecem comuns na vida de um adolescente.
Os exemplos corriqueiros que citei acima apareceram em relatos colhidos em Fairfax, nos Estados Unidos, em 2014, e foram contados no The Washington Post pela colunista Petula Dvorak recentemente. Apesar da aparente distância espacial e temporal com nossa realidade, as situações descritas apontam para uma atualidade em que adolescentes ainda enfrentam barreiras e falta de apoio para dar conta dos problemas de saúde mental. Falta suporte. Falta apoio. Falta escuta.
Continua após a publicidade
Em certos contextos - como o que vivemos atualmente e muito bem definiu o doutor em História Social, Dante Gallian quando diz que existe uma epidemia de transtornos mentais na sociedade e precisamos entender qual a vacina para isso - elas podem ganhar contornos assustadores.
No Brasil, um dos estudos mais usados para tratar desse assunto é a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A sua edição mais recente é de 2019 e mostra que cerca de um terço dos estudantes de 13 a 17 anos sentiam-se tristes na maioria das vezes ou sempre. E 21,4% sentiam que a vida não valia a pena ser vivida.
Em 2019, 21% dos adolescentes entrevistado na pesquisa PenSe disseram que a vida não valia ser vivida
Veja: "a vida não valia a pena ser vivida". Como pode este pensamento sair da cabeça de jovens num dos exatos momentos em que a vida mais pulsa? O que leva adolescentes, aqueles que a gente julga ser "o futuro", a desistir da vida? A perder o brilho nos olhos. Não é possível que este fato não te incomode.
O estudo contempla dados de 2019. Estamos falando de antes da pandemia e é inegável que após dois anos de isolamento social tivemos pioras significativas no brilho dos olhos de nossos jovens e eu te pergunto: como permitimos que a luz se apague justamente numa das fases mais explosivas e empolgantes da vida? Como?
A pandemia do coronavírus levou esse grupo a novos casos de ansiedade e depressão, segundo apontou uma pesquisa da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), o que só agravou a fase já conturbada da vida que é a adolescência.
"A gente vem observando um aumento de manifestações de sofrimento. Há muita decepção e uma sensação de desespero junto disso", aponta Leila Salomão, professora do Instituto de Psicologia da USP.
Continua após a publicidade
Na busca por alternativas a esse cenário, faz-se necessária a importância de uma rede de apoio aos adolescentes. Dos pais aos amigos, educadores e colegas, vários são os pares que podem ficar atentos à saúde mental desse grupo.
Mas aqui vai um alerta: os pais nem sempre são os mais preparados e procurados pelos filhos e muito disso está diretamente relacionado a um descompasso que existe entre os adultos e os adolescentes. E sabe por quê?
Porque o adulto tende a desvalorizar a dor do adolescente. Tende a minimizar o sofrimento do adolescente. Tende a menosprezar o sentimento que vive dentro do adolescente.
Eu já trouxe esse assunto aqui e talvez ele seja dos mais urgentes na atualidade. É preciso aprender a escutar a dor do outro com mais empatia e gentileza. É preciso descer do salto da autoridade parental para se relacionar com o filho adolescente de maneira mais próxima e humana.
"O adulto precisa estar presente e compreender. O entorno precisa estar preparado para estabelecer um diálogo e compreensão sem muita invasão. Os filhos precisam sentir que podem contar com os pais", recomenda Leila Salomão.
Veja: "os filhos precisam sentir que podem contar com os pais". Seu filho conta com você? Seu filho te conta o que passa dentro da cabecinha dele? Ele fala das angústias, dos medos e receios?
Eu sei que você vai me dizer que adolescentes não falam, são monossilábicos, e eu vou discordar. Eles podem falar pouco ou menos do que os adultos gostariam, mas eles falam. E mais ainda, eles escutam. Capacidade esta quase em extinção na vida humana dos seres crescidos.
Continua após a publicidade
Nós, adultos, perdemos nossa capacidade de escutar o outro. A gente ouve com o sentido, mas não escuta com o sentimento. E dessa forma, a relação de confiança entre pais e filhos tão recomendada é comprometida quando os primeiros não têm plena noção do que está se passando com os segundos - inclusive fisicamente.
Isso porque a fase da adolescência traz por si só um sofrimento natural explicado por diversos fatores, entre eles as alterações hormonais e também pelo fato de a região do cérebro que "regula as emoções" ainda não estar completamente desenvolvida, o que pode acontecer até os 25 anos de idade.
Além disso, é o momento que o adolescente se depara com mais emoções sem ter experiência de vida suficiente para lidar com elas. Mas nem sempre os adultos têm noção de tudo isso. "De vez em quando ele vai falhar, é natural dentro desse processo, mas a gente tem pouca paciência com eles. Eles se sentem injustiçados e isso separa mais as gerações", diz a professora Sabine Pompéia, do departamento de Psicobiologia da Unifesp.
Lembra da caixinha de experiências que eu falei alguns textos atrás? É dela que estamos falando aqui. E o segredo desta relação está no equilíbrio entre a compreensão e a cobrança para que a gente possa empoderar o adolescente estimulando que ele gerencie suas próprias emoções.
"O ponto é: aceitar que ele seja assim, mas tentar corrigir. Tem que pegar no pé, mas estar aberto para acolher quando dá errado. Se não tem esse diálogo com os adultos, o adolescente se isola muito e ele fica em um risco muito maior [de se expor à depressão]", completa Sabine.
Nesse caminho, os pais podem cair na armadilha do "você está exagerando" quando o filho está lutando contra problemas de saúde mental. Mas como fazer diferente? Como conseguir ajudar o adolescente a fortalecer seu controle emocional nessa fase tão complicada da vida?
"Parte de como podemos ajudar os mais jovens é normalizando o estresse", indicou a psicóloga Lisa Damour em entrevista ao The Washington Post. Ela também lembra da importância de se mostrar aberto e caloroso mesmo nos momentos mais simples - aqueles que muitas vezes parece "banal" - da vida do adolescente.
Continua após a publicidade
Ou seja, não ser um pai ou mãe "limpador de para-brisa". O que estou querendo dizer? Em uma forte chuva, o limpador de para-brisa vai freneticamente de um lado para o outro para manter a visão do motorista mais clara possível, certo? Na relação entre pais e filhos, as coisas não devem funcionar exatamente assim.
Quando o adolescente se atrapalha na entrega de uma tarefa, por exemplo, ou se depara com algum outro problema, nem sempre é papel dos pais tomar as rédeas e resolver a situação sozinhos. Adolescentes devem ser estimulados a tirar proveito das experiências de erro. Nesses casos, funciona mais os pais se mostrarem abertos a escutar e reduzir a intensidade de pensamentos negativos do que sair secando chuva.
Também é preciso dar esperanças - no plural mesmo. O estresse acentuado pelo qual um adolescente passa é natural. Mas, quando ele passa do ponto - dando sinais comportamentais como apatia ou muita agitação - e chega a níveis de depressão e ansiedade, é importante que o adolescente saiba que aquilo não é permanente e que os sintomas de uma depressão não vão defini-lo.
Pergunte sobre pensamentos de automutilação. Nos últimos anos, a prática tem chamado atenção de pais e especialistas. No filme, O filho, o pai do adolescente Nicholas enlouquece quando vê que o menino continua a se cortar. Ele não entende o que pode estar acontecendo e pergunta insistentemente ao filho por quê ele faz aquilo.
Nicholas diz que é para tirar a dor que carrega dentro do peito. É para desfocar do sentimento que ele não consegue suportar e para isso, ele precisa produzir alguma outra dor. E é esta a resposta em 99% dos casos de mutilação de adolescentes.
O que fazer? A recomendação é ouvir, escutar e deixar claro que o adolescente tem apoio. A gente precisa começar a dar apoio aos adolescentes. A gente precisa começar a cuidar dos machucados que eles fazem.
Por que é que a gente corre e acode uma criança quando ela cai e não faz o mesmo com o adolescente? Adolescentes se machucam e também precisam de carinho, de band-aid dentro do peito. E como é que a gente faz isso? Mostrando que se importa.
Continua após a publicidade
O psiquiatra americano Jerome Motto percebeu que quando médicos enviavam mensagens de check-in atenciosos a seus pacientes, eles sentiam-se mais valorizados e, o que poderia ser um ato pequeno ou até burocrático, passou a ser uma ferramenta importante capaz de reduzir significativamente o risco de suicídio de uma pessoa - isto inclui um adolescente.
Onde estou querendo chegar? Ao início deste texto: em 2019, 21% dos nossos adolescentes disseram que a vida não valia a pena. Vivemos um colapso, uma crise de saúde mental na adolescência e as melhores ferramentas ainda são a escuta, o afeto e gentileza para com o outro.
A gente vive a negligência absoluta à saúde mental desta geração e ela já nos deu sinais de que não dá conta de tamanha dor, de tamanha violência. Adolescentes também precisam ser cuidados. E tenho certeza que somos capazes. Fonte: https://www.estadao.com.br
O abismo humano em Blumenau
- Detalhes
Terminei a semana mais convencido de que não somos superiores às outras formas de vida
Fernando Gabeira
Jornalista e escritor
Este artigo foi sacudido pelos acontecimentos de Blumenau: um homem de 25 anos matando quatro crianças a machadadas.
No entanto ele começava suave, com lembranças de Dona Vanna, da Livraria Leonardo da Vinci, no Rio. Ela viajava sempre e trazia novos livros. Numa das últimas viagens, trouxe, entre outros, um que me interessou pelo título e pela capa: “Android Epistemology”. É uma reflexão teórica sobre as máquinas pensantes, e a capa colorida mostrava alguns recortes da figura humana, entrelaçados por fios coloridos. Nem todos os artigos são acessíveis a um leigo como eu. Destaquei algumas frases de um deles e pensava em trabalhar com ela:
— A oposição à teoria dos androides é uma das últimas resistências à demolição científica da ideia da condição única e especial dos humanos e de sua posição no Universo.
Coincidência, pensei. A ecologia que estudo há alguns anos também coloca em xeque o antropocentrismo, a suposição da superioridade humana sobre outras espécies. Os seres humanos não são os únicos para quem o mundo existe. No passado, essa ideia era tão forte que, segundo ela, o cocô de cavalo não tem cheiro desagradável porque o animal foi desenhado por Deus para acompanhar os humanos.
O livro trazido por Dona Vanna tinha uma sátira aos humanos, produzida por uma civilização de máquinas que visitava a Terra. Elas se perguntavam por que somos tão violentos. E a resposta era porque toda a nossa evolução foi feita a ferro e fogo, com garras e dentes. E por que éramos tão perigosos? Somos mortais e, por causa disso, temos pouco a perder.
Estava juntando algumas ideias para tentar responder a um amigo que me disse que o mundo estava virado. E está sim. Um sociólogo que morreu em 2015, Ulrich Beck, dizia que o mundo vivia uma metamorfose, algo diferente de uma revolução, que é intencional. Vivemos consequências descontroladas da modernização. O país não é mais referência, porque o mundo está interligado, classes sociais não nos explicam mais, mas classes de risco diante das ameaças das mudanças climáticas.
Neste mundo de pernas pro ar, creio que o meio ambiente e o avanço do meio digital de uma certa maneira acabarão por nos dar uma outra e mais modesta dimensão do humano.
Nada neste artigo poderia explicar o fato de que um homem matou crianças a machadadas em Blumenau. A globalização, diferente do colonialismo, que se justifica pela suposta inferioridade do colonizado, tem pelo menos um horizonte normativo: os direitos humanos.
Mas um crime dessa natureza também nos obriga a reexaminar o que é o humano. Sou plenamente favorável às restrições que a imprensa adotou na cobertura de casos como esse. No entanto sou favorável à discreta busca do conhecimento. Na década de 1970, creio, o FBI (a Polícia Federal dos Estados Unidos) criou um grupo especial para fazer longas entrevistas com criminosos em série. Como funcionavam essas mentes, que gatilhos acionam sua violência extrema? Foi por meio das pesquisas atuais sobre a influência de contágio de crimes espetaculares que a imprensa se inspirou para mudar seu comportamento diante deles.
Não sei precisamente a que levaria um esforço redobrado de conhecimento do tipo de mente criminosa que ataca crianças em escolas. Já tivemos um caso em Minas; outro em Saudades, Santa Catarina; e este em Blumenau. Minha esperança é que saiam algumas indicações para uma política preventiva.
Teremos 50 policiais vigiando redes sociais, mas precisam ser alimentados por informação adequada. Nem sempre poderão contar com bons indícios.
Terminei a semana mais convencido de que não somos superiores às outras formas de vida e, agora, com o livro que Dona Vanna trouxe, nem de que somos também os mais inteligentes. Fonte: https://oglobo.globo.com
Ataque contra creche deixa quatro crianças mortas em SC
- Detalhes
Ambulâncias e policiais em frente à creche Cantinho Bom Pastor, em Blumenau (SC), onde um homem de 25 anos matou quatro crianças nesta quarta (5) - Denner Ovidio/Reuters
Autor tem 25 anos, usava uma machadinha e foi detido; as vítimas são três meninos e uma menina
BLUMENAU (SC), SÃO PAULO, PORTO ALEGRE e CURITIBA
Um homem de 25 anos invadiu a creche Cantinho Bom Pastor, em Blumenau (SC), e matou quatro crianças, segundo informações da Polícia Militar e do Corpo dos Bombeiros do estado. As vítimas são três meninos e uma menina, com idade entre 5 e 7 anos.
Uma machadinha foi usada na ação, segundo o tenente Márcio Filippi, comandante do 10º BPM (Batalhão da Polícia Militar). Conforme as informações iniciais, o assassino chegou em uma moto, pulou o muro e escolheu as vítimas aleatoriamente. Ao perceber que as professoras correram para proteger as demais crianças, ele decidiu fugir pulando novamente o muro.
Segundo a polícia, o autor não tinha aparentemente nenhuma ligação com a creche.
Outras quatro crianças feridas foram socorridas e levadas para o hospital Santo Antônio. De acordo com a unidade, são duas meninas de 5 anos e dois meninos de 5 e 3 anos, nenhum em estado grave.
De acordo a PM, o autor do ataque se entregou no 10º BPM e se manteve calado.
Uma das professoras da creche disse que trancou a sala onde se encontravam os bebês para tentar protege-los. Ela confirmou que uma das armas utilizadas pelo autor era uma machadinha.
O prefeito de Blumenau, Mário Hildebrandt (Podemos), e o delegado Ulisses Gabriel, chefe da Polícia Civil de Santa Catarina, afirmaram em entrevista à Rádio Gaúcha que ainda não se sabem as motivações para o crime. De acordo com o delegado, o suspeito será interrogado nas próximas horas.
O governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), decretou luto oficial de três dias no estado. "O assassino já está preso. Que Deus conforte o coração de todas as famílias neste momento de profunda dor", afirmou.
"Não há dor maior que a de uma família que perde seus filhos ou netos, ainda mais em um ato de violência contra crianças inocentes e indefesas", escreveu Lula.
O clima em frente à creche, localizada na rua dos Caçadores, bairro da Velha, é de consternação e busca por informações. Há mobilização de bombeiros e policiais para atender familiares.
Além de funcionar como creche e pré-escola, a unidade oferece no contraturno atividades educativas para alunos de escolas públicas conveniadas.
Em nota, o Ministério Público de Santa Catarina disse que vai acompanhar todos os desdobramentos nos âmbitos criminal e cível, "mas, no momento, quer externar sua profunda tristeza com o ocorrido e prestar condolências aos familiares das vítimas e aos envolvidos nessa tragédia que abala a todos os catarinenses".
AULAS CANCELADAS
Em nota, a creche Cantinho Bom Pastor afirma que ajudará nas investigações e que se solidariza com as famílias.
"Estamos desolados com a tragédia ocorrida no dia de hoje no nosso ambiente escolar, sofrendo terrivelmente e sentindo as dores que afeta cada criança, familiar e amigo. Ainda estamos tentando entender o ocorrido, que atinge o que nos é mais sagrado: a integridade de nossas crianças, que sempre foram aqui recebidas com amor e carinho", declarou a instituição.
A Prefeitura de Blumenau informou que as aulas da rede municipal foram suspensas nesta quarta-feira. Na rede estadual, o governo cancelou as aulas em todo o estado nesta quarta e quinta (6). Outras atividades, como a comemoração oficial da Páscoa em um parque da cidade, também foram canceladas.
A prefeitura afirma que o serviço de psicologia do município está à disposição das famílias. "Lamentamos profundamente essa tragédia que causa uma triste marca na história da nossa cidade. Que Deus possa confortar o coração de todas as famílias", disse o prefeito Mário Hildebrandt, segundo a prefeitura. Fonte: https://www1.folha.uol.com.br
Multiversos
- Detalhes
Só acreditando em universos paralelos é possível entender que tanta gente continue dando a Bolsonaro apoio consolidado
Por Merval Pereira
O guru da extrema direita mundial Steve Bannon disse em entrevista à Folha de S. Paulo que a questão das joias das Arábias não tem a menor importância e que Bolsonaro continua com a mesma força, assim como Trump nos Estados Unidos. Estou entre os que não gostaram do vencedor do Oscar “Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo”, mas devo admitir que só acreditando em universos paralelos é possível entender que tanta gente continue dando a Bolsonaro apoio consolidado.
As lambanças que andou fazendo não afetam a militância. Ele está ferido de morte com quem não é bolsonarista nem extremista e o preferiu ao PT pelo que considerava um mal menor. Esse grupo, que é forte, está desembarcando dele, mas não embarca no PT, não da maneira como o governo vai se conduzindo, repetindo comportamentos que pareciam exclusivos de Bolsonaro, mas acabam se revelando uma posição comum a autocratas.
Juca Chaves morreu, e o governo que preza a cultura foi incapaz de enviar uma manifestação de pêsames, assim como Bolsonaro se calou diante da morte de Gal Costa ou de Erasmo Carlos. Juca Chaves é o autor de uma modinha satírica sobre o mensalão que o colocou no índex petista, assim como Gal e Erasmo eram considerados inimigos pelos bolsonaristas. Bolsonaro vivia às turras com os jornalistas, e o ministro da Secretaria de Comunicação Social de Lula, o jornalista acidental Paulo Pimenta, destrata uma jornalista na televisão e inventa uma instituição oficial de checagem de informações.
Está inaugurada a era da “verdade oficial”, uma situação tão esdrúxula que só pode sair da cabeça de autoritários que desconhecem que verdade oficial é propaganda. A direita civilizada está embarcando em alternativas como os governadores Tarcísio de Freitas, de São Paulo, ou Romeu Zema, de Minas. A militância extravagante, agressiva e radical continua com Bolsonaro, mas é minoritária. Assim como é minoritária a esquerda que apoia Lula.
O centro continua majoritário, mas incapaz de produzir uma alternativa a essa polarização. Os ativistas do bolsonarismo vivem num universo paralelo nas redes sociais e realmente conseguem neutralizar muitas acusações contra seu líder. O PT, que dominava essas redes, ficou ultrapassado pela moderna tecnologia que os bolsonaristas trouxeram de seus contatos internacionais com gurus da extrema direita feito Bannon. Portanto a adequação da volta de Bolsonaro não importa muito para esse pessoal, tanto que estão programando motociatas, desfile em carro aberto e outras manifestações para a chegada a Brasília.
A Polícia Federal (PF) montou um esquema de segurança para tentar impedir que conheçamos a verdadeira capacidade de reaglutinação de Bolsonaro. Outra questão é saber se ele tem algum risco de ser preso chegando ao Brasil. É pouco provável, mas pode aparecer um juiz de primeira instância que mande prendê-lo sem razão legal sólida. As acusações são muitas, mas os processos estão no começo, pois ele tinha imunidade até janeiro. Ainda não há perspectiva de haver algo concreto, a menos que alguma descoberta tenha sido feita e se alegue que a presença dele coloca em risco as investigações, como a possibilidade de influir na PF.
A volta de Bolsonaro é mais um elemento no choque de realidade a que Lula vem sendo submetido, num mundo que mudou sem que ele notasse. Lula está descobrindo que não tem superpoderes ou pelo menos encontrou no ex-juiz Sergio Moro a kriptonita que os neutraliza. Comecei a coluna falando em multiverso e termino com a boa e velha kriptonita. Os mais jovens não devem nem saber do que se trata. É uma tentativa, talvez inócua, de ser atual sem esquecer a tradição. Fonte: https://oglobo.globo.com
Mulher ‘enterrada viva’ em MG acorda e interage com funcionários do hospital, diz médico
- Detalhes
Vítima saiu da sedação nesta quinta-feira; médicos irão analisar se ela ainda precisará passar por cirurgias
Por Letícia Messias e Paulo Assad — Rio de Janeiro
A mulher de 36 anos que foi encontrada presa dentro de um túmulo na cidade mineira de Visconde do Rio Branco teve uma “melhora muito grande” no estado de saúde, segundo os médicos responsáveis. A vítima ainda está na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) do Hospital São João Batista, mas acordou nesta quinta-feira e tem interagido com os funcionários.
— A situação dela melhorou muito de ontem para hoje. Agora, vamos ver se ela precisa engessar a perna e se o braço dela será caso de gesso ou cirurgia — informou o médico Henrique de Almeida, diretor do Hospital. — Mas são casos ligados à função, e não mais à vida.
Agora, de acordo com o profissional, um ortopedista fará a análise do caso da mulher. Até ontem, ela estava sedada e com “múltiplas fraturas no braço, dedo e perna”, embora também apresentasse uma “pressão boa”. Almeida ressaltou, ainda, que ela sofreu um traumatismo craniano e chegou desidratada ao hospital.
Além disso, Almeida também informou que a mulher está sedada e com “múltiplas fraturas no braço, dedo e perna”, embora também esteja com uma “pressão boa”. Ela também sofreu um traumatismo craniano e chegou desidratada ao hospital:
— Ela está com um escalpo parcial, vários cortes extensos no couro cabeludo e com uma hemorragia subaracnóide. No entanto, ela está se mantendo com bons parâmetros hemodinâmicos — disse.
Entenda o caso
Na última terça-feira, a mulher foi resgatada de dentro de um túmulo no cemitério municipal de Visconde do Rio Branco, em Minas Gerais. Coveiros que trabalham no local acionaram a Polícia Militar após terem encontrado o sepulcro fechado com tijolo, cimento fresco e sinais de sangue.
Quando chegaram ao local, os militares ouviram pedidos de socorro vindos do túmulo. A lápide, que estava fechada com materiais de alvenaria, foi quebrada pelos policiais. O resgate foi realizado e a mulher foi retirada com ferimentos na cabeça.
— Com a ajuda dos funcionários, (os oficiais) quebraram a lápide e viram que uma mulher tinha sido colocada enterrada viva. Já temos a identificação dos autores — disse o tenente-coronel Santiago. Fonte: https://oglobo.globo.com
Covid-19: Brasil bate 700 mil mortes, com forte declínio graças às vacinas.
- Detalhes
Marca foi atingida um ano após os 650 mil óbitos; especialista diz que as 40/ 50 vidas perdidas por dia atualmente são de pessoas que não se imunizaram por completo
ONG Rio de Paz realiza ato em memória dos 400 mil mortos pela Covid-19 Agência O Globo
Por Constança Tatsch — São Paulo
O Brasil bateu, na última semana, a marca dos 700 mil mortos pela Covid-19. Os números precisos serão divulgados ainda nesta terça-feira, com a atualização pelo Ministério da Saúde da semana epidemiológica que foi do dia 19 a 25 de março.
Desde que chegamos à marca dos 600 mil mortos, passaram-se 17 meses. Desde os 650 mil, foi um ano. Esse intervalo chegou a ser de apenas um mês, entre março e abril de 2021, quando passamos de 300 a 400 mil mortos.
O aumento no período de tempo mostra a imensa desaceleração da pandemia graças à vacinação. É o que reforça o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Alexandre Naime Barbosa, professor da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp):
— O intervalo começou a ficar grande após a vacinação em massa, que foi do primeiro para o segundo semestre de 2021. O impacto que a vacinação trouxe em termos de redução de gravidade foi contundente. Tivemos picos de 3.500 óbitos por dia e hoje são, em média, cerca de 40 a 50. São pessoas que não se vacinaram ou não estão com vacinação completa — afirma.
Entre 35% e 40% das pessoas não tomaram alguma dose de reforço, seja a terceira dose ou a quarta para a população indicada.
Naime Barbosa conta que, na última semana, perdeu um paciente de apenas 39 anos por Covid grave. Ele tinha Aids, não sabia, e confessou não ter achado que a doença era grave ao participar de grupos que divulgam fake news.
— Hoje vivemos um estado de convivência om o vírus. Para a população geral, vida normal. Para a população mais vulnerável, manter uso de máscara em locais de aglomeração. Mas quem pesa mesmo nessa conta de 40 a 50 óbitos por dia são as pessoas com vacinação incompleta.
Cada vida conta
Se a desaceleração é algo a ser celebrado, não é possível deixar de dizer o número altíssimo de óbitos no país ao longo da pandemia em comparação com o resto do planeta.
Sexto país mais populoso do mundo, o Brasil é o segundo com mais mortes por Covid, em números absolutos, atrás apenas dos Estados Unidos, onde morreram mais de 1,1 milhão de pessoas.
Com a vacinação, o momento agora é outro:
— Não há dúvida que aqui no Brasil a Covid não é mais uma emergência de Saúde Pública de importância nacional (Espin). Isso persiste na Organização Mundial de Saúde (OMS) porque muitos países têm taxa de vacinação baixa e com esse decreto há questões de enfrentamento prático. Já saímos de uma fase epidêmica e estamos numa fase endêmica, mas dá para melhorar, se os elegíveis para a quarta ou quinta dose se vacinassem, esses óbitos podiam cair para 1/3 disso. Seria importante otimizar ao máximo porque toda vida conta. Fonte: https://oglobo.globo.com
Mais de 800 mil idosos ainda não tomaram a vacina bivalente contra a Covid-19 no Rio
- Detalhes
Cariocas com mais de 60 anos ou de grupos prioritários podem receber o reforço em qualquer posto de saúde da cidade
Por Felipe Grinberg — Rio de Janeiro
Dados da Secretaria municipal de Saúde do Rio mostram que 833 mil idosos ainda não procuraram os pontos de imunização para receber o reforço da vacina bivalente contra a Covid-19. Desde o começo do mês, todos com 60 anos ou mais estão aptos, desde que tenham tomado no mínimo duas doses da vacina e a última dose há pelo menos quatro meses.
Quem pode receber o reforço da bivalente?
Pessoas com 60 anos ou mais
Pessoas com deficiência permanente (PcD) com 12 anos ou mais
Gestantes e puérperas
Trabalhadores da saúde
Pessoas imunocomprometidas com 12 anos ou mais
A demora dos idosos em ir aos postos de saúde agora contrasta com a grande procura pela vacina no início da campanha de imunização, em 2021. Na primeira etapa da vacinação contra a Covid-19, o Rio alcançou a cobertura de 90% dos idosos imunizados com a primeira dose em cerca de três meses. Na época, o calendário era escalonado por idade e sexo, e a marca foi atingida quando o calendário chegou à cobertura total dos idosos.
O secretário municipal de Saúde, Rodrigo Prado, explica que a vacina bivalente oferece proteção contra variantes da Covid-19. Ele pede que o carioca atualize a caderneta de vacinação para sua proteção individual e para a manutenção do "cenário epidemiológico controlado".
— As unidades da SMS já aplicaram mais de 530 mil doses da vacina bivalente nos grupos prioritários, mas a população idosa imunizada com esse reforço ainda está abaixo da expectativa. Sabemos que os idosos podem ter maior dificuldade de ir à unidade de saúde, seja por problemas de mobilidade ou por precisarem ser levados por filhos ou netos com horário apertado devido ao trabalho. Por isso, procuramos oferecer serviços que facilitem o acesso, para que ninguém fique sem a oportunidade de se vacinar — explica Prado.
Além das 237 Clínicas da Família e postos de saúde, o carioca pode se vacinar no Super Centro Carioca de Vacinação, em Botafogo, que fica aberto todos os dias das 8h às 22h. O local funciona ao lado do Hospital Municipal Rocha Maia e conta com um drive-thru para a imunização. Também há pontos de vacinação na Cidade das Artes, na Barra da Tijuca; no Museu da República, no Catete; no Planetário, na Gávea; no Shopping do Méier; no Parque Shopping Sulacap e no Bangu Shopping.
Morador da Tijuca, o ortopedista Carlos Eduardo, de 67 anos, está com a perna quebrada. Ele recebeu a dose de reforço da bivalente na última semana, no Super Centro de Vacinação. Impossibilitado de andar sozinho, ele aproveitou a carona do amigo Albertus Ramalho para garantir a imunização.
— Meu amigo já conhecia o local e me trouxe aqui pela facilidade na condição que eu estou — contou o médico.
As 237 unidades de Atenção Primária do município também realizam a vacinação em domicílio para idosos, pessoas com deficiência e com comorbidades acamados. Para isso, é necessário que um familiar entre em contato com a unidade de saúde de referência solicitando o serviço. A vacinação será agendada em até 30 dias. Fonte: https://oglobo.globo.com
Ataque em escola: reflexões e lições sobre essa tragédia
- Detalhes
Vamos esperar que esses episódios não se repitam e não se tornem uma rotina no Brasil
Por Daniel Becker
Ontem, 27 de março, foi um dia triste, marcado por uma tragédia: um assassinato numa escola, cometido por um menino de 13 anos que atacou diversas pessoas e conseguiu matar a professora Elizabeth, a quem eu mando o meu abraço, minha solidariedade à família, uma pessoa de 71 anos, uma apaixonada pela educação, e também mando um abraço pra professora Cíntia, que conseguiu conter esse menino e evitar que esse massacre fosse pior.
É importante a gente refletir sobre isso e tentar tirar lições sobre esse episódio, que possam nos ajudar a refletir como sociedade. Nada que vá contribuir pra esclarecer esse crime, para tentar entender esse menino, mas reflexões genéricas a partir de certos elementos que essa tragédia apresenta e que são importantes que a gente pense sobre eles.
Primeiro, esse menino tinha uma conta no Twitter. É totalmente inadequado ter uma conta aos 13 anos porque o Twitter é um lugar de ódio, de violência, de ideologias radicais, de bolhas de extrema direita. É um lugar extremamente perigoso para adolescentes e ele estava solto ali. Nessa conta ele falava de misoginia, queria matar mulheres, especialmente as mais bonitas, e falava de armamentismo. Dizia que era perseguido e que ninguém falava com ele, ninguém gostava dele, e que sofreu bullying. Falou também sobre o pai dele dizendo que era um “FDP”, que o criticava e humilhava diariamente. Então vamos tentar pensar sobre essas coisas.
O que esses elementos podem nos trazer de reflexões? Primeiro lugar: é muito importante a gente vigiar o que os nossos filhos, crianças e adolescentes, estão fazendo nas redes sociais. São lugares perigosos entre outras muitas outras coisas por isso: são cheios de ideologias nocivas, odiosas que cultivam preconceitos, racismo, misoginia, onde se formam bolhas em que a criança ou adolescente não vai ter nenhum contraponto de ideologia que se oponha a esse tipo de radicalismo. Assim, ele vai mergulhar cada vez mais nesse mundo e isso favorece atitudes como essa. Já é inadequado um garoto de 13 anos estar no Twitter, muito mais ainda sem nenhum tipo de vigilância.
Em segundo lugar, falar da ideologia do armamentismo, da violência, do ódio que se espalhou na sociedade brasileira. Nos últimos quatro anos, nós vivemos o predomínio político de um grupo que esteve no poder, de um grupo de extrema direita, ultra radical, extremamente violento, ligado à milícia, à ideologia das armas e à disseminação do ódio quanto a minorias, que propalava que os adversários políticos tinham que ser fuzilados e coisas do gênero.
O armamentismo é uma praga nos Estados Unidos e esse tipo de massacre é extremamente comum lá. Há pouco tempo havia mais crianças mortas em massacres do que dias do ano em 2023. Assassinatos a bala são a principal causa de morte nos Estados Unidos de crianças. É para esse lugar que estamos querendo ir? Esse é o grande fator ligado a essas tragédias: o armamentismo.
Essa cultura do armamentismo se expandiu enormemente no nosso país nos últimos anos. Nos últimos quatro anos, para ser exato. Não só a cultura, como o próprio armamentismo, as armas se disseminaram na sociedade, os clubes de caçadores e atiradores se multiplicaram — a maior parte pra mim é fraude, são pessoas que estão comprando armas pra vender para o crime organizado, inclusive. Isso é muito grave. E a quantidade de armas duplicou na nossa sociedade, com o governo fazendo leis pra facilitar a compra de armas de uso que favorecem massacres, como fuzis, metralhadoras automáticas, e tentando passar leis pra que as munições não sejam sequer rastreáveis. Coisas absurdas. E a gente precisa combater essa ideologia da armamentismo de forma muito, muito séria.
Esse novo governo se comprometeu contra isso como uma das suas prioridades. Eu espero que isso seja levado à frente.
Em terceiro lugar, racismo e misoginia também se espalharam nas redes exatamente nesse mesmo período (possivelmente pelos mesmos motivos). A gente viu essas ideologias sairem do esgoto e se espalharem pela sociedade, disseminadas inclusive em igrejas. Isso é muito sério, a gente precisa olhar para os nossos filhos e ser exemplos pra eles, exemplos de se relacionar com as pessoas com igualdade, com amor, com respeito, tratando a todos dos da mesma maneira.
Além disso, esse menino falava em bullying. Isso é uma coisa muito séria, tendo ele ou não sofrido bullying, se ele fala nisso é importante que a gente reflita. O bullying é algo muito grave porque é perseguição sistemática, não é uma situação pontual, são humilhações e agressões diárias. Isso deixa uma criança num sofrimento monstruoso e precisa ser detectado, precisa ser trabalhado por todos, pela família, pela escola, porque uma criança que sofre bullying não fala sobre isso. Ela vai acumulando aquela dor imensa e pode explodir como uma agressão ou com uma depressão.
E, finalmente, esse menino falava de um pai violento, um pai não que batia nele mas que humilhava, agredia e criticava todos os dias. É muito importante a gente refletir sobre como cuidamos das nossas crianças. A importância da gente ter uma relação de cuidado, de amor, de afeto, de respeito com a criança desde cedo. Que a gente seja uma referência de segurança, de confiança, para que ela procure a gente quando precisar, quando estiver numa situação difícil e quiser consolo, carinho e orientação, quando ela estiver confusa e não souber o que fazer.
Nós devemos ser os esteios, os protetores dessa criança e não aqueles que acusam, que humilham, que criticam e que fazem ela se sentir cada vez pior. E é claro que essa criança provavelmente ela estava abandonada em casa, tanto que tinha uma conta no Twitter completamente livre onde ele fazia e falava das coisas mais terríveis sem que ninguém provavelmente soubesse.
Então é importante a gente refletir sobre o tipo de cuidado, de criação que a gente oferece aos nossos filhos. Lembrando da importância da gente fazer essa criação com amor, com afeto, respeito e confiança. Que a gente possa ser uma referência de amor, afeto, respeito, e confiança pros nossos filhos. E esperar que essas tragédias não se repitam e não se tornem uma rotina no Brasil. Fonte: https://oglobo.globo.com
Aluno esfaqueia e mata professora em ataque a escola em SP
- Detalhes
Testemunhas disseram que o menino que agrediu colegas e professores tinha 13 anos e uma relação problemática com os demais estudantes. Escola ficará fechada por duas semanas
Por Mariana Rosário — São Paulo
Alunos e professores foram esfaqueados na Escola Estadual Thomazia Montoro, em São Paulo Mariana Rosário
O governo de São Paulo confirmou a morte de uma das três professoras atacadas a facadas por um aluno na Escola Estadual Thomazia Montoro, na Vila Sônia, na Zona Oeste da capital paulista.
Morre professora esfaqueada por aluno em SP
A informação foi confirmada na manhã desta segunda-feira em coletiva de imprensa na porta da escola com o secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite, e o secretário da Educação, Renato Feder.
A professora que faleceu se chama Elizabeth Tenreiro, e tinha 71 anos. Ela foi a primeira atingida pelo aluno ao entrar na sala de aula. As demais vítimas, segundo o secretário de Educação, estão fora de perigo.
— A professora foi socorrida via terrestre e evoluiu a óbito. São quatro professoras e dois alunos vítimas, temos três professoras que sofreram alguns golpes, mas encontram-se estável. E os outros dois são superficiais — disse Derrite. — Um aluno está estável, já atendido, e outro em estado de choque.
Uma das professoras, Cinthia Barbosa, de Educação Física, ajudou a imobilizar o agressor, até a chegada da ronda escolar, três minutos depois de acionada.
— Não fosse essa ação heroica da professora, certamente a tragédia seria maior. Registramos aqui nosso agradecimento — disse Derrite. — O foco agora é dar atendimento às vítimas.
As outras professoras se chamam Rita de Cássia Reis, Ana Célia Rosa e Jane Gasperini. O governo de SP informou que a escola ficará fechada por ao menos duas semanas e o recesso de julho
Aluno também esfaqueou colegas em ataque a escola em SP
Ainda é preciso, acrescentou o secretário, entender as motivações do crime. Testemunhas disseram que o menino que esfaqueou os colegas e professores tinha 13 anos e uma relação problemática com os demais estudantes. Ele já tinha sido aluno da instituição e pediu transferência de volta, em 15 de março.
Em nota, o governo de SP informou que a professora de 71 anos chegou a ser levada em estado grave para o Hospital Universitário da USP, mas morreu em seguida. "O Governo de SP lamenta profundamente o óbito da professora e se solidariza com as famílias dos professores e alunos vítimas do ataque. A Polícia Militar foi acionada e a Civil investiga os fatos", afirma o texto. Fonte: oglobo.globo.com
Decidi deixar o Twitter. Não desejo emprestar nome e credibilidade a uma plataforma que favorece comportamentos criminosos
- Detalhes
Por Natalia Pasternak
O fenômeno das bolhas de desinformação nas mídias sociais é conhecido há tempos. Os algoritmos reforçam a circulação de informação – e desinformação – que reforça os preconceitos e crenças comuns no interior de grupos que compartilham ideologias e estilos de vida. Dentro da bolha, é natural encontrar quem pensa parecido, e mensagens que reforçam essas semelhanças são mais compartilhadas do que mensagens que desafiam e contradizem o consenso interno.
Psicólogos sociais distinguem bolhas epistêmicas de câmaras de eco. Nas bolhas, informação divergente não existe. As pessoas talvez nem saibam que há quem pense diferente delas. Imagine, por exemplo, uma comunidade religiosa pequena e fechada, para cujos integrantes a ideia de existir um ateu no mundo é quase inconcebível.
Nas câmaras de eco, sabe-se que ideias divergentes existem, mas estas ideias são ridicularizadas. Quem as defende é atacado e difamado, há repressão e assassinatos de reputação.
Na bolha epistêmica, vozes relevantes para a diversidade do debate são excluídas acidentalmente, sua existência não é conhecida. Já nas câmaras de eco, a exclusão é deliberada, mas a divergência não só é conhecida como se torna o foco da existência do grupo, que gira em torno do discurso de ódio contra a dissidência. Segundo o filósofo Thi Nguyen, bolhas epistêmicas podem ser furadas com exposição a evidências contraditórias, mas esta intervenção requer cuidado, ou corre-se o risco de a bolha virar câmara de eco.
As câmaras, infelizmente, não têm muita chance de salvação. Tentar penetrá-las para travar um debate honesto é quase sempre inútil. O contexto social da câmara perverte o processo.
Recentemente, decidi deixar o Twitter. Toda a minha produção de conteúdo sobre ciência está em artigos de jornais e revistas, publicações científicas e programas de rádio e TV. Meu uso da plataforma tendia a limitar-se ao compartilhamento destes conteúdos. De pessoal mesmo, só fotos de gatinhos.
Com a troca de controle do Twitter, o ambiente ali deteriorou-se. Perfis que haviam sido banidos por assédio, racismo e homofobia foram convidados a retornar. A monetização do selo verificado e dos impulsionamentos de conteúdo facilitam a multiplicação de câmaras de eco, discursos de ódio, fazendas de trolls e aceleradores de desinformação. Assédio, difamação e calúnia são premiados com aplauso e visibilidade ampliada.
Durante a pandemia, considerei minha presença ali necessária. No contexto particular da emergência sanitária, o Twitter viu-se elevado a referência para o jornalismo, que acompanhava o debate entre cientistas na plataforma. Com a normalização da Covid-19, que deixa de ser uma crise, o meu trabalho volta a ser de nicho, de alertar contra o uso de pseudociência em políticas públicas e a circulação de crenças perigosas na sociedade. Sair da plataforma foi para mim, portanto, uma decisão técnica e também particular.
Técnica porque o colapso acelerado da plataforma em câmaras de eco em guerra constante, impermeáveis a fatos e argumentos, reduz muito seu valor como ferramenta de trabalho. É como um motor de carro que faz muita fumaça, muito barulho e quase não transmite energia para as rodas. E particular porque não desejo emprestar nome e credibilidade a uma plataforma que favorece comportamentos criminosos. Popularidade é útil, mas não a qualquer preço.
Como presidente do Instituto Questão de Ciência (IQC), professora e voz com acesso ao debate público, meu trabalho é ensinar e tornar a informação científica disponível e amigável para todos. Isso, faço em diversos veículos de mídia. O IQC, enquanto instituição, seguirá disponibilizando conteúdo nas mídias sociais enquanto ainda for possível extrair algumas migalhas de trabalho útil dessas plataformas. Fonte: https://oglobo.globo.com
Aposentado do Globo Repórter, Sérgio Chapelin diz que evita abrir a boca na rua: 'Isso me cria muito problema'
- Detalhes
Sergio Chapelin em último programa do Globo Repórter apresentado por ele - João Cotta/TV Globo
Programa que já foi comandado pelo jornalista completa 50 anos neste ano e será um dos assuntos do 'Fantástico'
Sérgio Chapelin pode não ser mais o apresentador do Globo Repórter, mas o programa segue em sua rotina. No próximo domingo (26), o jornalista concede uma entrevista à Renata Ceribelli, no Fantástico, sobre os 50 anos da atração jornalística, celebrados em 2023, e curiosidades de sua rotina. Na conversa, ele fala de um cuidado redobrado todas as vezes que sai de casa.
"Chapelin, você até pode passar desapercebido pela rua, mas na hora que você fala as pessoas já pensam: opa, o Globo Repórter tá aí?", brincou Renata. Chapelin, então, concordou e relatou como é a rotina: "É, realmente é assim. Isso me cria muito problema. Porque, por exemplo, eu saio com a minha mulher, saio, bota o meu bonezinho, boto meu shortzinho, minha camiseta e saio caminhando. A minha mulher fala assim: 'Não abre a boca! (risos) Não abre a boca!'".
O jornalista apresentou o Globo Repórter durante 37 dos 50 anos e tem um aprendizado que ficará para sempre. "Olha, eu não aprendi a fazer outra coisa. Então, a única coisa que eu aprendi na vida foi a ler um texto, né? Minha mãe (se emociona), minha mãe me ensinou a ler o primeiro", revela ele que se aposentou da emissora em 2019.
Os jornalistas Cid Moreira e Sérgio Chapelin, apresentadores do "Jornal Nacional" em 1972, posam para foto Reprodução
Além de Chapelin, Renata conversou com Sandra Annenberg, Ernesto Paglia e outros jornalistas envolvidos com a festividade do Globo Repórter, que começa a ser comemorada no dia 31 de março. Fonte: https://f5.folha.uol.com.br
Pág. 19 de 660