Frei Carlos Mesters, O. Carm.

Naquele século XII, época da origem da Família Carmelitana, havia muitos escapulários. Um deles era o escapulário do Carmo. O escapulário era uma espécie de avental ou manto, usado pelos camponeses de um determinado lugar ou fazenda, para expressar sua pertença à família do dono daquele lugar. A veste do escapulário era um sinal visível da família, a que eles estavam ligados. Conferia identidade às pessoas e as integrava num determinado grupo social ou comunidade.

O escapulário era expressão da garantia de proteção que os camponeses recebiam do dono do lugar (feudo, fazenda) e da sua esposa, chamada a “Senhora do Lugar”. Era expressão também do obséquio ou serviço que eles deviam prestar ao fazendeiro e à “Senhora do Lugar”.

Os primeiros carmelitas, porém, abandonaram o seu feudo na Europa e foram  para a Terra de Jesus. Queriam viver em obséquio de outro dono, Jesus; e de outra Senhora do Lugar, Maria, a Mãe de Jesus. O Escapulário do Carmo é a expressão visível deste novo jeito de viver o Evangelho. Manto de proteção e de compromisso.

AUTOR: FELIPE RIBOT († 1391)

Autor do artigo: Lucas M. di Girolamo, OSM, Revista CARMELUS, 52, 1, 2005)

INTRODUÇÃO

            Texto dos inícios da Ordem do Carmo. Conjunto singular de documentos espirituais e conteúdos entre os quais a devoção e a identidade mariana do Carmelo. Parte de uma coleção de livros escritos e editados pelo provincial catalão Felipe Ribot († 1391). Dois elementos de destaque: (a) a importância de Elias, (b) a particular devoção à Virgem Maria. A mensagem mariana numa sucessão de inúmeras imagens e denominações bíblicas para sublinhar a ligação dos carmelitas com a mãe de Deus.

  1. A experiência do Carmelo

            A dimensão mariana no panorama das origens da Ordem Carmelita. Contexto mais amplo é os das primeiras Cruzadas. Eremitas latinos se fazem notícia no monte Carmelo. Procura do Reino e projeto de vocação em vida de “santa penitência, com a oração centrada na Bíblia, na Eucaristia, às vezes, e na mortificação” (E. Boaga, “Como Pedras Vivas”). Ligação com o lugar e a afirmação da devoção mariana com origem na literatura de viagens e peregrinações, Bíblia e Vidas de Santos, interesse por lugares santos dedicados a Maria + a percepção da unidade de fundo existente entre a Virgem Santa e seu Filho Jesus. — Fator 1: o contexto das Cruzadas e sua devoção mariana (lugar; oração; modelo). Fator 2: o uso constante da Sagrada Escritura, definindo a relação “Mariaß>Carmeloß>Elias”. Textos da caminhada carmelita dos primórdios: 1Rs 18, 42-45 e Ct 7, 6 (em perspectiva mariana). Apoio mais antigo: Honório de Autun (entre 1133 e 1156) e Felipe de Harveng. — Base ao título mariano: capela dedicada à Virgem; a denominação encontrada 1245 e 1247, de Inocêncio IV. — Base do caráter eremítico: a “Fórmula de Vida”, as bulas papais, uma acentuação forte e digna de respeito dos inícios do caráter eremítico e da identidade da Ordem consolidfada já no século XIII. — Outro aspecto básico para o caráter original: a assiduidade em relação à Sagrada Escritura de seus membros (atitude de escuta; “modus vivendi”; uso da Escritura; papel de Elias). — Importância de três aspectos interligados pela frase corrente “A Escritura foi dada para a salvação”: a percepção da Escritura como fato espiritual (motivo); a finalidade de edificar as pessoas em vista da salvação (finalidade); o conjunto de citações e a afirmação da intenção subjacente (método). Exemplos: Livro II, capítulo 2 e Livro III, capítulo 1 (Elias, profetas, profetismo); Livro III, capítulo 1 filhos dos profetas, ótica de futuro e progresso histórico, vicissitudes históricas, itinerância); Livro V, capítulo 1 (característica de universalismo; celebração entusiasta e ao mesmo tempo “pacata” pelo crescimento da família; fenômeno da “agregação”). —       A partir dos elementos presentes no “De Institutione” se pode delinear os valores que, especialmente após a aprovação de Inocêncio IV (mendicantes, 1247); 1) sua matriz eremítico-eliana, não como afastamento do mundo, mas como ligação com a realidade à volta; 2) a itinerância, elemento precioso para a tarefa da pregação + figura da caminhada existencial do homem em direção ao Reino; 3) as figuras de Elias e Maria (cf. Lc 2, 39s), unidas por Cristo (testemunho de carmelitas: John Baconthorp, G. de Cheminot († 1342-50), G. de Coventry († em mais ou menos 1360), G. de Hildesheim († 1375).

 A Virgem Maria no “De Institutione”

            Concentrada essencialmente no Livro VI (privilégios da Virgem Mãe + relação Maria<-->membros da Ordem.

1) Premissas de método

            Há chaves de interpretação do tempo e da história. Em síntese, pode-se dizer que são três: 1) o fato da Revelação como critério interpretativo de fundo e tendo por centro e vértice a Encarnação de Jesus, A saber: (a) Cristo como vértice e centro da Revelação, legitimando o uso livre da Bíblia; (b) repetição dos textos (leit-motiv) e familiaridade (como uma co-autoria). — 2) A vivência e interpretação da história através de um “quid” de natureza meta-histórica por ele experimentado (experiências espirituais colocadas por escrito). — 3) A dimensão cristológica que inclui e sustenta a doutrina mariana (fala-se da Virgem Maria, mas o panop de fundo é Cristo-Fonte.

 2) Elementos marianos do livro.

            Pelo menos quatro elementos (conceitos: 1) a nuvenzinha, cf. 1Rs 18, 42-45, e seu sentido (caps. 1-4); 2) o testemunho de virgindade da Ordem (caps. 3.5-6); 3) as figuras exponenciais de Elias e Maria (cap. 5); 4) o título da Ordem (cap. 6-8). Sua unidade e enlaçamento expõem a identidade da família carmelita, portadora na Igreja da sábia síntese entre a tradição do AT e a novidade de Jesus bebida na experiência mariana. Esta se tornou um estilo de vida em Deus (“vita mariefome”, Miguel de S, Agostinho, † 1684). 

2.1. A nuvenzinha e seu significado.

            1 Rs 18, 42-45. Texto carmelita mais característico: a nuvem, a forma de mão de homem, do mar para o céu. A identificação “nuvem ß> Maria” (cf tbm Is 19, 1 + 45, 8) aparece no Oriente e no Ocidente nos séculos IV e V. — Testemunho precioso, porque se aproxima bastante do que se fala longamente no “De Institutione”: Maria é a criatura imaculada e imune do pecado. Fala ainda da virgindade como elemento importante na formação carmelita. — Particular importância tem a locução “Mare amaro”, de base bíblica: “mare” = realidade de forças desconhecidas e negativas. semelhante interpretação: Maria = gota de mar ou mar amargo. Há em Maria esplêndido equilíbrio entre a sua eleição por Deus, que lhe deu privilegiados dotes, e a pertença à humanidade pecadora (“Mare amaro”). — A tradição espiritual da Ordem viu nessa figuração da Mãe de Deus sua imaculada conceição, verdade de fé diretamente dependente da Encarnação. Viu, também, a figuração da Assunção (cf Miguel Aiguani, autor carmelita, † 1400).      — Primeira conclusão: a presença mútua de dois fatores (pertença à nossa humanidade + graça especial de Deus) na única imagem da nuvenzinha. Imagem profunda que reafirma a pureza de Maria e abre a reflexão sobre o testemunho e a vocação dos carmelitas.

 2.2. O testemunho da virgindade da Ordem.

            Está no livro VI, caps. 3. 5-6. A dura disciplina dos monges para imitar Elias. Lembrança da nuvenzinha. Etimologia estranha da palavra “Carmelo” (“ciência da circuncisão” ß-> “castração mental”; expressão violenta para duas coisas: a adesão incondicional a Deus + o Carmelo como garantia.    

2.3. As figuras de Elias e Maria

            Livro VI, cap. 5: centralização sobre esses dois caracteres da Ordem. Moldura disso: a relação ”Elias ß> Maria”, nó teológico importantíssimo e fator que acompanha a caminhada carmelita: a imitação recíproca. Ribot garimpa idéias em textos bem anteriores ao seu. Fator de exemplaridade e internalização de ambos como patrimônio carmelita. “Conditio sine qua non” para a relação de fraternidade entre Maria e os frades. A passagem do AT para o NT não é vista como ruptura, mas indicação de fraternidade com a Virgem, o que torna mais válida sua imitação, pois esta é antecipada e fundamentada na Encarnação (cf Hb 1, 1-3). De Elias (cf presença em Mt 17, 3 e paralelos) se vai a Cristo, cuja encarnação engrendece Maria e a Igreja.

            A significação da passagem do AT para o NT, como se lê no “De Institutione” se pode ver no gráfico abaixo:

2.4. O título da Ordem

            A questão do título pode ser vista num plano de evolução histórica, como afirma E. Boaga (“Como Pedras Vivas”). Recordam-se aqui duas datas iniciais (séc. XIII): 1246-1247, carta de Inocêncio IV ao bispo de Londres, onde fala de “fratres beatae Mariae Virginis de Monte Carmelo” (irmãos da bem-aventurada Maria Virgem do monte Carmelo”); e 1252, data do início do uso oficial do título, depois de aprovado por Inocêncio IV: “heremitae fratres ordinis sanctae Mariae virginis de monte Carmeli” (eremitas irmãos da ordem da santa Maria virgem do Monte Carmelo). Não há como ter clareza de se o título veio de fora ou emergiu de dentro. Na primeira hipótese, é da autoria do povo que queria distinguir o grupo de outros residentes no Monte (Santa Margarida); na segunda, há testemunhos implícitos de escritos do século XIV e a comparação entre datas oficiais da bula de 1252 e as datas de quando o povo chamava os carmelitas. A questão, porém, não está resolvida.

            Nosso livro propõe três elementos relacionados com o título: 1) o conceito de imitação (Elias); 2) a troca do nome favorito na passagem do Antigo para o Novo Testamento; 3) a fixação dos dois títulos finais. 

            Dito isto, fica proposto novamente o conceito de imitação pelos monges que seguem os passos de Elias, “profetas”, por exemplo, título vinculado ao costume deles de louvar e salmodiar com todo o ser. Depois, ao serem chamados de “filhos dos profetas”, os discípulos, à imitação de Elias, residente do monte Carmelo — passaram a também residir ali, de onde o título “carmelitas”. Tais aspectos são passados pelo texto no intuito de reafirmar e confirmar a memória das origens.     No cap. 7, uma outra lista de títulos a partir da novidade evangélica, por exemplo o de Nota-se já no título “religiosos”, a saber, gente ligada a Deus, sobretudo pelo culto.              

            Preparando a conclusão, deixamos para trás dois aspectos talvez irrelevantes: a lista dos títulos antigos (cap. 7); a lista dos títulos modernos (cap. 8), para concentrar a argumentação no último capítulo, onde estão dois únicos títulos de uso corrente: “carmelitas” e “irmãozinhos da Bem-aventurada Virgem Maria”. Eles representam tanto a síntese das duas épocas em que se “snoda” (?) o mistério/desígnio da salvação centralizado em Jesus, quanto o próprio núcleo do patronato exercido por Maria sobre a Ordem, resultante da dimensão espacial (Senhora do Lugar), da dimensão teológica (Maria, Mãe de Deus e figura da Igreja) e da dimensão espiritual (Maria com quem se liga a Ordem por vincula de fraternidade).

CONCLUSÃO

            “Maria, que entrou intimamente na história da salvação, reúne em si de alguma forma e reverbera os maiores dados da fé” (Vaticano II, LG 65, cap. VIII). Em que pese a distância cronológica entre a LG e o “De Institutione”, essa frase representa um ponto de partida e um ponto de chegada. De partida, para as reflexões seguintes; de chegada, enquanto exprime um longo itinerário de estudo sobre a devoção à Virgem. Isto significa que a Mãe de Deus está no centro de uma pluralidade de aspectos por ela mesma conservados unidos por força de sua singular comunhão com Deus e aprofundados de tempos em tempos.

            O “De Institutione” nasce sem dúvida da experiência de vida e do fervor inicial em torno de um projeto de exclusiva dedicação às coisas do Senhor (cf 1Cor 7, 35). Isto implica uma renovação de vida assumida na força do exemplo da Mãe de Deus — a Senhora Nova — de uma novidade que lhe é inerente, sem dissociação com Jesus e com repercussão eclesial. Partindo dessa premissa, podem-se anotar os aspectos relevantes do livro resumidos em linhas fundamentais.

DESEJO DE DEUS. — Determina a vida contemplativa inicial. Os primeiros carmelitas vivem em grupo no Carmelo, lugar biblicamente associado à manifestação divina; lugar de solidão, que logo se enche da sonora presença dos primeiros consagrados à pregação e à salmodia. Esse desejo de Deus não é imobilismo nem existência estática; logo a eles se agregam outros ao modo de filiação que garante sua continuidade.

CONSCIÊNCIA DO LIMITE. — Aspecto com certa dramaticidade. Na visão da nuvenzinha, a proposta carmelita de vida em virgindade a exemplo de Elias e Maria. Por isso temos dois planos significativos, mesmo antropologicamente: o inferior (a humanidade pecadora de são parte os carmelitas); o superior (toda a singularidade da Virgem Maria). É notável, contudo, como o “De Institutione” sublinha fortemente o caráter agônico da vida espiritual!

CARÁTER MARIANO: HÁBITO E CULTO. — A presença de Maria determina o itinerário desta família, que a ela se dedica pelo culto e pelo sinal externo do hábito mudado para a cor branca emblemática da pureza. 

            Por fim, o “De Institutione” traz como característica um forte e realista ascetismo; sua leitura atenta revela uma impostação fortemente cristológica, com base em interpretações da época, que levam em consideração a escatologia cristã, os eventos que consumam a Páscoa de Jesus e se encontram na glorificação de Maria, antecipação da glória da Igreja e do Homem.

            O que liga concretamente essas chaves de leitura é o empenho pela santidade, que é a vocação de toda pessoa consagrada, vocação  originada da plenitude a que Deus faz chegar cada homem/mulher; santidade que é a meta de caminhada para a qual, sustentado pela graça, cada qual se orienta por uma vida de fidelidade.

            Tal fidelidade é comum a Elias e Maria, ambos distinguidos pelo caráter profético e, como tais, capazes de falar de Deus. É a missão do profeta: não o anúncio de um futuro róseo, mas recordar e fazer recordar a verdade que são a caminho para o céu. Neste sentido, o grande defensor da fé do AT e a Mãe do Senhor não são para os carmelitas parâmetros jurássicos fossilizados, mas passíveis de serem vividos em substância e na prática em todos os contextos em que a Ordem estiver operacionalizando a parte de Igreja chamada a difundir a única mensagem de Salvação. No percurso desse caminho, é possível testemunhar com credibilidade o dom a nós confiado e que somos chamados a tornar conhecido como dádiva universal de redenção!

*Tradução de Frei Martinho Cortez para uso no Noviciado Carmelita/2008

            A devoção a Maria é o perfume da nossa fé, é o sorriso celestial para as almas dos fiéis, é a música alegre para os nossos corações, é o palpitar mais querido da nossa vida cristã.

            Compreende-se, portanto, que o amor a Maria, graças à sua dignidade sublime de Mãe de Deus e à sua missão de Mãe dos homens, tenha em todos os tempos arrebatado os Santos. E assim existe uma fileira imponente de Santos Padres e Doutores - e vai crescendo um século depois do outro - que têm páginas admiráveis sobre Maria e nos ensinam a verdadeira devoção a Nossa Senhora.

            O grande Bispo e Doutor Santo Afonso Maria de' Liguori foi com certeza um dos Santos mais devotos de Maria. A santidade da Virgem, a sua pureza e beleza, a devoção cheia de ternura que nutria para com Ela fizeram-lhe brotar do coração o doce canto:

 Sois pura, sois pia, sois  bela, ó Maria! Toda  alma  já sabe, que  mãe assim terna no mundo não cabe.

             À "dulcíssima Senhora", à "sua caríssima Rainha" Santo Afonso nada mais pede que amá-la sempre mais e fazê-la amada por todos. "Ficai sabendo - escreve ele na súplica colocada no início do livro das suas GLÓRIAS - que desta minha pequena homenagem eu quero uma recompensa; e esta seja que de hoje em diante eu Vos ame mais do que antes e cada um, em cujas mãos chegar esta minha pequenina obra, fique inflamado de amor por Vós".

            Difundir a devoção a Maria, falar a seu respeito, cantar as suas glórias, celebrar as suas prerrogativas, tornar conhecida a ternura do seu amor e o seu poder junto ao trono de Deus, eram os anseios do nosso Santo. "É costume - dizia - dos amantes deste mundo falar muitas vezes sobre as prerrogativas das pessoas amadas e louvá-las, para verem assim o seu amor louvado e aplaudido também pelos outros. Muito medíocre, portanto, deve supor-se o amor daqueles que se gabam de amar a Virgem Maria e, no mais, pouco pensam em falar sobre Ela e fazê-la amada também pelos outros".

            "Não agem assim os que verdadeiramente amam esta amabilíssima Senhora; gostariam eles de louvá-la por toda parte, e vê-la amada pelo mundo inteiro, e, por isso, sempre que lhes é possível ou em público ou privadamente procuram acender nos corações de todos aquelas benditas chamas, pelas quais se sentem inflamados de amor para com a sua amada Rainha". (As Glórias de Maria).

            Manter-se-á sempre fiel a este programa, e da sua iluminada inteligência correrão rios de doutrina sobre a devoção a Maria, devoção que chama os pecadores à penitência e lhes aponta o caminho da salvação. "Todos os que se salvam - escreve ele no livro citado - não se salvam senão por intermédio desta divina Mãe; por necessária conseqüência pode dizer-se que da oração a Maria e da confiança na sua intercessão depende a salvação de todos".

            Santo Afonso associava às práticas interiores da devoção à Santíssima Virgem o exercício das práticas exteriores. O santo Doutor conhecia bem quanto as tradicionais práticas de piedade, sejam úteis, desde que sejam feitas da maneira devida, e assim via nelas outros tantos eficacíssimos meios para conquistar a proteção de Maria e tornar-se merecedor do seu santo amor. Nele já desde os primeiros anos foi muito cheia de carinho a devoção ao Rosário e ao Escapulário do Carmo. De fato ele escrevia no livro "As Glórias de Maria": «Devoções assim tão piedosas foram-me queridas desde a infância». Esta terna e sincera confissão brotou espontânea do seu coração amargurado pela leviandade de um escritor seu contemporâneo que tivera a ousadia de chamar "devoçõezinhas" estas práticas de piedade, que eram para ele um estímulo constante a recorrer à divina Mãe, a invocar o seu patrocínio a cada instante.

            Sempre ligou grande importância ao santo Escapulário: nele via um sinal de destinação ao serviço da celestial Rainha, um uniforme que distingue os prediletos de Maria e os admite à sua filiação: "Como os homens têm como uma honra ter alguns o seu uniforme, assim Maria fica feliz quando os seus devotos trazem o se Escapulário como um sinal de que estão dedicados ao seu serviço e são do número dos familiares da Mãe de Deus" ("As Glórias de Maria").

            Ensina-nos Santo Afonso também que a devoção ao Escapulário se apóia sobre bases sólidas, visto que é de origem celeste. Eis o que escreve a respeito no livro citado: "Pelo ano de 1251 Maria apareceu ao Bem-Aventurado Simão Stock, inglês, e dando-lhe o seu escapulário disse-lhe que aqueles que o houvessem trazido estariam livres da eterna condenação; foram estas as suas palavras: "Recebe, filho muito querido, este escapulário da tua Ordem, sinal da minha confraternidade, privilégio para ti e todos os carmelitas; quem com ele morrer não padecerá o fogo eterno". É a Mãe de Deus que intervém para assegurar aos filhos, que se apressem em oferecer-Lhe homenagens e orações, a fim de se tornarem dignos de tão grande dom.

            Hereges e críticos que não disseram para desacreditar o uso do santo Escapulário? Mas a devoção dos fiéis tem resistido a todos os golpes sem nunca enfraquecer-se, e os Sumos Pontífices, prestando reconhecida homenagem à bondade de divina Mãe, enriqueceram esta devoção com numerosas Indulgências. É conhecido o grande bem que o sagrado Escapulário tem oferecido às almas, e por isso exclama o nosso Santo: "Oh! Quantos que hoje estão no inferno ter-se-iam salvo se tivessem perseverado nos obséquios a Maria, aos quais uma vez deram início!"

            O caminho que conduz ao céu está semeado de espinhos; inimigos traiçoeiros escondem-se de emboscada, e o viajante temeroso sente a necessidade de um guia que lhe infunda coragem e o acompanhe ao seu destino. A devoção a Maria, diz Santo Afonso, é arma poderosíssima para vencer em todos os combates: invocando o seu nome, apertando ao peito o seu Escapulário, desvanecer-se-ão as tentações e a alma conservará toda a beleza espiritual.

            O Bentinho do Carmo não é somente defesa da pureza, mas também refúgio nos perigos que ameaçam a vida na terra e despedaçam o delicado fio da existência humana. O santo Bispo aponta as virtudes singulares conferidas por Maria ao Escapulário do Carmo e, segundo o testemunho do sábio e piedoso Pe. Crasset, narra como um soldado ferido de morte, recomendando-se à Virgem Santíssima, cujo escapulário carregava, alcançou tempo para reconciliar-se com Deus e salvar-se. Conta ainda sobre um homem que, golpeado de cheio no peito por uma bala, ficou incólume, servindo-lhe o bentinho de escudo.

            A proteção de Maria não se limita à nossa vida mortal, mas se estende para além do túmulo, em favor das almas que sofrem no Purgatório: "Naquela prisão das almas esposas de Jesus Cristo, escreve Santo Afonso, Maria tem um certo domínio e autoridade plenipotenciária, tanto para aliviá-las como também para libertá-las daquelas penas". O Bentinho do Carmo dá prova disto, uma vez que a Santíssima Virgem prometeu a quem o trouxer dignamente libertá-lo do Purgatório no primeiro sábado depois da morte.

            Privilégio singular e preciosíssimo, confirmado pelos Sumos Pontífices e enriquecido de Indulgências; privilégio, graças ao qual Santo Afonso nutria uma devoção toda particular ao Escapulário, privilégio que recomendava, especialmente aos sacerdotes, na sua "Floresta de matérias a serem pregadas".

            Como todos devotos de Maria, Santo Afonso não passava um dia sem ter prestado a Nossa Senhora a ardorosa homenagem da sua veneração, com a esperança de ser acolhido na feliz eternidade. E cantava a Maria:

Concede-me ainda, ó minha Rainha, sempre te ame. até que no céu possa um dia sem véu ver a tua beleza.

            A Divina Providência conservou incólumes os sagrados restos mortais do grande Doutor da Igreja; e a Rainha do Carmelo quis manifestar quanto lhe tinha sido grata a devoção do apóstolo das suas glórias, conservando intacto o sagrado Escapulário que repousou sobre o coração de Santo Afonso, com o qual morreu e foi sepultado.

    [1]. Il Monte Carmelo  1938  p. 42-45

Da: “Forma de vida dos primeiros monges” (ano 1370)

Os Religiosos monges ermitães que somos, devemos meditar sempre mais cada uma destas palavras, não só no sentido literal histórico, mas principalmente no sentido místico, e com tanto maior solicitude, quanto nelas se encerra mais perfeitamente a instituição, isto é: o modo de vida para chegar à perfeição profética e, enfim, à vida religiosa eremítica.

Esta vida de perfeição religiosa encerra dois fins: um podemos consegui-lo com nosso esforço e o exercício das virtudes, ajudados pela graça divina. Este fim consiste em oferecer a Deus o coração santo e limpo de toda mancha atual de pecado.

Conseguimos este fim quando já formos perfeitos e estivermos no Carit. ou seja, quando nos tivermos escondido naquela caridade da qual disse o sábio: “a caridade cobre todas as faltas” (Prov 10,12).

Mostrando o Senhor a Elias que queria que chegasse a este fim de caridade, lhe disse: te esconderás na torrente do Carit.

O outro fim da santa vida eremítica é dom totalmente gratuito de Deus que Ele comunica à alma. Consiste em que, não só depois da morte, mas ainda nesta vida mortal, possa gozar no afeto do amor e no gozo da luz do entendimento, algo sobrenatural do poder da presença de Deus e o deleite da eterna glória. Isto quer significar beber da torrente da delícia divina.

O Frei Petrônio de Miranda, Padre Carmelita e Jornalista/RJ, fala sobre a devoção a Nossa Senhora do Carmo: Sua origem e expansão a partir da capelinha dedicada a Santa Maria no Monte Carmelo. Para ler o texto, clique aqui: http://www.olharjornalistico.com.br/index.php/video-cast/8739-novena-de-nossa-senhora-do-carmo-na-lapa-rj-2017 Convento do Carmo da Lapa, Rio de Janeiro. 7 de julho-2017.

- Novena com a celebração da Missa -

(Comentários; Dom Frei Wilmar Santin, O. Carm. Bispo de Itaituba-PA; Frei Christopher O’Donnell, O. Carm e  Frei Petrônio de Miranda, O. Carm. Rio de Janeiro).

1º DIA: COMENTÁRIO INICIAL

Boa noite! Bem vindos e bem vindas ao primeiro dia do nosso novenário de Nossa Senhora do Carmo. A Partir de hoje, iremos percorrer os nove dias com Maria, a Mãe dos Carmelitas e nossa em uma caminhada ao encontro do seu filho, Jesus Cristo.

A devoção a Nossa Senhora do Carmo tem sua origem no Monte Carmelo, onde os primeiros carmelitas, após o fim da Terceira Cruzada (1192), se fixaram e construíram uma capela dedicada a Maria e desenvolveram uma particular devoção à Mãe de Deus.

Na Regra de Vida dada por Alberto de Jerusalém (entre 1206-1214) não havia menção à Bem-aventurada Virgem. A Regra realmente especificou que deveria haver um oratório no meio das celas onde missas diárias deveriam ser celebradas. Pelo relato dos peregrinos, sabemos que a partir de mais ou menos 1231 ou talvez mais tarde, esse oratório foi dedicado à Nossa Senhora. Ainda encontramos indícios desta igreja dedicada à Maria no Monte Carmelo até o século XV. Naquele tempo existiam muitas igrejas dedicadas a Maria em lugares associados à sua vida, com legendas ou liturgias sobre ela.

Ao retornarem à Europa, manifestaram sua especial devoção mariana na dedicação de igrejas e incluindo o nome de Maria no próprio nome da Ordem. Já em 1252 o Papa Inocêncio IV oficialmente denomina os carmelitas como pertencentes a Ordem da Virgem Maria do Monte Carmelo

Várias gestos concretos provaram o amor dos Frades a Senhora do Monte Carmelo, tais como inserir o nome de Maria na fórmula da profissão; Na obrigação de recitar diariamente nos ofícios e na missa a “Salve Regina” e nas diversas festas marianas dedicadas a Mãe de Jesus, tais como;  Purificação, Anunciação, Assunção e Natividade de Maria e, por último, no uso da capa branca.

É com toda essa riqueza espiritual-  mariana que vamos acolher de pé o celebrante, os coroinhas e as ministras de eucaristia. Cantemos os louvores à Nossa Senhora do Carmo.

2º DIA:  COMENTÁRIO INICIAL

Boa noite! Bem vindos e bem vindas ao segundo dia do nosso Novenário de Nossa Senhora do Carmo.

Os Carmelitas chegaram em 1580 no Brasil. Em 1583 fundaram em Olinda o primeiro convento. Sucederam-lhe as fundações de Salvador (1586), Santos (1589), Rio de Janeiro (1590), Angra dos Reis (1593), São Paulo (1594), Paraíba (1596), São Cristóvão (1600), São Luís (1616), Belém (1624), Alcântara (1647), Recife (1654). Em todas estas fundações, suas igrejas conventuais foram dedicadas à Nossa Senhora do Carmo. Portanto se tornaram centros de difusão da devoção à Virgem do Carmo.

Quando assumiram as missões nos rios Negro e Solimões, também colocaram várias aldeias sob o patrocínio de Nossa Senhora do Carmo.

Relembrando os missionários carmelitas que espalharam a devoção a Nossa Senhora do Carmo e do Escapulário pelo Brasil, vamos acolher de pé o celebrante, os coroinhas e as ministras de eucaristia. Cantemos os louvores à Virgem do Carmo.

3º DIA:  COMENTÁRIO INICIAL

Boa noite! Bem vindos e bem vindas ao terceiro dia do nosso Novenário de Nossa Senhora do Carmo.

Além de fundar os conventos no Brasil, os carmelitas também foram fundando a Ordem Terceira do Carmo. Estas por sua vez se tornaram centros de vivência e de difusão da devoção a Nossa Senhora do Carmo. A primeira Ordem Terceira foi no Brasil foi a de São Paulo em 1594. Raul. Outras foram fundadas em Salvador, em 1636); Rio de Janeiro, 1648; Recife, 1695 e Santos, em 1742.

Nesta noite, vamos trazer a memória os frades, as freiras e leigos que implantaram essa devoção no Brasil e de modo particular aqui na comunidade da Lapa.

 Agradecendo ao Bom Deus pela presença dos Carmelitas na história do Brasil, vamos acolher de pé o celebrante, os coroinhas e as ministras de eucaristia cantando louvores a Mãe de Deus e dos Carmelitas. Cantemos!  

4º DIA:  COMENTÁRIO INICIAL

Boa noite! Bem vindos e bem vindas ao quarto dia do nosso Novenário de Nossa Senhora do Carmo.

Quando as pessoas têm devoção a um santo ou a um determinado título de Nossa Senhora, colocam nos filhos o nome do santo de sua devoção. Assim os nomes de santos dados aos filhos demonstram a existência de uma determinada devoção. Em relação a Nossa Senhora do Carmo, temos no Brasil muitas pessoas, principalmente mulheres, com os nomes: Carmem, Carminha, Carmelita, Carmela... e sobretudo Maria do Carmo. Entre os homens temos: Carmelo e Carmo. O mais comum é encontrar a expressão “do Carmo” como segundo nome ou mesmo sobrenome, por exemplo: José do Carmo, Carlos do Carmo, Antônio do Carmo, etc.

Nesta noite, louvemos a Mãe dos Carmelitas presente em nossas famílias, seja através do nome “Do Carmo” ou do Escapulário, como forma de expressão do carinho, amor e confiança na Mãe de Deus.

De pé, vamos acolher o celebrante, os coroinhas e as ministras de eucaristia. Cantemos louvores a Nossa Senhora do Carmo nas expressões culturais e familiares em nosso Brasil.    

5º DIA:  COMENTÁRIO INICIAL

Boa noite! Bem vindos e bem vindas ao quinto dia do nosso Novenário de Nossa Senhora do Carmo.

No Brasil há 103 paróquias que têm Nossa Senhora do Carmo como padroeira. Apesar da devoção a Nossa Senhora do Carmo ter chegado ao Brasil já no século XVI, só tardiamente, ou seja, no século XVIII (1743), foi realizada a fundação da primeira Paróquia Nossa Senhora do Carmo. Isto se deve ao fato de que os carmelitas não assumiam paróquias no início de suas atividades no Brasil.

            No séc. XVIII temos a fundação de apenas duas paróquias Nossa Senhora do Carmo, a saber, as paróquias de Piracuruca (1743) e de Jucás (1755). No séc. XIX são fundadas 31; no séc. XX, 68. Por estes números constata-se um crescimento concreto da devoção.

Hoje, vamos nos unir aos conventos, catedrais, paróquias, comunidades, associações e congregações que também estão celebrando a Virgem do Escapulário.

 De pé, vamos acolher o celebrante, os coroinhas e as ministras de eucaristia. Cantemos louvores a nossa Padroeira, nossa mãe e nossa e Rainha do Carmelo.    

 

6º DIA:  COMENTÁRIO INICIAL

Boa noite! Bem vindos e bem vindas ao sexto dia do nosso Novenário de Nossa Senhora do Carmo.

A maior devoção ligada a Nossa Senhora do Carmo é o Escapulário. Apesar de se recordar a visão de São Simão Stock o que mais se divulga é o Escapulário como sinal de proteção nos perigos e na hora da morte.

Segundo a tradição da Ordem do Carmo, Nossa Senhora apareceu a São Simão Stock, carmelita inglês, no dia 16 de julho de 1251. Ele era um homem de grande santidade e devoção, que sempre pedia à Virgem, em suas orações para favorecer a Ordem com algum privilégio único. A Virgem apareceu a ele segurando o Escapulário em sua mão e dizendo: “Isto é para ti e para os teus um privilégio. Aquele que morrer com ele será salvo”.

Esta devoção não chegou ao Brasil só através dos carmelitas, mas também através dos leigos que já tinham a devoção em Portugal. Só isto justifica a presença da devoção em regiões onde os carmelitas não trabalharam e nem sequer tiveram contato. Nas igrejas dos conventos carmelitas e da Ordem Terceira encontramos em geral imagens e pinturas da entrega do Escapulário a São Simão.

No meio do povo a devoção sempre esteve centrada no escapulário e na proteção que Nossa Senhora do Carmo dá para aqueles que o usam. Recentemente esta devoção foi reforçada pela mídia brasileira ao noticiar que vários surfistas aqui no Rio de Janeiro foram tragados por uma grande onda no mar. Apenas um não morreu. Este publicamente afirmou que só se salvou porque usava o Escapulário. O resultado é que todos os surfistas passaram a usar o Escapulário como um sinal de proteção de Nossa Senhora.

Nesta noite, roguemos a Senhora do Escapulário para que, neste período de crise e desemprego, nos auxilie e nos proteja em nossa caminhada e anuncio da Boa Nova do seu filho Jesus Cristo. 

De pé, vamos acolher o celebrante, os coroinhas e as ministras de eucaristia. Cantemos louvores a nossa Padroeira e nossa protetora. Cantemos!   

 

7º DIA:  COMENTÁRIO INICIAL

Boa noite! Bem vindos e bem vindas ao sétimo dia do nosso Novenário de Nossa Senhora do Carmo.

A mais antiga devoção mariana entre os Carmelitas é, provavelmente, a invocação da Padroeira. Não significa que a ideia de Mãe, parte da herança cristã comum à toda Igreja, foi ignorada. Mas numa era feudal, a reflexão carmelitana sobre o oratório consagrado à Maria influenciou rapidamente a devoção de Maria como Padroeira.

Assim, na cultura medieval feudal, Maria é vista como a Suserana do lugar, a sua Padroeira, pois tudo está sob seu domínio. O Carmelita é, portanto, um vassalo num incondicional serviço.

A noção de padroeira é tão tradicional e profunda que poderia parecer que pertence à essência do carisma mariano da Ordem. Uma chave para sua compreensão é que, diferente de alguns outros modos de se considerar Maria, o patronato implica num relacionamento de duas vias: Maria protege os Irmãos; os Irmãos servem a Maria. A dimensão deste duplo relacionamento para com Maria é característico do modo de vida carmelitano.

A existência desta devoção em terras brasileiras pode ser demonstrada historicamente pelo menos a partir da chegada dos carmelitas em 1580. Como esta devoção não era um monopólio da Ordem do Carmo - apesar de ter ali sua origem, mas estava eclesial enraizada na religiosidade popular portuguesa, provavelmente chegou antes através de imigrantes leigos que já tinham a devoção em Portugal.

Nesta noite, roguemos a Padroeira do Carmelo para que todos nós, sob a inspiração da Boa Nova do seu filho, coloquemo-nos a serviço do Seu Filho na implantação do Reino.

De pé, vamos acolher o celebrante, os coroinhas e as ministras de eucaristia. Cantemos louvores a nossa Padroeira e nossa protetora. Cantemos a nossa Padroeira.   

 

8º DIA:  COMENTÁRIO INICIAL

Boa noite! Bem vindos e bem vindas ao oitavo dia do nosso Novenário de Nossa Senhora do Carmo.

Na devoção a Nossa Senhora do Carmo há um grande número de cânticos. Mesmo depois do Vaticano II continuam a surgir cânticos dedicados à Virgem do Carmo. Gradativamente nos novos cantos está desaparecendo o tema do escapulário. Em vez de se evocar a proteção e ajuda na hora da morte, louva-se a Maria e se manifesta a certeza de que Ela caminha com seus devotos. O título que mais aparece nos cânticos é Flor do Carmelo. Aqui se vê a influência direta do cântico-oração Flos Carmeli, que segundo a tradição carmelitana, foi composto por São Simão Stock e cantado na noite de 16 de julho de 1251 após a Visão de Nossa Senhora.

 

9º DIA:  COMENTÁRIO INICIAL

Boa noite! Bem vindos e bem vindas ao nono dia do nosso Novenário de Nossa Senhora do Carmo.

Hoje, vamos olhar para Nossa Senhora do Carmo com o título de IRMÃ DOS CARMELITAS. A noção de Maria como Irmã pode estar implícita nos títulos de Irmãos da Bem-aventurada Maria do Monte Carmelo. Essa expressão IRMÃOS começou a surgir  apenas no século XV que o passo corajoso foi assumido e divulgado e Maria foi explícita e diretamente chamada de Irmã dos Carmelitas.

O tema de Irmã, que é significativo para a mariologia contemporânea, não foi central no século XV, mas sua importância não deve ser minimizada. O uso de “Irmã” começou mais ou menos como um jogo de palavras com “Irmãos da Bem-aventurada Virgem” e não refletiu um genuíno uso devocional de tal título mariano. 

As fontes desta devoção são, de fato, patrísticas. Reside no fato de que Maria, como nós, é uma filha de Adão. Maria é nossa irmã pelo fato de que todos temos nossa origem em Adão.  Nos tempos modernos, Paulo VI desenvolveu o tema no discurso final da terceira seção do Concílio Vaticano no dia 21 de novembro de 1964.

A noção de irmã reforça o elemento da proximidade de Maria a nós, uma companheira e uma presença amorosa tão característicos da mariologia carmelitana. Esta é, certamente, uma razão a mais para aprofundar esta nossa herança mariana carmelitana.

Nesta última noite, roguemos a nossa irmã- A Senhora do Carmo, que nos ajuda a sermos verdadeiramente sinais de irmãos no sentido pleno de Atos dos Apóstolos.

De pé, vamos acolher o celebrante, os coroinhas e as ministras de eucaristia. Cantemos louvores a nossa irmã e Mãe. Cantemos!    

Para que os discípulos de Elias estabelecessem de maneira permanente a residência no monte Carmelo, procurou fazer deste monte um lugar muito devoto, não só com sua vida exemplar vivendo ali o resto de seus dias que foi de dezesseis anos, mas destacando-o sobre todas as outras solidões, onde havia vivido, com alguns milagres portentosos realizados para provar claramente aos idólatras que o Deus de Israel era o Deus único e verdadeiro.

Havendo os Sacerdotes de Jerusalém dito a seus pais, antes do nascimento de Elias que este seu filho julgaria Israel com a espada e o fogo, a Escritura Sagrada nos asseguras no Livro dos Reis que os portentos realizados no monte Carmelo comprovaram bem ser verdadeiro este vaticínio.

O povo de Israel juntamente com seu rei Acab deram culto a Baal e desprezaram o culto de adoração ao Deus verdadeiro seduzidos pelos sacerdotes daquele falso deus. Abrasada a alma de Elias pelo zelo da glória de Deus e sofrido pela transgressão idolátrica do povo reuniu neste monte Carmelo toda a nação com seu rei e lhe propôs este julgamento: se Baal, ouvindo as petições e súplicas de seus sacerdotes enviasse do céu fogo que queimasse o sacrifício que neste monte lhe iam oferecer, fosse proclamado deus de Israel, porém se Baal não tivesse poder para enviar fogo do céu nem para ouvir as súplicas de seus sacerdotes, e lhe enviava o Deus de Israel a petição de Elias para queimar o sacrifício que lhe ia oferecer neste monte, que a nação abandonasse para sempre o Baal e acreditasse com firmíssima fé que o único e verdadeiro deus era o de Israel.

O povo acolheu benignamente esta proposta de Elias; porém Baal não pode enviar fogo do céu para queimar o sacrifício que seus sacerdotes lhe ofereceram; então Elias construiu neste monte Carmelo um altar onde ofereceu o sacrifício e na presença de todos e suplicou ao Deus de Israel que mandasse descer do céu o fogo para queimar seu holocausto e Deus assim fez.

Deste modo o povo de Israel, induzido até então à idolatria pelos sacerdotes de Baal voltou, ensinado por Elias a dar culto ao único Deus verdadeiro no monte Carmelo e Elias passou ao fio da espada na torrente do Cedron a todos os profetas de Baal que haviam seduzido o povo, para que não voltassem a enganá-lo.

Ainda fez mais: enganados pelos profetas de Baal, o rei e o povo invocavam e suplicavam constantemente a Baal durante três anos e seis meses que lhes mandasse chuva porém o ídolo não pudera enviar-lhes a chuva nem impedir, durante este tempo, que se cumprisse a palavra anunciada por Elias: “Não há de cair nem orvalho nem chuva durante estes anos até que eu o ordene” (III Rs 17, 1).

Evidenciada deste modo a impotência de Baal durante tanto tempo; se manifestou mais patente o poder de Deus; porque, pondo-se Elias em humilde oração diante de Deus neste monte Carmelo, alcançou logo que lhe mandasse abundante chuva para a nação.

Além disto, Elias mandou emissários a Ocozias, rei de Israel que estava doente, para que lhe comunicasse que, certamente, morreria, porque se cuidava consultando a Belzebu, deus de Acaron, o resultado de sua doença, menosprezando o Deus de Israel. Fortemente é impressionado o rei com esta notícia, se enfureceu contra Elias e, desejando matá-lo, enviou um capitão com cinqüenta soldados para que fossem ao monte Carmelo e lhe levassem Elias. Se Elias não quisesse ir voluntariamente, o levassem à força.

Este capitão, cooperador voluntário do rei no crime, marchou irritado e orgulhoso com seus cinqüenta soldados em busca de Elias e o encontrou sentado no alto do monte Carmelo, com desprezo o chamou homem de Deus e com imponência lhe mandou que descesse do monte e fosse com ele à presença do rei.

Vendo Elias que aqueles soldados desprezavam o Deus verdadeiro em sua pessoa, fez baixar fogo do céu sobre o monte Carmelo, o qual abrasou o Capitão e seus cinqüenta soldados.

Com isto, o rei se irritou muito mais ainda e mandou pela segunda vez outro Capitão com seus cinqüenta soldados. De novo Elias fez baixar do céu fogo que, como da vez anterior, abrasou o Capitão com seus cinqüenta soldados no monte Carmelo.

Com estes evidentíssimos julgamentos da espada e do fogo, Elias mostrou aos incrédulos que o Deus verdadeiro era o que ele adorava no monte Carmelo e não Baal, a quem o pérfido Acab dava culto com o povo de Israel, nem Belzebu a quem o sacrílego rei. Ocozias mandou consultar, desprezando o verdadeiro Deus.

*Livro da Instituição dos Primeiros Monges Fundados no Antigo Testamento e que  perseveram no Novo por Juan Nepote Silvano, Bispo XLIV de Jerusalém. Traduzido do latim por Aymerico, Patriarca de Antioquia e do latim para o castelhano por um Carmelita Descalço e Carta de São Cirilo Constantinopolitano Traduzida para o castelhano. (Ávila Imprensa e Livraria Vida de Sigirano-1959. Censura da Ordem Imprima-se. Madrid, 6 - XII - 1958.

25.Tudo o que desejamos e pretendemos ser na realidade da hora presente vemo-lo realizado na vida do profeta Elias e da bem-aventurada Virgem Maria, que, cada um a seu modo, «tiveram o mesmo espírito, [...] a mesma formação, o mesmo mestre: o Espírito Santo». Olhando para Maria e Elias, podemos mais facilmente compreender, interiorizar, viver e anunciar a verdade que nos torna livres.

  1. Elias é o profeta solitário que cultiva a sede do Deus único e vive na sua presença. Ele é o contemplativo possuído (raptado) pela paixão ardente pelo absoluto de Deus, cuja «palavra ardia como fogo». É o místico que, depois de um longo e penoso caminho aprende e lê os novos sinais da presença de Deus. É o profeta que se envolve na vida do povo e, lutando contra os falsos ídolos, o reconduz à felicidade da Aliança com o único Deus. É o profeta solidário com os pobres e os marginalizados e que defende aqueles que sofrem violência e injustiça.

O Carmelita aprende, pois, com Elias a ser homem do deserto, de coração indiviso, que está todo diante de Deus, todo entregue ao serviço de Deus, o homem que fez uma escolha sem compromissos pela causa de Deus e por Deus arde de paixão. Como Elias, crê em Deus, deixa-se conduzir pelo Espírito e interioriza a Palavra no próprio coração, para testemunhar a presença divina no mundo, aceitando que ele seja realmente Deus na sua vida. E enfim, vê em Elias, unido ao seu grupo profético, a fraternidade vivida na comunidade, e com ele aprende a ser canal da ternura de Deus para com os indigentes e os humildes.

  1. Maria, envolvida pela sombra do Espírito de Deus, é a Virgem do coração novo, que dá um rosto humano à Palavra que se faz carne. É a Virgem da escuta sapiente e contemplativa, que conserva e medita no seu coração os acontecimentos e a palavra do Senhor. É a discípula fiel da sabedoria, que busca Jesus –Sabedoria de Deus– e pelo seu Espírito se deixa educar e plasmar para assimilar na fé o estilo e as opções de vida. Assim educada, Maria é capaz de ler as "grandes coisas" que Deus realizou nela para a salvação dos humildes e dos pobres.

Maria, sendo também a Mãe do Senhor, torna-se a discípula perfeita dele, a mulher de fé . Segue Jesus, caminhando juntamente com os discípulos, e com eles compartilha o penoso e comprometedor caminho que exige acima de tudo o amor fraterno e o serviço mútuo. Nas bodas de Caná ensina-nos a acreditar em seu Filho; aos pés da Cruz torna-se a Mãe de todos os crentes e com eles experimenta a alegria da ressurreição. Une-se com os outros discípulos em «oração contínua» e recebe as primícias do Espírito, que enche a primeira comunidade cristã de zelo apostólico.

Maria é portadora da boa nova da salvação para todos os homens. É a mulher que cria relações de comunhão, não só com os círculos mais restritos dos discípulos de Jesus, mas também com o povo: com Isabel, os esposos de Caná, as outras mulheres e os "irmãos" de Jesus.

Na Virgem Maria, Mãe de Deus e modelo da Igreja, os Carmelitas encontram tudo aquilo que desejam e esperam ser. Por isto, Maria foi sempre considerada a Padroeira da Ordem, da qual é também chamada Mãe e Esplendor, e tida sempre pelos Carmelitas, diante dos olhos e no coração, como a "Virgem Puríssima". Olhando para ela e vivendo em familiaridade de vida espiritual com ela, aprendemos a estar diante de Deus e juntos como irmãos do Senhor. Maria, de facto, vive no meio de nós como mãe e como irmã, atenta às nossas necessidades, e junto a nós atende e espera, sofre e alegra-se.

O escapulário é sinal do amor materno, permanente e estável, de Maria para com os irmãos e as irmãs carmelitas.

Na sua tradição, sobretudo a partir do século XVI, o Carmelo manifestou a proximidade amorosa de Maria ao povo de Deus, mediante a devoção do escapulário: sinal de consagração a ela, meio da agregação dos fiéis à Ordem e mediação popular e eficaz de evangelização.

*CONSTITUIÇÕES DA ORDEM DOS IRMÃOS DA BEM-AVENTURADA VIRGEM MARIA DO MONTE CARMELO.

*Dom Frei Vital Wilderink, O , Carm. In Memoriam

Uma vocação não passa por cima de uma biografia da qual pode, inclusive, receber determinadas acentuações. O que ela não dispensa é sem uma abertura interrogante para um horizonte ao qual não se sabe dar um nome. É o “espaço”  que perpassa a própria história concreta do ser humano, mas não coincide com ela. Certos textos da literatura, especialmente certas poesias, de autores modernos, deixam entrever esse espaço fazendo com que o próprio leitor se sinta atraído por esses textos, não por meras razões estéticas, mas porque reconhece neles algo de si mesmo. São frequentemente determinados acontecimentos ou fatos, para outros talvez insignificantes, cujo impacto desfecha o espaço da auto transcendência que é inerente ao ser humano. Em termos religiosos corresponde ao “Tu nos fizeste para ti, Senhor” de santo Agostinho, embora esta dimensão nem sempre esteja presente de maneira consciente. No entanto, mesmo assim, não deixa de ser uma descoberta elementar do Mistério desta simples presença-a-si-mesmo e do existir-no-mundo.

Mas o homem que na sua história abre o espaço da sua auto transcendência ao Mistério sem nome, deixando aflorar a sua aspiração ontológica a uma plenitude,  não tem como exigir a revelação desse Mistério. É como a águia que tem a capacidade de voar muito alto, mas é incapaz de voar acima de si mesma. O chamado de Deus é sempre uma iniciativa gratuita de Deus. Tradicionalmente a teologia sempre faz a distinção entre natural e sobrenatural, e com razão. Mas é uma distinção que afeta o ser humano; certamente não pretende definir o Mistério atuante de Deus.   A iniciativa gratuita de Deus em se comunicar, ou seja a graça incriada não é, em si, natural nem sobrenatural: ela é presença do próprio mistério divino. Embora a sua aspiração ontológica a uma plenitude faça o homem estender os braços para uma presença desse Mistério – ainda sem nome -, a revelação dessa presença – um chamado -  é sempre nova, inesperada. É sempre um início que dá sentido ao tempo,  fazendo nele acontecer a história de uma vocação.

A busca do homem e a oferta gratuita de Deus encarnaram-se em Jesus Cristo. É por Ele, com Ele e n’Ele  que a nossa vocação transcorre no tempo e no espaço para  testemunhar essa Boa Nova da presença da graça de Deus revelada na glória humana de Jesus na história. Vocação é para fazer ver Jesus Cristo, ela é uma cristofania. É claro que ao falar de uma cristofania, não podemos deixar de considerar o mundo em que estamos inseridos. Não existe uma língua universal para a vocação O que há de único e universal nela é a caridade.

Como discernir o chamado de Deus onde o humano e o divino parecem mesclar-se? Normalmente deve ser feito um discernimento para ver se trata realmente de um chamado de Deus, levando em atenta consideração os impulsos e motivações que induzem alguém a determinadas opções. Ou, em sentido inverso, se não há uma inércia que impede de deixar-nos  levar pelo Espírito. É conhecido o itinerário de discernimento que Inácio de Loyola traçou nos seus Exercícios espirituais. Um dos critérios mais destacados para discernir que uma opção é feita para maior glória de Deus, e quando a pessoa experimenta uma profunda consolação cuja causa não sabe explicar. Outro critério: vocação sem abertura  aos outros é um contra-senso. Mas é bom lembrar que o caminho de encontro e relação com o mundo, não é um só. No discernimento vocacional deve-se levar em séria consideração o seu caráter eclesial. A Igreja, ela mesma, é Mistério como professamos no símbolo da nossa fé: creio na Igreja. O que não impede que ela possa ser uma provação. Quanto mais misturado com o concreto da história, tanto mais difícil torna-se uma opção vocacional. Os mistérios da Divindade encontram-se, de certa maneira, mais distantes e, por isso, perturbam menos, embora não seja tão raro alguém dizer que Deus às vezes desconcerta. O mistérios do Verbo encarnado já são mais difíceis a crer. Haja visto as inúmeras publicações que nos últimos anos tentam reduzir o paradoxo fundamental da fé cristã que é o mistério da encarnação. O que dizer então da fé referente a uma Igreja em que o divino e o humano não somente existem unidos, mas onde o divino nos é oferecido através de situações humanas negativas? Certo é que a Igreja jamais poderá aplicar a ela mesma as palavras de Jesus que ela anuncia: “Quem de vós pode acusar-me de pecado” (Jo 8,46).  Insistindo no caráter eclesial da vocação, não pretendemos voltar à dicotomia entre sagrado e profano, dicotomia de uma visão da Igreja voltada unilateralmente ad intra. A Igreja é sacramento da auto comunicação de Deus. Quando se fala do sacramento da Igreja, geralmente se pensa nos sete sacramentos. O mysterion do Novo Testamento é mais vasto e profundo que o sacramento latino. Os Padres gregos, quando falam da Igreja, eles se referem ao divino mistério do cosmos. A visão deles é que Deus criou o mundo para a Igreja, para deificar, divinizar sua criação, fazendo-a tornar seu próprio corpo cuja cabeça é Jesus Cristo e nós, os seres humanos, o resto do corpo. Esta visão já reaparece um pouco nos documentos do Concílio Vaticano II, e permite colocar a vocação eclesial em outra perspectiva.

*Dom Frei Vital Wilderink, O Carm- Eremita Carmelita- foi vítima de um acidente de automóvel quando retornava para o Eremitério, “Fonte de Elias”, no alto do Rio das Pedras, nas montanhas de Lídice, distrito do município de Rio Claro, no estado do Rio de Janeiro. O acidente ocorreu no dia 11 de junho de 2014. O sepultamento foi na cidade de Itaguaí/RJ, no dia 12, na Catedral de São Francisco Xavier, Diocese esta onde ele foi o primeiro Bispo.

Mãe e Irmã dos Carmelitas: Um Padre, a Morte e Nossa Senhora.

*Aparecido Antunes, sou ex-frade carmelita,

O ano é 2002, decorriam as festividades dos 750 anos do escapulário, e fui convidado para participar da visita da Imagem peregrina na cidade de Pouso Alegre, juntamente com outros frades e as irmãs carmelitas do Divino Coração.

Durante uma semana, visitamos várias paróquias, escolas e o Carmelo das monjas de clausura, fizemos carretas e muitas homenagens.

Mas uma visita me marcou muito, foi quando a Imagem peregrina visitou um hospital público e lá podia se sentir a fé e o carinho com que as pessoas acolhiam a Mãe de Jesus em suas vidas naquele momento de dor e sofrimento. Mas um fato faria compreender concretamente o que é ser Carmelita.

De quarto em quarto, eu e a Ir. Lúcia levávamos uma pequena imagem de Nossa Senhora. Visitávamos os acamados impondo o Santo escapulário e levando uma palavra de esperança. Em um desses quartos vimos uma família conversando e num quanto do quarto uma cama com um senhor muito idoso, muito debilitado. Fomos até ele e sua aparência não era tranquila e sim longe e dispersa, mas ao ver a imagem de Nossa Senhora uma força brotou dentro de seu coração e com dificuldades ele quis pegar a imagem e abraça-la como quem encontra alguém muito querido.

Perguntamos se ele queria receber o escapulário, acenou com a cabeça que sim e assim o fizemos. Neste momento a família se deu conta que estávamos ali, parece que estavam já conversando como seriam aquelas próximas horas. Então uma moça se aproximou, perguntei se aquele senhor seria parente dela, ela disse que sim, era tio. E que ele era padre.  Imagine o nosso espanto!

Segundo ela, ele morava num povoado próximo de Pouso Alegre e que por muito tempo  viveu nesse povoadinho isolado e longe da agitação. E tinha a fama de ser muito duro, rígido, bravo e isso o afastou do convívio dos padres da região.

Após essa conversa, pedimos ao padre se ele poderia nos dar uma benção e traçando uma cruz na nossa frente, já com o olhar radiante. Fomos embora, consternados e pensativos!

Durante a noite, vinha na minha cabeça à imagem daquele padre, ali não inteiramente só, mas como se aqueles parentes estivessem ali só para dar sequência nos fatos que poderiam acontecer naquela noite presentes ali, mas nenhum sinal de afeto, frios. Logo de manhã participei da missa na capela das monjas, e no final da celebração o padre que presidia disse que tinha um aviso.

“Nesta madrugada, faleceu o padre... os mais velhos devem conhecê-lo e sabem do seu temperamento e de sua rigidez, mas um fato talvez poucos saibam. Quando ainda era seminarista em Mariana, o diretor espiritual chamou todos os seminaristas para uma conversa e disse que era importante que seguissem um itinerário espiritual e sugeriu que todos passassem a seguir aos ensinamentos da Ordem Terceira de São Domingos, dos Padres Dominicanos. E assim os seminaristas fizeram, menos um Padre.... Esse teimou com seu diretor espiritual que não queria ser da Ordem Terceira Dominicana, mas da Ordem Terceira do Carmo. E assim, a contra gosto do seu diretor espiritual ele se consagram na Ordem Terceira do Carmo. Assim, um pacto estaria selado, uma aliança duradoura entre ele e a Irmã dos Carmelita.

Aliança, que não se rompeu apesar da distancia entre aquele dia e o desta madrugada, pois antes da aurora da vida nova, Nossa Senhora confirma sua promessa e vem ao encontro de seu irmão, juntamente com um frade e uma irmã. Tem sinal mais claro que ser Carmelita é pertencer a uma família?”.

Naquele momento, entendi o que é Ser Carmelita, é pertencer a uma família, terrena e Celestial.

*Chamo-me Aparecido Antunes, sou ex-frade carmelita, casado com Josely, pai do João, da Maria e da Júlia.

 

Frei Christopher O’Donnell, O. Carm.

(Texto para o programa, " A Palavra do Frei Petrônio",  de hoje, terça-feira dia 4, logo mais às 20h. Para interagir ao vivo, Adicione o Frei na página: www.facebook.com/freipetros Acompanhe também aqui no Olhar).

A Escravidão de Maria

Podemos lembrar o surgimento, no século XI, do que se chamaria mais tarde de “escravidão de Maria”. São Bernardo, por exemplo, chamava-se de pajem de Maria (servuli). Isso pode ser significativo para a difundida ideia carmelitana da vassalagem, que encontraremos posteriormente.

Não só os Carmelitas

Como veremos, os carmelitas que foram para a Europa assumiram muitas dessas práticas e crenças existentes. Se nos restringirmos a estudar apenas o que é carmelitano, corremos o risco de subestimar e mesmo de negligenciar uma parte considerável de nossa herança mariana. Em vez disso, devemos tentar ver toda vida mariana dos primeiros frades carmelitanos, das quais apenas algumas partes serão específicas deles mesmos.

Existem diversos paralelos com outras ordens, tais como os cistercienses, os cônegos premonstratenses  e, é claro, os dominicanos. Precisamos em primeiro lugar, levantar a questão da identidade carmelitana, descrita particularmente nas primeiras Constituições e títulos da Ordem.

O Século XX

No século XX tivemos o chamado “Movimento Mariano”, um tempo de grande entusiasmo, congressos, escritos, crescimento devocional.[i]  Esse tempo culminou na definição do dogma da Assunção (1950) e no Ano Mariano (1954). Depois disso houve um declínio, apesar do significativo ensinamento do Vaticano II. Com o importante documento de Paulo VI, Marialis cultus (1974) e de João Paulo II, Redemptoris Mater (1987) houve uma gradual recuperação. A partir da metade de 1970 houve uma abundância de trabalhos eruditos, essenciais sob todos os aspectos, de mariologia.

Na ordem, o ano de 1950 também foi um clímax do século XX com o caloroso endosso do Escapulário por Pio XII na carta Neminem profecto latet.  Mas os anos seguintes testemunharam algum declínio e falta de energia da parte da Ordem. A historicidade da visão do Escapulário foi submetida a um minucioso exame. Apesar da evidência desta visão ser considerada inadequada por severos estudiosos como Jean de Launoy (+ 1678) e Herbert Thuston (+ 1939), suas opiniões não influenciaram muito a apreciação que a Ordem tinha do Escapulário. Mas os valentes esforços de B. M. Xiberta em defender a autenticidade da visão do Escapulário[ii]  foram gradualmente colocados em dúvida. Foram feitas afirmações mais específicas, que não confortaram aqueles cuja tranquila certeza anterior sobre a visão do Escapulário tinha sido perturbada.  O Privilégio Sabatino, baseado numa suposta visão de João XXII foi considerado como uma mentira medieval.  No Próprio da Missa Carmelitana de 1972 não houve festa ou memorial para Simão Stock. A revisão inicial do Calendário para a Igreja Universal, posteriormente, omitiu a festa de Nossa Senhora do Monte Carmelo.

Mas também houve uma recuperação, um tanto irregular, da consciência mariana carmelitana datando do capítulo geral extraordinário de 1968. Tal capítulo apresentou Maria nos termos do Vaticano II e defendeu o significado do Escapulário.

Estas questões encontram-se por trás do capítulo geral de 1971 e são, de certo modo, percebidas em alguns encontros do conselho das províncias, congregações gerais e capítulos. A revisão do Missal Romano em 1969 restaurou a celebração de Nossa Senhora do Monte Carmelo. Para a Ordem Carmelitana a Missa e o Ofício de São Simão Stock foram reintegrados pela Santa Sé em 1979.

Junto a esses desenvolvimentos podemos ver na bibliografia anual no Carmelus que tem havido um crescente interesse na mariologia carmelitana e nos escritos realizados pelos membros da Ordem sobre a Virgem Maria. Em 1989 aconteceram três congressos marianos na Ordem: no Centro Santo Alberto em Roma, Sassone fora de Roma e Nova Iorque. Uma conferência em Reno (1998) foi celebrada pela grande família carmelitana nos Estados Unidos.

Portanto, o tempo atual é apropriado para abordarmos novamente o carisma mariano da Ordem e para apresentá-lo em termos apropriados à Igreja contemporânea. Esse breve trabalho quer examinar as origens e o desenvolvimento do carisma mariano carmelitano.

*Comunicações Carmelitanas-Melbourne Austrália. 2000.

[i]  Roschini, Maria 4:425-495; R. Laurentin, La question mariale (Paris: Seuil, 1963) = Mary’s Place in the Church (London: Burns and Oates, 1965) cap. 2.

[ii]  De visione sancti Simonis Stock (Roma: Carmelite Institute, 1950).

Frei Christopher O’Donnell, O. Carm.

Doutrina

As grandes verdades sobre Maria foram defendidas no século XIII. O dogma de sua Maternidade Divina tem sido celebrado desde o Concílio de Éfeso (431). A Assunção de Maria está presente na liturgia desde o século VI e sua festa litúrgica teve uma oitava a partir de Leão IV (+ 855). A Virgindade Perpétua de Maria é questão pacífica desde o tempo do Concílio não-ecumênico Lateranense de 649. O quarto Concílio Lateranense usou a frase “Maria sempre virgem” em sua fórmula do Credo para os albigenses e cátaros. Acreditava-se também na Imaculada Conceição, mas muitos teólogos tinham sérias reservas, principalmente os seguidores de Tomás de Aquino. Sua festa começa a ser celebrada na liturgia a partir do século XII. Foi o papa siro-siciliano Sérgio (+ 701) quem estabeleceu uma procissão solene em Roma para quatro grandes festas marianas: o Nascimento de Maria (08 de setembro), a Apresentação (02 de fevereiro), a Anunciação (25 de março) e a Assunção (15 de agosto).

Além dessas verdades de fé, existia uma ampla crença em outras verdades sobre Maria. Em distintos lugares encontramos importantes afirmações sobre a união de Maria com seu Filho na Redenção. Em São Bernardo e, mais tarde, em Santo Alberto Magno e em São Boaventura, encontramos esboços da doutrina da mediação de Maria. O Memorare, atribuído a São Bernardo, tem algumas frases dele mesmo, apesar de em sua forma atual ser do século XV ou mesmo anterior. A maternidade espiritual de Maria, afirmando que ela é nossa Mãe e Mãe da Igreja, foi ensinada com muito mais clareza a partir do século XI, quando teólogos como Anselmo de Lucca (+ 1086) e Rupert de Deutz (+ 1130) começaram a aprofundar a verdade latente na cena aos pés da cruz relatada por João (19,25-28a). A apresentação de Maria como Rainha já estava presente com freqüência nos sermões e nos hinos do século VI. Foi encontrada há muito tempo nas liturgias, tanto do Oriente quanto do Ocidente e tornaram-se marcantes no século XIII.

Devoção

Quando olhamos para as orações e devoções marianas no século XIII encontramos uma grande riqueza. Já existiam então muitos santuários e lugares de peregrinação marianos. Por exemplo, na Inglaterra foram fundados dois antigos santuários: Walsingham (1061) e Glastonbury (do século VII, reconstruído em 1186). O santuário de Einsiedeln, na Suíça, data do século X. Poemas em língua vernácula são encontrados especialmente a partir da metade do século XII.

Existiam muitas devoções a Maria naquele tempo. A coleção de orações de diversos tipos começou no período carolíngio. Uma das mais conhecidas era o Livro das Orações Sagradas (Libellus sacrarum precum), datado do final do século IX, contendo várias orações marianas. Mais tarde, encontramos os Livros das Horas, cuja essência foi o Pequeno Ofício da Bem-aventurada Virgem. Sua origem foi uma devoção adicional (cursus) acrescentada ao Ofício canônico assim como aos ofícios votivos da Bem-aventurada Virgem, que surgiram com os carolíngios. Este material foi reorganizado por São Pedro Damião (+ 1072) e recomendado por ele para uso diário.

Existiam muitos hinos e orações marianas circulando no século XIII, que foram incorporados à liturgia e às orações comunitárias carmelitanas. A primeira parte da Ave Maria já existia mais ou menos a partir do século VII. Era um elemento do Pequeno Ofício e foi recomendada por Pedro Damião para recitação freqüente. O acréscimo do nome “Jesus” pode vir do tempo de Urbano IV (+ 1264), mas a segunda parte da oração (“Santa Maria...”) é do século XV. Os hinos comuns durante esse período incluíam o Ave maris stella que data do século IX. As quatro grandes antífonas marianas já eram conhecidas: Alma redemptoris mater (século XII), Salve regina (talvez do século XI), Ave regina caelorum (século XII) e o Regina coeli (provavelmente do século XIII).

Outras formas mais populares de oração foram encontradas nesta época. As ladainhas marianas surgem mais ou menos no século XI com a Ladainha de Loreto, datando do final do século XII, com 73 invocações. Uma ladainha irlandesa com 76 invocações pode datar do século XII. Da mesma forma, saudações a Maria, muitas vezes repetidas 150 vezes correspondendo ao Saltério (Grusspsalter), começaram a ser usadas a partir de 1130. Estas últimas teriam dado origem ao Rosário, que tomou sua forma atual no começo do século XV. Coleções das Alegrias (cinco) e Dores (sete) de Maria (Marienklagen) também são do século XII. A grande seqüência Stabat Mater é provavelmente do final do século XIII, talvez do franciscano Jacopone da Todi (+ 1306). O costume de dizer três Aves Marias à noite pode datar do século XI. Gregório IX (+ 1241) ordenava que os sinos tocassem para que o povo pudesse oferecer as Aves Marias às Cruzadas. A primeira coleção de legendas sobre Maria apareceu no século XI, o Liber de miraculis santae Dei genetricis Mariae.

As vidas de Maria, muitas vezes baseadas vagamente nos Ofícios, tornaram-se populares no século XII. Irmandades marianas são encontradas a partir da primeira metade do século XIII, especialmente na França e na Itália.

Uma importante área de interesse para a antiga mariologia carmelitana foi ressaltada por E. Boaga. Ela lembra o número de santuários e de lugares sagrados na Palestina que foram associados à Maria nas escrituras, nos apócrifos e nas tradições orais.   Posteriormente, eles nos ajudarão a compreender mais plenamente o significado da escolha de Maria como Protetora do oratório do Monte Carmelo.

*UMA PRESENÇA AMOROSA: MARIA E O CARMELO. Um Estudo da Herança Mariana na Ordem. Comunicações Carmelitanas-Melbourne Austrália. 2000

No vídeo, imagens da celebração eucarística de entrada dos irmãos e irmãs da Venerável Ordem Terceira do Carmo de São João del Rei-MG. A Missa foi celebrada por Frei Petrônio de Miranda, O. Carm. Delegado Provincial para Ordem Terceira do Carmo. São João del Rei-MG. 1º de julho-2017.