Imagens da primeira noite da Novena de Nossa Senhora do Carmo em Angra dos Reis/RJ. Imagens: Olhar Jornalístico. Convento do Carmo, 7 de julho-2021. 

(Leituras do dia: 1Rs 18,42-45; Jo 19,25-30).

Frei Martinho Cortez, O. Carm. In Memoriam (*20 /02 1938 + 04/08 2020)

 

1 — Nas origens: capela de Santa Maria.

             É uma presença constante, “que tem exercido um vital e profundo influxo” no Carmelo. No monte havia uma capela dedicada a Maria. O carmelita, falando do “seguimento de Jesus” (Regra), cultivou naturalmente aquela que disse “sim” ao plano de Deus. Ele é sua padroeira original, que em seguida é venerada com outras formas de devoção e títulos. A veneração de Maria se prende ao fato de ela ser Mãe do Verbo de Deus, na pessoa de Jesus. Para isto ela tinha de ser imaculada (Imaculada Conceição) e, no fim, da vida, recebeu a graça de voltar para Deus de corpo e alma (Assunção). Maria, Mãe de Deus, é a Nova Eva (salvação) e a Mulher Coroada de Estrelas (Apocalipse). Tudo em sua vida, sobre a qual pouca coisa temos nos Evangelhos, é motivo de alegria, de esperança, de adoração ao Senhor. O Carmelo habituou-se a relacionar-se com ela como mediadora, protetora, santíssima, intercessora, e a lhe prestar honras, endereçar-lhe orações e imitar suas virtudes. Tornou-se um modelo de espiritualidade por sua pureza virginal, humildade consciente, sentido da presença de Deus e de serviço generoso ao próximo. Por Cristo primeiro, os carmelitas chegaram a Maria; depois, por Maria chegaram cada vez mais a Jesus! Chamavam-na de “Mãe de Deus” e “Toda Santa”, e a Ordem do Carmo passou a ser eminentemente mariana, porque, além de terem surgido na terra de Maria – a Terra Santa – foram para lá na qualidade de “peregrinos” e por causa de Jesus. Por isso ela, como verdadeira Rainha, é chamada de “a Senhora do Lugar”: sua beleza é como a beleza do monte Carmelo em tempo de floração; o tema da “nuvenzinha” de Elias é visto em Maria como seu poder de intercessão, que faz cair sobre da parte de Deus uma chuva de graças (“medianeira” – 1Rs 18, 42-45). — Ou seja: nas origens da Ordem do Carmo, Maria aparece nas citações bíblicas, nas tradições da região do monte Carmelo e na consciência que possuíam os carmelitas do papel dela na história da Salvação. Daí a história da espiritualidade carmelita revelar que a Ordem do Carmo sempre se relacionou com Maria em acentuações de afeto, ternura, cordialidade e familiaridade íntima.

 

2 — Na Idade Média: a Senhora do Lugar.

             Desde o início Maria foi para os carmelitas protetora e sua padroeira. Aprofundamentos são feitos, desenvolve-se o modo de exprimir a devoção, fica mais rico o conteúdo da fé. Chega-se a um ponto em que, entre os carmelitas, Maria é claramente venerada como a “Mãe do Senhor”, a “Senhora do Lugar” (patrona), a “Virgem”, a “Imaculada”, a “Toda Bela”, a “Mulher Coroada de Estrelas”, a “Mãe do Redentor” (Virgem puríssima), a “Libertadora” (livra das penas do purgatório) e a “Preservadora” (força para evitar no fim da vida a pena capital do inferno). — O significado de “patrona” faz pensar em dedicação, proteção, senhorio. Disso foi que nasceu a consciência de a Ordem do Carmo ter sido fundada para a hora e o serviço de Maria. Por conseqüência, tudo na Ordem era feito através de Maria: a espiritualidade, a profissão de vida consagrada, o uso do hábito e a dedicação das igrejas. Daí, também, o alcance do nome oficial da Ordem: Irmãos da Bem-aventurada Virgem Maria do Monte Carmelo. Em geral, as igrejas carmelitas recebem o nome de Igreja de Nossa Senhora do Carmo, Igreja do Carmo. A profissão de consagração à vida carmelita é feita também em nome da Virgem do Carmo. O hábito oficial da Ordem, que inclui a capa branca, sinal da pureza virginal de Maria, incorporou o Escapulário, inicialmente um avental de serviço dentro de casa, nas horas ou nos jardins. O Escapulário ficou sendo um sinal de serviço a Deus pelo serviço a Maria. No conjunto de hinos e celebrações do Carmelo, mesmo as celebrações eucarísticas, incluiu-se o nome de Maria, a própria ave-maria e a salve-rainha. As orações e antífonas proclamavam as virtudes e excelências da Mãe de Deus e sua mediação. Os escritores, pregadores e teólogos carmelitas se referiam cada vez mais freqüente e profundamente das glórias da Mãe e Esplendor do Carmelo. — Do meio para o fim da Idade Média, a Ordem do Carmo dedicava a Maria grandes temas de sua espiritualidade: a “conformidade de vida” (“Tudo em Maria”, “O Carmelo é todo de Maria”); a “maternidade de Maria em relação à Ordem” (“Mãe e Esplendor do Carmelo”; tudo, até a origem da Ordem, é mariano!). O objetivo de vida segue sendo a intimidade com Deus pelo seguimento de Jesus, mas, por isso mesmo, é que o Carmelo funciona com base no ser/agir da Mãe de Deus (cf. também presença de Maria junto à Cruz: Jo 19, 25-30)

 

3 — Na passagem para os tempos modernos: a intimidade com Maria vira fraternidade.

             Ao final da Idade Média emergiu no Carmelo uma reflexão profunda sobre a “virgindade” de Nossa Senhora em sua condição de Mãe do Puro Amor (Deus). Era uma exigência decorrente da espiritualidade carmelita: para estar sempre na presença do Senhor, fundamentar-se numa vida de “coração puro e reta consciência”. Maria Puríssima e Santíssima tinha de ser modelo de inspiração e imitação. Maria então passou a ser sentida ainda mais como “companheira de caminhada e consagração”. Sua pureza e santidade deviam ser como “atitudes vitais de entrega e abandono a Deus, e de conformidade à sua vontade”. Traduziu-se tudo isso na palavra “Irmã”, com o sentido de “fraternidade na virgindade” (santidade de vida), “fraternidade na vida em comum” (comunidade de vida) e “fraternidade na pertença por consagração” (membro da Ordem). A pureza de Maria na vida dos carmelitas passou a ser vivida como “beleza”, como “ausência de mancha”, como sinônimo de “vida totalmente disponível à união com Deus”. Esta “união com Deus” se faria como de fato se deve fazer: pela aceitação plena da vontade do Senhor, pela criatividade a partir dela, pelo testemunho diante do mundo e pela profecia em favor da justiça e da paz. Santa Maria Madalena de Pazzi escreveu: “a leveza no corpo, a alegria no coração, a liberdade na vontade, a transparência na inteligência, a lembrança dos benefícios na memória, a verdade nas intenções, a simplicidade nas ações, a veracidade nas palavras, a  mortificação nos sentimentos: assim (alguém) poderá elevar-se com Maria”. Elisabete da Trindade, por sua vez, chamado-a de “Porta do céu” ensinava: “Existe uma criatura que conheceu este dom de Deus, uma criatura que não perdeu nenhuma parcela deste dom, uma criatura que foi pura, tão luminosa que parece ser a própria Luz: “Speculum justitiae” (espelho de justiça); uma criatura cuja vida foi tão simples. Tão perdida em Deus, que quase nada se pode dizer a respeito: “Virgo fidelis” — é a virgem fiel, aquela “que guardava todas as coisas em seu coração” (Lc 2,51).

 

Conclusão

             Os carmelitas, em sua espiritualidade, sempre se relacionaram intimamente com Maria Santíssima, de tal modo que ela se tornou entre eles uma presença mística (na qual se pode fazer a experiência de Deus); uma companheira de caminho à luz do Evangelho (experiência da vida cristiforme), uma mulher digna de imitação (união mística com Maria, vida marieforme) e uma possibilidade de reproduzir o amor de Jesus pela Mãe (atualização e volta a Cristo). Por meio da devoção ao Escapulário do Carmo, os carmelitas pretendem não somente vender o produto de uma espiritualidade sempre atual (“O cristão do século 21 ou será um santo ou nada será” – Karl Rahner), como também continuar afirmando, apesar os pesares (relaxamento, decadência, defasagem espiritual) o que afirmamos a oito séculos: que Maria é a grande protetora humana dos irmãos de Cristo; que ela nos ajuda a alimentar a fidelidade a Deus, a viver uma vida de serviço ao Reino de Deus e a confiar plenamente em que, por sua intercessão, não fica difícil obtermos a salvação!

Fonte bibliográfica única: Boaga, E. – “A Senhora do Lugar”, Edição Carmelita, 1994, Paranavaí – PR.

 

Santo Eliseu é um dos profetas citados no Antigo Testamento, sua história está relatada na Bíblia, mais precisamente no livro de II Reis.

 

O nome desse profeta que foi discípulo de Elias significa “meu Deus é salvação” em hebraico. Sua atividade profética foi exercida em Israel durante os reinados de Ocozias, Jorão, Jeú e Joacaz. Ele era filho de Safat e vivia em Abel-Meolá, onde Elias o encontrou e o ungiu conforme o Senhor ordenara.

Eliseu acompanhou e serviu a Elias por um tempo, antes que fosse arrebatado em direção aos céus numa carruagem de fogo.

Eliseu pediu a Elias uma "porção dobrada do espírito de Elias" como vontade de sucedê-lo na obra do Senhor. E foi lhe dada uma porção dupla da sua unção assim que Elias lançou sobre ele seu manto oficial.

Após ter recebido o espírito profético, ou seja, o dom da profecia, começou a profetizar em Israel, realizando muitos atos miraculosos. As Escrituras relatam cerca de vinte milagres realizados por Eliseu, que vão desde a ressurreição de um menino até ao aumento do azeite de uma pobre viúva. Um dos mais conhecidos, senão o mais importante, é o que trata da cura do sírio Naamã, que era general do rei da Síria. Aquele homem, de elevada posição social, havia sido contaminado pela lepra. Naqueles tempos, a lepra era uma doença incurável, a qual excluía a pessoa completamente do convívio social. Naamã, então, ouviu falar a respeito de Eliseu e foi até ele, suplicando-lhe que fosse curado. Eliseu, então, manda que ele se banhe nas águas do rio Jordão. Ao sair do banho, Naamã estava curado. Ele agradece ao profeta e retorna para a sua terra, levando consigo uma porção de terra do solo israelita e afirmando que daquela hora em diante serviria somente ao Deus dos hebreus.

Eliseu exerceu sua atividade durante mais de sessenta anos. Assim, ele acompanhou de perto a sucessão de vários reis e presenciou muitas guerras, invasões e fomes que assolaram Israel. O rei Jeú foi ungido por Eliseu, o qual o apoiou em sua determinação de acabar com o culto pagão ao deus Baal.


Eliseu adoeceu e morreu já em idade avançada. 

A Bíblia afirma que Eliseu encontrava-se doente, passando por sofrimento tamanho que comoveu o coração de Joás, rei de Israel. “E Joás, rei de Israel, desceu a ele, e chorou sobre o seu rosto, e disse: “Meu pai, meu pai, carros de Israel e seus cavaleiros!” Eliseu adoeceu e morreu já em idade avançada. Fonte: https://www.arautos.org

 

Frei Jorge Van Kampen, Carmelita. In Memoriam. (*17/04/1932 + 08/08/2013)

Que Cristo foi transpassado por uma lança verifica-se ao pé da terra nas palavras de Zacarias (I2,10). De Jesus não se quebrou nenhum osso; para se cumprir o que ordenava a Lei de Moises a respeito a respeito do cordeiro, que se sacrificava na Páscoa (Ex. 12,46)! Ao mesmo instante saiu sangue e água. O sangue era sinal do próprio sacrifício pelos pecados, como recorda a carta aos Hebreus 9,21: “Sem derramar o sangue não se apagam os pecados”.

A água, no Evangelho, é sinal de graça, ou seja, do dom do Espírito Santo. João primeiro, e a Igreja depois dele, vão ver sair do coração aberto de Cristo os sacramentos do batismo e da eucaristia: água e sangue. Da cruz brota para nós o perdão e a vida nova. Ver o Jô. 5,6: “Tanto a água como o sangue são sinais de Jesus Cristo. Não só água, mas a água com o sangue. São também os sinais do Espírito Santo por ser Ele o Espírito da Verdade”.

O coração aberto nos convida a descobrir o amor poderoso e o segredo, que inspirava toda a vida de Jesus. Os que rodearam e conviveram com ele, verão diluir e a estender com o tempo estas recordações e emoções, mas descobrirão também, que não houve palavras, gestos, incluído o silêncio, que em Jesus manifesta o Amor de Deus.

O coração aberto deu origem à devoção ao Coração de Jesus. Convida para não se perder em emoções, mas aprofundar as considerações e palavras, que explicam a fé, e assim nos levam a olhar melhor para Jesus, e contemplar o Seu amor, e a deixar-nos transformar na Sua imagem.

*25/12/1929 +13/05/2021

 

Hoje o Cristo recebe sua noiva no céu: Irmã Natalina, o. Carm, do Carmelo de Paranavaí/PR nos deixa após vida profunda de oração, contemplação e entrega.

Natural de Itu (SP), fez sua profissão temporária no Carmelo em 1954 e a profissão perpétua em 1957. Foi compositora litúrgica de canções como "Se conhecesses o dom de Deus" da (CF 2011), "Suba a Ti ó Deus Pai" (CF 96) e tantos outros cantos da espiritualidade e vivência do Carmelo.

Junção entre a Oração Litúrgica e a Oração Contemplativa

               A característica principal do grande Profeta é a oração, de que a sua vida está impregnada. Por isso, São Tiago apresenta-o como modelo vivo de contínua oração. Descobrimos na oração de Elias uma união providencial da oração oral e da oração contemplativa, esta última entendida no duplo significado de ativa e passiva.

               Temos nele um exemplo de oração litúrgica, pois na escola dos Profetas dava-se muito realce ao canto dos louvores divinos. A significação da palavra "Profeta" era na Lei antiga muito mais ampla do que agora. Profeta era não só aquele a quem Deus havia dado o dom da profecia, de vaticinar, mas também o que cantava as glórias de Deus juntamente com os outras, geralmente sete vezes por dia. Lemos, por exemplo, na história de Israel, que Saul contava-se entre os profetas não por possuir o dom da profecia, mas por haver-se unido a estes grupos peculiares no canto das glórias divinas. Elias foi Profeta em todos os sentidos que a palavra tem. Tinha uma escola e vários discípulos espalhados por diversos lugares; provavelmente presidia-lhes na oração, feita a horas determinadas.

               Podemos, pois, dizer que a oração litúrgica tem uma antiquíssima tradição, não obstante a posição secundária que ocupa em confronto com a oração mais profunda da meditação e da contemplação.

               A nossa Ordem não é uma Ordem de oração litúrgica como o éa antiga Ordem oriental dos monges de S. Basílio ou a ocidental dos Beneditinos; porém, o rito próprio da Ordem não deixa de dar-lhe singular relevo. Ocupa posição muito importante na nossa vida com Deus. A Regra convoca-nos para a celebração litúrgica em Coro do Ofício divino.

               Santa Teresa, atraída pela estima da oração litúrgica, impregnou-a de tal maneira com santas considerações, que transformou, em certo sentido, em oração contemplativa, em oração de contemplação ativa. Foi sempre notável a influência e atração da singela e devota oração litúrgica na Ordem do Carmo. Mais de um Carmelo se fundou por este motivo na Europa.          

              

Crescimento da Vida Contemplativa no Deserto pelo Alimento da Eucaristia

                A espiritualidade Carmelitana concebe a vida espiritual como algo orgânico que cresce. Neste ponto a vida do profeta dá-nos outra lição notável. A vida espiritual, do mesmo modo que a vida natural, pede alimento. A Sagrada Escritura narra que Elias, robustecido pelo alimento que o Anjo lhe ministrou, andou quarenta dias e quarenta noites até ao monte Horeb, onde lhe foi dado contemplar a Deus. A vida espiritual e a vida mística anseiam pelo santo Alimento que Deus nos dá no Santíssimo Sacramento da Eucaristia.

               Na escola do Carmelo a vida contemplativa e mística é fruto da vida eucarística. A vida de Elias apresenta um dos mais típicos símbolos, prefigurativos do Santíssimo Sacramento do altar, fonte da nossa vida de oração. O pão milagroso que o Anjo lhe deu é uma imagem perfeita do alimento eucarístico por cuja força percorremos a jornada da vida terrena.

               O culto especial da Eucaristia não é exclusivo da Ordem do Carmo. Contudo, é lícito afirmar que tem sido sempre uma parte importante da tradição carmelita. Os nossos conventos foram em muitas ocasiões verdadeiros centros de culto eucarístico. Santa Maria Madalena de Pazzi sentiu-se atraída para o Carmelo de Florença porque as religiosas deste mosteiro recebiam diariamente a Sagrada Comunhão, costume pouco comum naquele tempo. Para Santa Teresa não havia maior alegria do que a abertura de uma nova igreja ou capela, novas moradas para o Senhor. A Regra prescreve que todos os membros da Comunidade Carmelita assistiam diariamente a Santa Missa e que a capela esteja no centro do claustro, facilmente acessível a qualquer hora do dia, e que as Horas Canônicas sejam rezadas na presença do Santíssimo Sacramento.       

               Por ser uma Ordem mendicante, a arquitetura das igrejas e conventos costuma ser simples, mas a pobreza não se estende a ornamentação das igrejas e dos altares. Nisto nota-se uma divergência acentuada dos costumes de outras Ordens mendicantes por exemplo, a dos Capuchinhos, em que a pobreza atinge o próprio santuário.            

               Eis em breves traços a tradição eucarística do Carmelo. Com Elias caminhamos pela força do pão divino. Já que na oração nos achegamos a vida divina, lembremos continuamente o mandamento do Salvador: "Se não comerdes a Carne do Filho do Homem e não beberdes o Seu Sangue, não tereis a vida em vós". Da mesma maneira que a comunhão de Elias no pão milagroso do deserto o conduziu na sua caminhada até a contemplação de Deus no Horeb, assim também a Eucaristia deve conduzir-nos a contemplação da Sua Santa Face. Nas cavernas de Horeb Deus falou ao Profeta no murmúrio da brisa ligeira. O Senhor não estava na tempestade nem no terremoto, mas na leve aragem. É desta maneira que na Comunhão havemos de contemplá-lo sob as espécies eucarísticas e nas profundezas do nosso espírito, pois Deus passa aí.

 

A Tríplice Base da Vida de Oração de Elias

                 Quando Elias, num carro de fogo, foi levado deste mundo, o discípulo Eliseu implorou-lhe o seu duplo espírito. No manto, que apanhou e com que se cobriu, Eliseu recebeu a herança implorada. O manto do profeta significou para ele segurança, e, pelos milagres com ele realizados, os discípulos entenderam que o espírito de Elias se encontrava nele. Andou Eliseu no espírito e na força de Elias; os seus discípulos também o imitaram. Este mesmo espirito tem-no a Ordem do Carmo procurado constantemente conservar nos seus membros, recordando-lhes sempre o ideal do duplo espírito e a promessa da dupla coroa.

Vida na Presença de Deus

                A discussão sobre o grau de contemplação a que Elias foi elevado no monte Horeb não passa duma questão acadêmica. Alguns afirmam que ele viu o Senhor face a face como nós esperamos contemplá-lo no Céu. Todos os escritores espirituais incluem Elias entre os visionários místicos mais favorecidos por Deus. A sua experiência no monte Horeb foi um reflexo antecipado daquilo que havia de testemunhar no Tabor quando o Salvador se transfigurou; Moisés e Elias apareceram como participantes da Sua deslumbrante glória. A Sagrada Escritura narra que a face de Moisés, ao descer do monte Sinai logo após o colóquio com Deus, irradiava tal esplendor e brilho de luz divina, que os judeus não ousavam erguer os olhos para ver-lhe o rosto. De Elias não se diz isto. Vêmo-lo, porém, voltar aos Judeus como vindo dum outro mundo, do próprio Céu, e ouvimo-lo dizer: Vivit Deus in cujus conspectu sto - Vive Deus em cuja presença estou. Eis a base da vida de oração.

               A sua vida na presença de Deus, a consciência de estar diante da face do Senhor, é uma grande característica que os filhos do Carmelo herdaram do insigne Profeta: Conversatio nostra in calis est _ A nossa conversação está nos Céus. Elias, ainda não levado para o Céu, vivia no Céu cá na terra, conservando-se devoto diante do trono de Deus: "Deus vive, estou diante da Sua face". As palavras do Arcanjo Rafael a Tobias são uma reminiscência das palavras de Elias. Acompanhou o jovem Tobias sob o nome de Azarias e, depois de havê-lo trazido são e salvo acabada a viagem, revelou-se como um Anjo de Deus: "Um dos sete que assistimos diante do Senhor". "Parecia-vos que eu comia e bebia convosco, mas o meu alimento é um manjar invisível, e a minha bebida não pode ser vista pelos homens". Esta vida na presença de Deus é de máxima importância na vida religiosa.

               Não é preciso explicar que o exercício da presença de Deus não pertence exclusivamente a Ordem do Carmo. Está na raiz de toda a vida espiritual e, embora haja vários métodos, todos os escritores espirituais o consideram como elemento essencial para o desenvolvimento da vida religiosa. No Carmo, porém, assume posição especial. É significativo que uma das obras mais conhecidas sobre a prática da presença de Deus seja da autoria de um simples Irmão leigo do Carmo de Paris. Frei Lourenço da Ressurreição nasceu em 1666 e morreu aos 25 anos. O livro não passa de um pequenito opúsculo, mas contém quatro diálogos e dezesseis cartas de suma importância. Publicado um ano após a morte do Irmão, foi traduzido pouco depois para o inglês. Desde então tem sido editado em quase todas as línguas, inclusive o esperanto.

               Na nossa época temos um grande exemplo deste exercício em Santa Teresa do Menino Jesus e da Santa Face. A sua devoção à Santa Face é a manifestação desta prática. Também a Santa Madre Teresa de Ávila se distinguiu por esta devoção. Em muitas igrejas antigas nossas encontramos vestígios da devoção carmelitana à Santa Face, cuja reprodução pode ver-se no grande fecho da abóbada da capela-mor das nossas antigas igrejas de Mogúncia e Francfort-sobre-o-Meno. Lá do alto contempla as cadeiras corais, e, rodeada de textos apropriados, lembra aos frades e oração que os olhos de Deus sempre estão sobre eles e que eles devem erguê-los para a Santa Face.

 

Amor da Solidão

                Elias não é somente o arquétipo dos contemplativos, colocado bem no centro e coração da Lei Antiga, mas é também um grande asceta. Nisto encontramos uma segunda base para a sua vida de oração: o amor à solidão a que continuamente volta; é o próprio Deus que para aí o dirige. Antes, porém, de orná-lo com os seus dons abundantes, Deus exigiu-lhe profundas renúncias. "O grande eremita, assevera S. Jerônimo, o amante da solidão, éconduzido para o deserto pelo espírito de Deus". É lá que entende as palavras do Salmista: Sedebit sollitarius et tacebit et levabit se supra se - O solitário sentar-se-a e no silêncio elevar-se-a acima de si mesmo.

               No seu desprendimento do mundo achamos uma terceira base para a sua vida de oração. Eleva-se a Deus por meio do sacrifício. "O Senhor chamou-o da sua terra natal e do seu povo". E, como mais tarde Nosso Senhor, prova a amargura do mundo solitário.

               Deus provou o Seu servo de várias e penosas e acima de tudo exigiu-lhe fé incondicional, confiança absoluta na Providência Divina.

               Podemos em verdade afirmar que a vida de alta contemplação do Profeta não se baseia apenas na prática de todas as virtudes, mas que esta prática e exercício da oração e da virtude heróica __ acompanham e seguem as suas visões e graças místicas. Estas graças místicas são dom gratuito de Deus, e Deus só as concede exigindo, como disposição e preparação humanas, sólidas e heróicas virtudes.

 

Capítulo- I

NO ESPÍRITO E NA FORÇA DE ELIAS

 

O Monte Carmelo, Refúgio da Vida Contemplativa, Caracterizada por Elias

 

              É de suma importância, tanto na vida espiritual como na vida comum de cada dia, termos um modelo em que inspirar-nos, um exemplo que possamos imitar. A espiritualidade Carmelita possui tal modelo.

               A Ordem do Carmo recebe o seu nome do monte sagrado em que teve origem. Na Terra Santa, onde cada montanha possui as suas grandes tradições e memórias, o Monte Carmelo pode gabar-se de algumas das mais santas e veneráveis. O Carmo ou o Carmelo é um nome afamado e conhecido, em todo o mundo cristão. A sua formosura natural rivaliza com a beleza das recordações que evoca. O seu perfil harmonioso eleva-se das águas do mediterrâneo, e do seu cume avista-se a ampla planície de Esdrelon a estender-se até ao longínquo horizonte, onde a alma contemplativa se debruça amorosamente sobre o mistério de Nazaré.

               O Carmelo é o sítio natural dos contemplativos. Não admira que nas suas vertentes se erga o Mosteiro do Carmo, o berço da Ordem. Sobranceiro ao redemoinho da vida e ao mar tempestuoso do mundo, a sua solidão está fora do alcance da inconstância da vida febricitante. Envolve-o a paz de Deus. Gostamos de identificar esta paz com o Carmelo, mas há outras recordações mais excitantes e mais turbulentas. A memória da tremenda luta espiritual de Elias contínua estreitamente vinculada ao monte santo. Foi aqui que o Profeta reuniu todo o povo de Israel para dirigir-lhe o seu mordaz desafio: "Até quando claudicareis com os dois pés? Se o Senhor é Deus, segui-O!" No Carmelo, Israel ouviu o seu repto na tocha flamejante de suas palavras de fogo. Elias, porém, foi mais do que o Profeta da espada, foi também aqui neste monte o primeiro da longa estirpe dos que adoram a Deus em espírito e em verdade. Reuniu à sua volta discípulos que dele aprenderam os profundos segredos da oração e da união com Deus. O seu duplo espírito passou para Eliseu, e deste para a escola dos Profetas, e pelos séculos afora a vida de Elias encontrou continuadores e renovadores nos ermitões que se deixaram inspirar por este seu grande modelo.    

               Quando a Europa foi sacudida pelo grito de guerra dos Cruzados: "Deus o quer!", e estes partiram para reconquistar os lugares santos, um dos primeiros pontos a ser ocupado foi o Monte Carmelo. Lá se encontraram as ruínas dos antigos santuários. Dizem que alguns ficaram na montanha para aí restaurar a vida antanho. Pela narrativa do monge grego João Focas (1177) sabemos que um dos Cruzados, São Bertoldo, foi exortado pelo Santo Profeta Elias a congregar os que no Monte Carmelo praticavam a vida eremítica, unindo-os numa comunidade religiosa. Isto talvez tenha acontecido em 1155. O Profeta, portanto, está no limiar da Ordem. Para prová-lo, apoiamo-nos não tanto em investigações históricas, mas sim nas marcas profundas que a sua memória e a sua vida deixaram na vida da Ordem. Elias foi sempre o grande modelo da Ordem. De fato, a sua influência tem sido tão constante que São Jerônimo o chama "pai de todos os eremitas e monges". Na sua carta a Paulino (Ep. 58 Ed. Migne, P. L. t. 22. pág. 583), refere-se a Elias, Noster princeps Elias, nostri duces filli Prophetarum (Elias, o nosso chefe: os filhos dos profetas, os nossos guias). Do mesmo modo, Cassiano, que nas sua Conferências, o aponta como o grande exemplo de todos os monges. O testemunho de Focas, já citado, confirma-se pelo de Tiago de Vittry, então Bispo de São João de Acre, que conhecia bem os eremitas. Escreveu-o em 1221, afirmando que muitos Cruzados permaneceram por devoção na Terra Santa, consagrando-se a Deus nos lugares santificados pela vida de Jesus Cristo. Alguns deles, continua o mesmo escritor, seguindo o exemplo de Elias, viviam nas grutas do Monte Carmelo ao pé da fonte do Profeta e do santuário de Santa Margarida. Não é providencial que os primeiros monges da Ordem do Carmo, como que para simbolizar a imitação de Elias, tenham bebido a água da fonte que dele recebeu o nome?

            Podemos mencionar também um velho manuscrito, "Institutio primorum Monachorum" (Vida dos primeiros Monges), que contém as mais antigas tradições da Ordem. Provavelmente foi composto no fim do século XIII ou no inicio do século XIV, depois da dispersão dos monges no Ocidente, mas em tempos passados era considerado de origem muito mais remota. Repositório de tradições consideravelmente mais antigas do que o próprio manuscrito, quer servir de guia seguro e permanente aos monges. Neste livro lemos que a direção dada a Elias pelo Espírito Santo e as promessas feitas aos Profetas hão-de ser os elementos normativos dos eremitas do Carmelo. A vida monástica deve seguir as linhas traçadas pela vida e experiência de Elias e refletir o seu duplo espírito, a saber, o apostolado e a prática da virtude na atividade individual ou social. Este duplo espirito tem uma tríplice significação.

SAGRADA FAMÍLIA: Outro Olhar, Por Frei Petrônio de Miranda, O. Carm. Direto da Comunidade Capim, Lagoa da Canoa/AL- Paróquia São Maximiliano Maria Kolbe- Dicese de Penedo. Domingo, 27 de dezembro-2020.

SANTA TERESINHA E O MENINO JESUS... Um Olhar Carmelitano para a Espiritualidade do Natal. Por Frei Petrônio de Miranda, O. Carm. Direto da Comunidade Capim, Lagoa da Canoa/AL- Paróquia São Maximiliano Maria Kolbe- Diocese de Penedo. Sábado, 26 de dezembro-2020. 

 

A Ratio nos diz que a oração é essencialmente um relacionamento pessoal, um diálogo entre Deus e o ser humano. Somos convidados a cultivá-la e a encontrar tempo e espaço para estarmos com o Senhor. A amizade só pode crescer através “da freqüente compatibilidade com Aquele que nos ama” (Santa Teresa d’Ávila – Livro da Vida 8,5) (Ratio 31). A Ratio continua dizendo que além de todas as questões da forma da oração, o importante é cultivar um relacionamento profundo com Cristo. Ela cita Santa Teresa mais uma vez dizendo que a oração perfeita “não consiste em muito pensar, e sim em muito amar” (Fundações 5,2; Castelo Interior 4, 1, 7) (Ratio). As Constituições nos lembram que: “A oração em silêncio é de grande ajuda no desenvolvimento de um espírito de contemplação. Portanto, devemos praticá-la diariamente por um período de tempo apropriado” (Art. 80).

Então o que é a oração em silêncio e o que é um período de tempo apropriado? Nossas vidas são muito agitadas, mas precisamos estabelecer prioridades. A oração é absolutamente essencial. O período de tempo depende do relacionamento da pessoa com Deus e, até certo ponto, depende da criatividade em encontrar espaço e tempo.

Todo relacionamento tem seu próprio ritmo. Geralmente, após um período de tempo, um relacionamento tende a ser menos complicado quando as duas pessoas se acostumam com o jeito uma da outra. Quando você não conhece bem uma pessoa, é difícil sentar em silêncio com ela. Temos a tendência de conversar. Ao conhecermos melhor a pessoa, o relacionamento torna-se mais fácil e sentar-se no silêncio amistoso torna-se normal e agradável. Quando entramos em harmonia com o outro podemos começar a ler seu silêncio. Trata-se de um relacionamento íntimo. O silêncio pode ser mais eloqüente do que muitas palavras.

É muito normal que no decorrer do tempo nossa oração se torne mais e mais simples. Pode ser que já tenhamos uma palavra que resuma tudo que queremos dizer a Deus. Dizer essa palavra significa milhares de coisas. Jesus abriu seu coração a seus discípulos e partilhou conosco o nome especial que tinha para Deus. Esse nome é “Abba”. Essa palavra contém todo relacionamento de Jesus com o Pai. É muito útil trabalhar nossa própria estenografia com Deus para que possamos lembrar durante o dia da presença constante de Deus conosco ao repetirmos uma simples palavra ou frase.

Cada relacionamento com o Senhor é diferente. Se você aproveita o máximo em sentar-se e conversar com o Senhor, ou de meditar sobre um tema, ou de ler e pensar sobre uma passagem da Escritura, ou de refletir sobre um livro espiritual, isso é bom. Por favor, continue a fazer isso. No entanto, podem existir momentos numa jornada de oração quando a pessoa se torna um pouco confusa e procura para onde ir. Também é comum ser levado ao silêncio durante a oração e, a princípio, isso pode parecer estranho e assustador. Não sabemos o que fazer e temos a sensação de estarmos perdendo tempo. A grande tentação é deixar de lado a oração porque não podemos mais encontrar o consolo que tivemos e ceder à sensação de perda de tempo. Como Santa Teresa d’Ávila, insisto que você não ceda a essa tentação e tenha uma “determinação muito determinada” de agarrar-se à oração especialmente quando ela não está de acordo com os seus planos.

É uma experiência muito comum passar por períodos prolongados de aridez na oração. Mais uma vez sentimos como se estivéssemos desistindo ou chateados. Sentimos que Deus foi embora não deixando endereço. Se, de alguma forma, mesmo no meio da confusão e da aridez, estamos convencidos do valor da oração, devemos apenas nos sentar na poeira e esperar por Deus. Em ocasiões muito estranhas em que um pensamento santo flutua sobre o rio de nossa consciência, temos a tendência de nos precipitarmos sobre ele e sufocá-lo, exaurindo-o por estarmos ressecados. No entanto, existe outra forma de lidar com esses pensamentos santos ocasionais. Não importa o quanto possam parecer santos, eles são nossos pensamentos, por isso subtende-se que deixamos que eles venham ou não. Se esses pensamentos forem verdadeiramente de Deus, retornarão em outro momento.

Existem muitos métodos de esperar por Deus no silêncio. Gostaria de propor um método de oração que pode fazer com que o silêncio seja muito produtivo e que pode nos ajudar a esperar por Deus no silêncio. Trata-se de um método de oração cristão baseado na rica tradição contemplativa e, especialmente, num livro clássico dessa tradição, “A Nuvem do Não-Saber”, um escrito anônimo do século XIV. Não estou sugerindo que devemos deixar de lado outras formas pessoais de oração, mas esse método pode aprofundar esses outros métodos e torná-los mais produtivos. O mais importante para esse tipo de oração é estar convencido de que Deus não está longe, mas muito perto. Deus faz sua morada em nós (cf. Jo 14,23).

Esse método de oração pode ser chamado de oração do silêncio ou de oração do desejo porque, no silêncio, nos voltamos para Deus com nosso desejo. Ele também foi chamado de oração em segredo, seguindo o conselho de Jesus para entramos em nosso quarto e rezarmos ao Pai ocultamente (M 6,6). A primeira fase dessa oração é encontrar um local adequado onde as interrupções sejam reduzidas ao mínimo. Depois se coloque numa posição confortável que você possa manter durante todo tempo da oração. Recomenda-se um mínimo de 20 minutos. Pode-se começar essa oração com uma pequena leitura da Bíblia. Não é hora de pensar no significado das palavras. Esse tipo de meditação fica para outra hora. Agora é hora de simplesmente estar na presença de Deus e de consentir na ação divina com nossa intenção. Então, com os olhos fechados, introduza gentilmente uma palavra sagrada em seu coração. Uma palavra sagrada é aquela que tem um grande significado para você em seu relacionamento contínuo com Deus. A palavra sagrada deve ser sagrada para você. De acordo com o ensinamento de “A Nuvem do Não Saber”, é melhor que essa palavra seja breve, de uma sílaba se possível. Sugiro algumas palavras: “Deus, Senhor, Amor, Jesus, Espírito, Pai, Maria, Sim”. Escolha uma palavra significativa para você. Talvez você pense em uma, se pedir a ajuda de Deus.

Quando peço que você introduza uma palavra sagrada no seu coração, não estou sugerindo que você a pronuncie com seus lábios, ou mesmo mentalmente, mas acolha-a dentro de você sem pensar em seu significado. Não é necessário forçar a palavra sagrada. Ela deve ser muito gentil. A palavra sagrada não é um mantra a ser repetido constantemente. A palavra concentra nosso desejo e sempre a usamos do mesmo modo simplesmente voltando nosso coração para o Senhor assim que percebemos que estamos distraídos. Essa é uma oração de intenção e não de atenção. Nossa intenção é estar na presença de Deus e consentir na ação divina em nossas vidas. A palavra sagrada expressa essa intenção e, assim, quanto tomamos consciência de que estamos pensando em algo diferente, podemos decidir se continuamos com a distração por ser mais interessante, ou se voltamos nossa intenção para a presença de Deus e consentimos com aquilo que Deus quer realizar em nós. Voltamos nosso coração para Deus pelo uso da palavra sagrada. Ela é um símbolo de nossa intenção. Não é necessário repeti-la freqüentemente, apenas quando desejamos voltar nosso coração para Deus.

Durante essa oração, não é hora de conversar com Deus usando belas palavras ou mesmo de ter pensamentos santos, mesmo se pensamos que são inspirações de Deus. É melhor deixar essas coisas para outro momento. Nosso silêncio e nosso desejo valem mais do que palavras.

Através da palavra que escolhemos, expressamos nosso desejo e nossa intenção de permanecer na presença de Deus e de consentir com a ação divina purificante e transformadora. Voltamos para a palavra sagrada, que é o símbolo de nossa intenção e de nosso desejo, apenas quando tomamos consciência de estarmos envolvidos em algo diferente.

A oração consiste simplesmente em estar na presença de Deus sem pensar em nada em especial. Se você compreende como estar em silêncio com outra pessoa sem pensar ou fazer algo em especial, então você será capaz de compreender do que trata a oração. Nem todas as pessoas se adaptam a esse método de oração. Se você sentir um chamado interior para um silêncio maior, ele pode ajudá-lo.

No final do período que você decidiu dedicar à oração, talvez você possa dizer um Pai Nosso ou outra oração lentamente. É bom permanecer em silêncio por alguns momentos para se preparar para levar o fruto de sua oração para sua vida pessoal.

(Convido você a rezar agora e usar brevemente esse método de oração em segredo. Fique à vontade e entre na sala secreta de seu coração onde Deus mora. Para marcar o final do tempo de oração recitarei lentamente uma oração comum. Esse é o momento de reajustar-se ao momento presente).

* ASSEMBLÉIA DA PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO – JANEIRO 2007

 

Foi o carmelita descalço de Lourenço da Ressurreição quem primeiro viveu e tornou famosa a Prática da presença de Deus. Essa prática é muito simples e, ao mesmo tempo, muito difícil. A Regra nos lembra: “que tudo seja feito na Palavra do Senhor” (Regra 19). Isso é um eco da carta aos Colossenses: “E tudo o que vocês fizerem através de palavras ou ações, o façam em nome do Senhor Jesus” (Cl 3,17). A prática da presença de Deus é um método de oração simples porque não requer qualquer regra complicada. Significa simplesmente viver na verdade.

Deus está presente em cada momento de nossas vidas, mantendo-nos vivos. Essa prática envolve partilhar com Deus tudo que acontece com você. Não é necessário conversar com Deus apenas sobre coisas sagradas. Podemos falar com Deus sobre o que nos interessa e partilhar com Deus o que acontece conosco. Lourenço da Ressurreição conversou com Deus sobre todos os detalhes práticos de seu trabalho como cozinheiro e tesoureiro comunitário. Santa Teresa d’Ávila nos lembra que Deus caminha entre os utensílios da cozinha. Deus está no meio da realidade que nos rodeia, seja ela qual for. Nós não trazemos Cristo para as circunstâncias em que vivemos. Ele está lá antes de nós.

A prática da presença de Deus é um modo de continuar o diálogo com Deus durante todo o dia. O Concílio Vaticano Segundo enfatizou o perigo da divisão entre fé e vida. Elas são e devem ser uma. Partilhar os eventos do dia é um modo de permitir que a Palavra de Deus influencie tudo que fazemos, pensamos ou dizemos. Se não temos vergonha de fazer ou dizer alguma coisa na presença de Deus, estamos vivendo uma ilusão ou nossas ações e palavras estão realmente de acordo com a vontade de Deus. Nosso falso eu levantará todos os tipos de razões para nos assegurar de que estamos certos e que não precisamos de mudança. Para vivermos na presença de Deus e trilharmos o caminho espiritual, a honestidade é uma virtude algumas vezes dolorosa, mas essencial.

* ASSEMBLÉIA DA PROVÍNCIA DO RIO DE JANEIRO – JANEIRO 2007

Frei Jorge Van Kampen, Carmelita. In Memoriam. (*17/04/1932 + 08/08/2013

 

Na festa de Nossa Senhora da Conceição o Evangelho de Lucas chama Maria com um novo nome: “Alegre-te, jovem amada e favorecida por Deus. O Senhor está contigo”. No Antigo Testamento, às vezes, um profeta poderia ser chamado: amado e favorecido por Deus, mas nunca foi chamado assim como se fosse um nome próprio. Aqui vemos, que Maria é chamada assim por ela ser um Templo da presença de Deus. E isto só poderia ser porque, como disse o anjo: A sombra do Espírito de Deus estará sobre ti”.

 

Liturgia da Palavra:

Deus quer a vida para as suas criaturas e não a morte violenta (Gen. 3,9-20) e criou o homem e a mulher para uma vida feliz (Ef. 1,3 -12). Por isso Deus veio restaurar o sentido da vida pelo exemplo de Maria (Luc. 1,26-38).

 

Reflexão.

A grandeza de Maria está na sua simplicidade e modéstia. Talvez seja exatamente a modéstia, que fez Maria tão grande para nós. Quem lê a Bíblia com fé, encontra em Maria um modelo. Maria foi sempre uma mulher impressionante. “Feliz porque acreditou, o que vai acontecer o que Deus falou”, diz Lucas.

Sabemos pouco sobre Maria, mas o pouco que sabemos, é suficiente. É uma mulher, que estava pronta para tudo. Ela sentia, a onde ela devia estar. Já grávida, fez uma caminhada difícil para atender sua parente Izabel, que estava prestes a dar à luz. Não era uma visita obrigatória ou de cortesia, mas ela está simplesmente a disposição, para atender a pessoa que necessita da sua ajuda. “Eis a serva do Senhor, faça-se em mim conforme a palavra de Deus”. Quando nós dizemos, que ela está cheia de graça, dizemos ainda pouco. Encontrar-se com Maria é uma benção. O diálogo do anjo com Maria é uma riqueza de modéstia e, ao mesmo tempo, de sublimidade.

 

Resposta à Palavra de Deus.

Convertidos e consagrados a Deus podemos contar com Maria: O senhor fez em mim maravilhas; santo é o seu nome.

Frei Joseph Chalmers, O. Carm. Ex- Prior Geral (Ex-Frade Carmelita)

A Ordem sempre afirmou que a contemplação está no coração de nossa vocação. O Institutio Primorum Monachorum, que desde o século 14 foi o documento para a formação de todos os jovens carmelitas, diz: “O objetivo dessa vida tem duplo sentido: Uma parte alcançamos através de nosso próprio esforço e do exercício das virtudes, com a ajuda da graça divina. Isso significa oferecer a Deus um coração que é sagrado e puro da verdadeira mancha do pecado. Alcançamos este objetivo quando somos perfeitos e ‘in Carith’, isto é, escondido naquela caridade que o Homem Sábio diz: ‘O amor cobre todas as ofensas’ (Pr 10,12). ... O outro objetivo desta vida nos é concedido como um dom gratuito de Deus; ou seja, saborear algo no coração e experimentar na mente o poder da presença divina e da doçura da glória celestial não apenas após a morte mas também nesta vida mortal (Livro 1, cap. 2). Santa Teresa e São João da Cruz foram formados na tradição carmelitana e conduziram a Ordem de volta à sua inspiração inicial, assim como todas as outras reformas através da história da Ordem. Santa Teresa e São João da Cruz são modelos de gênios espirituais e, para aqueles que desejam compreender mais o desenvolvimento da contemplação dentro da pessoa, é essencial estudar estes santos.

Nesta apresentação do carisma carmelitano, a Ordem declara nas Constituições dos frades: “Os carmelitas buscam viver em fidelidade a Jesus Cristo através do compromisso de buscar a face do Deus vivo (a dimensão contemplativa da vida), através da fraternidade e do serviço no meio do povo” (Const. 14). Outro artigo nas Constituições diz: “A tradição da Ordem tem interpretado a Regra e o carisma inicial como expressões da dimensão contemplativa da vida e os grandes mestres espirituais da Família Carmelitana sempre se voltaram para esta vocação contemplativa” (Const. 17). De acordo com as Constituições, a contemplação “é uma experiência transformadora do amor esmagador de Deus. Esse amor nos esvazia de nossa maneira humana de pensar, amar e agir, limitada e imperfeita, divinizando-a” (Const. 17). Nas Constituições das Congregações afiliadas e na recentemente aprovada Regra da Ordem Terceira, aparece a mesma insistência na contemplação.

A Ratio Institutionis Vitae Carmelitana e (o documento da formação ao qual nos referiremos como Ratio) dos frades, esclarece o papel da contemplação no carisma da Ordem: “A dimensão contemplativa não é meramente um dos elementos de nosso carisma (oração, fraternidade e serviço): ela é o elemento dinâmico que os une.

Na oração nos abrimos para Deus que, por sua ação, nos transforma gradualmente através de todos os grandes e pequenos eventos de nossas vidas. Esse processo de transformação nos possibilita iniciar e manter relacionamentos fraternos autênticos. Ele nos faz desejosos de servir, capazes de compaixão e de solidariedade, e nos permite colocar diante do Pai as aspirações, angústias, esperanças e súplicas do povo.

A fraternidade é o teste básico da autenticidade da transformação que está acontecendo dentro de nós” (Ratio 23). A Ratio continua dizendo: “Através dessa transformação gradual e contínua em Cristo, que é realizada dentro de nós pelo Espírito, Deus nos chama em sua direção numa jornada interior que nos leva das margens dispersivas da vida ao âmago de nosso ser, onde Deus mora e nos une a ele.

O processo interior que leva ao desenvolvimento da dimensão contemplativa nos ajuda a adquirir uma atitude de abertura à presença de Deus em nossa vida, nos ensina a ver o mundo com os olhos de Deus e nos inspira a buscar, reconhecer, amar e servir a Deus naqueles que estão à nossa volta” (Ratio 24).

O objetivo da jornada contemplativa é nos tornarmos amigos amadurecidos de Jesus Cristo a tal ponto que seus valores se tornem nossos valores e comecemos a ver com os olhos de Deus e a amar com o coração de Deus. A contemplação autêntica deve encontrar expressão num compromisso de serviço, quer seja realizado através de um apostolado ativo, quer dentro de um mosteiro. Quando contempla o mundo, Deus vê para além do exterior. Deus vê a motivação do coração humano. A autêntica experiência de Deus de uma comunidade contemplativa nos leva a tornar nossa “a missão de Jesus, que foi enviado para proclamar a Boa Nova do Reino de Deus e a realizar a libertação total da humanidade de todo pecado e opressão” (Ratio, 38)

Joseph Chalmers, O. Carm. Ex- Prior Geral (Ex-Frade Carmelita)

Em nossa jornada de fé, existem momentos em que somos levados ao deserto. Algumas vezes caminhamos pelo deserto seguindo o chamado de Deus ou apenas nos encontramos lá por força das circunstâncias. O deserto é árido e pode ser um lugar assustador. O que significa tudo isso? Podemos ser tentados a não seguir adiante na jornada porque sentimos que ela não vale toda a dificuldade. Então Deus nos envia um mensageiro (cf. 1Rs 19,4-7). Este mensageiro pode vir de todas as formas e tamanhos. Ele, ou ela, nos encoraja a comer e beber, pois a jornada é longa. Somos encorajados a comer o pão da vida e a beber da fonte do Carmelo, que é a tradição carmelitana, que deu vida a muitas gerações antes de nós. Mas talvez estejamos muito deprimidos para nos darmos conta disso. Então o mensageiro de Deus nos cutuca novamente e nos encoraja a comer e beber. É um grande desafio reconhecer o que Deus está nos dizendo através de nossa vida diária bem como reconhecer a voz de Deus na voz, ou através da voz, de algumas pessoas insignificantes.

Nossa fé, esperança e amor, estas três virtudes cristãs essenciais, estão no princípio de nossa jornada, sustentadas no que aprendemos com os outros. Ao continuarmos na jornada, nossas razões humanas para acreditar, para esperar em Deus e para amar como Cristo mandou, começam a esgotar-se. Elas não são mais suficientes. Podemos jogar tudo para o alto, porque a jornada é bem precária e o fim é incerto ou também podemos rejeitar o mensageiro e ficar exatamente onde estamos. Ou podemos continuar a jornada dentro da noite (1Rs 19,4-7). Um elemento essencial em nossa jornada em direção à transformação é a noite escura. Esta noite nunca teve a intenção de ser algo sombrio ou impossível, mas um convite para que nos libertemos de nosso modo humano e limitado de pensar, amar e agir para que possamos pensar, amar e agir de acordo com os desígnios de Deus (cf. Constituições dos Frades, 17).

João da Cruz nos dá descrições magistrais dos diversos elementos que se seguem para compor a noite, mas não é uniforme para todos. A noite é experimentada pelas pessoas de modos diferentes e é realizada precisamente para ajudar a purificação de cada indivíduo em particular. A noite escura não é uma punição pelo pecado ou pela infidelidade, mas é um sinal da proximidade de Deus. A noite escura é o trabalho de Deus e leva à completa libertação da pessoa humana. Por isso, ela deve ser acolhida apesar da dor e da confusão envolvida. A noite escura pode ser experimentada não apenas por indivíduos mas também por grupos e sociedades (cf. Lm 3,1-24).

A jornada de transformação geralmente dura muito tempo porque a purificação e a mudança que acontecem no ser humano são profundas. Não se trata apenas de uma mudança de ideia ou de opinião. Trata-se de uma completa transformação nos nossos relacionamentos com o mundo ao nosso redor, com as outras pessoas e com Deus. Os índios americanos têm um ditado lembrando que temos de caminhar uma milha no caminho de outra pessoa antes de compreendê-la. Jesus advertiu seu seguidores para não julgarem (Lc 6,37; Rm 14,3-4) e a razão é muito simples: não podemos ver as coisas a partir do ponto de vista de outra pessoa e, portanto, não conhecemos os motivos por trás de suas ações. Contudo, o processo da transformação cristã leva o ser humano em direção a uma profunda mudança de perspectiva, de seu próprio modo de ver as coisas para o modo de Deus vê-las. Isso envolve uma profunda purificação e esvaziamento de tudo que nos prende para que possamos ser preenchidos por Deus.

Essa jornada contemplativa, tanto no nível pessoal quando no comunitário, purifica nossos corações de modo que possamos ter espaço para os outros e possamos ouvir o clamor dos pobres sem traduzi-lo pelo filtro de nossas próprias necessidades. Então seremos capazes de realizar o desafio formulado pelo papa João Paulo II:

            “Homens e mulheres consagrados são enviados a proclamar, através do testemunho de suas vidas, o valor da fraternidade cristã e o poder transformador da Boa Nova, que torna possível ver todas as pessoas como filhos e filhas de Deus e inspira um amor auto-doador para todos, especialmente os menores de nossos irmãos e irmãs” (VC 51).

 

Frei Jorge Van Kampen, Carmelita. In Memoriam. (*17/04/1932 + 08/08/2013)

              

Jesus pregava que Seu Reino seria um Reino de amor. O amor é algo que menos se pode impor. É um sentimento tão livre, que ninguém o pode conquistar à força. Pode-se impor com violência o poder, ou por obediência, mas ninguém pode mandar, que nos amem.

Jesus fez do amor o primeiro mandamento, e foi mais longe. Quis que amamos todas as pessoas. Como isto é difícil! O esforço exige, às vezes o amor da sua esposa, ou vice-versa, e não se encontra o amor.

Nem sempre conquistamos o amor de um irmão ou de um filho. Jesus não contenta com um ano de dedicação. A prática de amor é para sempre, sem nenhum arrependimento. Também Cristo quer ser amado.

Um homem que como ele, que foi abandonado em vida pelos seus próprios amigos; que morreu desprezado como criminoso e expirou numa cruz no meio de insultos, não seria muita pretensão de querer ser amado? Milhões de pessoas o amam, com amor sincero, um amor que se traduz em sacrifícios; quantos mártires deram sua vida por ele.

Os fariseus chamam Jesus de sedutor. De fato ele seduz, mas no verdadeiro sentido da palavra.

 

Liturgia da Palavra de Deus.

Ezequiel insiste muito em reconhecer Deus como Supremo Pastor (Ez. 34, 11-17). Paulo mostra, que a ressurreição de Cristo comprova a nossa ressurreição (1 Cor. 15, 20-28). Cristo veio colocar um ponto final a desordem existente (Mat. 25, 31-46).

 

Reflexão.

Senhor Deus, outro dia vi um eucalipto muito alto e retinho. Parecia até que queria usar as nuvens como chapéu. Vi também outra árvore baixinha, raquítica e toda retorcida. Pensei comigo: “As pessoas são como árvores. Umas se levantam mais gigantes e outras se arrastam pelo chão como serpentes venenosas”.

Há pessoas que se elevam em nobrezas e dedicação, muito acima do esperado e exigido; e há outras que se rebaixam em covardia e maldade. Aquelas que vivem animados por um ideal bonito, e enxergam o rosto do Senhor na figura do próximo a outros que servem de inspiração para ninguém.

Elas podem até cumular bens e tornar-se ricas em poder, mas continuam levianas e sem a preocupação de imprimir profundamente a vida. Para nos chamar a responsabilidade pela pessoa que sofre, houve um santo chamado Basílio, que disse: “O pão que em vossa casa fica como sobra inútil, é o pão daquele que passa fome;  a camisa que fica guardada só em vosso guarda-roupa, é a camisa daquele que está nu. Vós cometeis tantas injustiças, quantas são as obras de beneficência, que deixais de praticar”.

O senhor adivinha, o que eu quero dizer? É isto mesmo: gostaria de ser gente muito boa, como Jesus de Nazaré. Vou deixar-me contaminar por ele. É ele que deve “reinar” reinar sobre mim. Hoje um pouco, amanhã mais. Quero ser gente boa e assim poderei levar alguém comigo no bem. Amém.

 

Resposta a Palavra de Deus.

Jesus se solidarizou totalmente com os necessitados. Ele não desejou nada para si. Só quer servir através dos irmãos. Ele deixou bem claro que seguir a ele, ultrapassa todos os rótulos e títulos.

Por: Patricia Fachin 

Santa Teresinha do Menino Jesus e da Sagrada Face, carmelita francesa que viveu durante 24 anos e é a doutora mais jovem da Igreja, apesar da pouca idade, nos convida a refletir sobre nossas misérias e a buscar a santidade vivida pelos santos. Parece uma utopia, mas nós gostamos, buscamos e, acima de tudo, precisamos da utopia. O comentário é de Patricia Fachin, jornalista, graduada e mestre em Filosofia pela Unisinos.

 

Eis o texto.

Nos últimos anos, especialmente em períodos eleitorais como este que estamos vivendo, tomamos consciência do ódio que sentimos pelo outro. Famílias e amizades são destruídas porque, embora todos preguemos a fraternidade e a misericórdia ao próximo, nos deixamos dominar pelo ódio que habita em cada um. Abrir mão desse tipo de sentimento, não somente da boca para fora em nossos discursos sobre como a vida deve ser vivida e não como a vivemos, requer um esforço diário que pode ser iniciado com o exame de consciência.

Santa Teresinha do Menino Jesus e da Sagrada Face, carmelita francesa que viveu durante 24 anos e é a doutora mais jovem da Igreja, apesar da pouca idade, nos convida a refletir sobre nossas misérias e a buscar a santidade vivida pelos santos. Parece uma utopia, mas nós gostamos, buscamos e, acima de tudo, precisamos da utopia.

Em "História de uma Alma", livro publicado pelas irmãs do Carmelo de Lisieux em 1898, depois de sua morte, Santa Teresinha nos mostra como podemos viver em direção à santidade. Ela é a prova viva de que não é difícil, não é uma utopia; é uma escolha, uma mudança de vida, uma conversão integral que nos move na direção dos dois mandamentos de Cristo, quando questionado pelos fariseus sobre qual é a lei fundamental que devemos seguir, entre as inúmeras que regem a nossa vida: Amar a Deus sobre todas as coisas e amar ao próximo como a si mesmo. É realmente transformador. É a revolução que tantos buscam em tantos caminhos e descaminhos. Que possamos aprender com esta que é considerada por alguns "a maior entre os santos modernos". Fonte: http://www.ihu.unisinos.br

 

Frei Petrônio de Miranda, O. Carm

Convento do Convento do Carmo de Angra dos Reis/RJ. Segunda-feira, 26 de outubro-2020.

 

A infidelidade de cada 

Bom dia, boa tarde e boa noite meu amigo diário. Como você foi sempre fiel aos seus objetivos e focos, quero neste dia te parabenizar. Não sei onde você encontra forças para seguir com esta vida certinha e fiel às 24 horas!

Sim, louvo por esta tua coragem e foco nos teus projetos e relações. Ah! Eu sei que não é fácil caminhar sem desviar e adentrar nas encruzilhadas da vida, afinal, vivemos na sociedade descartável onde tudo pode e tudo muda no piscar de olhos. De fato, você é um exemplo para o meu trilhar nesta vida recheada de traições, falsidades e devaneios.

Você disse fidelidade? Você disse foco e objetivo? Quem dera, quem dera! Na verdade, não sou aquilo que aparento ser, procuro rebuscar ou aprimorar as minhas infidelidades diárias. Digo, quando caiu, olho no espelho da vida e sei que o importante é levantar-me logo em seguida, quando desvio o olhar dos meus objetivos traçados, sei que os meus olhos precisam mudar de direção, quando perco o rumo do caminho, lembro-me que estou perdido nas trilhas traiçoeiras onde só tem espinhos e estrupícios que ficam torcendo pelo meu fracasso e queda. Este, amigo diário, é o meu segredo de sucesso.  

Tudo bem meu fiel anjo diário. Mas vem cá, é possível levantar-se sem se ferir depois da queda? É possível continuar no caminho depois dos desvios? É possível amar depois das traições? É possível olhar no olho depois das eternas mentiras? É possível recomeçar depois das fraquezas de cada dia?...

Sim, sim, tudo é possível, quando nos reconhecemos quebrados, limitados e necessitados de concerto, afinal, o que seria de Maria Madalena sem o perdão de Jesus? O que seria de Pedro após ter negado o Filho de Deus por três vezes, se não fosse a amorosidade de Jesus? O que seria da nossa cidade, se Deus tivesse olhado com os mesmos olhos que olhou e condenou Sodoma e Gomorra?

Ah! Tá, quer dizer que podemos ser infiéis e depois voltar atrás das sujeiras cometidas e tudo bem? Não, não amigo diário! Não é que a infidelidade seja o nosso brinquedo, mas as nossas escolhas fazem tais opções e, contando com a misericórdia de Deus, buscaremos forças para nos levantar e recomeçar tudo de novo. E tenho dito!

 

Por Gilvander Moreira[1]

 

Que beleza e que responsabilidade integrar a Província Carmelitana de Santo Elias, da qual faz parte Frei Carlos Mesters! Que maravilha termos a companhia de Frei Carlos Mesters, que dia 20 de outubro de 2020, celebra 89 anos de idade e a maior parte da sua vida dedicada ao Carmelo, à Leitura Popular da Bíblia e aos pobres nas lutas por libertação.

A primeira vez que vi Frei Carlos Mesters foi em maio de 1984, quando eu estava no noviciado, no agreste do Pernambuco. Estávamos arrancando feijão na roça. Frei Carlos Mesters chegou, cumprimentou todos os vinte noviços, se abaixou e começou a arrancar feijão ao nosso lado. Colhemos 25 sacos de feijão naquela safra. Fiquei surpreso e pensava: “Um doutor em Bíblia arrancando feijão conosco?!” Ali eu já percebi em Frei Carlos a humildade, a mãe de todas as outras virtudes. Depois veio uma semana de estudo dos Salmos, muitos pequenos encontros de formação bíblica, sete anos de INTERCAB (Encontro Intercarmelitano dos/as Carmelitas no Brasil), sete anos de CARMELO BÍBLIA, a celebração dos 60 anos de Frei Carlos dia 20 de outubro de 1991, em São Paulo, momento em que tive a alegria de gravar e depois transcrever os inúmeros depoimentos das pessoas que em uma grande fila queriam falar sobre a atuação de Frei Carlos. No meio da celebração, Dom Pedro Casaldáliga, de surpresa, chegou na celebração dos 60 anos de Frei Carlos Mesters. Chegou carregando um grande pote e, retirando de dentro do pote uma Bíblia da edição Pastoral, dizia: “Frei Carlos Mesters é presença do Deus da vida no nosso meio que retira do baú, do pote, coisas velhas que são coisas da vida e da caminhada. Carlos Mesters democratiza o acesso aos textos bíblicos ao nos ensinar a fazer leitura bíblica de forma comunitária, ecumênica, transformadora e militante. Quem não leu ainda deve ler todos os livrinhos do frei Carlos Mesters. Seus textos, frei Carlos, nos ajudam na caminhada de enfrentamento ao latifúndio, na Opção pelos Pobres, na luta pela terra e pelos direitos dos povos indígenas.” Publicamos os depoimentos em um número especial de uma Revista Carmelitana.

Após ouvir atentamente todas/os, Frei Carlos, com humildade que lhe é característica e sabedoria ímpar, agradeceu a todas/os e disse: “Esse “poeirão” – tudo que vocês dizem que tenho feito – que vocês estão vendo não sou eu que estou fazendo. Sou apenas uma formiguinha em cima do camelo, que belisca o camelo e o faz andar. Quem causa o “poeirão” que vocês estão vendo são as patas do camelo: Deus Javé e Jesus Cristo, nosso irmão, que sempre fazem opção pelos pobres, abraçam suas causas e caminham junto conosco e em nós”.

Naquele dia, Frei Carlos recebeu um telefonema da África do Sul com mensagem de Frei Alberto Nolan que dizia: “Traduzimos vários livrinhos do Frei Carlos Mesters aqui na África do Sul e constatamos depois que a leitura dos textos de Frei Carlos Mesters foram imprescindíveis para a superação do apartheid racial e social, que era sustentado em uma leitura racista e fundamentalista da Bíblia.”

O 1º livro de Frei Carlos que li foi “Maria, mãe de Jesus”, depois “Missão do Povo que sofre”, “Seis dias nos porões da humanidade”, “Flor sem defesa”, “Por trás das palavras”, “Jeremias, boca de Deus e boca do povo”, “Apocalipse, esperança de um povo” etc e etc. Ah! Inesquecível também: Frei Carlos foi meu orientador em um trem chamado monografia de conclusão do curso de Teologia que virou o livrinho “Compaixão-Misericórdia, uma espiritualidade que humaniza” (Paulinas, 1996). Inesquecível também! Durante dois anos, Frei Carlos, nosso querido e saudoso ex-frei Argemiro, e eu nos reunimos inúmeras vezes e construímos o roteiro que virou o filme Pedra em flor sobre a Leitura Popular da Bíblia.

Celebrar mais um ano de vida de Frei Carlos Mesters: que beleza espiritual-humana! Tempo de kairós para recordarmos os inúmeros momentos inesquecíveis e marcantes vivenciados ao lado do Paulo Freire da Bíblia: Frei Carlos Mesters. Gratidão eterna, Frei Carlos Mesters. Abraço terno. Frei Gilvander

 

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente da CPT, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH e de Teologia bíblica no SAB, em Belo Horizonte, MG. E-mail: Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar. – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br      –       www.twitter.com/gilvanderluis        –    Facebook: Gilvander Moreira III

Fonte: https://cebimg.org.br

O confrade foi internado no último dia 15, para realizar um procedimento cirúrgico na próstata em Brasília/DF e continua na UTI. Rezemos! Convento do Carmo de Angra dos Reis/RJ. Domingo, 18 de outubro-2020.